O homem que defendeu a miscigenação brasileira, dando a ela um valor positivo, foi também o homem que elogiou Salazar, ditador que impôs um regime autoritário de mais de 30 anos a Portugal. Essa e outras controvérsias foram relembradas na mesa “Além da casa grande”, que reuniu, na Flip, o africanista Alberto da Costa e Silva, a historiadora Maria Lucia Burke e socióloga Angela Alonso, sob a mediação da antropóloga Lilia Schwarcz.
“Freyre parecia ter uma visão romantizada da abolição da escravatura, como se ela tivesse ocorrido sem conflito social nenhum”, disse Angela Alonso. Para justificar a admiração de Freyre por Salazar, Costa e Silva disse que o ditador português sabia conquistar os intelectuais pela vaidade: ele se preparava, lendo a respeito da produção de um pensador, antes de se encontrar com ele.
A conversa também foi temperada por menções ao estilo único de Freyre, que escrevia como um romancista e pesquisava como um bisbilhoteiro, nas palavras do próprio. “Ele enumera imagens para transmitir ao leitor a sensação da mudança da sociedade colonial para a moderna, no Brasil. Entram aí receita de bolo, jazigos, anúncio de chapéu, anúncio de dente de ouro, modinhas”, afirmou Angela. “É o que ele chama de bisbilhotice disfarçada de investigação sociológica.”
Lilia lembrou que o método de pesquisa de Freyre era inovador para a sua época, e que gerou alguns narizes tortos para o pernambucano. Torto mesmo, porém, foi o período em que Freyre foi banido das universidades. “Quando eu fiz faculdade, não se lia Gilberto Freyre”, contou Angela. “A gente lia escondido”, brincou Lilia. Hoje, Freyre vive um resgate, que inclui essa homenagem ao antropólogo na Flip, em que colaborou a historiadora Maria Lucia Burke, cocuradora do tributo.
Por Maria Carolina Maia.
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