Será que só eu achei uma chatice sem tamanho a iconoclastia marqueteira de Fernando Vallejo, escritor colombiano que virá à Flip? Vallejo tem despejado na imprensa brasileira vitupérios em série contra tudo o que se move: de Chávez a Uribe, do papa a Fidel, da Colômbia ao Brasil, de García Márquez ao que você quiser imaginar – isto é, se a essa altura o tédio não tiver congelado sua imaginação. Tudo com mão tão pesada, tão obviamente calculado para épater le bourgeois – um burguês que não está nem aí, claro – que fiquei pensando: terá a literatura chegado a tal ponto de rebaixamento frente ao mercado que, como uma puta velha, precisa desses atavios cada vez mais espalhafatosos, desses esgares grotescos que tentam se passar por sorrisos? Ou o cara é assim mesmo?
Como sei que Vallejo já ganhou o prestigiado prêmio Rómulo Gallegos e é levado a sério pelos críticos de língua espanhola, não me espantei de ver que o “Estadão” de sábado embarcou em sua conversa sem o menor traço de distanciamento irônico, mencionando sua “ira explosiva”. “O Globo” de ontem não ficou atrás e disse que Vallejo “atirou, com cinismo e humor, contra as hipocrisias”. Entre explosões e tiros, o lado bom da batalha foi que corri para subtrair “O despenhadeiro” (Alfaguara, tradução de Bernardo Ajzenberg, 176 páginas, R$ 28,90) da minha fila de leituras pré-flipescas. Sei que corro o risco de ser injusto, que a boa literatura pode vir de qualquer lugar – inclusive de bufões. Mas sabe como é, a vida é curta, a fila é longa, a crítica é volúvel… Se um pobre leitor não puder confiar em seu instinto para as afinidades eletivas, vai confiar em quê?
33 Comentários
Alguns agindo como putas velhas e outros como putas tristes 🙂 Minha ignorância vai pesquisar um pouco mais sobre o Fernando Vallejo. Me será útil como estudante de espanhol, pelo menos. Abs!!
Também não conhecia esse sujeito. Pelo que o Sérgio escreveu imaginei um Cláudio Assis das letras (credo!). Tem aquele Efraim não-sei-quê que também explora muito essa imagem de contre tout. Essa última frase ficou uma jóia: “Se um pobre leitor não puder confiar em seu instinto para as afinidades eletivas, vai confiar em quê?”
Eu também acho horrível esse comportamento, mas, convenhamos: ele está no papel dele. Não basta escrever livros: tem que vender.
Agora, se ele é contra tudo… infelizmente devo dizer que essa é a primeira opção dos medíocres.
espero que ele tenha melhorado da Virgen de los sicarios pra ca…caso contrario e melhor voltar para a biologia.
So uma pergunta, de onde voce desenterra esses caras, Sergio?
Não entendi, Chico. Vallejo está cheio de espaço na grande imprensa, livro saindo esta semana, presença confirmada na Flip. O que foi que eu desenterrei?
O papel da imprensa também é este. Mostrar quem vale e quem não vale a pena, ainda que involuntariamente. Se o Globo e o estadão embarcaram na onda do cara, pelo menos o leitor mais atento percebeu logo qual é a dele, nas primeiras respostas. Não foi preciso mais que duas perguntas pra decidir não perder tempo com esse sujeito.
Desculpe Sergio. Estou por fora da Flip, moro em Vanuatu. No caso do Vallejo, ele tem que fazer muito marketing mesmo, pois pelo menos o ‘Virgen’ eh ruim. Os meninos narrados no livro sao copia mal acabada do Capitaes de Areia na versao topa tudo por dinheiro. Uma amiga colombiana me presenteou um exemplar em 99 me vendendo o peixe da iconoclastia e esta esperando ateh hoje minha opiniao…
Não sei por que, mas esse negócio de ficar apedrejando tudo e todos para vender livros me lembra muito um tal de Marcelo Mirisola, de alguns post atrás.
O Fernando Vallejo é um iconoclasta pop: atira em tudo e não derruba nada. Por isso a grande mídia baba. No fundo, é mesmo inofensivo. Agora, é uma pena que nesta sociedade do espetáculo a literatura tem se transformado cada vez mais em outra coisa que não literatura.
No mais, parabéns pelo blog: cada vez melhor.
Sergio, só pra vc saber, colocamos um link pro Todoprosa aqui: http://www.revistabula.com
abs
cw
O Tomás tem razão. Acolhido sem muito distanciamento nem ironia por aqui, o Mirisola combina um bocado com a descrição ora dedicada ao Vallejo. Aliás, em termos políticos a relação de criticados (Uribe, Chávez, Fidel, Garcia Márquez e João Paulo II) me pareceu lúcida e pertinente.
Lendo as entrevistas dele, me pareceu mais um Mirisola tentando ser Bernhard.
Deixa o gajo fazer o marketing dele. A mídia adora essas diatribes… mas preciso ler o cara antes de formar qualquer juízo sobre a literatura dele. Literatura é uma coisa, marketing é outra, pois não?
Sérgio, a frase final do filme Advogado do Diabo é “A Vaidade é meu pecado favorito”. Escritores são especialmente vaidosos, alguns é só dar espaço para eles pecarem um pouquinho. Sinceramente, ainda desconheço este senhor que você descreve. Como meu amigo Eric Novello vou pesquisar sobre ele, tqalvez até lê-lo.
