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Notícia da atual literatura brasileira: instinto de internacionalidade (II)

23/08/2010

Falávamos das respostas que a literatura brasileira ensaiou ao longo da história para a velha charada de produzir arte relevante num país situado na periferia econômica e cultural do mundo. Como já deixei sugerido, acredito que o novo livro de João Paulo Cuenca, “O único final feliz para uma história de amor é um acidente”, possa trazer um ou dois elementos novos para a conversa. Um deles é o de, roubando novamente a ideia de Machado de Assis com sinal trocado, nos fazer pensar que boa parte da literatura brasileira contemporânea pode estar sofrendo de uma “internacionalidade de vocabulário”. Par oposto do nativismo de Alencar e Gonçalves, em que o índio é enfiado numa forma europeia sem alterá-la significativamente, a “internacionalidade de vocabulário” seria a propensão de soar cosmopolita (todos queremos ser universais, certo?) por meio da citação, do adorno, da ostentação de cultura, sem que isso altere de modo significativo o que está sendo narrado e como.

Às vésperas da Copa de Literatura de 2009, o jurado e blogueiro que se assina Doutor Plausível escreveu um artigo curioso afirmando ter contado um a um os casos de name-dropping, de citação de pessoas ou objetos culturais – nacionais e estrangeiros – em meia dúzia de romances brasileiros contemporâneos, inclusive um meu. Apurou uma goleada dos estrangeiros (a ordem é a mesma exposta por Plausível):

“As sementes de Flowerville”, de Sérgio Rodrigues: 26 x 1
“Corpo estranho”, de Adriana Lunardi: 42 x 3
“Lugares que não conheço…”, de Cecilia Gianneti: 9 x 5
“Toda terça”, de Carola Saavedra: 27 x 2
“O dia Mastroianni”, de João Paulo Cuenca: 23 x 2
“O filho eterno”, de Cristovão Tezza: 107 x 21

O autor observa que grande parte dessas citações são gratuitas (desatento ao fato de que “Flowerville”, por exemplo, faz da macaqueação do estrangeiro um tema central) e conclui que “a xeno-referência não deixa de ser o modo como esses autores brasileiros se relacionam com… o Brasil” – o que é verdade, mas uma verdade um tanto óbvia. Buscar intervir ao seu modo naquela peça-civilização de Nabuco, não se contentando em ser um figurante moreno de pele oleosa (interpretado aliás por um mexicano), sempre foi uma das faces do bicho-papão que acorda os escritores brasileiros no meio da noite. Nada a ver com uma preocupação de “vender lá fora”, trata-se de algo bem anterior. Nos voltamos para o eixo da cultura ocidental porque somos um galho dela, para ficar naquela metáfora cândida. Escrevemos numa língua que é um ramo dela. Somos seus filhos bastardos, mas filhos. O entrelugar do artista terceiro-mundista – ou pós-colonial, na classificação favorecida pela crítica anglófona – é limitado por dois abismos: de um lado despenca o bom selvagem, do outro o civilizado arrivista; de um lado o pitoresco local (que a matriz espera e incentiva), do outro o exibicionismo cosmopolita (tentativa vã de impressionar a matriz).

De todo modo, o artigo não me saiu da cabeça, e agora acredito ter a oportunidade de fazer bom uso da sanha quantificadora do Doutor Plausível: e se estivermos padecendo de um “internacionalismo de vocabulário”, quando talvez devêssemos buscar machadianamente um certo “sentimento íntimo de internacionalidade”? Acredito ser mais ou menos isso o que o livro de Cuenca propõe ao pegar nossas “raízes na marquise” (como cantava Elis) e, em vez de improvisar na marquise um canteiro em que as raízes pudessem se nutrir, dobrar a aposta do desenraizamento e levar tudo para além das nuvens, até um ponto culturalmente rarefeito da atmosfera.

