A suspeita é antiga, mas uns dois séculos mais nova do que a obra fenomenal do poeta e dramaturgo inglês William Shakespeare (1564-1616): ele não seria o verdadeiro autor de suas peças e poemas, ou pelo menos de grande parte deles. Algumas lacunas historiográficas e sobretudo o fato de que o jovem Will nunca teve acesso a uma educação clássica de primeira linha, então ao alcance apenas da nobreza, são os principais argumentos invocados pelos céticos. Como diz o próprio Stephen Greenblatt na introdução do excelente Will in the world: how Shakespeare became Shakespeare, “(sua) obra é tão assombrosa, tão luminosa, que parece ter vindo de um deus e não de um mortal, muito menos um mortal de origem provinciana e educação modesta”. Convém deixar claro que o autor de “Como Shakespeare se tornou Shakespeare” (lançado aqui pela Companhia das Letras, com título que abre mão do trocadilho intraduzível entre Will e “vontade, determinação”) não duvida que Shakespeare tenha sido escrito por Shakespeare. Apenas se dedica a pesquisar, com uma mistura sedutora de informações históricas e insights, como isso foi possível. Se os céticos nunca foram capazes de provar sua tese, correndo o risco de se aproximar de descabelados teóricos…
O mundo é tão vasto, tão complicado, tão repleto de maravilhas e surpresas que a maioria das pessoas leva alguns anos para começar a perceber que é também irremediavelmente quebrado. A esse período de pesquisa chamamos “infância”. Segue-se um programa de investigação reiterada, quase sempre involuntária, sobre a natureza e os efeitos de mortalidade, entropia, coração partido, violência, fracasso, covardia, hipocrisia, crueldade e sofrimento, cujas histórias e amargas lições o pesquisador aprende de cor. Ao longo do caminho, ele ou ela vai descobrindo que o mundo está quebrado até onde alcança a memória de qualquer um, e luta para conciliar tal fato com a pontada de nostalgia cósmica que, de tempos em tempos, agita-se em seu coração: uma sugestão de glória extinta, de inteireza perdida, uma memória do mundo antes de se quebrar. Ao momento em que essa pontada se manifesta pela primeira vez chamamos “adolescência”. O sentimento assombra as pessoas pelo resto da vida. Todo mundo, cedo ou tarde, é submetido ao aprendizado da quebra. A questão passa a ser então: o que fazer com os pedaços? Há quem se abanque em sua pilha local de escombros e toque a vida assim mesmo, beduínos criando suas cabras à sombra…
A história do livro como tecnologia – o livro como uma tecnologia revolucionária, de ruptura – precisa ser contada honestamente, sem triunfalismo nem derrotismo, sem esperança nem desespero, como Isak Dinesen nos recomendava escrever. Um grande obstáculo à produção de um relato desse tipo, contudo, é a “heurística da disponibilidade”. Trata-se de um modelo de psicologia cognitiva proposto pela primeira vez em 1973 por Daniel Kahneman, ganhador do Nobel, e seu colega Amos Tversky, que descreve como os seres humanos tomam decisões baseadas em informações relativamente fáceis de lembrar. Como as coisas de que nos lembramos com facilidade são aquelas que ocorrem com frequência, tomar decisões baseadas em amostras que temos à mão parece fazer sentido. O sol nasce todo dia; inferimos daí que o sol nasce todo dia. Um peru é alimentado todo dia; inferimos daí que será alimentado todo dia – até que, de repente, não é. A heurística é ótima até deixar de ser. Lemos um grande número de notícias sobre gatos que pulam de árvores altas e sobrevivem, e desse modo acreditamos que os gatos devem ser resistentes a longas quedas. Notícias desse tipo predominam amplamente sobre aquelas em que um gato cai e morre, como…
Ouvir a voz de Leon Tolstoi, um dos maiores escritores do século XIX, é uma experiência quase fantasmagórica. É difícil espantar a ideia de que aquele som não vem do além, mas foi realmente articulado por um ser vivo e gravado por meios terrenos, prosaicos. O fato de que nessa rara gravação de 1909 – um ano antes de sua morte – o escritor não está falando russo, mas inglês, torna tudo ainda mais estranho. Numa cortesia do blog Brainpickings, o que se ouve aqui é o autor de “Guerra e paz” lendo um trecho da tradução inglesa de seu livro “Calendário da sabedoria”, um precursor da onda de auto-ajuda em que Tolstoi, preparando-se para o fim da vida, resumia o legado de suas inquietas investigações espirituais – em que se combinavam um cristianismo peculiar (e excomungado pela Igreja Ortodoxa), o pacifismo, a idealização da vida no campo e uma espécie de proto-ambientalismo. Mas o que vale mesmo, de toda a experiência, é ouvir aquela voz. Abaixo, uma tradução caseira do trecho: Que o propósito da vida é a busca da perfeição, a perfeição de todas as almas imortais, e que esse é o único propósito da minha vida, é…
