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Borges e eu, o não memorioso: a próxima pista
Vida literária / 08/12/2011

Como não tenho a memória perfeita de Irineu Funes, sei apenas que estava no México a trabalho, cobrindo para um jornal brasileiro a Copa do Mundo que seria vencida de forma acachapante pela Argentina de Maradona, quando recebi a notícia da morte de Jorge Luis Borges. Lembro-me de ter ficado triste, o que é uma memória óbvia. Se tivesse uma fração do dom de Funes – personagem de Funes, o memorioso, um dos melhores contos de “Ficções” (1944), provavelmente o melhor livro de Borges –, estaria escrevendo agora sobre tudo o que tornou aquele 14 de junho de 1986 um dia sem igual, como todos são: temperatura, forma das nuvens, quanto tempo se passou – certamente uma vida, mas isso também é óbvio para quem conhece o México – entre a encomenda da ensalada de guacamole e sua chegada à mesa; a cor do cardápio, o comprimento da saia da morena sorridente na mesa ao lado, as letras de todas as canções com que os mariachis torturaram o jantar. Tudo isso está perdido para sempre. Só sei que estava no México, me esforçando para falar espanhol dia e noite, quando o argentino que era meu herói literário naquele tempo morreu….