Uma vez, falando aqui no blog sobre o escritor suíço (radicado em Londres) Alain de Botton, autor de “Como Proust pode mudar sua vida” (Rocco), eu disse que ele tinha praticamente inventado um novo gênero literário, que batizei de Auto-Ajuda Podre de Chique (AAPC). A leitura que se faz do gênero é a mesma da auto-ajuda mais rasteira, isto é, uma leitura utilitária: “Como este livro pode adiantar o meu lado?”. Ao mesmo tempo – eis o golpe de mestre – há uma aura de refinamento intelectual que impede o leitor de se sentir um filisteu.
Contudo, estou reavaliando meu juízo sobre o homem depois que li esta notícia no “Mais!” do último domingo (só para assinantes). Alain de Botton é sócio de uma certa Escola da Vida, que acaba de ser inaugurada em Londres com uma proposta espantosa. Como diz o texto assinado por Pedro Dias Leite:
A idéia é a seguinte: o cliente preenche uma ficha com informações sobre sua história, suas aspirações e seus hábitos e, a partir de uma consulta com um especialista, recebe indicações de leitura que o ajudem a enfrentar uma nova fase, encarar uma etapa importante ou simplesmente aproveitar um momento da vida.
A consulta, segundo a reportagem, custa o equivalente a R$ 120, e pode resultar em algo como os seguintes exemplos:
Para aqueles que se preocupam com a morte: “Nothing to Be Frightened of” (Nada a Temer), do escritor britânico Julian Barnes
Para aqueles em busca de sua própria companhia: “Man Alone With Himself” (“Homem a Sós Consigo”, parte de “Humano, Demasiado Humano”), de Nietzsche.
Para aqueles que ficaram profundamente e inesperadamente apaixonados: “Fragmentos de um Discurso Amoroso” (ed. Martins Fontes), de Roland Barthes.
Depois dessa, estou pensando em rebatizar a AAPC: Auto-Ajuda Picareta e Caricata parece um nome mais adequado.
Sempre disposto a fomentar o empreendedorismo, porém, deixo algumas sugestões nativas a quem, inspirado na vanguarda londrina, quiser montar por aqui sua própria tendinha biblioterápica:
Para aqueles que estão planejando uma festança inesquecível de réveillon: “Feliz ano novo”, de Rubem Fonseca
Para aquele pai zeloso cuja filha está prestes a se casar: “O casamento”, de Nelson Rodrigues
Para quem deseja encarar um caso extraconjugal sem medo: “A cartomante”, de Machado de Assis
Para quem morreu e não sabe: “Memórias póstumas de Brás Cubas”, de Machado de Assis
Se alguém quiser contribuir com outras idéias, o guichê está aberto.
45 Comentários
Para quem está com depressão pós-parto: “A Profecia”.
Para quem está com a consciência pesada: Crime e Castigo (Dostoievski)
Sérgio, Brás Cubas morreu e sabia que estava morto (caso contrário à falácia de Olivier Bécaille, de Zola)> Logo, eu sugiriria, na mesma categoria, o Livro dos Espíritos, de Kadec. Literatura, penso, está mais para o profilático, do que para o paliativo. Não li a matéria (e não me sinto tentado a fazê-lo), mas prevejo insucesso no empreendimento de Botton, a não ser, claro, que ele inaugure uma franquia brasileira…
Cláudio, é evidente que Brás Cubas sabia que estava morto. Quem não sabe e precisa aprender com ele é o cliente de um serviço desses.
Para quem quer dar conselhos biblioterápicos: Como falar dos livros que não lemos?, do Pierre Bayard
Para quem deseja aprender fotografia: Eu hei-de amar uma pedra, de António Lobo Antunes
Para quem deseja ingressar no mundo dos negócios: Eu S/A, de Max Barry
Como não lidar com TDAH: Aurora sem dia, de Machado de Assis.
