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Era uma vez
Sobrescritos / 30/04/2012

Eram os dois maiores poetas de seu tempo, um tempo remoto em que os homens morriam cedo, mas em compensação os rios eram cristalinos. O poeta do reino do norte era rico e famoso. Casado com a mulher mais bela e cobiçada do mundo, que o acompanhava aonde fosse, era autor de odes e epicédios que o rei encomendava para comemorar as datas cívicas e que o povo ouvia em meio a arrepios festivos ou contrito silêncio, conforme o caso, na praça em frente ao palácio. O poeta do reino do sul, ao contrário, vivia sozinho numa choupana no meio do mato, ignorado por seus conterrâneos e encarado com desprezo ou hostilidade pela corte. O poeta do norte usava como argamassa de sua obra velhas crônicas de atos heroicos ou traiçoeiros, amores cortesãos mal disfarçados sob pseudônimos burlescos, intrigas filosóficas fermentadas nos grandes centros de saber do reino. Para que a mistura não resultasse pesada, temperava tudo isso com um humor descrente que denunciava o olhar de um verdadeiro cidadão do mundo. O poeta do sul era um caipira que não se cansava de escrever sobre os mesmos temas bucólicos: o por do sol, o nascer do sol, os cabritos…