Este post, minha despedida do portal Veja, fica apenas como registro. O fim lá é um recomeço aqui, no velho Todoprosa de sempre. Seja bem-vindo(a)! A MULHER DE BOTERO João Pontes, o escritor, olhou um dia pela janela ao lado de sua mesa de trabalho, no nono andar de um edifício na Gávea, e viu na cobertura do outro lado da rua, bem à sua frente, entre vasos de planta, uma mulher de Botero. A visão o desagradou, como o desagradavam as mulheres de Botero. Mas logo João a decompôs numa ilusão de folhas amarelas e vasos escuros, tela nublada pela lâmina de vidro que tudo recobria, com seus reflexos e sombras. Terminou por achar graça: a assombração era um incrível trompe-l’oeil produzido pelo acaso. Concentrou-se então no trabalho por mais meia hora – escrevia seu quinto romance, uma ficção histórica sobre o bando de Lampião – e, mal deixou o olho escapar pela janela atrás de um nome próprio, a palavra cardo, o adjetivo ressequido, lá estava a mulher de Botero outra vez. Era uma visão súbita, perfeita, de uma nitidez que dava náusea. E de novo, o que era estranho, João a recebeu com a surpresa de um…
FINADOS (MANTRA DO ESCRITOR OBCECADO) Cervantes morreu em 22 de abril de 1616. Shakespeare o acompanhou um dia depois, 23 de abril de 1616. Sterne R.I.P. em 18 de março de 1768. No século seguinte, também em março, dia 22, do ano de 1832: Goethe. Flaubert tinha então dez anos, e 58 ao parar de envelhecer, em 8 de maio de 1880. Machado foi fazer companhia a Brás Cubas no dia 29 de setembro de 1908. Mais dois anos e Tolstoi perdeu a guerra, tomara que para encontrar a paz: 20 de novembro de 1910. Em 3 de junho de 1924 foi a vez de Kafka sair da vida, mas aquilo era vida? Joyce começava então a escrever o Finnegans Wake. Em 13 de janeiro de 1941, levou-o a peritonite. Rosa completou sua travessia de homem humano em 19 de novembro de 1967, três dias depois de virar imortal. Em 1977, Nabokov se foi em 2 de julho e Clarice em 9 de dezembro, no pós-parto de Macabéa, um dia antes de completar 57. Conclusão: escrever é tão perigoso quanto viver. E eu mesmo não estou me sentindo muito bem. * O AMOR LITERÁRIO É A RAIZ QUADRADA DO ÓDIO…
– A literatura brasileira contemporânea é uma imensa montanha de cocô. Não produz nada que chegue aos calcanhares da potência de Machado, Rosa ou Clarice. – Pra que ir tão longe? Vamos combinar que também não chega aos pés de Raduan ou do Rubem Fonseca dos bons tempos. – Exato. A literatura virou um espetáculo cheio de som e fúria, mas sem sentido. A tal vida literária tem mais importância do que a arte literária propriamente dita (e impropriamente exercida). Esse circo de festivais, feiras, prêmios, traduções, viagens, oficinas, blogs, networking e o diabo cria uma ilusão de movimento e um verniz de profissionalismo, entre aspas, que encobrem a irrelevância fundamental do ofício. – Eu diria mais: que mascaram um tédio de cemitério. Por que será assim? – Porque tudo já foi dito, ora. Como esperar algo revolucionário ou pelo menos renovador num cenário em que os escritores são robôs teleguiados pelo mercado, aprendem meia dúzia de truques, dominam uma técnica mas não comovem ninguém, não arriscam o pescoço, não incomodam, não acessam o novo? Não têm, em suma, nada a dizer? Não admira que o público ignore esses farsantes. – É o que eu sempre digo. A literatura brasileira…
