Para um homem de sua idade, cinqüenta e dois, divorciado, ele tinha, em sua opinião, resolvido muito bem o problema de sexo. Nas tardes de quinta-feira, vai de carro até Green Point. Pontualmente às duas da tarde, toca a campainha da portaria do edifício Windsor Mansions, diz seu nome e entra. Soraya está esperando na porta do 113. Ele vai direto até o quarto, que cheira bem e tem luz suave, e tira a roupa. Soraya surge do banheiro, despe o roupão, escorrega para a cama ao lado dele. “Sentiu saudade de mim?”, ela pergunta. “Sinto saudade o tempo todo”, ele responde. Acaricia seu corpo marrom cor-de-mel, sem marcas de sol, deita-a, beija-lhe os seios, fazem amor.
E já que andamos falando do homem, vai aí o começo do tétrico romance “Desonra”, obra-prima do escritor sul-africano J.M. Coetzee (Companhia das Letras, 2a. edição, 2003, tradução de José Rubens Siqueira). O professor universitário David Lurie, personagem solitário, orgulhoso e triste, logo vai descobrir – a um preço alto – que não resolveu tão bem quanto imaginava “o problema de sexo”.
31 Comentários
Na minha opinião, J.M.Coetzee é um dos grandes escritores de todos os tempos. Seu livro “Desonra” e “Reparação”, de Ian McEwan, pertencem à categoria dos clássicos universais.
Eline
Acaricia seu corpo marrom cor-de-mel, sem marcas de sol, deita-a, beija-lhe os seios, fazem amor.
Cinqüenta e dois anos e ainda não aprendeu que beijar rapidamente os seios não é exatamente o que se espera de um amante experiente? Se depois disso o que restou foi “fazerem amor”, então não surpreende que os problemas sexuais do indigitado senhor (não li o livro, não sei seu nome) ainda não estivessem resolvidos. Provavelmente Coetzee sofre dos mesmos problemas. Ou a imaginação é que anda mal.
Um dos livros mais perturbadores que já li. Aquela cena do estupro, Deus do céu.
Tibor…
Essa disposição de ir “contra” é legal…
Mas, o texto fala que foi rapidamente? Não, não fala, então vc concluiu ou inferiu…
A descrição do Coetzee é sucinta, sumária, elíptica…ou seja, omite imagens, omite palavras… e o leitor então pode concluir (ou inferir) como melhor lhe aprouver.
O diabo é que normalmente o leitor usa a própria experiência ou expecativa para fazer essas inferÊncias quando se depara com textos elípticos.
Coetzee é um escritor muito bom mesmo. Sua obra, normalmente, inquieta o leitor. Acho que essa é a maior qualidade que um escritor pode ter, a capacidade de inquietar.
Vamos lá… mesmo que não tenha sido rapidamente, o que você diria de um sujeito que ficou vários minutos ou até horas beijando os seios da amada? Teve que sacudir ela pra acordar, se não, não haveria sexo… Ô meu Deus… falta imaginação há mais gente além do Coetzee.
Oi Cezar, tudo bem?
O texto está lá, direto, objetivo. Uma ou duas palavras mais e tudo estaria resolvido.
Com relação ao “rapidamente”, realmente não estava lá. Mas suponhamos que o senhor da história tenha ficado então vários minutos ou até horas beijando os seios da amada. Ele teria que acordá-la aos solavancos, se não, não haveria sexo.
No mais, adoro essas palavrinhas como ‘elíptico’, ‘oblíquo’, que significam muito e não dizem absolutamente nada.
Esqueça um dos dois comentários. A droga da observação falhou na primeira mas parece que foi só pra me enganar.
Tive que repetir e ficou esse pastiche aí.
Desculpe, Tibor, mas esse livro é fantástico. E não só por essa breve descrição. Leia o livro.
meninos,
Quem tem que se preocupar com o tempo é a Soraya. Você inventam cada motivo para discutir. Que coisa.
Essa discussao é engraçada. A Soraya é uma puta. O sexo que ela e o Lurie fazem é triste, tristíssimo. Não acho que o Coetzee pudesse ter deixado isso mais claro sem estragar o começo desse livro estupendo. No mais, só lendo.
Sérgio, o que você disse está implícito no começo do começo…
Ficou claro que Soraya é uma prostituta, garota de programa ou algo do gênero… então, sexo com ares românticos e grandes descrições da cena “amorosa” não são tão, digamos, necessários… até porque o ato em si, realizado com uma mulher de programa, não é bem o ideal de romantismo que se pode esperar de um livro de um autor como COetze…
Concordo com o Sérgio. O sexo em Coetzee, ao meu ver, é sempre triste. E um pouco maquinal, como essa descrição, seca, objetiva, “eliptica” (boa palavra, de fato).