O plano é meio insensato. Cuenca só consegue levá-lo a termo – e, mesmo assim, nem sempre de forma convincente – porque deve ser um dos menos realistas entre os jovens escritores brasileiros. Suas histórias têm um andamento onírico-farsesco que, aliado à pegada pop e à notável clareza da prosa, as entrega imediatamente como “histórias”. Boas de ler, mas só histórias, e isso pouco importa porque no fim tudo é texto-sonho-fantasmagoria, visto que o mundo não existe ou, se existe, não pode ser representado na literatura. Só a literatura pode ser representada na literatura. E isso, de alguma forma, dói.

Não considero “O único final feliz…” um ótimo livro, mas ele certamente deixa a impressão de que ótimo pode muito bem ser o próximo livro de Cuenca. É um romance furos acima da média nacional, e nos pontos em que (a meu ver) falha, deixando-se vergar sob o peso de uma certa máscara ultracool, falha de forma interessante. Sua petulância pop e quase leviana de roçar imensas questões filosóficas – a representação, a consciência, o eu, o outro, o tempo, a vida e a morte – e tocar em frente, numa leveza de Muhammad Ali ou Fernando Sabino, faz supor até que a falha seja parte consciente do efeito que busca atingir. Se a história é nebulosa, convulsa, o texto é econômico e solar. Como se o narrador fosse um adestrado prosador realista que soubesse estar sendo sonhado por alguém, e nada daquilo, portanto, tivesse tanta importância: Just fiction, folks!

Nesse clima de distanciamento, a imagem que se forma às vezes na cabeça do leitor parece vista numa TV com chuvisco. A Lagosta gigante que arrasa a cidade ecoa monstros que vimos numa moldura desse tipo – e a prosa, ao mesmo tempo que espelha, parece absorver isso. Eis como o autor evita o clichê turístico na abordagem factual da experiência de estar em Tóquio: o cenário é de filme, mas não de filme-clichê. Os ambientes minúsculos no fim de longos corredores de paredes rabiscadas e o café fuleiro que imita Dunkin’ Donuts soam como representações realistas de um mundo esvaziado de real. Completada a suspensão da incredulidade, vemos uma Tóquio além do clichê – por ser clichê do clichê? – com seus anúncios de sopa em neon e seus fugus letais.

Nesse ambiente conhecemos Shunsuke, o narrador principal, empregado burocrático numa fábrica de filmes fotográficos (ou seja, destinada à ruína), e as três mulheres que demarcam os vértices do livro: Yoshiko, a boneca perfeita de cinquenta milhões de ienes, voz que abre o romance e que até o fim intervém como a segunda narradora; Misako, dançarina de formas geometricamente perfeitas; e Iulana Romiszowska, estrangeira entre estrangeiros, a garçonete polonesa-romena que é o amor de Shunsuke – afinal, diz o nome da coleção à qual o título pertence (e da qual Cuenca foi o curador) que a história tem que ter um amor. Um Amor Expresso.

Parece significativo que “O único final feliz…” seja desprovido justamente do sentimento do amor. O que rege o mundo ali é mais primitivo, pulsão de vida contra pulsão de morte. Estamos num terreno em que certa descrença pós-moderna – como acreditar em algo além da beleza crepuscular do instante presente se a vida é um pesadelo, e então morremos? – altera o pH do solo: o amor não brota aqui. Shunsuke não ama Iulana, está apenas apaixonado por ela. E não se pode chamar de amor – não sem um qualificativo bem desclassificante – o que preside a relação entre Shunsuke e seu pai, o enigmático poeta Atsuo Lagosta Okuda, deus tirano com jeito de Big Brother que tudo vê e tudo pode. O fim, anunciado engenhosamente na repetição da cena da explosão no trem – um dos trechos de prosa mais inspirada do livro – acaba sendo mais pesado do que se anunciava. A nota soturna é contrabalançada pelo achado de Yoshiko, a boneca, descobrindo o ciúme e partindo dele para a revolta contra Deus.

