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Dízimo

16/10/2007

O dízimo com que os fiéis alimentam a riqueza da Igreja Universal do bispo Edir Macedo – e que ajudou a tornar a TV Record vice-líder na guerra da audiência – é palavra antiguinha, presente no português desde o século 13, para uma prática de idade bíblica. Dízimo quer dizer a décima parte. É termo gêmeo de décimo, com o qual compartilha o ancestral latino decimus, mas, enquanto este é um derivado culto, dízimo é um desdendente vulgar. Existe ainda a palavra “dízima”, também velhinha e também referente a um tributo de 10% – este, porém, devido ao governo e pago em dinheiro, enquanto o dízimo, na origem, era cobrado em gêneros.

Vale conferir o que dizia sobre o dízimo Rafael Bluteau em seu “Vocabulário Português e Latino”, o primeiro grande dicionário de nossa língua, no início do século 18. Atenção para a mistura de definição objetiva e justificação moral, não fosse Bluteau um padre: “A décima parte, que é paga às Igrejas, párocos delas, e pessoas eclesiásticas para sua côngrua sustentação; que assim como estes sustentam aos fiéis com o pasto espiritual da doutrina e sacramentos, assim é razão, que os fiéis sustentem aos tais ministros com a décima parte dos frutos que colhem”.

O estilo é arcaico: “côngrua”, palavra caída em desuso, era a pensão paga aos párocos. Mas o discurso, desatualizado no contexto do catolicismo, que aboliu o dízimo, encontra eco no toma-lá-dá-cá de Macedo. “É um compromisso que revela a fé prática. A de que Deus fica obrigado a esse compromisso com a pessoa que deu o dízimo…”, diz ele no livro “O bispo – A história revelada de Edir Macedo”, que está sendo lançado com tiragem inicial de 700 mil exemplares, recorde no mercado editorial brasileiro.

Uma curiosidade: o verbo “dizimar”, que significa exterminar, devastar, matar em grande número, tem a mesma origem. Nasceu de uma punição adotada pelo exército romano em casos de sublevação das tropas: matar um em cada dez soldados, aleatoriamente. Logo o sentido se estendeu para grandes matanças em geral.

Texto publicado em minha coluna na “Revista da Semana”.

20 Comentários

  • Thiago Maia 16/10/2007em22:11

    ——————-[OFF TOPIC]————————–
    O Man Booker Prize 2007 foi concedido à irlandesa Anne Enright, por ‘The gathering’ (por enquanto inédito no Brasil).
    É a segunda irlandesa a vencer o prêmio (a outra foi Iris Murdoch, por ‘O mar, o mar’, da Nova Fronteira).
    Também irlandeses ganhadores do MBP são Roddy Doyle (por ‘Paddy Clarke ha ha ha’, da Estação Liberdade) e John Banville (Por ‘O mar’, da Nova Fronteira, esse já citado aqui pelo SR).

  • andré telles 17/10/2007em07:07

    E a editora que lançou a biografia do bispo é simplesmente a Larousse, de passado tão glorioso…

  • andré telles 17/10/2007em07:07

    E a editora que lançou a biografia do bispo é simplesmente a Larousse, de passado tão glorioso…

  • Jeferson de Andrade 17/10/2007em08:01

    Não consegui e-mail para solicitar end. para remessa de um livro e peço, assim, que Sérgio Rodrigues me passe esse end..

  • Sérgio Rodrigues 17/10/2007em10:10

    Jeferson, me escreva no sergio@todoprosa.com.br, por favor.

  • Bruno 17/10/2007em11:17

    — sobre o off

    O Booker Prize surpreende mais uma vez e premia outra surpresa — aliás, já é tradição premiar azarões.

  • Bruno 17/10/2007em15:49

    Norman Mailer subiu no telhado. Alguém confirma isso?

  • francisco 17/10/2007em16:58

    Oi

    Que bom ler um comentário sóbrio e coerente sobre a palavra dízimo e o “bispo” ( “bispo” para os otários dele). Incrível como a tão propalada entrevista do Macedo com Paulo H. Amorim não o inocenta de nada e, expôs a justificativa do juiz que concedeu o mandado de prisão atualíssima (“pastor que se aproveita de pessoas incultas e ingênuas com fim mercantilista”).
    Edir não mudou; suas práticas também não podem receber outro classificação que não seja a de exploração odienta. Aqui onde moro, uma amiga de minha irmã foi despedida e procurou uma orientação do pastor de uma Universal. O salafrário disse à desesperada que ela trouxesse o dinheiro da indenização que Deus dar-lhe-ia um emprego melhor.
    Ela ainda está desempregada e perdeu o dinheiro no valor de R$ 7.000,00. As acusações de charlatanismo, curandeirismo e estelionato estão ou não valendo?

  • aiaiai 17/10/2007em18:39

    Poxa…um post tão legal e nenhum comentário que preste! (valeu sérgio, mas fiquei com uma dúvida: os judeus não tinham algo como o dizimo também???

