Sempre fui – e digo isso sem orgulho, apenas uma daquelas constatações plácidas que vêm com o autoconhecimento – impermeável à emoção de pedir, que dirá colecionar, autógrafos. Uma dedicatória sincera garatujada por um amigo de fama literária restrita a dois quarteirões e meio sempre teve, na escala afetiva das minhas estantes, muito mais valor do que uma assinatura fria e carrancuda que possa ser arrancada de, sei lá, J.M. Coetzee himself numa noite memorável em Parati.
Se essa inapetência me poupa de uma extensa quilometragem em filas, sem dúvida desvalorizará minha biblioteca em sebos futuros. A troca parece justa. O desapego aos rabiscos famosos, porém, não impedirá ninguém de se divertir com essa coleção online (via blog da Amazon). Dedicada quase exclusivamente ao universo da literatura anglo-americana, com alguns escritores de outras nacionalidades e nomes nada literários engrossando o caldo, ela permite o exercício deliciosamente barato de comparar, por exemplo, a assinatura ilegível de Thomas Pynchon, com seus traços que tentam se esconder atrás de si mesmos, com o floreado todo pimpão de H.G. Wells. Mais do que dois autógrafos, duas atitudes diante da literatura?
18 Comentários
Essa história de analisar rabiscos lembra-me o charlatanismo adotado por vários departamentos de recursos humanos, que contratavam profissionais especializados em destrinchar a personalidade do candidato pelo exame da assinatura. Letras grandes: espírito arrojado e desembaraçado; letras pequenas: pessoa tímida, ensimesmada; letras inclinadas, alguém de pouca retidão; letras arredondadas, personalidade expansiva.
hummm…
julgamento de fraude; julgamento do livro mais superestimado da literatura brasileira; marketing; autores novos publicados ou não por editoras tradicionais (os aspitantes que encalham e ficam com o ego arranhado e ressentidos)
agora se chega à caligrafia dos autores e análise do autógrafo…
A amável e simpatissíssima professora “Martíssima” (apelido dado por Cortázar) mais do que autógrafos poderia se vangloriar (ao que, graças a Deus, ela está imune) de suas correspondências com alguns dos grandes escritores de nosso tempo. Exemplo? Borges, Cortázar, Puig. Mais? Allende, Fuentes, Sabato, enter outros. Como vivemos em tempos múltimídia, Martíssima, que é professora na George Mason University, resistiu, mas colocou seu álbum de fotos na internet. Olha, é de causar inveja a qualquer fã de literatura hispano americana: http://mason.gmu.edu/~mfrances/pictures.html
alguém aí sabe como se pronuncia o nome do pychon? (pura curiosidade).. sérgio?.. aguardo..
abraço
Will: que eu saiba é Píntchon mesmo. Tem um ene no meio. Abs.
Sérgio, esse seu post me fez pensar que uma das coisas mais chatas da vida de escritor deve ser autografar livro para gente desconhecida ou pouco íntima. Deus do céu! Deve ser um horror aquela fila interminável e você lá sentado, suando, com aquele sorriso petrificado no rosto, fazendo pose para as fotos e escrevendo, pela centésima vez, uma das dedicatórias-padrão que você trouxe de casa…
Um abraço!
Prezada Sra. Ana,
Escritores escrevem, não autografam. Só autografa quem quer.
valeu, sérgio
Gostaria de enviar uma assinatura, com dedicatória enigmática, de Rudyard Kipling, um autor hoje quase esquecido, mas que mereceu um Nobel (1907, 1º inglês, 8º escritor desde a premiação). É uma história bastante interessante (ele visitou minha cidade – Piracicaba/SP), que pouca gente conhece.
De qualquer forma, para terminar, não sei como anexar o autógrafo e frase enigmática. Se interessar aos seus leitores/internautas, me instrua.
Francisco
Fico tentando imaginar onde o Pynchon foi encontrado para dar esse autógrafo..
O Pynchon se isola da imprensa e não gosta de fotos, mas ao que parece não é um recluso. Li em algum lugar que, até uns anos atrás, ele era visto todo dia buscando o filho na escola em NY etc etc.
Francisco, depois de escanear a página (se é que já não fez isso), você pode enviar o arquivo por email para sergio@todoprosa.com.br. Não garanto a publicação – é que esse papo de autógrafo foi só uma digressão, em espírito de brincadeira – mas quem sabe? Um abraço.
Nunca pedi um autógrafo, mas tenho um monte deles, todos em livros comprados no sebo aqui da rua de casa. Pra ficar só em alguns defuntos: Juan José Saer, Josué Montello, Fernando Sabino, Clarice Lispector, Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto e Manuel Bandeira.
tb “coleciono” ilustres autógrafos comprados por acaso em sebos: Pedro Nava, Manuel Bandeira, Cecília Meireles, Drummond, Nassara, Raul Pompéia (aliás, nesse espaço alguém já disse que R.P e um autormenor…fico realmente estarrecida com esses neo-leitores), Floberla Espanca, e tantos outros. Mas de todas de minha “coleção” a que mais aprecio é uma linda dedicatória de Vitorino Nemésio (poeta portugues, apra quem não sabe) para uma senhora brasileira, por quem se mostrava interessado. O livro: um belíssimo exemplar de Selected Love Poems do Byron, minusculo, do tamanho de uma palma e com uma encadernação azul carbono, já esmaecido pelo tempo.
Algumas dedicatórias são divertidíssimas, do Otto Lara Resende para Nelson Rodrigues…. Aliás, um entrevistou o outro para uma revista comnunista da década de 50…E é uma das mais divertidas e sinceras entrevistas literárias que já li. De qualquer forma, vejo os velhos autógrafos como uma navegação no tempo, uma ponta da história do afeto.
com corrreção:
Tb “coleciono” ilustres autógrafos comprados por acaso em sebos: Pedro Nava, Manuel Bandeira, Cecília Meireles, Drummond, Nassara, Raul Pompéia (aliás, nesse espaço alguém já disse que R.P é um autor menor…fico realmente estarrecida com esses neo-leitores), Floberla Espanca, e tantos outros.
De todas de minha “coleção” a que mais aprecio é uma linda dedicatória de Vitorino Nemésio (poeta portugues, para quem não sabe) para uma senhora brasileira, por quem se mostrava interessado.
O livro: um belíssimo exemplar de Selected Love Poems do Byron, minúsculo, do tamanho de uma palma e com uma encadernação azul carbono, já esmaecida pelo tempo.
Algumas dedicatórias são divertidíssimas, do Otto Lara Resende para Nelson Rodrigues…. Aliás, um entrevistou o outro para uma revista comunista da década de 50…E é uma das mais divertidas e sinceras entrevistas literárias que já li.
De qualquer forma, vejo os velhos autógrafos como uma navegação no tempo, uma ponta da história do afeto.
Sabe, Sérgio, nos anos 80 mantive uma curtíssima mas proveitosa e prazerosa correspondência com Josué Montello. Eu como fã, ele como grande escritor que era. O mais valioso para mim é que ele as escrevia à mão. Como é gostoso escrever e receber cartas manuscritas mesmo em tempos de Internet… Criou-se um pequeno vínculo, grande preciosidade para mim.
zzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzz
tá brava a coisa, hein? Falar de autógrafos…