A aposta na radicalização do desenraizamento em busca do universal é alta e contra-intuitiva, pois há tempos passa por sagrado o mandamento de que é preciso falar primeiro do seu quintal para conseguir falar do mundo. Já na saída se fixa o sarrafo lá em cima: quem narra é uma inteligência artificial japonesa que acaba de nascer, no ato mesmo de se abrir a caixa (livro). Não há personagens brasileiros à vista, como havia no título anterior do autor, “O dia Mastroianni”, com seus dândis carioquíssimos a flanar por uma metrópole universal caleidoscópica. O Brasil só aparece em “O único final feliz…” de viés, nas participações especiais em tom menor do “músico brasileiro João Gilberto”, com sua “voz noturna”. Que me fizeram pensar em “O concerto de João Gilberto no Rio de Janeiro”, o conto de Sérgio Sant’Anna, que também opera por subtração: Cuenca parece ser em alguma medida devedor de Sant’Anna, embora sua abordagem desencanada do pop seja mais próxima do José Agrippino de Paula que o veterano escritor mineiro-carioca admira. A diferença é que, enquanto Agrippino tem uma fúria de Fellini, Cuenca faz pose de Antonioni.

É certo que “O único final feliz…” vai desagradar alguns paladares. O maior risco do desenraizamento absoluto é o de terminar sem chão. Não falar de nada – nem de fora nem de dentro, nem de si nem do outro. É mais ou menos a acusação que costuma ser feita a Cuenca por seus (ativos) antipatizantes: pop demais, leviano demais, “bem escrito, e daí?” – eis um comentário que ouço bastante sobre o autor. A esse argumento não tenho muito que responder além de que ser bem escrito (atenção, patrulha, bem escrito não tem nada a ver com beletrista, é o contrário!), ser realmente bem escrito não é coisa que se ache a todo instante. Qualquer leitor que tenha lido o suficiente e saiba usar o ouvido entende o que estou dizendo.

Falar, pela ausência, da experiência de ser um escritor brasileiro, produzindo prosa local de qualidade sobre objetos remotos ou imateriais. Fazer o oposto do que esperam que você faça se quiser se vender internacionalmente: livros mais ou menos realistas (realismo mágico pode) que “retratem o país” – por que outro motivo, se não para aprender algo, leria alguém o livro de um escritor brasileiro que não seja Paulo Coelho? Atirar-se a isso com uma coragem demente de Carlitos atravessando a corda bamba entre as Torres Gêmeas e no caminho, antes de despencar, atingir meia dúzia de pontos altos, cenas de tirar o chapéu em qualquer língua. É o que “O único final feliz…” faz. A queda vem porque o projeto era inexequível desde o início. E talvez o que impede o livro de Cuenca de ser um grande romance seja a mesma leveza cronística que o faz levantar voo – curiosamente oposta à linguagem espessa que pesa e prende no chão outro título recente da mesma coleção, “Do fundo do poço se vê a lua”, de Joca Reiners Terron. A leveza duela o tempo todo com o lastro dos temas, impedindo o voo de longo curso que tínhamos a impressão de estar nos planos do piloto. Por essa razão, novela é um nome que lhe cai melhor que romance, como também em “O dia Mastroianni”.

Quando digo que “O único final feliz…” traz elementos novos para essa conversa, não me passa pela cabeça supor que ele esteja abrindo um caminho a ser seguido (a não ser, talvez, pelo próprio Cuenca). Bom exemplo de literatura pop à brasileira, o livro tem sobretudo o mérito de ampliar uma certa liberdade artística, erguendo o olhar para além do horizonte globalizado em busca de uma miragem de universalismo que, a esta altura do furdunço planetário, parece inatingível para nativos de qualquer parte. Mas literatura, já disse Don DeLillo, não passa de uma palavra depois da outra. Se como brasileiros nos damos o direito de falar do vasto mundo com tamanha desfaçatez, quem sabe isso não acabe afetando o olhar que lançamos sobre nosso ainda mal explorado quintal?

