Finnegans Wake é um laboratório que submete a leitura a sua prova mais extrema. À medida que nos aproximamos, aquelas linhas nebulosas se transformam em letras e as letras se amontoam e se misturam, as palavras se transmutam, se alteram, o texto é um rio, uma torrente múltipla em contínua expansão. Lemos restos, pedaços soltos, fragmentos, a unidade do sentido é ilusória. A primeira representação espacial desse tipo de leitura já está em Cervantes, sob a forma dos papéis que ele recolhia na rua. Essa é a situação inicial do romance, seu pressuposto, melhor dizendo. “Sou aficionado a ler até pedaços de papéis pelas ruas”, afirma-se no D. Quixote. Poderíamos ver nesse trecho a condição material do leitor moderno: ele vive num mundo de signos; está rodeado de palavras impressas (que, no caso de Cervantes, a imprensa começou a difundir pouco antes); no tumulto da cidade, ele se detém para recolher papéis atirados na rua, deseja lê-los. Só que agora, diz Joyce em Finnegans Wake – ou seja, na outra ponta do arco imaginário que se abre com D. Quixote – esses papéis amassados estão perdidos numa lixeira, bicados por uma galinha que cavouca o chão. O trecho – e…