Sem cobrar nada, dou minha sugestão para o dilatamento da felicidade humana. Simples e barato, aliás.
NÃO DESPERDICE SEU TEMPO, QUE É ESCASSO E NÃO MAIS RETORNA, LENDO O CADERNO MAIS! AOS DOMINGOS, PREFIRA O FAUSTÃO OU O GUGU, MUITO MAIS INSTRUTIVOS.
Tá vendo. Não precisa gastar nada.
Para quem quer salvar o pai de um assassinato ocorrido há 40 anos: Síndrome de Cérbero, de Tibor Moricz
Para quem sonha em levar uma gulosa da secretária: As sementes de Flowerville de Sérgio Rodrigues.
Para quem subitamente se sente impelido a voar: Santos Dumont número 8, de Claudio Soares.
E por aí vai…rsrs
Então Isabel, Bayard fez até FLIP, não? Olha aí, uma franquia brasileira de sucesso… Estou lendo o seu livro. Tem um esquema de símbolos que indicam (uma coisa que ainda não consegui entender, juro) “livros não lidos, mas indicados”. Não serei injusto. Lerei até o final (tentarei ao menos) e aí então, indicarei ou não.
Lemke: não sei se você sabe um caso interessante do Eu S/A. Eu acompanhei por algum tempo o blog do Max Barry. Um dia, ele (surpreso) questionava a capa e o título da edição brasileira (o original é “Jennifer Government”). Alguns dias depois, apareceu o capista da edição brasileira informando que (a capa pelo menos) seguiu o que ele havia entendido do primeiro capítulo do livro: o único ao qual ele havia tido acesso para criar a capa (!?)
Sérgio: esse morto é “muito do vivo”! 🙂
Para brigas familiares: Esaú e Jacó, Machado de Assis
Para quem não tem heróis: Macunaíma, Mário de Andrade
Para quem acredita na fidelidade: A Insustentável Leveza do Ser, Milan Kundera
Para quem sofre de insegurança: Dom Casmurro, Machado de Assis
Para crises existenciais: A Náusea, Jean Paul Sartre
Para quem sofre de loucura: O Alienista, Machado de Assis
Para quem se sente burro: Os Piores Textos de Washington Olivetto
Grande Tibor: com uma pequena ressalva: voemos, mas não esqueçamos que não nascemos com asas, logo é um voo intermediado, literário. O SD8, penso, também deve funcionar com os supersticiosos 🙂
Para hipocondríacos:
Medicina Alternativa de A a Z de Carlos Nascimento Spethmann
Para quem pensa em se mudar para um condomínio de luxo paradisíaco: As Sementes de Flowerville – Sérgio Rodrigues.
Desculpe Sérgio, Não resisti.
para quem não tem o que fazer: obras completas de Carlos Zéfiro
Para quem não quer se matar e não sabe bem o por quê, indico o meu O Suicida (Cultura e Martins Fontes)…Ooops!
Para quem não tem mais jeito: Qualquer um da Fernanda Young.
Sérgio,
Esse Botton ai nunca me enganou. O cheiro de embuste nos livros dele exala a quilômetros de distância. Confirrnou-se inequivocamente com essa ai.
Para aspirantes a jornalista/escritor: Ilusões perdidas, Balzac
Para hipoconcríacos: A montanha mágica, Thomas Mann (vai um pouco além do Medicina Alternativa de A a Z)
Para investidores/especuladores: O Dinheiro, Emile Zola (esse está bem em voga)
Para bipolares: O vinconde partido ao meio, Italo Calvino
E por aí vai.
Sérgio: estou lendo o último romance de Philip Roth, “Indigmation,” publicado neste ano centenário de Machado. E achei curiosa uma coincidência: o narrador de Roth também é um defunto. Só que a sério.
Para a AAPC: Para aprendizes de torneiro mecânico: “Zen e a Arte da Manutenção da Motocicleta”, de Pirsig.