24 Comentários

  • João 23/08/2010em16:01

    “…para a velha charada de produzir arte relevante num país situado na periferia econômica e cultural do mundo…” – hum… a iconoclastia atingiu, aqui, ponto crítico, Sérgio. Muito me agradou seu artigo anterior – ainda que eivado por um pessimismo quase ingênuo; mas, agora, ao reprisar certas ácidas observações, deixou transparecer não mais uma arguta análise sobre a literatura nacional, e, sim, uma estranha dose de amargura. Ainda que sejamos, ao longo das décadas, receptores de estilos exteriores, sabemos reescrevê-los como ninguém – dou-lhe a oportunidade de me apresentar qualquer outro país (qualquer em nítida exclamação, frise-se, e resolutamente) que tenha autores do calibre (permite-me ficar em dois exemplos, apenas?) de um Guimarães Rosa ou de um Graciliano Ramos. Não há, Sérgio, não há – e eu sei que você, lúcido que é, concorda comigo. Cuenca é incrível – produto de um peinel de escritores brasileiros que, desejosos de um estilo pátrio de escrever – ainda o encontrarão. A gente sempre encontra. Sempre. E não há (frise-se, com muita contundência) qualquer traço exacerbado de ufanismo neste comentário. É apenas a realidade. É o que somos. E isso é muita, muita coisa. Abraço.

  • Vinícius Antunes 23/08/2010em16:17

    Aumentou minha vontade de ler o livro. Vou esperar o preço dar uma caída… se bem que, acabei de achar por menos de 30 na Travessa! Acho que vale. Abraço!
    Vinícius Antunes
    http://cronicasdumasviagens.wordpress.com

  • Marcelo Moutinho 23/08/2010em17:35

    Não tinha lido o artigo do Doutor Plausível. Muito interessante e pertinente.

  • Rodrigo Lattuada 23/08/2010em17:45

    Estou no terço final do livro em uma leitura que se arrasta há duas semanas (tempo demais, dado o tamanho do livro e simplicidade da prosa), mas já o tenho como uma das piores leituras do ano, à frente apenas do muito malescrito romance-policial-sueco “A rainha do castelo de ar”. Acho que, no fim, vou me enquadrar entre aqueles que o consideram leviano demais e nem tão bem escrito assim.

    Quanto à atual literatura brasileira, tenho lido muito pouco pra ter uma opinião formada.

  • fera 23/08/2010em18:56

    olha, nunca vi tanto cococo para tao pouco ovo. livro sofrivel, pretensiosamente tolo. e essa historia de autores brasileiros que sao levianos e sem qualidade e rasos e que fazem isso de forma proposital, me perdoe! vcs todos, autores e criticos, deveriam se envergonhar quanto a isso.

  • João Marcos 24/08/2010em00:38

    Então, Sérgio, estamos eternamente condenados a ser como aqueles escravos alforriados que vemos em antigas fotografias, de terno de linho e pés descalços? E se calçarmos umas havaianas, isso nos faria mais brasileiros? Um famoso antropólogo morto recentemente disse que aqui, nas Américas, vamos da barbárie à decadência sem jamais atingirmos a civilização. Mas ele escreveu isso em 1950, desconfio que, hoje, os Estados Unidos seriam um caso à parte. Mas então é por isso Dave Eggers e Jonathan Safran Foer, só pra citar dois autores da mesma geração do J. P. Cuenca, podem situar seus romances e contos em qualquer lugar sem cair em abismo nenhum? Não creio.
    Posso soar antigo demais, ou talvez moderno demais, mas o fato é que o texto se impõe. Se o livro do Cuenca não dá conta do recado, a culpa é do escritor, não da sua casa na periferia. Afinal, a Argentina é, sob qualquer aspecto, um país periférico, assim como J. L. Borges é um autor fundamental.
    Parabéns pelo texto, anyway.

  • Mauro Mestre Correia 24/08/2010em01:12

    fera,
    Antes de comentar aprenda a escrever porque do jeito que está você escreve como uma onça. Mas não escreva como esse outro comentarista que assina Lattuada. Podem falar mal do Cuenca, do livro, do que quiserem, mas no mínimo escrevam como se deve. Nunca é tarde para aprender.

