Dá uma história? Se dá, começa há três anos. Em abril de 1976, quando é publicado meu primeiro livro, ele me manda uma carta. Com a carta vem uma foto, eu no colo dele: nu, estou sorrindo, tenho três meses e pareço um sapinho. Ele, em compensação, saiu bem na fotografia: paletó cruzado, chapéu de aba fina, o sorriso franco – um homem de trinta anos que olha o mundo de frente. Ao fundo, apagada e quase fora de foco, aparece minha mãe, tão moça que no início quase não a reconheci. A foto é de 1941; atrás ele havia escrito a data e depois, como se quisesse orientar-me, transcreveu as duas linhas do poema inglês que agora serve de epígrafe a este relato. O começo do romance “Respiração artificial”, lançado em 1980 pelo crítico e ficcionista argentino Ricardo Piglia (Iluminuras, 2006, tradução de Heloísa Jahn), marca o fim – ou seria a suspensão temporária? – do clima de retrospectiva que tem dominado esta seção nos últimos meses. Os tais versos da epígrafe, que obrigam o leitor a voltar duas folhas rumo ao passado do volume, são de T.S. Eliot, do terceiro de seus “Quatro quartetos”, e estão em inglês…