– Ele está fotografando há três anos, dá só uma olhada no trabalho – disse Maurice. – Aqui, esse cara. Repara na pose, na expressão. Quem ele te lembra?
– Parece um pilantra – disse a mulher.
– Ele é um pilantra, o cara é um cafetão. Mas não é disso que eu estou falando. Aqui, essa. Dançarina de cabaré nos bastidores. Te lembra alguém?
– A garota?
– Dá um tempo, Evelyn: a foto. A sensação que o cara captura. A garota tentando parecer adorável, exibindo a mercadoria, que aliás não é nada má. Mas repara no camarim, nas tralhas brilhosas todas, essa pobreza de papel laminado.
– Você quer que eu diga Diane Arbus?
– Eu quero que você diga Diane Arbus, isso seria bem legal. Eu quero que você diga Duane Michaels, Danny Lyon. Eu quero que você diga Winogrand, Lee Friedlander. Quer voltar alguns anos no tempo? Eu gostaria muito que você dissesse Walker Evans também.
– Seu velho chapa.
– Muito, muito tempo atrás. Antes até do seu tempo.
Não sei por que o diálogo que abre “LaBrava”, de Elmore Leonard, que li há uns vinte anos, nunca me saiu da cabeça – nem todo começo inesquecível se deixa desvendar tão facilmente. Introdução indireta do personagem principal, o fotógrafo Joe LaBrava, trata-se sem dúvida de um início mais frio que o da maior parte dos livros do autor, de quem sou fã de carteirinha. O que é, então? O timing perfeito da conversa? A forma como ela nos leva a ver nitidamente as fotos, mesmo sem descrevê-las? Ou apenas o fato de que a história que vem em seguida é espetacular? (O site da Câmara Brasileira do Livro informa que existe uma edição brasileira, com o título “Joe LaBrava”, pela Record, mas a tradução acima é minha.)
Publicado em 29/2/2008.
11 Comentários
REALMENTE O MUNDO É PEQUENO! Eu também Sergio sempre fiquei com essa frase na cabeça e anotei em 2000 no meu livro O PROCESSO de KAFKA.
“a foto. A sensação que o cara captura. A garota tentando parecer adorável, exibindo a mercadoria, que aliás não é nada má. Mas repara no camarim, nas tralhas brilhosas todas, essa pobreza de papel laminado.”
É SIMPLESMENTE DESLUMBRANTE!!!!!!!!!!!!
OBRIGADA. Fiquei profundamente emocionada.
Olá Sergio Rodrigues. Sou coordenador da Biblioteca Comunitária Muniz, Manoel e Joana, que já possui mais de 50 mil obras e colaborador para a formação de uma outra biblioteca, esta, exclusiva dos esportes, com apenas 56 obras. O Centro Esportivo Miécimo a Silva nos cedeu espço para abrigar as 2 bibliotecas, incluindo sala para palestras, com 140 cadeiras, sistemas de som, video e quadro. Você pode nos ajudar doando obras para nossas bibliotecas. Nos parece que a exclusiva dos esportes será a 1ª do Brasil e sera ótimo se ela pudesse se constituir numa referência para todos nós. Contatos. Gilberto J. Muniz. (21) 3394.6618 e (21) 9285.5704 e, CEMS. Secretaria (21) 3316.1991 – Assessoria.(21) 3316.3984, e-mail patriciassouza@ibest.com.br
Muito obrigado
um começo inesquecível é a descrição da feira em paris em 1800 e qualquer coisa no livro “O PERFUME” patrick suskind….
dava pra sentir o cheiro……
Olá Sérgio Rodrigues. Sou coordenador, supervisor, diretor, bibliotecário, faxineiro e recepcionista da Biblioteca Particular Saint-Clair Stockler (além de animador cultural). A referida biblioteca já possui 5000 livros e está em constante formação. Também estou montando uma outra biblioteca – de literatura gay – mas esta possui apenas 24 obras, nenhuma brasileira (porque sabemos que no Brasil não existe literatura gay, certo?). Você pode nos ajudar, doando obras para as nossas bibliotecas (no caso, para uma delas: a maior, já que você não é um autor gay). Você pode começar nos enviando um exemplar de As sementes de Flowerville e outro de Elza, a garota. Não há necessidade de nos enviar um exemplar de O homem que matou o escritor pois já possuímos catalogado um exemplar desse excelente livros de contos.
Lembre-se: “O Senhor ama o dador animado!” (está escrito na Bíblica, em algum lugar, esta frase edificante)
P.s.: Desculpe-nos os erros de digitação acima. Não sou digitador.
“Quando certa manhã Gregor Samsa acordou de sonhos intranquilos, encontrou-se em sua cama metamorfoseado num inseto monstruoso”
A abertura de A Metamorfose,ficou cravada na minha memória de maneira indelevel.
Kafka ja nos faz ficar presos a leitura desde sua 1ª frase.
Fulminante”
PELO COMECO O LIVRO E BOM PARA SER UM BOM LIVRO TEM QUE DER UM BOM COMECO COM OS DE CIMA VOCE ESTA DE PARABENS
Pontuação. Acentos. Maiúsculas e minúsculas.
Sempre acreditei que esses quatro elementos são indispensáveis para a existência mesma da Civilização.
A nossa, ao que parece, naufraga.
Rafael: Eu me imaginei em mais uma reforma ortografica sem tudo isso. Assustador.
É muito pior que o pesadelo do metamorfoseado acima…
Pontuação é para os fracos…
Realmente, belo começo, não conhecia ainda.
Os começos inesquecíveis são uma de minhas predileções no Todoprosa. Sempre se descobre um monte de coisas boas.
Sérgio, sinto falta do “Primeira mão”. Peguei umas ótimas dicas nessa época.
Há chances de voltar?