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A musa e o xodó: Pola Oloixarac e Valter Hugo Mãe

08/07/2011

Foto de Walter Craveiro/Divulgação

A Flip teve finalmente seu momento de emoção explítica na mesa de hoje ao meio-dia, chamada “Pontos de fuga”, que reuniu o português Valter Hugo Mãe e a argentina Pola Oloixarac. Surpreendentemente, os papeis tradicionais se inverteram: Pola, que antes mesmo de pisar em Paraty já carregava o título (merecidíssimo) de musa da Flip, foi o lado racional da conversa, e coube a Mãe, que chegou às lágrimas ao ler um simpático texto sobre a importância do Brasil em sua geografia emocional, arrebatar o público que lotou a Tenda dos Autores e ser aplaudido de pé.

“Foi a mesa dos baixos instintos”, comentou uma velha raposa da Flip, referindo-se tanto àqueles instigados em parte da audiência pelas longas pernas envoltas em meias pretas da escritora argentina quanto aos que, de natureza diferente , o autor de “a máquina de fazer espanhóis” despertou ao falar de sua infância marcada por telenovelas e vizinhos vindos do Brasil, todos envoltos em certa aura de magia, e agradecer no fim, com voz embargada, o convite para visitar o país como escritor. “Sinto que fazem de mim um homem de ouro”, disse, referindo-se a um episódio de sua infância em que o fato de ser vizinho e amigo de duas moças brasileiras mais velhas representava um “toque de Midas” que lhe valia pequenos favores sexuais de amiguinhas portuguesas.

Com um discurso sempre pautado pela emoção, tanto ao falar do pai que morreu precocemente quanto do filho que ultimamente tem sentido vontade de ter, Valter Hugo Mãe – um excelente escritor, é bom deixar claro – disse que, chamado Lemos no registro civil, escolheu seu sobrenome artístico justamente pelo sentido de amor incondicional que ele carrega, algo que esperava ver transferido para a relação do leitor com seus livros. “Para mim, os livros são máquinas de fazer sentir”, afirmou.

Pola trilhou caminho bem diverso na conversa. Com uma simpatia temperada por timidez, arriscou frases em um português surpreendentemente fluente, mas em relação ao livro que a trouxe à Flip, o romance “As teorias selvagens”, adotou um tom racional e frequentemente técnico. “Gosto de pensar na cultura como um espaço em guerra, guerra por significados. Quando escrevi o romance queria conversar com certa substancia contemporanea, e tinha a sensação de que, para escrever, era importante ter uma imaginação política”.

Num momento engraçado da conversa, Mãe tinha acabado de falar sobre a questão de ter ou não ter um filho quando Pola o atalhou: “Se fosse eu a falar disso, diriam que eu pareço um personagem de ‘Sex and the city’”. A inversão dos papéis tradicionais – homem emotivo, mulher racional – foi realmente a marca da mesa, além de algo que Pola declarou incomodá-la na recepção de sua literatura. “Me parece que quando uma mulher fala de ideias, com certa ambição mental, tenta-se trivializar isso, como se ela no fundo estivesse falando de outras coisas, de emoções, de relações familiares”, afirmou.

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