Todo direito de achar a Virgem dos sicários ruim. Eu acho um grande romance. Dizem que O despenhadeiro é ainda melhor, mas ainda não li. Mas daí a comparar com Capitães de areia… é demais, até porque o que está em questão na narrativa é o narrador, não os meninos. O Vallejo é um Mainardi que escreve bem. E que se leva menos a sério. Sérgio, vale a pena e é curtinho!
Anderson, bom saber que alguém defende o homem, que não ficamos todos loucos de vez. Mas eu passo, pelas razões já expostas. Digamos que “Mainardi que escreve bem” não foi um argumento dos mais persuasivos. Mesmo porque o problema do Diogo Mainardi não é “escrever mal”.
De toda forma, Cezar, se é claro que marketing e literatura não se confundem (e eu digo isso no post), não é menos verdadeiro que qualquer leitor precisa fazer escolhas – e, no meu caso, bufões como esse sujeito largam em enorme desvantagem.
Bom vê-lo por aqui, Otto. E valeu pelo “cada vez melhor”, principalmente neste momento em que muita gente resolveu tratar a enorme repercussão de um ou outro post mais polêmico como se fosse o apocalipse, a própria invasão dos visigodos. Quando na verdade é só dor do crescimento. E a multidão, reparem, se dispersa assim que eu paro de falar mal de Machado de Assis e dos gays, hehe.
Obrigado pelo link, Carlos.
Abraços a todos.
Sergio, perdoe usar aqui esse espaço, mas morreu hoje H. Dobal. Um grande nome da poesia brasileira, ainda pouco conhecido no sul, mas sempre brilhante. acho que merecia, ao menos, uma olhada sua nos belos poemas dele, e, quem sabe, um post por aqui. um dos muitos links sobre ele: http://www.algumapoesia.com.br/poesia/poesianet082.htm
abraço.
Total, Sergio, total. me lembrou nosso ‘iconoclasta’ do Tietê.
André, não há o que perdoar. Obrigado por trazer a notícia. O blog não trata de poesia, mas acha que o mundo deveria ser como a Mangueira de Nelson Cavaquinho e Guilherme de Brito: quando morre um poeta, todos choram. Um abraço.
Imagine… Vallejo, hipster?
O bom eh que sempre sobe a superficie um nome, uma uma dica valiosa…Hindemburgo Dobal… o Dias sem Pressagio, ja esta pedido. Obrigado Andre.
Mas Sérgio, tem uma coisa: don Roberto Bolaño gostava bastante do Vallejo. Será que essa “indicação de luxo” não faz com que o sr. reclamão mereça nossa leitura?
Inclusive, esse excesso de pseudo-iconoclastia é vigente hoje na internet…
Sempre tem um ou outro “estrela-da-vez” que adora aparecer criticando, ofendendo e desdenhando em um mundo e meio… tudo pra chamar a atenção.
Sempre que alguém se comporta assim, dá logo a impressão de que é uma pessoa carente e sem atenção. Ou, o que é mais comum atualmente, apenas um grande chato.
Reconheço que esse argumento tem peso, Jonas. Embora não tenha a menor pretensão de estar certo nem de falar por ninguém, minha leitura no momento está cancelada, fazer o quê. Mas prometo pensar no assunto. Abs.
obrigado, sérgio.
obrigado, chico.
aproveitem a “deixa”, apesar de triste, e conheçam a obra de Dobal.
afinal, sua poesia o manterá vivo, sempre.
Parabéns pela epígrafe. Bem adequada para o público doi IGnorância…
Aliás, esses asnos não devem nem saber o que é epígrafe. E vão achar q você é o João Ubaldo!
Sérgio, depois que publiquei o comentário percebi que “Mainardi que escreve bem” é uma tremenda injustiça com o texto do Vallejo. Mas a gente tem mesmo de selecionar o que lê, e é uma pena para o Vallejo perder um bom leitor. Avise ao pessoal aí que o cara não é nenhum arrivista… já tem uma carreira construída, e grande reconhecimento da crítica, mesmo de quem torce o nariz para ele, a despeito das polêmicas e dos cachorros. Eu mesmo acho detestáveis suas entrevistas e aparições públicas, mas respeito – e muito – sua literatura.
Valeu, Anderson. Mas o aviso que você me pede para dar já está no texto: “Vallejo ganhou o prestigiado prêmio Rómulo Gallegos e é levado a sério pelos críticos de língua espanhola”. Um abraço.
Sérgio, o que phode não é a verborragia dele e sim a incompetência dos ‘jornalistas culturais’, mais preocupados em conseguir uma manchete boa do que analisar a sério a literatura dele. Cada vez mais importa o autor(ou a persona inventada para chamar a atenção e vender mais livros) e menos a literatura. E seus ‘coleguinhas’ tem boa parcela dessa culpa.
Baiduei, já comprei o livro, tá na fila da flip.
olá… considero o seu critério de leituras e não-leituras admirável. um abraço.
Obrigado, implicante. A coragem com que você assume suas opiniões também é notável.
Sérgio, tenha certeza de que não está sozinho: também achei a aparição de Vallejo uma… porcaria, isso mesmo.
Se é marqueteira, não me convenceu. Se é bufão, é tudo de que não precisamos: do presidente aos aspones da República, há excesso de candidatos à vaga-mor.
À mítica ilha deserta eu jamais levaria seus impropérios, à fogueira de 33, no coração da Alemanha, eu não lhe pouparia.
Que volte ao seu quintal, onde à sombra de olhares mais cuidadosos um sem-fim de pragas assolou os matos e urbanidades.
Outras rendas: Parabéns pela continuidade, Sérgio. Te acompanho, esporadicamente, desde os idos de NoMínimo. De lá pra cá, sua pena só fez precisar o alvo.