– Nonada. Tiros que o senhor ouviu foram de briga de homem não, Deus esteja. Alvejei mira em árvores no quintal, no baixo do córrego. Por meu acerto. Todo dia isso faço, gosto; desde mal em minha mocidade. Mas só comecei a acertar mesmo quando troquei o velho trabuco por esta Taurus aqui, arma de grande maravilha. O senhor espie. Hem? Hem? * Até hoje permanece certa confusão em torno da morte de Quincas Berro Dágua. Dúvidas por explicar, detalhes absurdos, contradições no depoimento das testemunhas, lacunas diversas. Nada que a agência de detetives Labanca & Irmãos não resolva em uma semana, com resultados comprovados e sigilo garantido. * Quando Ismália enlouqueceu, Pôs-se na torre a sonhar… Viu uma lua no céu Viu outra lua no mar. O doutor que a atendeu Não tardou a receitar Óc’los da Ótica Fiel Pra vista dupla acabar. * Levantai-vos, heróis do Novo Mundo… Andrada! arranca este pendão dos ares! Colombo! que chás espetaculares! * Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria. Se os tivesse, não hesitaria em escolher o conforto e a segurança da Maternidade Nossa Senhora do Bom Parto, que tem convênio com todos os planos…
“Lá fora espocam foguetes que choram lágrimas incandescentes”, ele escreveu. “Mas não choram mais que Maria Flor.” Assim terminava a redação de 1975 que nunca lhe saiu da memória. Tinha treze anos e sua presunção, como toda presunção, era feita metade de coisas sabidas – lágrimas metafóricas! o verbo espocar! – e metade de coisas rotundamente ignoradas. O atraso cósmico, por exemplo. Transformar a tarefa escolar num esboço de conto regionalista dos anos 30 sobre um coitado, o marido de Maria Flor, que os capangas de um coronel provavelmente nordestino matavam por vagas disputas fundiárias em pleno curso dos festejos juninos era para sempre embaraçoso. Talvez desculpável também. Quem sabe nessa idade o que é clichê ou, mais difícil ainda, purple prose? A professora de português, que devia saber tudo isso, adorou. Leu a redação em voz alta para a turma e apressou a chegada do arrependimento que ia se agravar com os anos, a ponto de levá-lo a passar a vida inteira, livro após livro – não que tivesse consciência disso, era algo que percebia agora, no leito da UTI – renegando no tutano de cada frase que escrevia a própria possibilidade de foguetes derramarem lágrimas incandescentes e serem…
Recebi ontem, de um endereço comercial no Japão, este spam assombroso: Grandes meios, elementar ?? ??? bolsa desimpedido, sem muita modificação, feminilidade esplêndida flor, uma força aliada, é manifestar a propensão pessoal ??? ?? e bondade, ela pode imediatamente invertido o seu ???? ??? imagem. Modelagem atmosférica, queda de galante, este pep-se, não há pintura unblended, o simples primordial refere ainda, notar ser adepto de extraordinariamente todas as vezes para manter ? ???? volta ótimo! Porque você não discernir a próxima segunda-lhe propósito colisão em encontro com quem! Temperamento imperatriz, linda interpretação quixotesca do discreto auto-indulgência ???? ????? posição pessoa, elegância de design polido, para fazer uma fuga através das necessidades avançadas de em voga ?? ??? as mulheres. Todo mundo que tem uma vida online – ou seja, todo mundo – já terá esbarrado com casos semelhantes de algaravia produzida por tradutores automáticos sem noção (com perdão da redundância). No entanto, como tendemos, e não sem razão, a tratá-los como lixo, desconfio que não seja tão comum a epifania que experimentei quando, no início da manhã e ainda não completamente desperto, liguei o computador e fui atropelado. Será delírio meu, ou achados verbais como “queda de galante”, “interpretação quixotesca…
Primeiro era o prazer infantil de pôr uma palavra depois da outra, encaixes de dominó. Depois que os encaixes em si perderam a graça, fáceis demais, veio a ambição de usar as sequências de peças para desenhar coisas no chão: bichos, casas, cidades. Ainda era uma ambição infantil, mas já continha o germe da fase seguinte, quando os desenhos começaram a parecer bobos, constrangedores, esquemáticos em sua bidimensionalidade de criança. Do lado de fora do jogo ficava o mundo inteiro com seus bichos de verdade, casas de verdade, cidades de verdade. Para desenhar o mundo em sua profundidade enigmática era preciso criar novos encaixes, superpor as peças do dominó rumo a uma nova dimensão: aspirar ao teto. Isso abriu uma fase de dificuldades imensas, torres penosamente empilhadas desabando sob o peso daquela última peça chamada ponto final, e com ela a temporada da frustração permanente – o fracasso como modo de vida – que só não provocou o abandono do jogo porque descobria-se na própria persistência uma nova e perversa modalidade de prazer infantil. Muitos anos depois, quando as torres começaram a se sustentar em pé e o espaço entre o chão e o teto se encheu de formas belas…
