Clique para visitar a página do escritor.
Começos (ainda) inesquecíveis: E.L. Doctorow

Ninguém tomava ao pé da letra as coisas que Martin Pemberton dizia; ele era melodramático demais, ou atormentado demais, para falar sem floreios. Por isso as mulheres o achavam atraente – viam-no como uma espécie de poeta, embora ele fosse mais crítico do que poeta, um crítico de sua própria vida e época. Assim, quando Martin começou a dizer que seu pai ainda estava vivo, nós que o ouvíamos falar e nos lembrávamos de seu pai tínhamos a impressão de que ele estava se referindo à persistência do mal, em termos gerais. Alguém, creio que Don DeLillo, já disse que o segredo da literatura está no modo como se enfileiram palavras, o resto é secundário. O que sugere um paradoxo: o que há de mais “profundo” na escrita estaria logo ali na superfície, numa combinação de sinais gráficos que leva o leitor a submergir naquilo – ou ir embora. O primeiro parágrafo de “A mecânica das águas”, do escritor americano E.L. Doctorow (Companhia das Letras, 1995, tradução de Paulo Henriques Britto), é um ótimo exemplo de como pode ser poderoso esse negócio de uma-palavra-depois-da-outra. Publicado em 1/5/2007.