Êxito, todos sabem, é sinônimo de sucesso, triunfo. Não foi sempre assim. É ilustrativo – não só da vivacidade mutante das palavras, mas também do quanto há de relativo nos sucessos e fracassos – pensar que o seu sentido hoje dominante nasceu como forma reduzida de “bom êxito”. A princípio, êxito queria dizer apenas resultado, conseqüência, termo, sem qualificação. Designava o lugar ou estado a que se chega ao fim de determinado processo. O êxito podia – e ainda pode, pois não se trata de modo algum de uma acepção arcaica – ser bom ou mau, péssimo ou excelente, dependendo da situação.
A própria palavra sucesso, que de início designava apenas um fato, uma ocorrência, passou por processo semelhante. Que está longe de ser incomum: a qualidade está aí para provar. Em sua primeira acepção o termo é neutro, mas diz-se informalmente, o tempo todo, que algo é “de qualidade” – e ninguém tem a menor dúvida sobre o caráter elogioso da expressão.
No latim exitus, o sentido original é ainda mais estrito: a palavra significa saída ou ação de sair. A medicina antiga usava o termo preferencialmente para funções fisiológicas, para tratar das “fluxões que fazem êxito para fora do corpo por alguma parte dele”, nas palavras do “Vocabulário Português e Latino”, dicionário do início do século 18.
No próprio latim, o sentido de êxito se ampliou para abarcar as acepções de resultado, conseqüência, conclusão, termo, fim e – mais distante ainda do êxito como normalmente o concebemos – morte. Curiosamente, cabe ao inglês, onde exitus foi dar em exit, que se manteve colado à matriz latina com o sentido de saída, nos trazer de volta um pouco do espírito original do vocábulo. Artigos e livros especializados têm traduzido literalmente a expressão médica lethal exit, eufemismo para morte, como “êxito letal”.
Publicado na “Revista da Semana”, da Editora Abril, que após 93 edições está sendo – para usar um eufemismo corporativo semelhante ao êxito letal – “descontinuada”. Esta coluna é dedicada ao Fabio, ao Wagner e a toda a redação, que fizeram um belo trabalho. E vamos em frente.
10 Comentários
Sérgio,
Na Copa de 98, na França, alguns jogadores brasileiros ficaram muito impressionados com a simpatia da recepção dos franceses. É que ao desembaracar eles viram no aeroporto várias placas desejanto “sorte” e “êxito”.
Grande abraço.
Sérgio, sou leitor da Revista da Semana. A revista está sendo “descontinuada” que dizer que não vai ser mais publicada? É isso mesmo? É uma pena se for verdade…
Infelizmente é isso aí, Marcos. Também vou sentir falta dela – inclusive como leitor. Um abraço.
A palavra êxodo, então, não teria a mesma origem?
Abrçs,
Edson..
Como não faz muito verifiquei as duas palavras, posso adiantar que “êxodo” vem do grego “eksodos”, havendo mesmo uma forma latina “exodus”, com a mesma origem. Creio que o fato de a palavra grega ter “invadido” o latim e chegado às linguas neolatinas com forma pouco mudada deriva do fato de ter sido empregada na Septuaginta como tradução do nome de um dos livros do Velho Testamento. Agora, quanto uma raiz remota comum lá pelas bandas do indoeuropeu, deixo o esclarecimento por conta do Sérgio Rodrigues.
Caramba, uma das melhores colunas, e olha que a média é muito boa. A revista vai fazer falta, sim, mas a coluna vai fazer mais – se é que ela vai acabar de vez. Vai?
Sérgio,
Muitíssimo obrigado pela homenagem a nós, da Revista da Semana, mas sobretudo obrigado pelas 93 precisas, inteligentes e bonitas palavras que você nos entregou, e aos leitores, a cada sete dias. Tenho certeza que a Palavra da Semana sobreviverá alhures.
grande abraço
Fábio
Sérgio,
A revista pode até ser “descontinuada”, mas não há motivo pra coluna acabar junto, né? Ela podia continuar aqui no blog, não? Por favor… Diz que vai continuar… Apesar de ser meu primeiro comentário, eu adoro essa coluna, desde o No Mínimo… Por favor! POR FAVOR!
Edson, o Daltro mandou bem. As duas palavras têm em comum apenas o prefixo que significa “para ou de fora”, eks no grego e ex no latim.
Fabio, salve. Você acredita que usei o “descontinuado” antes de ler a Carta ao Leitor?
Diogo e Thaís, não sei se o formato será este, mas espero que a coluna encontre outro pouso na imprensa. Seja como for, e mesmo que a periodicidade fique incerta por enquanto, não há a menor chance de eu parar de falar de palavras – já é vício antigo. Obrigado pelo interesse e pela torcida.
Abraços a todos.
Sérgio, como assinante da Revista da Semana e admirador daquela publicação desde a edição de estreia, fiquei triste com o cancelamento. Mais ainda pelo fato de que a sua coluna – primeira página que eu lia ao receber a revista – se foi.
Costumo colaborar com publicações da Editora Abril. Uma delas, a Flashback, também foi descontinuada há quatro anos. Por isso, sei o que você deve estar sentindo. Pelo menos o Todoprosa está aí para que não fiquemos longe dos seus deliciosos, informativos e bem escritos textos.
A propósito, apesar de todas as boas qualidades da Revista da Semana, eram comuns – e ouso dizer que isso acontecia em toda edição – alguns erros de português. Você já deve ter comentado isso com os editores, imagino.
No penúltimo número, por exemplo, encontrei duas crases errada e constrangedoramente colocadas. E ainda havia um ou outro atentado às novas regras ortográficas, se bem que isso é até desculpável.
De qualquer forma, torço para que, um dia, a revista volte a circular. E que, quando isso acontecer, você esteja novamente assinando a já saudosa coluna sobre a palavra destacada da semana.