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FHC espanca Gilberto Freyre: homenagem é isso

04/08/2010

Quem esperava o tom reverente e meio anódino que é típico das homenagens festivas deve ter levado um susto com a palestra de Fernando Henrique Cardoso sobre Gilberto Freyre, a primeira da Flip 2010, encerrada há pouco. Ponto para a Flip. “É muito fácil estraçalhar Gilberto Freyre”, disse o ex-presidente da República na mesa intitulada “Casa grande & senzala”, ao lado do quase mudo historiador Luiz Felipe de Alencastro.

Falando de improviso, sem consultar em momento algum o calhamaço que tinha nas mãos e que disse ter escrito para a ocasião, FHC chamou o sociólogo pernambucano de racista, contraditório, conservador, pouco rigoroso como cientista social – “muitas vezes ele nem conclui o raciocínio, se perde, e você continua a ler porque ele escreve muito bem e o leva no embalo” – e defensor imperdoável do colonialismo português em plena vigência do regime salazarista. Passou perto de dizer que seria melhor a organização do evento ter homenageado Sérgio Buarque de Hollanda, autor de “Raízes do Brasil”, contemporâneo de Freyre. De toda forma, deixou o pai do Chico como sugestão para o futuro.

Isso lá é homenagem? Por incrível que pareça, é, pela razão simples de que ideias que não provocam controvérsia são ideias mortas. E Gilberto Freyre era um homem de ideias. Quem conhece um pouco da trajetória dos dois sociólogos não se surpreendeu. Fernando Henrique lembrou ter sido discípulo de Florestan Fernandes, fundador da chamada “escola paulista de sociologia”, cujos membros, nos anos 1950, costumavam desprezar Freyre como um simples ensaísta enquanto eles próprios gostavam de se ver como cientistas. “Usávamos até bata branca”, disse FHC, arrancando risos da plateia. Essa oposição de origem, ao lado da disposição de não abrandar as críticas em nome do bom-tom, acabou por valorizar a palestra.

FHC situou Freyre no ambiente intelectual brasileiro dos anos 1930, simbolizado pelo pensamento “autoritário e arianizante”de Oliveira Vianna, para apontar o caráter progressista de seu clássico “Casa grande & senzala”, de 1933. O elogio da mestiçagem, que mais tarde passaria a ser encarado como mascarador de conflitos, era então francamente libertador. “Ele não esconde a violência contra os indígenas, principalmente a cometida pelos jesuítas, nem esconde a violência dos senhores contra os escravos. A mensagem dele é de amor ao patriarcalismo, sim, mas não é racista. Não se pode dizer que ele justificava a raça como critério.” A expressão “democracia racial”, pela qual Freyre foi mais atacado, não aparece em “Casa grande & senzala”, lembrou o palestrante. E concluiu:

“Por que ele permanece? Porque escreve muito bem, porque rompeu com o autoritarismo da época, rompeu com o racismo e criou esse mito do equilibrio de contrários para explicar o Brasil. É como uma dialética que não tem síntese, uma oposição binária permanente. Mas é um mito que tem grande valor explicativo, porque Gilberto Freyre o usa para falar do concreto, das pessoas, das relações familiares. Lendo, você aprende muita coisa sobre o Brasil. É fantasioso, mas nos ajuda a entender e a projetar o futuro.”

Outro ponto positivo: não se falou uma única palavra sobre política partidária. Começou bem a Flip.

31 Comentários

  • pedro curiango 05/08/2010em01:03

    Há MUITOS anos ouvi dizer que os escritores consideravam Gilberto Freyre um grande sociólogo e os sociólogos diziam que ele era um grande escritor…

  • Rodrigo 05/08/2010em01:29

    “FHC chamou o sociólogo pernambucano de racista, contraditório, conservador, pouco rigoroso como cientista social”

    Aposto que pro graaande FHC o “conservador” foi o termo mais ofensivo usado por ele.

