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Voto
A palavra é... / 27/09/2008

Voto, do latim votum, é uma palavra que veio do vocabulário religioso para entrar no da política. Seu sentido original, que ainda conserva, é o de promessa, desejo íntimo, e por extensão o de oferenda com que se paga tal promessa, consagração. Do voto de castidade dos padres aos votos de boas festas, das velas votivas aos ex-votos com que os fiéis agradecem as graças que acreditam ter recebido de Deus ou de algum santo, não faltam exemplos da permanência desse núcleo semântico religioso na linguagem moderna. De forma menos evidente, as bodas (casamento) também têm a mesma origem, segundo a maioria dos etimologistas. E a própria palavra devoção é descendente de votum, particípio do verbo latino vovere (obrigar-se, prometer), um termo de raiz indo-européia aparentado de outros do sânscrito e do grego. Se a história do voto devocional vem de muito longe, seu sentido político hoje dominante – “modo de manifestar a vontade ou opinião num ato eleitoral ou assembléia”, segundo o Houaiss – é bem mais recente. Registrada em inglês a partir do século 15 ou 16, consta que essa acepção da palavra vote nasceu no parlamento da Inglaterra e logo foi importada pelas línguas latinas, a começar…

Crise
A palavra é... / 20/09/2008

“Que crise?”, perguntou o presidente Lula. Bom, que tal essa crise-mamute que ameaça engolfar o mundo, levantando até especulações de que a de 1929, em comparação, pode acabar parecendo um piquenique? Provando que a interdependência global, embora tenha se acelerado nas últimas décadas, não é uma invenção contemporânea, a palavra saiu do grego krísis para o latim crisis e daí para o mundo. Chegou ao francês no século 15, ao inglês e ao alemão no 16, ao italiano no 17 e ao português no 18. Sem mencionar o sueco, o holandês, o turco etc. Globalização é isso. A diferença é que, hoje, a vertigem eletrônica tornaria o contágio lingüístico mais rápido, como tem tornado o financeiro. A palavra nasceu no vocabulário da medicina. Referia-se ao momento na evolução de uma doença em que se definia para o médico o caminho que o paciente tomaria numa encruzilhada: de um lado a cura, do outro a morte. O grego krísis quer dizer decisão, definição e, por extensão, momento decisivo. O que explica também o sentido da palavra crítico (de arte, por exemplo), um profissional encarregado de decidir, de julgar o mérito de algo (no caso, uma obra). Foi apenas no século 19,…

Google
A palavra é... / 06/09/2008

Google é uma daquelas marcas registradas que, de tão integradas à vida cotidiana, acabam fatalmente perdendo a inicial maiúscula e caindo na linguagem comum. Os substantivos gilete, chiclete e xerox são bons exemplos dessa transformação. Em inglês, o verbo to google – procurar uma informação por meio de um mecanismo de busca na rede mundial de computadores – teve ascensão vertiginosa nos primeiros anos do século 21, espelhando a da própria empresa. Em 2006, ganhou a bênção do dicionário Oxford. Imaginar que os donos de uma marca adotada pela linguagem comum encarem o fenômeno como uma espécie de consagração pode ser prova de ingenuidade. Por meio de seu departamento jurídico e em campanhas junto aos usuários, o Google tem se esforçado para que o verbo to google só seja usado se a ferramenta de busca for mesmo… o Google. Perda de tempo, claro. Desde sua fundação, em 1998, a empresa que agora lança seu próprio navegador tornou-se uma superpotência da economia digital, mas seu poder certamente não se estende à língua. O novo verbo tem sido lento em sua penetração no português, provavelmente devido ao exotismo de grafia e pronúncia. Embora não seja rara, a forma googlar – ou mesmo…