  • Drex Alvarez 24/08/2010em02:48

    Essa discussão toda me jogou da literatura para o cinema.

    E então caí no exemplo que, de tão óbvio, já está ficando desgastado nos últimos tempos: o cinema argentino. De latitude tão próxima à nossa, mas que ofusca quase a totalidade da nossa produção. Como? Com técnica de classe mundial, linguagem apurada, sensibilidade própria. E histórias sobre seres humanos, pois seres humanos há no mundo todo.

    Mas, no fundo, creio que o xis da questão está na “qualidade”. Acredito que o autor, quando é mesmo grande, consegue naturalmente dar o salto universalizante, transformando sua voz local e original em algo que sensibiliza a todos. Vide Almodóvar, para continuar nos exemplos cinematográficos, cujos filmes não deixam de ser explicitamente espanhóis e, no entanto, falam a pessoas de todos os lugares.

  • Rodrigo Lattuada 24/08/2010em09:52

    Mauro Mestre Correia, vai parecer revanchismo, mas eu teria discordado de ti mesmo que tu não tivesse dirigido a crítica a mim (mas provavelmente eu não teria replicado). A tua suposição da existência de uma maneira certa de escrever impõe à linguagem o papel de mera normatização para a expressão de ideias, que não deveria ser dela. E, se fosse, o Sérgio Rodrigues nem teria escrito esse artigo pra analisar o livro do Cuenca, teria simplesmente enquadrado o livro dele na cartilha de como se deve escrever.

    Agora, voltando ao assunto: não creio que o autor para ser “grande” precise ser (ou ambicionar ser) universal; qualquer um que leia uma dramatização humana pode relacionar o que estiver ali exposto com a sua realidade ou uma realidade próxima. Se a literatura é compreendida então ela já é universal. Mas o autor precisa procurar ir além. Deve ter visão própria, porque repetir as visões alheias só serve como atividade recreativa. E que procure também uma voz própria, não um simples substrato de vozes. A literatura é uma construção de significados, e isso requer de um autor a capacidade de apreender e de se expressar.

  • Antonio Gonçalves 24/08/2010em09:57

    Custei muito para ler o post – virgulas, ordem indireta, excesso de metáforas, exibicionismo vocabular.
    Isso dito, apesar das muitas patrulhas, Paulo Coelho é ainda o melhor escritor do Brasil.

  • Takahashi 24/08/2010em10:53

    Sérgio, brilhantes seus dois posts. Pergunta: e a influência (me parece que bastante clara) do livro “Sayonara, Gangsters” no livro do Cuenca?

    • sergiorodrigues 24/08/2010em11:38

      Takahashi: obrigado. Sim, fica bem evidente a influência não só de seu xará mas de toda a literatura japonesa dita pop, Murakami inclusive.

      João: qualquer outro país? O João Marcos respondeu Argentina. Mas isso é uma discussão estéril. O chato mesmo é que viver a essa altura de Rosa e Graciliano, grandes escritores, é mais parte do problema do que da solução, não?

      João Marcos: não entendi por que estaríamos condenados a viver como escravos alforriados. E me parece meio injusto usar como parâmetro a literatura americana, que além de ser a mais profissionalizada do mundo já não pode ser considerada periférica há pelo menos um século.

      Drex: qualidade é a palavra-chave, concordo. Mas definir qualidade é uma outra briga de foice.

      Abraços a todos.

  • Stefano 24/08/2010em13:46

    Estou um pouco alheio ao assunto. Mas não entendo o fato de ter que se prender às raízes. Fosse assim, não teríamos bandas de rock aqui ou na Ásia. Arte é liberdade.