Ia entrar na garagem de seu edifício quando um PM fortão de cabeça raspada fez sinal para que encostasse o carro. Obedeceu, claro. Baixou o vidro da janela. – Boa noite, cidadão. Seu farol está queimado. – É mesmo? – ele fingiu que não sabia, lendo a identificação do homem no bolso do uniforme: sargento Hudson. – Prometo consertar amanhã cedo, sargento. – Mas isso é uma infração, cidadão. Como é que fica? Claro, que coisa mais previsível: o cara queria levar uma grana. Mas não ia levar. Ele não compactuava com corrupção. – Bom, se tiver que me multar… – O que é isso, cidadão, não tem escopo nem determinismo. O senhor é revisor, positivo? O primeiro efeito daquelas palavras foi deixá-lo confuso, depois com medo. Como o sargento Hudson sabia que ele era revisor? Será que os medíocres livros de auto-ajuda e elevação espiritual que garantiam seu sustento, e com os quais se relacionava com envergonhada discrição, tinham deixado alguma marca traiçoeira em sua testa? Confirmou: – Como sabe disso, sargento? O homem riu. – Não precisa se assustar, cidadão. Não vamos causar malefício a si. Provemos a segurança aqui da área, conhecemos todo mundo. Gostaríamos de fazer…
A dar fé ao viajante inglês William Boyd Sennett, que em 1819 teria tido diante dos olhos as memórias posteriormente perdidas do então recém-falecido bispo Antônio Simão das Neves (e não vejo por que não lhe dar mais fé do que à arenga anticlericalista e factualmente vaga que no fim daquele século publicaria em São Paulo o anarquista Vicenzo Cucco, outra fonte habitualmente consultada pelos estudiosos da história de Simão), a dar fé a Sennet, como eu ia dizendo, no rigoroso inverno mineiro de 1777 o então jovem padre baiano viu-se com a alma “toda em farrapos”, numa crise de fé que teria como fulcro o amor (se platônico ou carnal, nunca se pôde comprovar) por dona Maricota, esposa de um comerciante de pedras preciosas de Vila Rica chamado Olegário, o que bem poderia configurar incidente banal ou ao menos não muito destoante das provações sensuais enfrentadas por tantos homens de batina ao longo dos séculos, porém (ai, porém), naquele instante demoníaco o futuro bispo se pôs a febrilmente deitar palavras ao papel em surto logorreico de todo semelhante a um transe de possessão, ao qual não faltavam olhos revirados, gemidos de dor excruciante e uma espuminha a borbulhar nas…
Cervantes morreu em 22 de abril de 1616. Shakespeare o acompanhou um dia depois, 23 de abril de 1616. Sterne R.I.P. em 18 de março de 1768. No século seguinte, também em março, dia 22, do ano de 1832: Goethe. Flaubert tinha então dez anos, e 58 ao parar de envelhecer, em 8 de maio de 1880. Machado foi fazer companhia a Brás Cubas no dia 29 de setembro de 1908. Mais dois anos e Tolstoi perdeu a guerra, tomara que para encontrar a paz: 20 de novembro de 1910. Em 3 de junho de 1924 foi a vez de Kafka sair da vida, mas aquilo era vida? Joyce começava então a escrever o Finnegans Wake. Em 13 de janeiro de 1941, levou-o a peritonite. Rosa completou sua travessia de homem humano em 19 de novembro de 1967, três dias depois de virar imortal. Em 1977, Nabokov se foi em 2 de julho e Clarice em 9 de dezembro, no pós-parto de Macabéa, um dia antes de completar 57. Conclusão: escrever é tão perigoso quanto viver. E eu mesmo não estou me sentindo muito bem.
