“Lá fora espocam foguetes que choram lágrimas incandescentes”, ele escreveu. “Mas não choram mais que Maria Flor.” Assim terminava a redação de 1975 que nunca lhe saiu da memória. Tinha treze anos e sua presunção, como toda presunção, era feita metade de coisas sabidas – lágrimas metafóricas! o verbo espocar! – e metade de coisas rotundamente ignoradas. O atraso cósmico, por exemplo. Transformar a tarefa escolar num esboço de conto regionalista dos anos 30 sobre um coitado, o marido de Maria Flor, que os capangas de um coronel provavelmente nordestino matavam por vagas disputas fundiárias em pleno curso dos festejos juninos era para sempre embaraçoso. Talvez desculpável também. Quem sabe nessa idade o que é clichê ou, mais difícil ainda, purple prose? A professora de português, que devia saber tudo isso, adorou. Leu a redação em voz alta para a turma e apressou a chegada do arrependimento que ia se agravar com os anos, a ponto de levá-lo a passar a vida inteira, livro após livro – não que tivesse consciência disso, era algo que percebia agora, no leito da UTI – renegando no tutano de cada frase que escrevia a própria possibilidade de foguetes derramarem lágrimas incandescentes e serem…