Candidato
A palavra é... / 30/08/2008

A palavra “candidato” vem do latim candidatus, termo derivado do adjetivo candidus, que significa, segundo o Houaiss, “branco, alvo, cândido; vestido de branco; radioso, brilhante; belo, formoso; sereno; feliz, ditoso”. Embora todo esse leque de conotações positivas fosse obviamente bem-vindo, o sentido de candidatus nasceu literal: queria dizer apenas vestido de branco. Aqui estamos na fronteira entre a política e a moda: na Roma Antiga, os aspirantes a qualquer cargo público só se apresentavam diante dos eleitores metidos em togas imaculadamente alvas. O costume, tão arraigado que passou a nomear os próprios políticos em campanha, foi analisado da seguinte forma no início do século 18 por Rafael Bluteau, em seu Vocabulário Português e Latino, o primeiro grande dicionário da língua portuguesa: “Candidato – Assim chamavam antigamente em Roma àqueles que pretendiam ser eleitos às dignidades, porque estes tais vestiam de branco, como se quisessem mostrar a candideza do seu ânimo na sua pretensão, dirigida só ao bem público; ou também porque queriam dar a entender que não fundavam nos seus merecimentos, mas na bondade e virtude dos que haviam de eleger, o sucesso da pretensão.” Já começado o século 21, Márcio Bueno, autor de A origem curiosa das palavras, acrescentou…

Nepotismo
A palavra é... / 23/08/2008

A notícia é excelente: o Supremo Tribunal Federal declarou ilegal o nepotismo, a prática de favorecer parentes com empregos públicos. Resta saber se isso bastará para extirpar uma crença tão trançada em nossa armação social – a crença no direito sagrado ao favorecimento, à mamata – que chega perto de constituir uma religião. A palavra nepotismo desembarcou no português no início do século 18. Vinha em última análise, provavelmente via francês, do latim nepos, nepotis – “sobrinho ou neto”. Mesmo antes de ganhar um nome, a prática já se espalhava feito praga por todos os cantos do poder na então colônia portuguesa. Casava-se à perfeição com a lógica de uma sociedade escravocrata que praticamente desconhecia – e levaria ainda muito tempo para começar a reconhecer – o valor do trabalho livre. A metáfora religiosa usada ali em cima é mais pertinente do que parece: a palavra nasceu para designar os privilégios de que gozavam os sobrinhos de certos papas na hierarquia da Igreja (netos não, apesar da ambigüidade da palavra latina, pois pelo menos em tese o Sumo Pontífice não devia tê-los). Nas palavras do filólogo brasileiro Silveira Bueno, fica assim: “Nepotismo – Proteção aos sobrinhos, criação italiana visando aos…

Recorde
A palavra é... / 16/08/2008

A profusão de recordes batidos nos Jogos Olímpicos de Pequim e sua extensa cobertura põem em evidência uma dúvida de pronúncia que sempre acompanhou esse termo importado do inglês record. Afinal, devemos falar récorde, palavra proparoxítona, como a maioria dos locutores e comentaristas da TV? Ou, seguindo a recomendação de dez entre dez sábios, recórde, paroxítona? Trata-se de um caso clássico em que a língua da vida real vai para um lado e a dos estudiosos para o outro. “Recorde”, estrangeirismo consagrado há décadas em todos os dicionários, pode ser substantivo – com o sentido de marca esportiva, desempenho a ser superado – ou adjetivo: tempo recorde, velocidade recorde. Até aí ninguém briga. A divergência começa na hora de definir a prosódia. Em seu Dicionário de palavras e expressões estrangeiras, Luís Augusto Fischer observa com bom humor que há “duas pronúncias: a que os gramáticos preferem, rre-CÓR-dji, ou a do resto da humanidade, RRÉ-cor-dji”. É mais ou menos isso. Basta substituir, na frase de Fischer, “o resto da humanidade” por “a maioria dos brasileiros” que ela fica perfeita. Em Portugal, os falantes se inclinam por recórde. Uma possível explicação para o descompasso: os portugueses manteriam a pronúncia que record ganhou…

Olimpíadas
A palavra é... / 09/08/2008

Quem não sabe que as Olimpíadas da era moderna, disputadas desde 1896, herdaram seu nome e seu ideal de confraternização dos jogos que se realizavam na cidade de Olímpia, na Grécia Antiga? No sítio arqueológico da velha Olímpia, tombado pela Unesco, a tocha é acesa de quatro em quatro anos antes de ser conduzida ao país-sede da vez. Mas o que eram aqueles jogos é algo pouco lembrado, mesmo em momentos olímpicos. O festival de Olímpia, realizado no verão a cada quatro anos a partir do século 8 a.C., era o mais importante dos quatro grandes festivais pan-helênicos, que atraíam levas de visitantes e celebravam a unidade grega acima das divisões em Estados. O Barão de Coubertin não criou do zero sua ideologia de integração entre os povos. O Dicionário Oxford de Literatura Clássica diz que “por ocasião do festival proclamava-se uma trégua sagrada (ekekheiria), graças à qual concedia-se um salvo-conduto aos viajantes a caminho de Olímpia”. Tudo começou com uma corrida de 183 metros, à qual se somaram com o tempo uma prova de longa distância, o pentatlo, o pugilismo e as corridas de bigas. O sucesso dos jogos pode ser medido pelo estádio que os abrigava, com capacidade…

