E já que falamos no homem… Post publicado em 23/9/2006:
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Quando Gregor Samsa despertou, certa manhã, de um sonho agitado, viu que se transformara, em sua cama, numa espécie monstruosa de inseto.
Eis o primeiro parágrafo de “A metamorfose” (Civilização Brasileira, tradução de Brenno Silveira, 5.a edição, 1988), do escritor tcheco Franz Kafka (1883-1924). Sem comentários.
10 Comentários
Se me permite, aqui vai uma tradução que julgo mais interessante:
“Quando certa manhã Gregor Samsa acordou de sonhos intranqüilos, encontrou-se em sua cama metamorfoseado num inseto monstruoso.”
(Companhia das Letras, tradução de Modesto Carone, 2a. edição, 1997, 15a. reimpressão)
Acho estranho que sempre traduzam o título – Die Verwandlung – como “metamorfose”, mas na primeira frase quase todos traduzam o verbo “verwandeln” como transformar-se.
Outra coisa interessante na tradução do Carone é a preservação da idéia de “encontrar-se a si” em sua cama metamorfoseado como se “tivesse vindo” de sonhos INtranqüilos (tradução bem melhor de UNruhigen do que “agitado”) Aliás, os sonhoS foram escritos por Kafka no plural.
Segue o original para cotejar:
Als Gregor Samsa eines Morgens aus unruhigen Träumen erwachte, fand er sich in seinem Bett zu einem ungeheueren Ungeziefer verwandelt.
E há, claro, os efeitos que nenhuma tradução é capaz de verter, como a seqüência UNruhigen, UNgeheueren, UNgeziefer, uma escolha de palavras que certamente não foi casual.
Pra mim não há melhor tradutor da obra do Kafka pro brasileiro que o Modesto Carone.
É incrível como uma história cujo começo parece a introdução de uma redação de criança de 10 anos ganha, nos parágrafos seguintes, e quase imediatamente, a marca evidente de uma obra-prima. Hehehe, e o cara
mandei a mensagem antes do fim (estúpido!)
e o cara ainda era chegado num XXX, como bem evidenciado por nosso anfitrião. Que figura!
Abs.
Sem comentários mesmo. Um começo inesquecível, uma história inesquecível… E concordo com o Fabio, essa tradução do Modesto nas eições da Cia das Letras soa bem melhor.
Ninguém vira adjetivo à toa. O Kafka é o cara.
Paulo,
“… começo parece a introdução de uma redação de criança de 10 anos ganha,…”
Uau, onde há crianças de 10 anos escrevendo assim?
Cezar Santos, tá bom, uma criança de 10 anos quase poderia escrever essa introdução. E é isso o intrigante. Não há nada de literariamente excepcional na introdução em si; ela só mostra a que veio quando a obra começa a se distanciar, logo em seguida, de um devaneio infantil para se assemelhar, mais e mais, a um pesadelo fantástico.
Aliás, acho que quase sempre é assim. Não lembramos de começos inesquecíveis em obras medíocres – e, por deus, deve haver alguns. Lembramos, sim, dos começos que introduziram obras inesquecíveis.
Abs!
Ok, Outro Paulo…
Quase…aceito suas excusas…quase diz tudo.