Não não. Papel, não. Ninguém vai falar de papel aqui. Não é coisa que se fale. Papel. Mas já reparou como tem papel por aí, espalhado, empilhado, grampeado, no mundo inteiro, um mundo de papel. Olha bem. Papel de parede, lenço de papel, papel-moeda, toda hora a gente está pegando ou olhando para um papel.
Que nem você aí parado.
E não precisa nem se mexer porque é aqui perto, bem pertinho, nessa página mesmo, que tem uma pessoa a um passo e a poucas páginas da maior complicação da sua vida por causa de um punhadinho bobo de papel.
Não conheço muita gente que concorde comigo, mas lamento que Rubens Figueiredo tenha abandonado tão definitivamente o estilo efervescente de seus três primeiros livros, “O mistério da samambaia bailarina”, “Essa maldita farinha” e “A festa do milênio” – em que brincava desvairadamente com a linguagem em farsas rebuscadas e divertidíssimas –, para se dedicar aos meios-tons melancólicos de obras como “As palavras secretas”, “Barco a seco” e “Contos de Pedro”. Sim, foi esta segunda fase, sem dúvida competente, que tornou Rubens respeitado pela crítica brasileira. Mas eu, que sempre tive medo de confundir seriedade com sisudez, confesso sentir falta de abrir um livro dele e encontrar um início empolgante como o de “Essa maldita farinha” (Record, 1987).
11 Comentários
Meu professor Flavio Carneiro (outro bom escritor) disse isso uma vez: ele também é dos que gostam desses 3 livros. Dois deles (não me lembro quais) podem ser encontrados na cada vez mais empoeirada, defasada e nojenta biblioteca do andar de Letras da Uerj, mas eu nunca me animei a pegá-los. Vou experimentar.
Não sei se, de alguma forma, “O livro dos lobos” pode ser encarado como ocupando um lugar intermediário entre essa fase mais, digamos, “colorida” e a atual (já de algum tempo), mas é um ótimo livro de contos. Foi meu primeiro contato com a obra do Rubens.
Eu sempre quis ler esses primeiros livros do RF. Sobre os últimos, tenho exatamente a mesma impressão que o Sérgio – e é o que sinto, também, em relação ao Michel Laub: puta escritor, puta texto, mas falta alguma coisa, uma irresponsabilidade, a sensação de que o cara escreveu aquilo com gosto, que pegou na veia mesmo. Acho os dois “profissionais” demais, se é que isso pode ser um defeito.
Eu também vejo isso no Laub, Roberto, mas no Rubens não. Ele trabalha com frases mais longas, tem um estilo lento e pensativo que me agrada. O Laub é sem sal, insosso. Muito melhor crítico que ficcionista. Pelo menos pelo livro que li dele (Música Anterior).
Talvez você tenha razão, Jonas. Comparando, eu realmente prefiro o Rubens ao Laub. Mas os dois são caras que me despertam a vontade de dar uma chacoalhada e dizer: “relaxa, cara!”.
Se bem que “relaxa”, no caso do Laub, pode ser definitivamente soporífero…
Laub é um ótimo sonífero. Sempre que estou com insônia saco meu exemplar de “Longe da Água”, leio dois parágrafos e em dois minutos estou afundado num sono pesado. Deviam vender o Laub nas farmácias. Melhor que Valium
Eu prefiro a segunda fase do Rubens, mas admito que não há ninguém hoje que se pareça com sua primeira fase.
Tbm prefiro a segunda fase, com destaque para “Barco a seco”
Tem a excelente frase inicial do conto “a arte racional de curar”, do Palavras Secretas:
“Ao aproximar sua mão do cachorro, teve medo dos dentes de bronze”.
(o conto na verdade não está entre os melhores dele, mas esse início é genial).
Pois é, até a literatura blogueira, que tinha tudo pra ser menos vetusta, é um apanhado de autobiografias de pessoas que levam muito a sério o fato de serem “cool”. Aí não dá.