Eis um belo exemplo de como (não) começar um livro. Publicado em 20/6/2006:
Antes de iniciar este livro, imaginei construí-lo pela divisão do trabalho.
Dirigi-me a alguns amigos, e quase todos consentiram de boa vontade em contribuir para o desenvolvimento das letras nacionais. Padre Silvestre ficaria com a parte moral e as citações latinas; João Nogueira aceitou a pontuação, a ortografia e a sintaxe; prometi ao Arquimedes a composição tipográfica; para a composição literária convidei Lúcio Gomes de Azevedo Gondim, redator e diretor do Cruzeiro. Eu traçaria o plano, introduziria na história rudimentos de agricultura e pecuária, faria as despesas e poria o meu nome na capa.
“São Bernardo” (1934), de Graciliano Ramos (39a edição, Record, 1983).
4 Comentários
Sérgio,
Esse início do velho Graça é a coisa mais antiliterária que se pode conceber, no entanto, que livraço, que texto…
Taí mais uma prova de que “receitas” no fazer literário não funcionam. Quantas manuais dizem que um texto “tem de” começar assim ou assado, sob pena de não atrair a atenção do leitor, etc. e tal.
O gênio suplanta as receitas…
Pouca gente escreveu um primeiro parágrafo como este. Ninguem anunciou tão claramente e com tamanha habilidade: vamos falar sobre a luta de classes.
Olha , Sérgio, com essa entrada, na boca do Paulo Honório, Graciliano já dá sinais do que chamanos autor fantasma. Se não, da pós-moderna literatura, da escrita feita com mais de uma mão.
Abraço
Esse começo é muito bom.