Eu me descobri envolvido em algo que se pode chamar de evento histórico mundial. Pode-se dizer que foi um grande evento político e intelectual do nosso tempo, até mesmo um evento moral. Não a fatwa, mas a batalha contra o Islã radical, da qual essa foi apenas uma refrega. Têm sido levantados certos argumentos, até por pessoas de orientação liberal, que me parecem muito perigosos. Argumentos que são basicamente de relativismo cultural: nós temos que deixá-los fazer isso porque é a cultura deles. Minha visão é: não. Circuncisão de mulheres – isso é uma coisa ruim. Matar pessoas porque você não gosta das ideias delas – isso é uma coisa ruim. Nós temos que ser capazes de ter um sentido de certo e errado que não se dilua nesse tipo de argumento relativista. Se não tivermos, teremos deixado de viver num universo moral. Em entrevista ao “New York Times”, concedida no mês passado mas publicada ontem, Salman Rushdie tocou com lucidez nos pontos que tornam “Joseph Anton” (Companhia das Letras, tradução de José Rubens Siqueira e Donaldson M. Garschagen, 616 páginas, R$ 54,50) – seu livro de memórias sobre a década que passou escondido sob o codinome inspirado em Joseph…
Esta é a segunda e última parte da entrevista que fiz com o ex-escritor Silvério Sombra, que há sete anos abandonou as lides literárias para criar galinhas num pequeno sítio chamado Itaguaí. A primeira parte pode ser lida aqui. A mulher feia que a juventude embeleza é uma metáfora da sua própria obra? Ou da literatura em geral? – (risos) É a metáfora de uma metáfora. Uma metáfora para acabar com todas as metáforas. Tudo é metáfora nesse negócio, vê só que porcaria. Demorei a entender o que estava errado. Que tinha alguma coisa errada, tinha. Aquela não era a minha turma. Entrei nesse negócio perseguindo uma miragem, como imagino que todo mundo entre. Um dia lá, perdido na infância, um Robinson Crusoé qualquer, uma Emília, um Zezé do Pé de Laranja Lima puxa um neurônio pra cá, outro pra lá, uma sinapse nova faz zapapof e aí já viu, está feito o estrago. O coitado vai passar o resto dos seus dias perseguindo uma coisa que não sabe direito o que é, querendo fazer parte daquilo. Nesse caminho ele muda de gosto, renega o passado, refina, escolhe a dedo uma meia dúzia de desafetos, quase sempre fica bastante besta,…
Encontrei o ex-escritor Silvério Sombra em seu sítio, que ele batizou de Itaguaí por motivos que veremos adiante, embora não se situe na cidade fluminense. O sigilo sobre a localização da pequena propriedade rural de Sombra é apenas uma das cláusulas restritivas que ele impôs como condição para conceder sua primeira entrevista desde que, há sete anos, abandonou tanto os círculos literários em que tinha atuação frenética quanto a própria literatura, recusando-se a acrescentar – conforme suas últimas palavras públicas – “uma linha que seja a uma obra que espero ver esquecida para sempre”. A obra de Sombra, composta de dois romances e dois livros de contos, foi esquecida sem demora, como ele desejava. Seu nome, porém, tem teimado em pairar como um fantasma sobre as conversas literárias nacionais, sobretudo depois que alguém cunhou para ele o epíteto maldoso de “Raduan sem Lavoura”, que pegou. O nervosismo com o imperativo jornalístico de lhe perguntar em algum momento da entrevista o que achava desse apelido me atazanou a viagem até o sítio. Contudo, assim que saltei do jipe um homem de meia-idade descalço e maltrapilho, saco de milho na mão, cercado de galinhas, acabou com o problema. “Aqui não tem lavoura…