Gerundismo
A palavra é... / 02/08/2008

Uma das qualidades do decreto de regulamentação dos call centers assinado pelo presidente Lula está numa ausência: o texto não procura banir do discurso dos atendentes o famigerado gerundismo. Quem não o conhece? “Vamos estar lhe enviando uma nova via.” Ao recusar o papel de patrulha da língua, a medida se distancia de um decreto folclórico assinado ano passado pelo governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda, proibindo o uso do gerúndio nas repartições públicas. Longe de defender o gerundismo, trata-se de reconhecer que os costumes lingüísticos zombam das tentativas de controlá-los a canetadas. Além disso, o decreto de Arruda confunde gerundismo e gerúndio. O primeiro é um vício de expressão que pode ou não vir a se firmar na língua. O segundo, uma forma verbal usada por Camões que hoje viceja mais no Brasil que em Portugal. Seria absurdo que, combatendo a praga (olha o gerúndio aí), matássemos também a planta. Neologismo ainda não dicionarizado, gerundismo tem sentido pejorativo. Nomeia e ao mesmo tempo critica o modismo que, depois de se firmar na fala burocrática em geral e na do telemarketing em particular, contaminou outros grupos sociais. Muita gente acredita que tenha nascido como tradução literal do inglês. No…

Genocídio
A palavra é... / 26/07/2008

As atrocidades que nomeia são mais velhas que a Bíblia, mas a palavra genocídio – extermínio deliberado, total ou parcial, de um grupo étnico, nacional ou religioso – tem apenas 64 anos. Quase a mesma idade de Radovan Karadzic, o ex-líder servo-bósnio que, preso esta semana em Belgrado, aguarda extradição para responder a processo no Tribunal Penal Internacional para a Antiga Iugoslávia, em Haia. Entre as acusações que Karadzic enfrentará, por crimes de guerra cometidos contra os muçulmanos bósnios no conflito dos Bálcãs nos anos 1990, a de genocídio diz respeito a um crime que ainda não existia no direito internacional em 1945, quando ele nasceu. A palavra acabara de surgir. Um ano antes, o advogado polonês de origem judaica Raphael Lemkin tinha publicado nos EUA um livro sobre a ocupação nazista na Europa em que punha por escrito pela primeira vez um termo cunhado por ele mesmo com elementos do grego (génos, “tronco, raça”, da família de gênese e gente) e do latim (cidium, “ação de matar”). A mesma obra propunha uma definição de genocídio que abrangia não só a perseguição física mas também a cultural, a moral etc. Como costuma ocorrer, a realidade tinha se antecipado à linguagem….

Charge
A palavra é... / 19/07/2008

Ao mostrar o casal Barack Obama encarnando os boatos que circulam contra o candidato democrata em setores conservadores dos EUA, a capa da revista “The New Yorker” tenta, pelo exagero da cena, expor tais boatos ao ridículo. Se a estratégia corre o risco de incompreensão que sempre acompanha a ironia, o que ninguém pode negar é que toda boa charge tem isso em comum: agressividade e exagero. Ou o gênero de desenho jornalístico que filtra o noticiário pela lente do humor não teria esse nome. O francês charge, de onde veio nossa palavra, quer dizer apenas carga, mas nesse caso com o sentido de crítica contundente. Trata-se de uma extensão metafórica da acepção militar de ataque – presente numa expressão como carga de cavalaria – adaptada ao vocabulário da imprensa e especialmente ao trabalho dos desenhistas cômicos. O italiano caricatura (inicialmente, ato ou efeito de carregar) partiu do mesmo ponto e chegou a resultado parecido. Tão parecido que é lícito supor que um vocábulo tenha surgido como tradução do outro. Nesse caso, há indícios de que a caricatura veio antes: segundo o Houaiss, o primeiro registro de sua acepção moderna (fins do século 16) aparece quase cem anos à frente…

