Existe uma segunda vantagem em tentar acompanhar o turbilhão de lançamentos que comentei na nota abaixo: diante da tarefa de eleger os livros mais destacados do ano, basta pescar na memória aqueles que conseguiram fugir do campo gravitacional dessa algaravia-láctea, suspendendo a impaciência e a exasperação da leitura para instaurar seu próprio tempo. Ah, o critério é subjetivo? Evidente que é. O Todoprosa nunca foi outra coisa. (Existe mesmo quem seja?) Os títulos à altura da façanha não foram tantos assim. Em meio ao borrão de velocidade que Thomas de Quincey, com uma argúcia que soa deliciosamente ingênua nestes tempos eletrônicos, identificou no futuro da humanidade ao contemplar em meados do século XIX a carruagem do correio inglês, os livros que carregam suas próprias cápsulas de tempo flutuam nítidos na memória do leitor que leu muito, leu demais, mas ainda se recusa a abrir mão do prazer como princípio básico da brincadeira. Não houve livro brasileiro de ficção que eu tenha lido com mais gosto este ano do que Mãos de Cavalo (Companhia das Letras), de Daniel Galera, resenhado na época aqui. Não estou dizendo que seja uma obra-prima, uma obra irretocável. Uma leitura ranzinza identifica nele pelo menos um…