O narrador do romance sou eu. Meu nome será omitido, mas não minha profissão, esta sim importante: sou psicanalista praticante, de consultório na praça há mais de vinte anos. Bem de vida, sim, mas não propriamente rico como alguns colegas. Fui mais escrupuloso, quem sabe; menos esperto sem dúvida. Construí uma carreira sólida e plana, mantive-me ao largo da politicagem da profissão, do assédio da imprensa, das tentações da glória acadêmica. Era um analista na linha de frente, só isso. Infantaria, tudo o que eu desejava. Como outros são ortopedistas, cirurgiões, otorrinos, eu praticava a psicanálise. Meus pacientes me pagavam por isso. E o que seria isso, exatamente? Ouvir, claro. Os pacientes contavam suas histórias. Eu ouvia. Compreendo que para o leitor isso seja, ao primeiro contato, meio desconcertante. Parece claro que o analista não pode ser outro senão, justamente, o leitor – confere? O escritor é o paciente, o analisando. Conta sua história, tece sua teia. O analista é o leitor, vítima e algoz, enredado e crítico ao mesmo tempo. Caberá a ele encaminhar a resenha, comprar ou não o livro, dá-lo de presente aos melhores amigos, esquecê-lo num canto inacessível da estante ou, pior, vendê-lo a peso a…