Colarinho-branco
A palavra é... / 12/07/2008

A palavra composta colarinho-branco, que traduzimos do inglês white-collar, está tão associada à expressão “crime do colarinho branco” que deixa em segundo plano sua idéia de origem, que era simplesmente dividir os trabalhadores em dois grupos: de um lado os colarinhos-brancos, com terno e gravata, alto grau de escolaridade e salários gordos; do outro os blue-collar workers, o pessoal de uniforme, mal remunerado, encarregado de trabalhos braçais. O colarinho-azul não migrou para o vocabulário do português. Ficamos só com o branco mesmo. Esse código de cores é bem americano: em grande parte das empresas daquele país, ao longo do século passado, o nível hierárquico dos funcionários era indicado por jalecos brancos e azuis. No entanto, há quem diga que as raízes são mais profundas. O primeiro registro de white-collar para qualificar o trabalhador de escrivaninha é de 1919 e aparece na obra de Upton Sinclair, autor do livro em que se baseou o filme “Sangue negro”, que valeu a Daniel Day-Lewis o Oscar de melhor ator. Supõe-se, porém, que a palavra tenha influência do colarinho engomado dos clérigos de várias religiões cristãs. Por séculos, foi nesses grupos que a sociedade européia recrutou não apenas sacerdotes, mas a maioria de seus…

Calote
A palavra é... / 07/07/2008

No dia em que for contada a história da crise econômica que, com maior ou menor força, aflige hoje o mundo inteiro, é provável que o primeiro capítulo seja dedicado a um calote, ou melhor, um megacalote: o das hipotecas subprime no mercado imobiliário dos EUA. Caída a primeira peça do dominó, os efeitos seguintes foram – estão sendo – complexos demais para resumir numa palavra, mas uma coisa é certa: o calote sempre volta a aparecer. Quando a disparada da inflação faz muita gente descobrir que calculou mal sua capacidade de endividamento, por exemplo. A peça de dominó do parágrafo acima não está ali por acaso. É controversa a origem de calote – palavra antiga, registrada em português desde 1771, segundo o Houaiss –, mas a tese mais provável sustenta que ela veio do francês culotte. Não o calção, mas um velho termo do jogo de dominó que, como afirma o etimologista Antônio Geraldo da Cunha, designava “as pedras com que cada parceiro fica na mão, por não poder colocá-las”. A relação do culotte lúdico com a dívida não paga parece forçada à primeira vista, mas não é tanto assim. O calote pode ser entendido como o entulho que…

Propina
A palavra é... / 28/06/2008

Num momento em que se teme uma explosão do mercado de propinas como efeito colateral da lei de tolerância zero para o álcool no trânsito, vale lembrar que a palavra, como se sabe, quer dizer gorjeta, gratificação extra por serviço prestado, mas não traz de berço conotações de prática escusa. Se no Brasil ela é empregada quase exclusivamente em contextos negativos, como parte do arsenal da corrupção, isso tem mais a ver com nossa cultura do que com sua etimologia. A propina surgiu no século 17, vinda do latim tardio propina, “dar de beber”, termo saído por sua vez do grego por um caminho curioso. Quem explica é o dicionarista Rafael Bluteau, autor do clássico Vocabulário Português e Latino: “Propinar – Os latinos tomaram esta palavra dos gregos, os quais nos seus banquetes costumavam encher um copo de vinho, e depois de dizer Tibi propino, ‘Bebo à tua saúde, ou faço-te um brinde’, bebiam um trago, e logo davam o copo a algum dos convidados”. Propina nasceu, assim, como o ato – legítimo e até elegante – de dar de beber e comer a quem se desejava agradar ou homenagear. Ninguém precisa ser cínico para enxergar aí o caldo de…

Dunga
A palavra é... / 21/06/2008

Dunga é o maioral, o ás, o bambambã, o batuta, o melhor de todos, o rei da cocada preta, o chefão. E para evitar que se interprete a frase anterior como uma defesa do contestado técnico da seleção brasileira, convém esclarecer que antes de ser o nome profissional do gaúcho Carlos Caetano Verri, capitão da equipe tetracampeã mundial em 1994, e mesmo antes do anão da Branca de Neve, dunga já era um regionalismo brasileiro, substantivo comum e adjetivo, com os sentidos listados acima. Ironia? Pode-se ler assim, claro. O próprio uso popular do termo dunga se presta a isso. Sua primeira acepção, de “sujeito sem igual em sua especialidade, exímio”, ganhou no Nordeste, segundo o dicionário Houaiss, um emprego irônico como “homem de influência local, chefe, mandão”. Convenhamos que, desde os tempos em que desfilava nos gramados suas qualidades de volante raçudo e dotado de forte espírito de liderança, Dunga, jogador de técnica limitada, estava mais para a segunda acepção do que para a primeira. Como a sonoridade não nega, dunga veio da África, afirma Nei Lopes, estudioso da cultura afro-brasileira e autor do Novo dicionário banto do Brasil. Lopes foi buscar sua origem no quicongo (língua da família…