  • Kylderi 24/08/2010em16:39

    Veio-me à mente o brasileiro que retrata personagens e lugares internacionais Bernardo Carvalho.Nunca li Cuenca, mas vou conhecer esse livro. (Cuenca,que nome engraçado…)

  • João 24/08/2010em17:10

    Sérgio, veja o que você escreveu há pouco, ao responder comentários: “…me parece meio injusto usar como parâmetro a literatura americana, que além de ser a mais profissionalizada do mundo já não pode ser considerada periférica há pelo menos um século…” Cá pra nós, existe a remota possibilidade de acreditar no conteúdo dessas linhas? Não, claro que não – e creio que nem mesmo você as credencie como passíveis de qualquer espécie de crédito. Vem a pergunta: por que as escreveu? Era alguma espécie de argumentação alicerçada no cômico ou algo semelhante?

    • sergiorodrigues 24/08/2010em17:14

      Não entendi, João. Seria interessante explicar o que você vê de errado nisso.

  • João 24/08/2010em20:54

    Pretendo não tecer aqui, Sérgio, um arrazoado sobre literatura internacional. Mas se a sua intenção era ilustrar ou colocar em evidência um exemplo de boa escrita estrangeira – profissionalizada e nada periférica há pelo menos um século, para ficarmos nos termos que você mesmo usou – poderia, muito mais salutarmente, ter se utilizado da literatura francesa, jamais a norte-americana – que, convenhamos, é de uma qualidade pífia. Abraço.

    • sergiorodrigues 24/08/2010em21:09

      João, o exemplo não foi citado por mim, mas é certo que eu jamais escolheria a decadente literatura francesa como parâmetro de nada a esta altura. Sua opinião a respeito da literatura americana poderia até render uma boa discussão, mas é, convenhamos, no mínimo idiossincrática, o que passa bem longe de justificar o tom de seu comentário anterior.

  • sandro so 25/08/2010em08:00

    Sérgio, você não acha que esse instinto de internacionalidade é na verdade uma questão hoje na literatura de qualquer país? Me faltam informações, mas tenho essa forte impressão. Talvez à exceção dos EUA, que são essencialmente pop, as demais literaturas hoje se dividem nas suas tradicionais e modernas “altas literaturas” (reduzidas a leitores escolares e hiperespecializados) e uma literatura cheia de clichês manobrados de diversas formas em busca de leitores. Nós, brasileiros, temos nossas história e nossa forma particilar de lidarmos com isso, mas todos no mundo hoje somos colonizados pelo mercado.