Numa das cartas do recém-lançado Here and now – que traz a intensa correspondência trocada por J.M. Coetzee e Paul Auster entre 2008 e 2011 e que teve um excerto publicado no site da “New Yorker” – o escritor sul-africano explica por que discorda do amigo americano quando ele sustenta que a dimensão estética do esporte explica seu fascínio sobre o espectador. De forma nada surpreendente, Coetzee leva a conversa para o campo ético. Para mim, a discussão não poderia ser mais atual. Estes dias estou dando os retoques finais em meu novo romance (a ser lançado no segundo semestre pela Companhia das Letras), que tem a história do futebol brasileiro como pano de fundo e que se ocupa de questões tanto estéticas quanto éticas. É justamente o futebol brasileiro que contraria um dos elos da argumentação de Coetzee. O discurso missivístico do autor de “Desonra” vai reproduzido abaixo, em tradução caseira, para que o leitor julgue por si. Pareceu-me interessante e iluminador de aspectos certamente presentes na mágica esportiva, mas limitado também. “Que atleta gostaria de ser parabenizado por sua graciosidade em campo?”, pergunta Coetzee. “Até mulheres atletas o olhariam de cara feia. Graça, graciosidade: termos efeminados.” Vê-se que…
O chinês Mo Yan (foto), Nobel de literatura do ano passado, se defendeu em entrevista ao Der Spiegel – a meu ver, bem – das acusações generalizadas de ser um escritor governista. Em inglês (melhor do que alemão, certo?), aqui. Como noticiou ano passado o vizinho “Veja Meus Livros”, Mo Yan é considerado por alguns especialistas ocidentais em assuntos chineses uma espécie de “via do meio”. * Morrissey, em momento de rara infelicidade (que o Guardian criticou aqui), disse que não haveria guerra se todos os homens fossem gays, porque “gays não matam”. Alguém aí dê ao Moz um exemplar de “As benevolentes”, por misericórdia. * Estou bem curioso para ler essa biografia da talentosa e atormentada escritora mineira Maura Lopes Cançado, que teve uma vida triste. Ainda no forno, mas promete. * Deve ser, disparado, a pauta preferida do jornalismo inglês que trata de literatura: por que é tão difícil escrever cenas de sexo, blablablá. Durante algum tempo dei trela para o assunto aqui no blog, mas confesso que estou cansado. A obsessão com o sexo na literatura me parece cada vez mais um problema de quem vive uma escassez de sexo fora dela. Reconheço que Daniel Galera discorreu…
Depois da banda Pussy Riot, Vladimir Nabokov (foto) é a nova vítima da ruidosa onda de ultraconservadorismo – nacionalista, populista, autoritário, religioso, anti-ocidental – que varre a Rússia de seu xará Vladimir Putin. Michael Idov conta no blog de livros da “New Yorker” (aqui, em inglês) como uma adaptação teatral de “Lolita” que estreou no início do ano em São Petersburgo tem despertado em parte da população um furor censório que incluiu o espancamento do produtor, Anton Suslov, tachado de “pedófilo”. A notícia parece ainda mais preocupante quando se considera que, segundo informa Idov, a mesma peça entrou e saiu de cartaz na cidade várias vezes durante décadas, sem provocar a menor marola. Até a censura soviética a liberou. “Lolita” é só parte da campanha contra Nabokov. Os fogosos militantes reivindicam ainda o fechamento do museu dedicado ao escritor, também em São Petersburgo, e o banimento de todos os seus livros. Talvez não vençam todas essas batalhas. Infelizmente, com Putin, têm vencido a maioria. * Gostei desse breve “ensaio filosófico” de Saulo Dourado sobre o ótimo romance “Barba ensopada de sangue”, de Daniel Galera. É restaurador ver uma obra de literatura contemporânea ser abordada por um prisma não exclusivamente literário,…