    Francisco: aiaiai, né não, meu irmão. O bispo é tão safado como todos os outros chefes, chefinhos e chefões religiosos, seja de qual denominação for. A igreja católica é que inventou o jeito de tirar uma grana dos fiéis e agora fica reclamando…assim não dá para conversar.
    E se essa otaria deu 7 mil reais para o pastor, sinceramente, mereceu perder. Acredito não…me desculpe…acho que é uma dessas histórias que neguinho vai contando para botar lenha na fogueira.
    Não defendo o bispo, mas também não defendo o papa e nem engulo papo de otário.

  • Daniel Brazil 17/10/2007em22:18

    A inteligência humana tem limites. Já a ignorância…

  • anrafel 18/10/2007em02:40

    Pode ser conferido em algumas passagens do Gênese: Abrãao e Jacó prometem dar a Deus a décima parte de tudo o que lograrem ganhar. Isso ferou o fundamentalismo pecuniário do bispo Macedão, que tanto incomoda a campeã de audiência.

  • Walter 18/10/2007em09:45

    Tá feia a coisa! Esse blog literário (?) parece que tá doido pra subir no telhado…

  • Sérgio Rodrigues 18/10/2007em10:07

    Caro Walter, muito curiosa sua mensagem. Além de seu evidente desejo de que isso ocorra, o que o leva a pensar assim? O espaço ocupado por ‘A palavra é’, uma coluna bem mais antiga que (e tão lida quanto) o próprio Todoprosa?

  • Corujão 18/10/2007em11:21

    O que a Universal faz que o marketing e os políticos não fazem?
    Iludir, vender máquina de desentortar banana, prometer o que não tem como cumprir, pregar a teologia da prosperidade, priorizar a posse, etc.
    A acusação é justa, mas tem muito mais gente que poderia ser enquadrada…
    Se você tiver o carro x, as mulheres o desejarão!
    Se você usar roupas da grife tal, será amado, admirado e vencedor!
    Se você não pecar, merecerá o reino dos céus!
    Você não pode ser feliz enquanto não tiver o novo lançamento…

  • Athayde 18/10/2007em16:12

    Alguém aí em cima se surpreendeu com o fato do Edir Macedo ter encontrado uma editora de tradição para publicar o livro. Ah, meu caro, você pode acreditar: o mercado editorial brigou a tapas pelo direito de publicação!
    Essa obra vai vender mais que pão quente em padaria e todo mundo sai enriquecido: o bispo, a editora e digo mais, até a Igreja, já que muitos leitores vão se converter.
    P.S. Não me entendam mal, só estou fazendo um prognóstico. Quanto ao resto, sou ateu de carteirinha.

  • francisco 18/10/2007em18:26

    Oi

    Sobre histórias inventadas sobre as práticas da Universal, busque em jornais as notícias sobre os processos movidos por membros que acionaram a Justiça ao perderem dinheiro e patrimônio por pressão dos pastores( não pensem que eles “pedem” ou o fiel oferece espontaneamente, pois cada templo tem uma meta financeira que deve ser cumprida).
    Para mais exemplos, leiam os livros “Nos bastidores do reino” e “Templo,mercado e teatro”. Melhor: entrem num templo e vejam a esculhambação que ali acontece.

  • Roger 23/10/2007em11:57

    Vi não sei onde, muito tempo atrás, uma explicação de um religioso católico sobre a origem do dízimo (não sei se verdadeira, não sei se a única).
    O tal religioso disse que o dízimo nada mais era do que uma provisão que cada um devia levar para o local onde seriam celebrados os cultos. Como esses locais eram distantes, um ponto de convergência aonde iam várias tribos, o culto poderia demorar mais do que um dia e cada um deveria levar provisões equivalentes a um décimo de suas provisões domésticas. Chegando ao local do culto, essas provisões era “comunitarizadas”, ou seja, acumulavam tudo em um só local para o consumo de todos.
    A ser verdade, o Macedão foi bem esperto na distorção do sentido original.
    Anyway, esses caras que dizem ter uma chama divina que salvará a humanidade nunca me inspiraram confiança, sejam eles evangélicos, católicos, marxistas ou sebastianistas petistas.

  • Luiz Carlos 29/10/2007em12:32

    O Bispo Edir Macedo pode não valer grandes coisas, mas eu pergunto: Roberto Marinho valia? Acho que Edir Macedo tem grande valor como empresário. Não sou evangélico mas torço por ele.

  • Luiz Carlos 29/10/2007em12:34

    Aliás, quem dá dinheiro para a Universal é trouxa e não merece receber de volta. Se eu fosse juiz daria ganho de causa ao Bispo.

  • Luiz Carlos 29/10/2007em12:37

    O Bispo, o papa etc, são tudo farinha do mesmo saco. A diferença é que a Igreja Católica é mais rica.