No dia em que o matariam, Santiago Nasar levantou-se às 5h30m da manhã para esperar o navio em que chegava o bispo. Tinha sonhado que atravessava um bosque de grandes figueiras onde caía uma chuva branda, e por um instante foi feliz no sonho, mas ao acordar sentiu-se completamente salpicado de cagada de pássaros. “Sempre sonhava com árvores”, disse-me sua mãe 27 anos depois, evocando os pormenores daquela segunda-feira ingrata.
A seção Começos inesquecíveis estava de férias desde outubro do ano passado, quando seu primeiro ciclo foi fechado com a eleição, pelos leitores do blog, da abertura de “Ana Karenina”, de Leon Tolstoi, como o mais memorável entre os começos memoráveis da literatura. Um dos concorrentes de Tolstoi na ocasião foi, é claro, Gabriel García Márquez com a primeira frase de “Cem anos de solidão”. Considerado por muitos vítima de uma injustiça, faz sentido que o colombiano ganhe agora mais uma chance de entrar no jogo, na segunda edição da enquete que o futuro nos reserva, e o privilégio de inaugurar a nova temporada de aberturas literárias brilhantes do Todoprosa.
O começo de “Crônica de uma morte anunciada” (Record, tradução de Remy Gorga, filho) pode não ser tão sensacional quanto o de “Cem anos…”, mas chega perto. O truque de embaralhar os tempos narrativos para abanar na frente do leitor uma cenoura que ele dificilmente deixará de perseguir é o mesmo. Para quem não leu, fica a recomendação: lançado em 1981, este “Crônica…”, com sua prosa sóbria, pode surpreender os fãs do estilo barroco empregado pelo autor ao narrar a história de Macondo, mas também é um livraço.
10 Comentários
Olá Sérgio, adorei o retorno da série “começos inesquecíveis”, saibas que li Lolita por causa da publicação daquele início espetacular, devorei cada palavrinha daquela obra inesquecível.
Grande retorno!
Bom retorno! Mas, pra mim, começo de livro continua sendo o do Dom Quixote.
Vim anunciar que para mim é Fim esquecível. Os rafaéis & companhia tem razão. Cada um no seu cada um. Quero agradecer as oportunidades e desejar bons começos.
A todos. Agora vou “dom quixotar ” até que perceba se é mais um fim ou mesmo novos começos.
Um abraço e desculpa ter atrapalhado, pois não foi essa minha intenção. Tudo o que faço faço com intensidade, verdade e sem medo de ser infeliz.
Rosângela
É uma pena Rosângela se você não postar mais teus comentários!
A diversidade de opiniões é sempre enriquecedora.
Você fará falta, mesmo que, por vezes, não concorde com tuas opiniões eu defendo teu direito de tê-las.
Um mundo feito somente de rafaéis & companhia pede pelo Armagedom ou é parte do próprio.
Respeitemos as opiniões deles. Talvez seja o único modo como conseguem se espressar ainda.
Não ligue ainda vão crescer e amadurecer e talvez um dia respeitem a opinião alheia.
Abraços
Interessante, muito. As primeiras palavras é a que prende o leitor. Há pouco tempo li um livro, (“O Rei de Girgentti”, de Andrea Camilleri, que me pescou pas palavras iniciais. Por causa delas li o livro quase de um só folego.
É claro que cai de paraquedas neste blog, mas se ninguém se incomodar, de vez em quando apareço e vou dar minha colaboração. Um abraço.
Há também uma película muito boa baseada nesse livro.
Um começo inesquecível e instigante é o do METAMORFOSE de Kafka!
Hahahaha, eu com sono, achando que você estava fazendo uma paródia do começo de “Cem anos”… (o dia da morte, espera, lembrança) – e o pior é que EU LI “Crônica de uma morte anunciada”! Adorei a volta dos Começos inesquecíveis. Bjs
Não podemos nos esquecer dos inícios sempre magistrais do nosso Luís Ferrnando Veríssimo, como este, de “Os espiões”:
“Formei-me em letras e na bebida eu tento esquecer…”