Não se sabe se Kublai Khan acredita em tudo o que diz Marco Polo quando este lhe descreve as cidades visitadas em suas missões diplomáticas, mas o imperador dos tártaros certamente continua a ouvir o jovem veneziano com maior curiosidade e atenção do que a qualquer outro de seus enviados ou exploradores.
A primeira frase de “As cidades invisíveis”, obra-prima lançada em 1972 por Italo Calvino (Companhia das Letras, tradução de Diogo Mainardi, 1990), pode não parecer, em si, inesquecível. É preciso ler esse espantoso conjunto de relatos de viagem por cidades imaginárias para descobrir que é, sim.
30 Comentários
Cidades Invisíveis e Cosmicômicas são inesquecíveis. Lembro deles como algo muito divertido, que me deu muito prazer em ler. Uma coisa quase infantil.
E a Companhia das Letras acabou de lançar Todas as Cosmicômicas, com o livro de narrativas já conhecidas no Brasil e a continuação T=0.
Uma vez o Mainardi disse: “não tenho qualquer compromisso com construir, só com destruir.” Será que ele estava falando dessa tradução lixorenta do livro do Calvino?
Não sei quanto às outras pessoas, mas para idiotas como eu que estudam, estudaram, ou vão estudar Direito mas preferem Letras, o parágrafo inicial do Detetives Selvagens é irresistível.
“No sé muy bem em que consiste el realismo visceral. Tengo diecisiete años, me llamo Juan Garcia Medero, estoy em el primer semestre de la carrera de Derecho, Yo no quería estudiar Derecho sino Letras, pero mi tío insistió y al final acabé transigiendo. Soy huérfano. Seré Abogado Eso le dije a mi tío y a mi tía y luego me encerré en mi habitación y lloré toda la noche. O al menos una buena parte. Después, con aparente resignación , entré en la gloriosa Facultad de Derecho, pero al cabo de un mes me inscribí en el taller de poesía de Julio César Álamo, en la Facultad de Filosofía y Letras, y de esa manera conocí a los real visceralistas o viscerrealistas?”
Fiz doutorado sobre a obra de Italo Calvino, que agora está sendo publicada pela Ed. UnB – Pequena Cosmovisão do Homem, e nas minhas pesquisas constatei realmente que o pior de Cidades Invisíveis é a tradução do Mainardi. Quando entrevistei Esther Calvino, esposa de Italo, ela confirmou isso. O homem simplesmente traduziu símbolo por signo. Assim, As cidades e os símbolos apareceu como as cidades e os signos, entre outras besteiras mainardianas…
Gustavo, não sei italiano para me aprofundar no assunto, nem me sinto muito confortável (confesso) defendendo o Sr. Mainardi, mas signo e símbolo são sinônimos. Que outras besteiras podem ser citadas?
“Marco Polo descreve uma ponte, pedra por pedra.
– Mas qual é a pedra que sustenta a ponte?, pergunta Kublai Khan.
-A ponte não é sustentada por esta ou aquela pedra, responde Marco, mas pela curva do arco que estas formam.
Kublai Khan permanece em silêncio, refletindo. Depois acrescenta:
– Por que falar das pedras? Só o arco me interessa.
Polo responde: — Sem pedras o arco não existe”
Sublime…
Quando li o nome do Mainardi nesse post, eu sabia que ele ia aparecer na discussões…
Gosto muito desse livro, ele é um lembrete das possibilidades da narrativa para além do romance tradicional.
As próprias “cidades invisíveis” podem ser tomadas como uma alegoria sobre a ficção e para o que ela pode construir, seguindo “urbanismos” variados.
Calvio é SEMPRE inesquecível! Adoro tudo que ele escreveu. Que saudades do Sr. Palomar!!!
CalviNo. Sorry.
Companheiro gustavo de castro
Eu, josef mario, morei há alguns anos atrás em veneza e, desde esta época, conheço o companheiro diogo mainard. Sem entrar no mérito do personagem que ora representa, devo dizer que o companheiro mainard é fluente no italiano e a sua tradução de “as cidades invisíveis” do companheiro ítalo calvino, é primorosa. Aconselho que o companheiro releia a obra vagarosamente, sem nenhuma pressa e sem antipatias gratuítas pelo tradutor, para melhor captar um pouco do mistério de zirma, fedora, ipazia, eutrópia, bersabéia, ândria, laudômia e tantas outras de nomes tão femininos, comportamentos tão singulares e aparências tão encantadoras.
