O dízimo com que os fiéis alimentam a riqueza da Igreja Universal do bispo Edir Macedo – e que ajudou a tornar a TV Record vice-líder na guerra da audiência – é palavra antiguinha, presente no português desde o século 13, para uma prática de idade bíblica. Dízimo quer dizer a décima parte. É termo gêmeo de décimo, com o qual compartilha o ancestral latino decimus, mas, enquanto este é um derivado culto, dízimo é um desdendente vulgar. Existe ainda a palavra “dízima”, também velhinha e também referente a um tributo de 10% – este, porém, devido ao governo e pago em dinheiro, enquanto o dízimo, na origem, era cobrado em gêneros.
Vale conferir o que dizia sobre o dízimo Rafael Bluteau em seu “Vocabulário Português e Latino”, o primeiro grande dicionário de nossa língua, no início do século 18. Atenção para a mistura de definição objetiva e justificação moral, não fosse Bluteau um padre: “A décima parte, que é paga às Igrejas, párocos delas, e pessoas eclesiásticas para sua côngrua sustentação; que assim como estes sustentam aos fiéis com o pasto espiritual da doutrina e sacramentos, assim é razão, que os fiéis sustentem aos tais ministros com a décima parte dos frutos que colhem”.
O estilo é arcaico: “côngrua”, palavra caída em desuso, era a pensão paga aos párocos. Mas o discurso, desatualizado no contexto do catolicismo, que aboliu o dízimo, encontra eco no toma-lá-dá-cá de Macedo. “É um compromisso que revela a fé prática. A de que Deus fica obrigado a esse compromisso com a pessoa que deu o dízimo…”, diz ele no livro “O bispo – A história revelada de Edir Macedo”, que está sendo lançado com tiragem inicial de 700 mil exemplares, recorde no mercado editorial brasileiro.
Uma curiosidade: o verbo “dizimar”, que significa exterminar, devastar, matar em grande número, tem a mesma origem. Nasceu de uma punição adotada pelo exército romano em casos de sublevação das tropas: matar um em cada dez soldados, aleatoriamente. Logo o sentido se estendeu para grandes matanças em geral.
Texto publicado em minha coluna na “Revista da Semana”.
20 Comentários
——————-[OFF TOPIC]————————–
O Man Booker Prize 2007 foi concedido à irlandesa Anne Enright, por ‘The gathering’ (por enquanto inédito no Brasil).
É a segunda irlandesa a vencer o prêmio (a outra foi Iris Murdoch, por ‘O mar, o mar’, da Nova Fronteira).
Também irlandeses ganhadores do MBP são Roddy Doyle (por ‘Paddy Clarke ha ha ha’, da Estação Liberdade) e John Banville (Por ‘O mar’, da Nova Fronteira, esse já citado aqui pelo SR).
E a editora que lançou a biografia do bispo é simplesmente a Larousse, de passado tão glorioso…
E a editora que lançou a biografia do bispo é simplesmente a Larousse, de passado tão glorioso…
Não consegui e-mail para solicitar end. para remessa de um livro e peço, assim, que Sérgio Rodrigues me passe esse end..
Jeferson, me escreva no sergio@todoprosa.com.br, por favor.
— sobre o off
O Booker Prize surpreende mais uma vez e premia outra surpresa — aliás, já é tradição premiar azarões.
Norman Mailer subiu no telhado. Alguém confirma isso?
Oi
Que bom ler um comentário sóbrio e coerente sobre a palavra dízimo e o “bispo” ( “bispo” para os otários dele). Incrível como a tão propalada entrevista do Macedo com Paulo H. Amorim não o inocenta de nada e, expôs a justificativa do juiz que concedeu o mandado de prisão atualíssima (“pastor que se aproveita de pessoas incultas e ingênuas com fim mercantilista”).
Edir não mudou; suas práticas também não podem receber outro classificação que não seja a de exploração odienta. Aqui onde moro, uma amiga de minha irmã foi despedida e procurou uma orientação do pastor de uma Universal. O salafrário disse à desesperada que ela trouxesse o dinheiro da indenização que Deus dar-lhe-ia um emprego melhor.
Ela ainda está desempregada e perdeu o dinheiro no valor de R$ 7.000,00. As acusações de charlatanismo, curandeirismo e estelionato estão ou não valendo?