De todos os itens do baú de David Foster Wallace que vêm surgindo, em número proporcional ao crescimento do culto ao escritor americano que se suicidou em 2008, um dos que considero mais interessantes é também um dos mais modestos: o programa de um curso de “análise literária” (na reprodução ao lado, a primeira página) que ele ministrou na universidade de Illinois em 1994. O programa é comentado (aqui, em inglês) pelo site Open Culture e está disponível na íntegra para consulta online (aqui), ao lado de outros documentos do professor DFW, graças a uma iniciativa da Universidade do Texas em Austin. O que mais chama a atenção no programa (conhecido em inglês pelo nome latino syllabus, como ocorre também em Portugal) é a lista de livros de ficção que DFW decidiu analisar com os alunos: de Mary Higgins Clark a Jackie Collins, de Stephen King a James Ellroy, de C.S. Lewis a Thomas Harris, todos os autores podem ser arquivados na mesma estante – uns em prateleiras mais elevadas, outros ao rés do chão – daquilo que a maior parte dos críticos universitários costuma chamar com desprezo de “literatura comercial”. Considerando-se que o próprio DFW favorecia em sua produção…
O segredo que Mark McGurl revela em ‘The Program Era: Postwar Fiction and the Rise of Creative Writing’ é o quanto a riqueza da cultura americana do pós-guerra (e aqui me atenho ao romance, por motivos que serão explicados) é produto de um sistema universitário e, o que é pior, do programa de escrita criativa como parte institucional e institucionalizada desse sistema. Não se trata apenas de uma questão de documentação e pesquisa histórica, abundantes no livro, mas de uma questão de vergonha: os escritores americanos modernos sempre gostaram de se imaginar livres do suplemento artificial à vida real que é a universidade e, sobretudo, dos cursos de escrita criativa. Quem sabe faz, quem não sabe ensina. Basta pensar no elogio que intelectuais europeus como Sartre e Simone de Beauvoir fizeram aos grandes escritores americanos que não deram aulas nem frequentaram a universidade, mas trabalharam como motoristas de caminhão, garçons, vigias, estivadores, enfim, em tudo menos como intelectuais, registrando “o fluxo constante de homens por todo o continente, o êxodo de toda uma cidade para os campos da Califórnia” – e por aí vai. Denso e recheado de provocações, o ensaio “O segredinho inconfessável da América”, do crítico marxista Fredric…
Essa apostasia se insinua no abismo largo que separa o fim de um romance do início do próximo. Não se trata de um bloqueio, não é uma longa noite, mas uma questão de profunda indiferença. A felicidade está em algum outro lugar. Passam-se os meses e lá vem uma virada, um realinhamento. Começa com um cutucão. Um detalhe, uma frase ou uma sentença pode dar início a esse retorno. Não precisa ser brilhante. Basta exalar um certo calor imaginativo. Em belo artigo no “Guardian” (em inglês, aqui), Ian McEwan fala sobre a crise de fé que costuma acometê-lo toda vez que termina um romance. Crise de fé na ficção, entenda-se. Por que perder tempo com narrativas inventadas se o mundo da ciência e da história está cheio de livros mais, digamos, relevantes para a compreensão do mundo em que vivemos? McEwan conta que a fé lhe volta sempre de forma meio fortuita, nunca a partir do plano geral de uma obra grandiosa e sim da leitura de uma frase solta, uma imagem bem sacada, um achado feliz – miudezas, os “divinos detalhes” de que falava Nabokov. * O desejo de escrever para o grande público está firmemente enraizado no peito…
Spine poetry, ou poesia de lombada, é a arte – pelo menos no sentido travesso da palavra – de empilhar livros de tal forma que os títulos formem um todo inteligível. Com sorte, um poema. Consta que a ideia surgiu em 1993, mas foi só no ano passado que a prática começou a virar febre no mundo anglófono – veja aqui e aqui. A foto aí em cima flagra minha primeira tentativa de dominar essa, digamos, nova linguagem literária. É recomendável clicar na imagem para ter melhor leitura. Mas cuidado, bibliófilos, a coisa vicia. Você nunca mais vai olhar para suas estantes do mesmo jeito. Para mim, o que mais chama a atenção na brincadeira é o fato de ser exclusiva do mundo físico. Olha aí, coveiros do livro de papel: quero ver fazer isso no Kindle!