Muito obrigado.
Li, aqui, elogios ao site que está vendendo os ingressos para a Flip. Minha experiência, porém, foi péssima. Ele está relatada aqui: http://www.marcelomoutinho.com.br/blog/2007/06/ingresso_facil.php
Já ontem à noite tentei comprar algum ingresso para a tenda dos autores na Modern Sound e me disseram que já não havia mais. No site só há para a tenda da matriz.
O curioso é que qdo vc chega lá em Paraty, vê que a Tenda dos Autores tem vários lugares livres.
Acho que a maioria dos ingressos dos autores é distribuido. Ano passado eles se “esgotaram” no primeiro dia. Dias depois apareceram. Acabei conseguindo alguns.
Hm…
Discrepo do Sérgio. Meu começo inesquecível do Calvino é outro. O de “Se um Viajante numa Noite de Inverno”.
Aquele livro que começa assim: “Você vai começar a ler o novo romance de Italo Calvino, ‘Se um Viajante numa Noite de Inverno’.”
Saladino, não discrepa não. O começo de “Se um viajante…” já passou por aqui meses atrás.
Discrepa? Tanto verbo mais bonito pra se usar…
Discrepa? Tanto verbo mais bonito pra se usar…
Caro Esteta, cuidado: boniteza não é tudo. “Discrepar” soa mesmo feioso, mas acredito que o Saladino o tenha empregado de forma brincalhona, fazendo uma citação do Houaiss, que o usava com freqüência. Discrepava muito, o Antonio.
Oi Sérgio, que história (absurda) é essa de acabarem com o nomínimo? Isso tem data?
Deve ser nomáximo boataria.
Sérgio, prezado,
Só para fazer um complemento na questão da tradução de símbolo para signo. Em semiótica peirciana (de Charles Sanders Peirce), símbolo é um tipo de signo… Na semiótica peirciana existem três tricotomias dos signos relacionando o signo com ele mesmo, o signo com seu objeto e o signo com seu interpretante. Em relação à primeira tricotomia temos qualissigno, sinsigno e legissigno. Na segunda tricotomia temos ícone, índice e o símbolo. Na terceira temos o rema, o discente e o argumento. Todos são tipos de signo, ou seja, símbolo na semiótica peirciana é um caso particular de signo. Não sei como seria o procedimento se o viés adotado por Mainardi na tradução for outro que esse, no caso se formos pelo viés da Linguistica saussuriana de Saussure que aborda os signos linguísticos de outra forma (espero ter escrito o nome dele certo também)…
Abraços
Claudio e Tibor, é verdade. Salvo uma reviravolta nas negociações com o mercado, sairemos do ar no fim deste mês. Saiu um editorial domingo explicando tudo, chamado “Quem liga para isto?” – ainda com chamada na home. Abraços.
Sérgio: enviei um e-mail para vc, assim que puder, me dê um retorno. Forte abraço!
Sinceramente, se eu precisar de semiotica peirciana para ler “Cidades Invisiveis”, desisto de vez e vou passar a ler “O Monge e o Executivo”.
“Cidades Invisiveis” é um grande livro, para quem conhece ou não semiotica. Tudo que li de Calvino (e isso é quase tudo) é acessível e simples. Não depende de um conhecimento acadêmico.
Não sei se a tradução do Mainardi é ruim, porque não falo italiano, mas da forma como estão colocando, quem não leu o livro vai acabar desanimando.
Vocês são uns chatos.
josef mario, acho que o Mainardi ficaria desconfortável com o termo “companheiro”… 😉
E, quanto ao Cidades Invisíveis, estava realmente demorando para ser citado aqui. Não entro no mérito da tradução por não entender necas de italiano e também por não ser nenhum entusiasta do tradutor. Se fez um bom trabalho, sendo fiel às palavras do Calvino (e tô com o Sergio quanto a minha interpretação de signo e símbolo como sendo o mesmo, no contexto), preferiria vê-lo traduzindo mais livros do que discorrendo sobre política e conspirações.
O Diogo Mainardi “jornalista” é uma brincadeira de péssimo gosto. Mas o cara é culto, morou muito tempo na Itália e fala fluentemente o italiano, portanto sua tradução de “Cidades …”, caso mereça reparo, certamente será o reparo feito à maioria das traduções.
“As cidades invisíveis” é daquele tipo de livro que integra o famoso kit da ilha deserta. A gente está sempre revisitando-o e o prazer e o fascínio permenecem o mesmo