Li no jornal, naquelas letras grandes que se usam em títulos, esta palavra espantosa: corroteirista. Senti vertigem. Asco. Deslocamento. Desviei os olhos rapidamente, mas não me livrei da imagem mental hedionda, que me acompanhou o dia inteiro. Corroteirista – de fora a fora no pára-brisa. Corroteirista – na hora do almoço, dentro do prato. Corroteirista – de olhos fechados.
Sempre defendi, por uma questão de princípio, a unificação ortográfica (que só não adotei ainda neste blog porque estamos em fase de transição, pressa pra quê?). Também sempre critiquei esse acordo pobrezinho que os doutos negociadores dos dois lados do Atlântico levaram tantos anos para alinhavar, principalmente por sua incapacidade de desbastar o ridículo emaranhado que são as regras do hífen. Nunca achei, porém, que essas ressalvas pudessem ser mais que ressalvas, invalidando o argumento central de que é melhor ter uma ortografia tosca, mas única, do que ter duas.
Mas isso foi antes de encontrar para nunca mais esquecer, na vida de minhas retinas tão fatigadas, o inominável corroteirista. O corroteirista rompe todos os cojones, corrói minhas convicções. Não sei de mais nada. Me limito a torcer para que, em nome do bom gosto, da elegância, da harmonia entre as letrinhas, esse negócio de corroteirizar caia rapidamente em desuso na cultura cinematográfica. Corra da corroteirização, roteirista! Por que se meter em corriola? Trabalhe sozinho, apartado dos colegas, em magnífico isolamento, é o apelo que faço. Só assim será possível acreditar que esse acordo ortográfico é uma boa idéia, apesar de todos os seus pecados.
36 Comentários
Eu avisei, eu avisei, eu avisei… Os sonhos da unificação produzem monstros, diria Goya.
Gênio.
Esses sujeitos que ajudaram a fazer a unificação, são mesmos uns correteiros!
Imagina então se o Co-réu de um processo criminal evitou a preisão evadindo em velocidade: O Corréu fugiu correndo. Ou se o Co-réu é piloto de alguma categoria automobilística? O “Corréu correu”.
a reforma, quem diria, impactará negativamente no trabalho de equipe, e também dará combustível aos maus poetas. eu disse, eu disse.
Continuo ignorando tudo isso… os revisores que se virem.
essa reforma é uma babaquice.
Meu pânico é com o para, sem acento. Lembra do caminhão que virou no Rebouças ? No dia seguinte, estava no Globo: Caminhão vira no Rebouças e para o Rio…
Fiquei pensando: para o Rio o quê ? Para o Rio tudo, para o Rio nada, então como é que é ? É big, é big, é hora é hora é hora…
Corroteirsta é uma palavra medonha. Me assustei quando abri o seu blog. 😉
Corroteirista.
A gente se acostuma…
Também ando com preguiça de aderir a essa reforma. A única mudança que fiz foi tirar o acento de ideia. Acho que, como um bom brasileiro, vou deixar para aderir no último dia do prazo.
abraço
w.m.carvalho
Essa reforma já produziu alguns exemplares bastante bizarros, mas de fato corroteirista é de doer. Eu, que volta-e-meia pego frilas de roteirista, vou passar bem longe desses trabalhos de co-autoria. (Ou será coautoria?)
Eu disse, eu disse. Essa reforma é uma bosta.
Corroteirista é realmente um pesadelo. Proponho corredator, muito mais elegante.
E, falando sério, o que dizer de carbo-hidrato (embora se aceite também carboidrato).
Ou das locuções dia a dia, pé de moleque, disse me disse e café com leite, além de outras às carradas, sem hífen?
Ou dos acrianos, que agora têm de engolir esse “i” em seu gentílico?
Ou – nunca me esquecerei desse acontecimento – de soto-pôr?
Nunca mais soto-porei nada, salvo meu exemplar do novo VOLP.
Será que ainda é muito tarde para adotarmos o Latim como língua oficial?
Tem como voltar atrás?
Como uma amigo mais acima falou, tenho preguiça de aderir ao reformantes… A propósito, preguiça tem trema?
Já leio há tanto tempo do jeito que as coisas estão que nem sei o que mudou com a reforma… vou voltar ao colégio… na primeira série primária. Do soletrar aos grandes tratados lerei tudo de novo. E que sejam re-impressos logo (é assim?)…
Que fique claro… meu comentário foi uma piada…
É sempre bom avisar.
Detesto aquelas cobrinhas no Word indicando que a palavra está incorreta. Quando essa atualização for feita, passo a escrever na nova ortografia.
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Tive a mesma sensação com Contrarreforma. Um horror.
A reforme pariu muitos desses monstrinhos! Aos poucos eles estão vindo à luz.
A reforma…
Ei, Tibor, os revisores que se virem? A gente se viramos, a gente se viramos (rsrsrs)
essa reforma é uma piada
O horror, o horror…
Outro dia me vi obrigado a escrever contrassenso. NÃO CONSEGUI.
Uma reforma ortográfica feita por um governante analfabeto só podia dar nisso aí. “Cocurador” é ainda pior! Pau no cu da Academia Brasileira de Letras!
Brasílio,
A reforma não foi feita pelo governante analfabeto. Ela é do tempo do governante cheirador. Ou até de antes: do tempo do governante maranhense. Mas só agora entrou em vigor.
Penso como o Fernando Torres… Pior do que corroteirista, só mesmo o diabo do corréu. Esse dói até a alma.
Corroboro tua posição…
Pois é. Corroteirista, cocurador, corréu…… socorro !!!!
Eu por mim só coloco na nova ortografia o que o chatíssimo vocabulário ortográfico da Academia Brasileira de Letras (http://www.academia.org.br/abl/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?sid=23) diz que é assim mesmo e fim de papo. Enquanto corroteirista não estiver lá, felizmente, não existe!!
BOA! Também acho hedionda a palavra “farmácia”. Voltemos a escrever “pharmacia”, que tal?
Boa sorte, André. Fernando Pessoa também achava. Quem sabe você acaba virando um heterônimo?