Documentos policiais recém-desencavados provam algo que há muito se murmurava por aí: há em “A sangue frio”, clássico absoluto do jornalismo literário (ou do romance de não-ficção, como o autor o chamou) publicado em 1966 por Truman Capote (foto), imprecisões factuais que vão além dos pormenores irrelevantes que até hoje tinham sido apontados. O livro reconstitui o assassinato brutal, ocorrido sete anos antes, de uma família de fazendeiros do Kansas por dois ex-presidiários. Sabe-se desde o início quem cometeu os crimes e ainda que eles serão apanhados pela polícia, mas mesmo assim a arte de Capote agarra o leitor pelo colarinho até o ponto final. Quem não leu “A sangue frio” pode ter uma ideia do clima que cerca a história assistindo ao bom filme “Capote” (2005), de Bennett Miller, cujo trailer segue abaixo. O filme se interessa pelas circunstâncias da apuração jornalística conduzida por um intelectual citadino, sofisticado e homossexual (em interpretação memorável de Philip Seymor Hoffman), tão integrado à paisagem do interior do Kansas quanto um norueguês em Tóquio. httpv://www.youtube.com/watch?v=-rWX7AFoOyI Nem é preciso dizer que, para conhecer o romance, nada substitui sua leitura, que recomendo efusivamente. Trata-se de uma obra-prima. Há no mercado uma edição de 2003 da…
O sempre interessante blog Explore, editado por Maria Popova (do não menos interessante Brain Pickings), voltado para estímulos diversos à criatividade, trouxe outro dia uma lista que me deixou pensativo. Trata-se de uma relação de “últimas palavras” de romances famosos. Atenção, não estamos falando aqui de frases de encerramento, algo que certamente pode ser objeto de estudo de quem escreve – se não for instrutiva, a investigação será no mínimo divertida, na mesma linha da seção “Começos inesquecíveis”, que por muitos anos foi uma das atrações mais visitadas deste blog. Não: trata-se realmente da última palavra, no singular, de cada romance. Foram listados 55 títulos. Ali aprendemos que “Cem anos de solidão”, de Gabriel García Márquez, e “O morro dos ventos uivantes”, de Emily Brontë, terminam com o mesmo vocábulo: “terra”. Descobrimos também que “Madame Bovary”, de Gustave Flaubert, deixa cair o pano da narrativa sobre o termo “honra”, o que é sem dúvida curioso. Mas significará alguma coisa saber que “Alice no país das maravilhas”, de Lewis Carroll, se encerra com a palavra “dias”, enquanto “O som e a fúria”, de William Faulkner, prefere se despedir com “lugar”? A lista me pareceu não só uma inutilidade ululante, mas o…
É possível que a romancista e poeta Amanda McKittrick Ros (foto), uma professora nascida em 1860 na Irlanda do Norte, não tenha sido a pior escritora do mundo. Com certeza foi a escritora ruim que mais sucesso fez justamente pela ruindade de sua literatura. Esbarro em sua história fascinante no ebook Epic fail (Fracasso épico), de Mark O’Connell, que teve um trecho (em inglês) reproduzido há poucos dias na revista eletrônica Slate. O surrealismo involuntário da prosa absurdamente artificiosa de Ros já foi apontado por sua legião de admiradores-detratores – com hífen porque são as mesmas pessoas, a admiração sendo no caso uma forma de gozação. A novidade do enfoque de O’Connell é lançar a hipótese de que Ros também tenha inventado sem querer o pós-modernismo ou pelo menos um de seus traços mais marcantes, a elevação irônica da ruindade galopante a uma forma de arte. Não se trata de fenômeno isolado. Ros está para as letras como Ed Wood está para o cinema e Pedro Carolino, autor do hilariante “Novo guia da conversação em portuguez e inglez” (Casa da Palavra), para os estudos linguísticos. Mestre insuperável da purple prose, como os anglófonos chamam o estilo empolado típico da subliteratura,…