Para quem quer fugir de casa: On the road ( Kerouac ).
Para quem quer matar um árabe ( O Estrangeiro ).
Para quem quer fazer terapia: Cosnciêcia de Zeno – Italo Svevo
Para quem quer voltar para casa ou afiar lâminas: Conversa na Sicília – Elio Vitorinni
Para quem não se reconhece no Espelho: Um, Nenhum e Cem mil – Pirandello
Para candidatos a representante comercial: A Morte do Caixeiro Viajante – Arthur Miller;
Para mulheres ambiciosas: As Aventuras da Menina Má – Vargas Llosa
Para pastores frustados: A Guerra do Fim do Mundo – Vargas Llosa
Para os ansiosos: O Amor nos Tempos do Cólera
[]’s
Para todos: Aurelio
Para os prosas: The Art of Fiction e Cartas a um Jovem Escritor
Para os marxistas: O Cobrador
Para o concupiscente: Le Rouge et le noir
Para viver no Rio do lado de ca do Reboucas: Manual do Guerrilheiro Urbano
Para os mineiros: Primeiras Estorias
Para quem le Paulo Coelho: Armadilha para Lamartine e O Autor mente muito
Para quem leva a vida na flauta: L’Education sentimentale
Para quem sofre: A História do Clube de Regatas do Flamengo
Para se entender: Raizes do Brasil, Casa-grande e senzala, Sermoes e epistolario do Pe. Vieira, 3 talagadas de Salinas antes da janta, 2 valiums antes de dormir
Depois de todas as sugestões, Alain, que se cuide… 🙂
Olha, recomendação de leitura mediante paga, desde que esclarecido o frequês de que não se trata de nada além disso – recomendação de leitura – me parece não apenas mais sadio, como também mais honesto do que a empulhação dos psicanalistas, que além de escravizar emocional e financeiramente o freguês, ainda postulam ares de seriedade à sua picaretagem pseudo-científica e pseudo-curativa.
Para quem acha que está louco e fala com Deus: Valis de philip K. Dick…
Para quem sabe não tem capacidade e nem bagagem cultural para tanto, mas faz questão de se fazer passar por intelectual;
O manual do cara de pau!!!
Para quem está com a sensação de que o tempo passa e não consegue realizar nada que o tire da mediocridade: “As Cadeiras”, de Ionesco.
Para quem acredita nessas bobagens de desenvolvimento econômico, criação de empregos e distribuição de renda: 3000 dias no bunker.
Todos esses dá para achar no sebo:
Para os dentistas: Caninos Brancos, de Jack London.
Para os oculistas: As Pupilas do Senhor Reitor, de Júlio Diniz.
Para os mecânicos: A Volta do Parafuso, de Henry James.
Para os jardineiros: As Flores do Mal, de Charles Baudelaire.
Para os zoólogos: O Dia do Chacal, de Frederick Forsyth.
Para os engenheiros: Os Sete Pilares da Sabedoria, de T. E. Lawrence.
Para os botânicos: O Nome da Rosa, de Umberto Eco.
Para os gramáticos: Amar, verbo intransitivo, de Mário de Andrade.
Para figurinista de escola de samba: O Jogo das Contas de Vidro, de Hermann Hesse.
Para quem está na dúvida se vai dar praia: As Nuvens, de Aristófanes.
Para quem vai hospedar a sogra: A Megera Domada, de Shakespeare.
Para qualquer um que seguir meus conselhos: O Bobo, de Alexandre Herculano.
Para quem detesta auto ajuda picareta e a maioria do que aí está pelas livrarias, “Sobre o ofício do escritor” do meu querido rabugento Schopenhauer (apresentação e notas de Franco Volpi, Martins Fontes). Risadas garantidas.