Ressurreição
A palavra é... / 14/06/2008

O que o governo federal (ou seria melhor, diante da preocupação geral em não deixar impressões digitais, usar aqui um sujeito indeterminado?) está tentando fazer com a CPMF, poucos meses após sua morte, tem em nossa língua um nome cheio de conotações religiosas: ressurreição, do latim resurrectionis, parente do verbo ressurgir. Só pode ressuscitar – isto é, reanimar-se, manifestar-se outra vez – aquele ou aquilo que estava morto. Como se sabe, a ressurreição é uma impossibilidade no reino da ciência e, no dogma católico, um poder reservado a Deus. No mundo das metáforas, porém, nada nos impede de empregá-la com liberalidade. Entre muitos outros casos de volta à vida, fala-se por aí na ressurreição de modismos, de carreiras e até, no sentido figurado, de pessoas que estavam apagadas ou esquecidas. Se de algum tempo para cá ficou mais comum, pelo menos em certos círculos, usar nesses casos a palavra revival, emprestada do inglês, vale observar que ela significa a mesma coisa – não faltam nem os contornos religiosos. Ateus, agnósticos ou pessoas de outras orientações espirituais que se incomodarem com a forte carga cristã de ressurreição têm outras escolhas no dicionário. A primeira é clássica: tratar a CSS como uma…

Milícia
A palavra é... / 07/06/2008

A palavra milícia ganhou projeção nacional depois que membros de um desses grupos torturaram jornalistas no Rio de Janeiro. No entanto, séculos antes de adquirir o sentido hoje dominante no Brasil – grupo de policiais dedicados à atividade criminosa de vender segurança em áreas abandonadas pelo Estado –, a milícia brotou da mesma fonte belicosa, mas respeitável, que daria em termos como militar e militante. A família saiu da raiz latina miles/militis, isto é, soldado, por meio de militia (serviço militar, campanha). O primeiro registro de uma acepção que diferenciava milícia e Exército apareceu no francês do século 17: milice ganhou o sentido suplementar de “tropa de cidadãos recrutada para reforçar as forças regulares em caso de necessidade”. A palavra ainda não estava associada ao crime: as milícias se punham a serviço dos militares de carreira. Esse sentido chegou poucos anos depois ao inglês militia. Em português, no início do século 18, o pioneiro “Vocabulário Português e Latino”, de Raphael Bluteau, retratava uma abertura semântica semelhante: “Gente miliciana é a gente bisonha, e soldados de ordenança, em que entram sapateiros, alfaiates e outros oficiais mecânicos”. (Bisonho, no caso, é recruta, soldado inexperiente.) A reputação da palavra ficou muito comprometida em…

Amazônia
A palavra é... / 29/05/2008

Assim como o estado da federação, a floresta que alguns gringos gostariam de internacionalizar deve seu nome ao rio. Tudo começou com um potamônimo, palavrão que quer dizer “nome de rio”. Coube ao explorador espanhol Francisco de Orellana, o primeiro a descer o Amazonas de ponta a ponta, rebatizar em 1542 aquele marzão doce – a princípio chamado pelos colonizadores, justamente, Rio Santa Maria de la Mar Dulce – de Rio (das) Amazonas, após enfrentar uma tribo de ferozes guerreiras armadas de arco e flecha às suas margens. A preposição foi tragada pelo tempo, e as certezas também. Seriam tapuias? Segundo uma tese, as “guerreiras” de Orellana eram na verdade mancebos cabeludos. De uma forma ou de outra, a maioria dos estudiosos é firme ao sustentar que o mito grego das amazonas está por trás de tudo, tratando como mera curiosidade a tese alternativa de que a palavra teria vindo de amassunu, termo indígena para “águas ruidosas” (e não “águias”, erro reproduzido em muitos sites brasileiros). Como a etimologia é um campo de batalha em que pululam versões e mal-entendidos, a palavra amazona também carrega um qüiproquó de origem. O vocábulo foi provavelmente importado do iraniano ha-mazan (“guerreiras”), mas, adotado…