  • 25/08/2010em08:52

    “O romance americano pretende encontrar sua unidade reduzindo o homem quer ao elementar, quer às suas reações e ao seu comportamento. Ele não escolhe um sentimento ou uma paixão, dos quais nos dará uma imagem privilegiada, como em nossos romances clássicos. Ele recusa a análise, a busca de uma motivação psicológica fundamental que explicaria e resumiria a conduta de um personagem. Por isso, a unidade desse romance não é mais que um vislumbre de unidade. Sua técnica consiste em descrever os homens em seu aspecto externo, nos seus gestos mais indiferentes, em reproduzir sem comentários o seu discurso, até em suas repetições, consiste, afinal, em agir como se os homens fossem definidos inteiramente por seus automatismos cotidianos. Neste nível mecânico, na verdade, os homens se parecem, explicando-se, desta forma, o curioso universo em que todos os personagens parecem intercambiáveis, mesmo em suas particularidades físicas. Esta técnica só é chamada de realista por um mal-entendido. Além do fato de o realismo na arte, como veremos, ser uma noção incompreensível, fica bastante evidente que este mundo romanesco não visa à reprodução pura e simples da realidade, mas sim à sua estilização mas arbitrária. Ele nasce de uma mutilação voluntária, efetuada sobre o real. A unidade assim obtida é uma unidade degradada, um nivelamento dos seres e do mundo. Parece que, para esses romancistas, é a vida interior que priva as ações humanas da unidade e arrebata os seres uns aos outros. “O romance americano pretende encontrar sua unidade reduzindo o homem quer ao elementar, quer às suas reações e ao seu comportamento. Ele não escolhe um sentimento ou uma paixão, dos quais nos dará uma imagem privilegiada, como em nossos romances clássicos. Ele recusa a análise, a busca de uma motivação psicológica fundamental que explicaria e resumiria a conduta de um personagem. Por isso, a unidade desse romance não é mais que um vislumbre de unidade. Sua técnica consiste em descrever os homens em seu aspecto externo, nos seus gestos mais indiferentes, em reproduzir sem comentários o seu discurso, até em suas repetições, consiste, afinal, em agir como se os homens fossem definidos inteiramente por seus automatismos cotidianos. Neste nível mecânico, na verdade, os homens se parecem, explicando-se, desta forma, o curioso universo em que todos os personagens parecem intercambiáveis, mesmo em suas particularidades físicas. Esta técnica só é chamada de realista por um mal-entendido. Além do fato de o realismo na arte, como veremos, ser uma noção incompreensível, fica bastante evidente que este mundo romanesco não visa à reprodução pura e simples da realidade, mas sim à sua estilização mas arbitrária. Ele nasce de uma mutilação voluntária, efetuada sobre o real. A unidade assim obtida é uma unidade degradada, um nivelamento dos seres e do mundo. Parece que, para esses romancistas, é a vida interior que priva as ações humanas da unidade e arrebata os seres uns aos outros. (…) A vida dos corpos, reduzida a si mesma, produz, paradoxalmente, um universo abstrato e gratuito, constantemente negado por sua vez pela realidade. Este romance, depurado de vida interior, em que os homens parecem ser observados através de uma vidraça, ao atribuir-se como tema único o homem supostamente médio, acaba logicamente colocando em cena o patológico. Explica-se, dessa forma, o número considerável de ‘inocentes’ utilizados nesse universo. O inocente é o assunto ideal de um empreendimento como este, já que só é definido, por inteiro, por seu comportamento. Ele é o símbolo deste mundo desesperado, em que autômatos infelizes vivem na coerência mais mecânica, que os romancistas americanos erigiram, diante do mundo moderno, como um protesto patético, mas estéril.” Camus.

  • Guilherme Vaz 25/08/2010em14:05

    Cascata de name dropping da “pífia” literatura americana: Longfellow, Nathaniel Hawthorne, Emerson, Stephen Crane, Edgar A. Poe, Walt Whitman, Emily Dickinson, O. Henry, Willa Cather, Henry James, Sherwoond Anderson, Tennessee Williams, Hemingway, Scott Fitzgerald, Thomas Wolfe, William Faulkner, Ezra Pound, T.S. Eliot, James Baldwin, Ralph Ellison, Carson Mc Cullers, Eudora Welty, Allen Ginsberg, Wallace Stevens, William Carlos Williams, Eugene O’Neil, Gregory Corso, Charles Olson, Joseph Heller, John Cheever, Saul Bellow, Philip Roth, Sylvia Plath, John Ashbery, William Gaddis, John Barth, Cormac Mc Carthy, Don De Lillo, Robert Creeley, Jonathan Safran Foer, David Foster Wallace. E um enorme etc.

  • Vladmir 26/08/2010em10:40

    Alguns “escritores”: Kafka, Machado de Assis, García Marquéz, Érico Veríssimo, Saramago. E uma meia dúzia de ilustres da literatura nacional contemporânea, que não cito por preguiça.

    Eta palavrinha vilipendiada por nós! já há muito, essa de escritor. Estamos acabando com o melhor significado dela. (E isso tanto nas literaturas nacionais como estrangeiras.)

    Agora, permitam-me, usando de um trocadilho muito bem achado do Sérgio – “Excretores”: Cuenca, ( Cuenca?), não sei o que “Galera”, entre tantos outros.

    Confesso que tentei ler alguma coisa de ambos, não obtive ânimo de passar da terceira página.

  • Foguete de Luz 10/09/2010em15:21

    Se literatura é palavra após palavra, a capa de um livro é sempre um convite a pensar que palavras foram escolhidas para tal fila de sentenças. Esta capa nos remete a um apocalipse, mas como Apocalipse é revelação e revelação não é essa coisa de palavra após palavra, mas sim, a Palavra, com certeza este livro não fala de final feliz.