Poxa…um post tão legal e nenhum comentário que preste! (valeu sérgio, mas fiquei com uma dúvida: os judeus não tinham algo como o dizimo também???
Francisco: aiaiai, né não, meu irmão. O bispo é tão safado como todos os outros chefes, chefinhos e chefões religiosos, seja de qual denominação for. A igreja católica é que inventou o jeito de tirar uma grana dos fiéis e agora fica reclamando…assim não dá para conversar.
E se essa otaria deu 7 mil reais para o pastor, sinceramente, mereceu perder. Acredito não…me desculpe…acho que é uma dessas histórias que neguinho vai contando para botar lenha na fogueira.
Não defendo o bispo, mas também não defendo o papa e nem engulo papo de otário.
A inteligência humana tem limites. Já a ignorância…
Pode ser conferido em algumas passagens do Gênese: Abrãao e Jacó prometem dar a Deus a décima parte de tudo o que lograrem ganhar. Isso ferou o fundamentalismo pecuniário do bispo Macedão, que tanto incomoda a campeã de audiência.
Tá feia a coisa! Esse blog literário (?) parece que tá doido pra subir no telhado…
Caro Walter, muito curiosa sua mensagem. Além de seu evidente desejo de que isso ocorra, o que o leva a pensar assim? O espaço ocupado por ‘A palavra é’, uma coluna bem mais antiga que (e tão lida quanto) o próprio Todoprosa?
O que a Universal faz que o marketing e os políticos não fazem?
Iludir, vender máquina de desentortar banana, prometer o que não tem como cumprir, pregar a teologia da prosperidade, priorizar a posse, etc.
A acusação é justa, mas tem muito mais gente que poderia ser enquadrada…
Se você tiver o carro x, as mulheres o desejarão!
Se você usar roupas da grife tal, será amado, admirado e vencedor!
Se você não pecar, merecerá o reino dos céus!
Você não pode ser feliz enquanto não tiver o novo lançamento…
Alguém aí em cima se surpreendeu com o fato do Edir Macedo ter encontrado uma editora de tradição para publicar o livro. Ah, meu caro, você pode acreditar: o mercado editorial brigou a tapas pelo direito de publicação!
Essa obra vai vender mais que pão quente em padaria e todo mundo sai enriquecido: o bispo, a editora e digo mais, até a Igreja, já que muitos leitores vão se converter.
P.S. Não me entendam mal, só estou fazendo um prognóstico. Quanto ao resto, sou ateu de carteirinha.
Oi
Sobre histórias inventadas sobre as práticas da Universal, busque em jornais as notícias sobre os processos movidos por membros que acionaram a Justiça ao perderem dinheiro e patrimônio por pressão dos pastores( não pensem que eles “pedem” ou o fiel oferece espontaneamente, pois cada templo tem uma meta financeira que deve ser cumprida).
Para mais exemplos, leiam os livros “Nos bastidores do reino” e “Templo,mercado e teatro”. Melhor: entrem num templo e vejam a esculhambação que ali acontece.
Vi não sei onde, muito tempo atrás, uma explicação de um religioso católico sobre a origem do dízimo (não sei se verdadeira, não sei se a única).
O tal religioso disse que o dízimo nada mais era do que uma provisão que cada um devia levar para o local onde seriam celebrados os cultos. Como esses locais eram distantes, um ponto de convergência aonde iam várias tribos, o culto poderia demorar mais do que um dia e cada um deveria levar provisões equivalentes a um décimo de suas provisões domésticas. Chegando ao local do culto, essas provisões era “comunitarizadas”, ou seja, acumulavam tudo em um só local para o consumo de todos.
A ser verdade, o Macedão foi bem esperto na distorção do sentido original.
Anyway, esses caras que dizem ter uma chama divina que salvará a humanidade nunca me inspiraram confiança, sejam eles evangélicos, católicos, marxistas ou sebastianistas petistas.
O Bispo Edir Macedo pode não valer grandes coisas, mas eu pergunto: Roberto Marinho valia? Acho que Edir Macedo tem grande valor como empresário. Não sou evangélico mas torço por ele.
Aliás, quem dá dinheiro para a Universal é trouxa e não merece receber de volta. Se eu fosse juiz daria ganho de causa ao Bispo.
O Bispo, o papa etc, são tudo farinha do mesmo saco. A diferença é que a Igreja Católica é mais rica.