“A redoma de vidro” (The bell jar), o único romance da poeta americana Sylvia Plath, foi lançado sob o pseudônimo de Victoria Lucas em 1963, poucos dias antes de sua morte. Está completando meio século, portanto, e para comemorar a data o editor teve a ideia de relançá-lo embalado na inacreditável capa chick lit aí ao lado. Como se Sylvia Plath e Sophie Kinsella não fossem antípodas, mas irmãs literárias. Tempos realmente estranhos: um dia vamos rir disso tudo? * Em compensação, como os tempos estranhos são os mesmos em que a informação flui com liberdade inédita, o áudio do famoso discurso de paraninfo feito por David Foster Wallace em 2005, chamado “Isto é água” (e lançado recentemente no Brasil na coletânea de ensaios “Ficando longe do fato de já estar meio que longe de tudo”), pode ser ouvido na íntegra, em duas partes, aqui. * Para mim, a oficina foi essencial para, digamos, começar a escrever. Porque, na Oficina, uma das maiores revelações foi a de que o apelo sensorial é um dos maiores méritos que um texto pode ter. Dito assim – e de repente eu me leio –, parece uma platitude, uma banalidade, uma ociosidade. Mas, dentro…
Blurb não tem, que eu saiba, uma tradução concisa em português. É aquele texto curtinho elogioso ao autor, em geral composto de uma ou duas frases e às vezes de uma única palavra, que aparece na capa ou na contracapa de um livro. Usado com alguma parcimônia no Brasil, é praticamente obrigatório no mercado americano. Quase sempre é extraído de uma resenha publicada, mas também existem os de encomenda. Blurb que se preza traz uma assinatura prestigiosa de escritor ou crítico colada na traseira, embora o elogio também possa ser referendado só pelo nome da publicação nos casos – não muito raros – em que este dê mais peso à louvação que o do crítico meio obscuro. Como se vê, trata-se de um gênero que tem mais a ver com promoção e marketing do que com literatura ou crítica literária. O próprio nome é pejorativo desde a origem e consta que foi popularizado nos primeiros anos do século 20 por um humorista, Frank Gelett Burgess. Sua credibilidade é baixa por uma razão simples: é possível recortar um blurb bastante decente de praticamente qualquer resenha. Mesmo que seja negativa, e ressalvados casos extremos de demolição da obra, uma apreciação crítica séria…
Após duas semanas de férias em que não tive preocupação maior que a de renovar o protetor solar depois de cada mergulho na água morna de uma praia do Nordeste, dei um jeito de, em poucas horas, reabastecer até a boca o reservatório de ansiedade: caí de cara na edição 2013 da imperdível enquete (em inglês) que a mesa-redonda eletrônica Edge promove todo início de ano com nomes de destaque do universo científico, tecnológico, artístico, jornalístico e editorial. O tema desta vez parece ter sido talhado para me trazer de volta ao mundo interconectado e profundamente preocupado em que vivemos: “Com o que deveríamos estar preocupados?”. A lista de respostas possíveis para tal pergunta é bem longa, claro, mas isso não é problema para a Edge: mais de 150 intelectuais são convocados a dar sua opinião em ensaios mais ou menos sucintos. No mais curto deles, o cineasta Terry Gilliam gasta duas linhas para dizer que desistiu de se preocupar com qualquer coisa, mas a maioria leva a encomenda a sério e expõe suas angústias sobre o futuro da humanidade em meia dúzia de parágrafos densos. Há especulações preocupadas para todos os gostos. Do provável emburrecimento da espécie à opinião…