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Dos poderes da ficção
NoMínimo / 07/11/2008

A ficção é tão boa ou melhor do que estudos acadêmicos em “representar e comunicar as realidades do desenvolvimento internacional”, concluiu um estudo conjunto da Universidade de Manchester e da London School of Economics, segundo notícia publicada ontem pelo jornal “Daily Telegraph” – em inglês, acesso livre. O argumento é que a ficção (o que, para efeitos do estudo, inclui poesia e dramaturgia) “não é comprometida pelas questões de complexidade, política ou legibilidade que às vezes afetam a literatura acadêmica”. O romance “O caçador de pipas”, de Khaled Hosseini, um best-seller mundial, é citado como exemplo: teria feito “mais para educar os leitores ocidentais sobre as realidades da vida no Afeganistão sob o jugo dos talibãs e imediatamente depois do que qualquer campanha governamental de mídia, relatório de organização de direitos humanos ou pesquisa de ciência social”. Muita gente vai dizer que os caras endoidaram ou querem aparecer, com essa conclusão tão contrária à nossa era de crença suprema na ciência e nos “fatos”. Outros, lembrando que contar histórias sempre foi – e não tem por que deixar de ser – parte indissociável daquilo que fez da humanidade, humanidade, dirão que os pesquisadores ingleses estão redescobrindo a pólvora. Fico com…

Michael Crichton (1942-2008)
NoMínimo / 05/11/2008

A família acaba de anunciar que o escritor americano Michael Crichton, autor de best-sellers como “Jurassic Park” e “O enigma de Andrômeda”, morreu ontem de câncer, aos 66 anos. Leia aqui (em inglês, mediante cadastro) a notícia no site do “New York Times”. Crichton foi fartamente traduzido no Brasil, com livros lançados por diversas editoras, mas sobretudo pela Rocco. Nos últimos anos, sua carreira estava em declínio. Seu último livro, Next, lançado em 2006, foi mais comentado na imprensa americana por um detalhe nada lisonjeiro: incluía um covarde acerto de contas do autor com um jornalista que o criticara, e que aparece transformado em um personagem pedófilo. Na época, comentei o caso aqui no blog, concluindo: “Tudo indica que Crichton pirou”. Next saiu ano passado pela Rocco com o título de “Next: o futuro (bem) próximo”.

Como se não bastasse, Obama sabe escrever!
NoMínimo / 05/11/2008

Barack Obama tem tudo para ser um grande presidente porque escreve muito bem. No blog de livros do “Guardian” de hoje (em inglês, acesso gratuito), o escritor Rob Woodard admite que pode haver deformação profissional em julgamentos desse tipo, mas não o suficiente para fazê-lo descartar o raciocínio. Em busca de precedentes históricos, cita entre outros Abraham Lincoln, que teria sido, em sua opinião, “um dos maiores escritores de seu século”. Obama ainda não chegou lá, mas para Woodard seu primeiro livro, Dreams from my father: a story of race and inheritance, lançado em 1995, é “de longe o mais honesto, ousado e ambicioso volume publicado por um político americano de primeira linha nos últimos 50 anos”. Também acredito que haja deformação profissional nesse juízo, além de um tanto de euforia pela vitória histórica de Obama e, evidentemente, de zombaria com a notória limitação intelectual de George W. Bush. Feitas todas essas ressalvas, a idéia continua me parecendo interessante. Como se sabe, um dos requisitos para escrever bem – talvez o mais importante – é pensar com clareza, ou seja, mobilizar as idéias certas e articulá-las na ordem correta. O que não garante o sucesso de político algum, claro, mas…

‘Gente inteligente, de muito discernimento…’
NoMínimo / 03/11/2008

RASCUNHO: Recentemente, no blog do jornalista Sérgio Rodrigues, “Viva o povo brasileiro” foi o vencedor de uma enquete sobre o principal romance brasileiro dos últimos 25 anos. O sr. concorda com a votação ou escolheria outro livro? JOÃO UBALDO RIBEIRO: Uma pergunta dessa é novidade pra mim. Vou até anotar, porque gosto de elogio, gosto desse tipo de coisa (risos). Eu concordo (risos). Não sei se houve outro livro, é cedo pra dizer. É cedo e até pretensioso dizer, mas já que vocês perguntam e já que não tenho outros elementos, a não ser os que estão aqui na minha cabeça no momento, concordo com essa escolha, sim. Fico muito lisonjeado com ela. Acho que os leitores ou os freqüentadores, não sei como se diz, desse blog têm muito discernimento, são gente inteligente. E quero cumprimentar o Sérgio Rodrigues pela feliz e tão bem-sucedida iniciativa. Por meio desta, ficam oficialmente transmitidos os cumprimentos de João Ubaldo aos leitores do Todoprosa. Aqui e aqui, as notas sobre a enquete vencida por “Viva o povo brasileiro” ano passado – da qual participaram cinco dezenas de escritores, editores, críticos e jornalistas. Para ler a entrevista completa do vencedor do Prêmio Camões ao jornal…

Começos (ainda) inesquecíveis: Graciliano Ramos

Eis um belo exemplo de como (não) começar um livro. Publicado em 20/6/2006: Antes de iniciar este livro, imaginei construí-lo pela divisão do trabalho. Dirigi-me a alguns amigos, e quase todos consentiram de boa vontade em contribuir para o desenvolvimento das letras nacionais. Padre Silvestre ficaria com a parte moral e as citações latinas; João Nogueira aceitou a pontuação, a ortografia e a sintaxe; prometi ao Arquimedes a composição tipográfica; para a composição literária convidei Lúcio Gomes de Azevedo Gondim, redator e diretor do Cruzeiro. Eu traçaria o plano, introduziria na história rudimentos de agricultura e pecuária, faria as despesas e poria o meu nome na capa. “São Bernardo” (1934), de Graciliano Ramos (39a edição, Record, 1983).

Afro-americano
A palavra é... / 01/11/2008

Barack Obama está perto de se tornar o primeiro presidente negro da história dos EUA. Ou o primeiro presidente afro-americano, dependendo do gosto do freguês – e o número de fregueses desse eufemismo, inclusive no Brasil, não parou de crescer sob a influência da onda politicamente correta emanada das universidades americanas nos anos 70 e 80 do século passado. A mesma onda que, em seus extremos de pedantismo, transformou mendigos em “moradores em situação de rua” no discurso de muita gente séria. Não se trata de erro. Aqui e ali se esbarra no argumento de que o termo afro-americano padece de imprecisão por sugerir que todo africano é negro. O literalismo dessa crítica, porém, lembra o de quem considera “errado” chamar os nascidos nos EUA de americanos, uma vez que brasileiros e canadenses, por exemplo, também o são. Como se as palavras não pudessem ter mais de um sentido. A questão é política antes de ser lingüística. Afro-americano é um termo surgido nos EUA em meados do século 19 e resgatado há poucas décadas pelos primeiros ideólogos do PC (o politicamente correto, não o Partido Comunista) como sinônimo de black – o que no país de Martin Luther King, com…