O narrador do romance sou eu. Meu nome será omitido, mas não minha profissão, esta sim importante: sou psicanalista praticante, de consultório na praça há mais de vinte anos. Bem de vida, sim, mas não propriamente rico como alguns colegas. Fui mais escrupuloso, quem sabe; menos esperto sem dúvida. Construí uma carreira sólida e plana, mantive-me ao largo da politicagem da profissão, do assédio da imprensa, das tentações da glória acadêmica. Era um analista na linha de frente, só isso. Infantaria, tudo o que eu desejava. Como outros são ortopedistas, cirurgiões, otorrinos, eu praticava a psicanálise. Meus pacientes me pagavam por isso. E o que seria isso, exatamente? Ouvir, claro. Os pacientes contavam suas histórias. Eu ouvia. Compreendo que para o leitor isso seja, ao primeiro contato, meio desconcertante. Parece claro que o analista não pode ser outro senão, justamente, o leitor – confere? O escritor é o paciente, o analisando. Conta sua história, tece sua teia. O analista é o leitor, vítima e algoz, enredado e crítico ao mesmo tempo. Caberá a ele encaminhar a resenha, comprar ou não o livro, dá-lo de presente aos melhores amigos, esquecê-lo num canto inacessível da estante ou, pior, vendê-lo a peso a…
– Imagine o futebol sem meritocracia. Imaginou? – Não sei se estou entendendo. – Um futebol sem meritocracia, ora. Sem hierarquia, sem mecanismos de aferição de valor. Imagine um ambiente em que não só o craque desapareceu como a própria ideia de que certos jogadores possam ser considerados craques é revoltante para a sensibilidade democrática de todos. Craque para quem, na opinião de quem? Com que autoridade divina alguém decreta que um jogador é craque e outro não? – Mas isso não é evidente? Qualquer torcedor na arquibancada percebe a diferença na primeira matada de bola, no primeiro passe. – Será evidente mesmo? Ou será que estamos falando de um olhar condicionado, adestrado pelos poderosos, construído por gerações de cronistas esportivos preconceituosos para cobrir de privilégios seus eleitos, seus amiguinhos? – Você está brincando, né? – De jeito nenhum. No futebol sem meritocracia, a violência e a arbitrariedade de todo treinador ficam grotescamente expostas. De onde ele pensa que tirou autoridade para decidir quem entra em campo, quem fica no banco, quem estará na próxima lista de dispensa? – Do presidente do clube? – Do presidente, claro, como personagem contingente, mas através do presidente fala uma força historicamente constituída chamada…
Quando conheci Maria Alice, era o auge da guerra poético-universitária dos anos 90, o que queria dizer que éramos todos grandes escritores, jovens o bastante para isso. Eu andava fascinado por e.e. cummings e escrevia coisas assim: cooktop scoop ;stop entope poo pi(l)l : há lá pupila pop Era absolutamente imperdoável, mas Maria Alice lia tudo com suas sobrancelhas grossas, seu silêncio enigmático, e depois se entregava na cama com tal desespero que eu me sentia aprovado de forma plena como poeta, como homem e como semideus, o que naquele tempo dava no mesmo. Foi Maria Alice quem me ensinou a catalogar aliados e desafetos com as letras A e D seguidas de um número, de forma que o primeiro professor que me elogiou em público fosse, por exemplo, A1, e o último poeta rival a me desancar para terceiros no botequim, D59. Foi também Maria Alice quem me sugeriu um aprimoramento no sistema, a fim de dar conta das migrações de um campo ao outro. Estas foram ficando mais frequentes à medida que a guerra poético-universitária dos anos 90 amadurecia: o professor A1 virava, por exemplo, D60(A1), o código alfanumérico entre parênteses indicando sua função passada, e se por…
No distante julho de 2007, impressionado com a capacidade que tinham os “debates críticos” sobre a literatura brasileira dos últimos 20 anos de descambar para lugar nenhum, publiquei aqui um Sobrescrito em forma de enquete chamado O problema é ‘o problema’, mais tarde compilado no livro “Sobrescritos” (Arquipélago Editorial, 2010). As respostas foram desenhadas de acordo com as metodologias mais avançadas de prospecção sociocultural da Universidade de Itaguaí, a fim de cientificamente dar conta de todos os vetores relevantes da nossa “cena”. O único problema com aquele experimento pioneiro é que a enquete era falsa, um mero simulacro literário de enquete: o internauta não votava. Será por isso que, cinco anos depois, ainda estamos mais ou menos no mesmo lugar? Por via das dúvidas decidi republicar a enquete, mas desta vez é diferente: ficamos interativos, docemente interativos. Vote, caro leitor, e ajude a descascar esse pepino. . [poll id=”61″]