Este parágrafo é um dos meus começos favoritos, também, acho perfeito. O personagem já está todo delineado aí.
digo, Coetzee…
Nunca fiz sexo em Coetzee… Ainda bem, como a coisa é sempre triste, evitarei de ir para lá. Há tantos lugares bons para fazer sexo.
Então, tá.
Sérgio Rodrigues tá certo e o Tibor comete erro grosseiro de interpretação. A mulher é uma prostituta. Quem tem de demonstrar experiência é ela e não ele. A cena é de um realismo perfeito: homens não beijam prostitutas na boca, seria dar ao encontro um tom de romantismo totalmente incongruente com o seu caráter negocial.
Paulo (outro Paulo),
Na verdade são as prostitutas que não beijam na boca dos homens…
As profissionais do sexo guardam este agrado para quando encontrarem o homem que amam, que esteja disposta a tirá-las da “vida”…
Acredito que suprimindo o ato de beijar por livre e espontânea vontade, Coetzee deu um ar ainda mais baixo-astral a cena, além de dar um aspecto mais melancólico ao encontro dos personagens…
Que bom ver que despertei a polêmica. Todos metendo o pau em mim. Que beleza. Que maravilha. Que surpreendente.
Tá certo… ela é uma prostituta. Eita discussão babaca essa. Esqueçam tudo o que eu disse até agora. É sábado e nos sábados eu não funciono direito. O Tico e o Teco vão descansar em destinos diferentes. Gente, bom final de semana e até segunda-feira, revigorado, mais animado e menos propenso a falar besteiras.
Tibor, eu estou aqui bem quietinho, sem falar nada. De prostitutas eu não entendo porra nenhuma, desculpa o trocadilho. Ainda se fosse um michê…
Ghost, eu jamais estive com uma prostituta, porque, nos dias que correm, convenhamos, a contraprestação sexual é a commodity que mais superabunda (sem trocadilho) no mercado, não se fazendo necessário pagar por ela. De qualquer modo, sua observação talvez seja verdadeira.
Ia fazer um comentário sobre o nível elevado do moralismo aqui, mas percebi que seria moralismo demais da minha parte. Sobre o livro, é um bom romance, só não acho que seja um começo especialmente interessante. Nonada.
Paulo (outro Paulo),
ouvi essa história em um documentário, infelizmente já se faz um tempo desde que o vi, então fica meio difícil de lhe informar a fonte… mas era um bom documentário, esra sobre as ditas mulheres da vida, que segundo as mesmas, beijar na boca não é parte do ofício…
Nunca perguntei a nenhuma se a regra é fato e nem tenho como comprovar se ela, a regra, se aplica a todas em qualquer lugar do mundo…
Não tenho conhecimento de causa, até porque não estou muito disposto a pagar por sexo… há tanto por ai e de graça, como você mesmo disse
A Carla Rodrigues ia adorar este post…
A Carla provavelmente diria que há uma atitude de submissão na prostituta que se humilha a ponto de perguntar se o homem sente saudade. Mulher moderna não pode fazer isso, onde já se viu?
gente, o Tibor nem fez um comentário tão ruim assim. Comparem os comentârios dele com o mausoleu por exemplo…
Que coisa…
Achei o comentário do Mausoléu engraçadíssimo. Acho que vocês estão ficando muito sérios.
Nunca uma caixa de comentários me divertiu tanto. O Coetzee é tão bom que até os detratores me ajudam a fazer o dia.
Como assim, “não resolveu tão bem quanto imaginava o problema de sexo”? Isso não faz sentido. Desde quando sexo é problema? Eu, heim…
Ô mausoléu!
Acorda. A escala de prazer tem várias pontuações. Maior do que a Escala Richter que vai até 9 como você sabe.
apesar de eu não ser entendido do assunto(*vergonha*), pode haver muitos problemas no sexo mausoleu…
Bem… falando sobre Cotezee, eu não li esse livro dele, mas eu li o primeiro capítulo inteiro que tem lá no site da Companhjia das Letras. Muito, mas muito bom mesmo…
Pensei que você estivesse falando de “Memórias das minhas putas tristes”. Altere alguns pontos e terei pensado certo. Abraços.
um homem de 52 anos indo fazer amor com uma prostituta, por mais gostosa que ela seja, por mais uisque que tenha ingerido, é sempre um ato triste.
o “sentiu saudade?” dela é so um tópico de conversa.
poderia ter dito “que calor, hein?”
a vida é mais complexa que supõe a vã besterola comentarística bloguiana.