O futebol internacional se profissionalizou de tal forma que a segunda Copa do Mundo que o Brasil sediará, em 2014, deve ter pouco em comum com a primeira, de 1950, vencida pelo Uruguai – principalmente no resultado da final, espera-se. Entre essas diferenças, uma das mais curiosas está à vista de todos: se naquele tempo a Copa era uma copa propriamente dita, em 2014 não será mais.
Convém explicar. Como anda na moda em certos círculos agarrar palavras pelo pé da letra, pregando-se a substituição de expressões legítimas como “risco de vida” (por risco de morte) e “greve de fome” (por greve de comida), é de admirar que ainda não tenham disparado o alarme: no reino do literalismo, faz tempo que a Copa do Mundo é uma ficção.
De fato, Copa-copa era no tempo da Jules Rimet, quando a taça tinha a forma de uma taça, na qual se podia até beber champanhe. E bebeu-se mesmo: na comemoração do título de 1958 na Suécia, a Jules Rimet passou de boca em boca. Quem recorda é Pelé no livro que lançou ano passado (“Pelé, a autobiografia”, editora Sextante). Acrescenta que limitou-se a assistir: aos 17 anos, estava abaixo da idade legal para aquele tipo de celebração.
O uso era irreverente, mas perfeito. A palavra “copa” é derivada do latim cupa ou cuppa, “vasilha grande”, que deu ainda nos nossos copo e cuba, no inglês cup e no italiano coppa, entre outros herdeiros mundo afora. Mas depois que o Brasil garantiu em 1970 a posse da Jules Rimet (para sempre, imaginávamos, até que ladrões a derreteram), o troféu da Fifa perdeu o côncavo necessário para se qualificar literalmente como copa.
Felizmente, tudo isso tem apenas valor de curiosidade. Faz tempo que o sentido de copa, tendo se expandido da taça para a disputa esportiva eliminatória em que ela é posta em jogo, estendeu-se também a troféus de formas variadas. Assim caminham as línguas. Já não existem discos em aparelhos de telefone, mas continuamos a “discar” números. Há anos a “novela das oito” começa às nove. E a Copa do Mundo é um globo.
Texto publicado na “Revista da Semana”.
5 Comentários
Já souberam notícias dos prêmios Gouncourt e Renaudot, na França?
Voilà:
http://passouline.blog.lemonde.fr/
(En français, bien sûr)
Notem a trapalhada da Editora de Amélie Nothomb, que lhe valeu ter o nome tirado da lista de premiáveis… Quem disse que é só no Brasil que Editoras fazem trapalhadas? Rsrsrs.
Esqueci de dizer: Amélie Nothomb era a FAVORITA. Quelle tristesse! Eu a acho uma excelente escritora, inteligentíssima, bem-humorada, irônica, sem pirotecnias desnecessárias… E, ainda por cima, é belga (piada interna).
Pois é Saint, mas o Assouline também é meio suspeito, por ser escritor, além de editor do caderno de livros do Monde. Na verdade é um baile de suspeitos esse Goncourt. O que eu acho curioso é que todo mundo saber que o prêmio é dado após um tremendo conlúio, mas todos parecem aceitar isso numa boa. O Jabuti é mais discreto.
ps: Parece que, coisa rara, o prêmio foi dado a um livro cheio de humor, leve como os outros do Pennac.
Chove na praia.
Areias, os franceses não serão menos hipócritas do que nós?
Aqui faz-se todo aquele jogo-de-cena, você (pobre autor concorrente) acredita, acha que é tudo isento, que tem reais chances de ganhar, quando no final das contas o vencedor já está escolhido desde o início…
Lá na França, pelo menos, você já sabe que é tudo um esquema pré-estabelecido… Desilude mais, rsrsrs.
Digo, desilude menos.