Nos contos de “Ficções”, um dos maiores livros do século XX, Jorge Luis Borges propõe vários jogos literários em seu estilo inimitável (embora não falte quem tente imitá-lo), no qual se misturam de forma quase inverossímil a seriedade mortal da investigação erudita sobre os limites da linguagem e uma espécie de molecagem irônica que torna possível ler seus rigorosos artefatos ficcionais com um prazer e um abandono normalmente associados à literatura de gênero – como o policial, por exemplo, que o autor argentino admirou e cultivou. Ou ainda o romance de espionagem, inspiração para uma de minhas “Ficções” preferidas, embora menos famosa do que “Funes, o memorioso”, “Pierre Menard, autor do Quixote” ou “A Biblioteca de Babel”. Estou falando de “O jardim de veredas que se bifurcam” (ou “O jardim de caminhos que se bifurcam”, ao gosto do freguês: o original fala em senderos), cuja maravilhosa cena final, na tradução de Carlos Nejar para a editora Globo, é reproduzida abaixo. Como costuma ocorrer nesta sessão, a leitura da cena é puro spoiler e talvez deva ser evitada por quem ainda não leu o livro, mas pretende lê-lo. Algo que, tendo a chance, deveria começar a fazer ainda hoje. Na Primeira…