Para quem quer enxergar melhor: “História do Olho”
Já que vc citou Nelson Rodrigues, sugiro a leitura de “Inveja – Saiba como tratar e se defender deste mal”. Deste modo, por meio da auto-ajuda podemos nos livrar de nosso “complexo de vira-lata” e deixar os ingleses em paz…
para quem quer ser barbeiro: o fio da navalha – de somerset maugham
para quem quer ser ecologista – Moby Dick – de Herman Melville.
para quem quer ser veterinário – Gata em Teto de Zinco Quente de Tennessee Williams
para quem quer ser diretor do zooológico – Il Gattopardo de Tomasi di Lampedusa
para quem quer ser miss – O Pequeno Príncipe de Saint-Exupéry.
para quem quer ser garota de programa – Jack the Ripper de Richard Wallace.
para quem quer viajar de navio – Afundem o Bismarck ! de
C S Forester
para quem realmente ama as músicas dos beatles – Helter Skelter: The True Story of the Manson Murders
por Vincent Bugliosi
Para quem quer comer a irmã: Lavoura Arcaica – Raduan Nassar
Divertida essa história da AAPC.
Lembrei da atriz que disse numa entrevista que seu gênero de leitura favorito era a comédia. E completou dizendo que o livro que mais gostou de ler foi a Divina Comédia de Dante Alighieri.
Minhas sugestões:
Para quem quer ser prefeito mas não quer trabalhar: As Cidades Invisíveis
Para quem quer saber o que colocar na mala para ir a país nórdico em janeiro: Se um viajante numa noite de inverno
Para quem quer ser latifundiário: Terras do Sem Fim
Para quem quer saber mais sobre o PMDB: Ulisses
Para quem tem medo do futuro: Admirável Mundo Novo – Aldous Huxley
Para quem tem medo de ficar feio: A Metamorfose – Kafka
Para políticos: Ensaio sobre a lucidez – Saramago
Para quem lê a bíblia: O evangelho segundo Jesus Cristo – Saramago
Para quem confia nas pessoas: Quincas Borba – Machado de Assis
Vc deveria citar uma das grandes obras dele, DESEJO DE STATUS, Desafio a qualquer pessoa a nao se enquadrar naquele livro. Ele consegue sintetizar muito bem o mal que aflige grande parte desta sociedade. E a coisa vai piorando, ainda mais em paises jovens como o Brasil que ainda se apegam a valores ja ultrapassados pela sociedade mais antiga, como na Europa. Digo isso com a maior tranquilidade pois vivo aqui em Londres e observo o comportamento social no meu dia a dia. Ahh, irei visitar a livraria ESCOLA DA VIDA..sem duvidas..nao tem nada de picareta, e originalidade pura. Livros de ajuda, ao menos tentam ajudar as pessoas. Melhor do que livros de romances enfadonhos, que nada de beneficio trazem a nossa vida. Temos que evoluir nosso lado emocional e nao apenas o intelectual!
Vc deveria citar uma das grandes obras dele, DESEJO DE STATUS, Desafio a qualquer pessoa a nao se enquadrar naquele livro. Nao s ei quem tem coragem de dizer que e embuste. Pessoas que nunca fizeram nada de grandioso deveraim se abster de criticar grandes personalidades reconhecidas mundialmente. Muito pratico se esconder no seu mundinho e questionar os outros. O Alain de Botton consegue sintetizar muito bem o mal que aflige grande parte desta sociedade. E a coisa vai piorando, ainda mais em paises jovens como o Brasil que ainda se apegam a valores ja ultrapassados pela sociedade mais antiga, como na Europa. Digo isso com a maior tranquilidade pois vivo aqui em Londres e observo o comportamento social no meu dia a dia. Ahh, irei visitar ,sim, a livraria ESCOLA DA VIDA..sem duvidas..nao tem nada de picareta, e originalidade pura. Livros de ajuda, ao menos tentam ajudar as pessoas. Melhor do que livros de romances enfadonhos, que nada de beneficio trazem a nossa vida. Temos que evoluir nosso lado emocional e nao apenas o intelectual!