Não, Roth não abandonou sua arte, não enterrou sua varinha como Próspero. Foi a arte que lavou suas mãos diante desse escritor irremediavelmente trivial e constrangedor. Tomando de empréstimo o título do primeiro livro Roth, a coletânea de contos ‘Adeus, Columbus’: Adeus, Philip! E, olhe, a porta da rua é a serventia da casa.
O artigo publicado pelo crítico americano Lee Siegel no “Estadão” de domingo, chamando de “absurdo sem tamanho” a comoção em torno da aposentadoria de Philip Roth, afoga um ou dois argumentos interessantes num caldeirão tão cheio de ódio e amargura que a coisa acaba por entornar inteira em seu colo. Siegel, vale lembrar, é um notório defensor da tese de que o romance está morto. Descobrir que o público ainda se importa tanto com o que um romancista faz ou deixa de fazer deve ser mesmo muito frustrante.
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Ano passado, poucos dias depois de se tornar o maior fenômeno de popularidade instantânea da história da Flip, o escritor português Valter Hugo Mãe me disse, numa longa conversa que se transformou nesta reportagem: “Muitas coisas na vida são momentos. Eu não me admirava nada de vir aqui no próximo ano e saber que ninguém mais se lembra de mim”. Não foi o caso, como prova o prêmio Portugal Telecom que ganhou por “a máquina de fazer espanhóis” (Cosac Naify).
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Este post (em inglês) do Writer’s Digest ensina como não fazer o pitch de uma história ficcional, isto é, aquela apresentação mais-que-sucinta da trama, geralmente destinada a vender a ideia a quem possa bancá-la. O exemplo negativo que pega é o “sumário oficial da trama” do novo filme do “Homem de Ferro”. Coisa realmente pavorosa, vaga e cheia de clichês. Só faltou ao post uma ressalva importante: “Eis como não fazer um pitch, a menos que você trabalhe para uma indústria apaixonada por clichês, como Hollywood”.
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Com tradução cuidadosa e introdução informativa (de Julia Powers e Livia Drummond), além de lindas ilustrações, saiu um bom pedaço dos escandalosos “Contos d’escárnio/Textos grotescos” de Hilda Hilst em inglês, na elegante revista eletrônica Triple Canopy (via Twitter de @BenjaminFMoser). Muito bacana. Ou “f…”, como diria Caetano.
4 Comentários
O artigo de Lee Siegel é muito menos bilioso do que muitas resenhas culturais publicadas na VEJA. Ele inclusive elogiou Roth, dizendo-o bom estilista.
Concordo em linhas gerais com Siegel. Acho Roth superestimado.
É difícil entender porque a crítica prestigia tanto determinados escritores americanos, como Roth ou os chatos John Updike e Anne Tyler (do enfadonho e sem graça ‘O Turista Acidental’) que nem tem tanto a dizer, e subestima autores talentosos, como Kurt Vonnegut, dos excelentes “Cama-de-Gato”, “Mother Night” e “Matadouro 5”
Li apenas dois livros do Roth, dois quais “Homem Comum” achei muito bom. Em relação ao post do Pedro, até gostei muito de alguns livros de Anne Tyler, como “O Jogo da Vida” e “Quase Santo”. Reconheço que não apreciei tanto assim alguns outros, mas não considerei nenhum exatamente ruim – se bem que não li “O Turista Acidental”. Para não sair da literatura americana, contudo, há outros autores que a meu ver caíram muito, sendo Paul Auster o exemplo mais destacado. Mas há alguns excelentes, como Cormac McCarthy, Jennifer Egan com seu “A Visita Cruel do Tempo” e Lionel Shriver, entre outros.
O turista acidental chato? Minha nossa. O luto por um filho assassinado em geral dá livros que deviam vir com um lenço de brinde. Tyler jamais se entrega pro sentimentalismo. As armas dela não são nada fáceis de usar: astúcia, humor, simplicidade. Tem mais: Tyler é especialista em nossas maluquices mais tristes e hilariantes. Que fiquem ensebando com o Franzen e outros da mesma laia, autores que precisam de 600 páginas pra dizer o que era demais em 150, sim é injusto. Quanto ao Kurt, só alguns acadêmicos não sabem o que ele vale.
Philip Roth? Ah, conheço,sim. Lee Siegel?…ahn, desculpe-me, mas nunca ouvi falar.