    Quando sera que algum intelectual de verdade vai ser convidado pra FLIP? Chega de Hitchens, FHCs, Chicos Buarques…

  • elias candido 05/08/2010em02:41

    por que sua opinião é contrário aos demais meios de comunicação e a fala do próprio ex presidente? eu toh louco ou vc??? segue um link, pra esclarecimento.
    http://entretenimento.uol.com.br/flip/ultimas-noticias/2010/08/04/na-abertura-da-flip-fhc-faz-o-elogio-das-contradicoes-de-gilberto-freyre.jhtm

  • beaujolais 05/08/2010em04:20

    Quantos séculos seriam necessários para o nosso presidente preparar-se para falar sobre o Sergio Buarque de Holanda? Teria ele capacidade para isso? Atenção, não confundir presidentes: estou falando do Inácio!

  • ney 05/08/2010em07:27

    Capacitação é fundamental, qualidade que nos dá saudade no cargo máximo da nação. O FHC expondo com esta desenvoltura e conhecimento, impõe o quanto deve se respeitar a qualificação, nos mostra porque este país tem urgência em priorizar para valer nossa educação. Além de assegurar o futuro do Brasil, teremos um povo capacitado e nunca mais veremos um analfabeto como presidente.

  • Ygor Valeriano Cardoso 05/08/2010em07:42

    Fernando Henrique em seu comentário traça um perfil de Gilberto Freire nem sempre condizente com a trajetoria do eminente sociologo e historiador pernambucano que rompeu com uma historigrafia marcada pela luta de classes, Freire nunca foi reacionário como enfatizou Fernando Henrique, ainda empreguinado por velhos conceitos esquerdizantes.

  • Karlos Santos 05/08/2010em07:53

    O que esperar deste esquerdista? Ele odeia qualquer um que diga que o Brasil não é um país de racistas. FHC foi um dos responsáveis pela importação do racismo americano para nossas plagas. Freire ficará na história como intelectual, FHC nem tanto. FHC passa…

  • Ventania 05/08/2010em08:13

    E sobre ele mesmo ? Não falou nada ? O sociólogo que foi presidente da República, ao invés de se preocupar com a pobreza do Brasil, implantou o NEOLIBERALISMO, onde os ricos ficaram mais ricos e a pobreza se alastrou e o Brasil foi à falência com um dívida enorme junto ao FMI e as pricipais empresas estatais brasileiras privatizadas a preço de banana.
    Precisou um operário sindicalista para arrumar a casa e colocar o Brasil entre as dez maiores economias mundiais.

  • Sérgio 05/08/2010em08:43

    Esse senhor faz um trabalho sociológico agressivo, iconoclasta… Aparenta nada saber da realidade dos lusodescendentes nordestinos, de como lutaram para amalgamarem-se à realidade social, incluindo o próprio Freyre.

  • Noga Sklar 05/08/2010em08:44

    Saudades da inteligência no poder, fala sério.

  • Julio Mad 05/08/2010em08:54

    FHC é outro nível. Pena que o Brasil de hoje esteja nivelado por Lula, Dilma e tantos outros aloprados. Será um atraso que irá demorar para ser recuperado.

  • Cesar 05/08/2010em09:44

    é isso k dá convidar este canalha.
    Mais respeito pela obra do Gilberto Freire !!!

  • ricardo 05/08/2010em10:17

    mas havia uns petralhas com faixas contra o sr fernando henrique.

  • Fábio 05/08/2010em10:25

    hum..acho interessante comparar esse post do Sérgio com a matéria escrita no Globo de hoje, sobre a mesma palestra proferida ontem pelo FHC…segundo O Globo ele havia adotado uma postura mais conciliadora e tal…enfim..fico pensando um pesquisador que, daqui há 20 anos talvez só tenha acesso ao jornal fotocopiado em alguma biblioteca e não poderá ouvir outras versões, como essa ( ou poderá?)..e mais, fico pensando nos pesquisadores de hoje, que consultam acervos de jornais., o que eles estão perdendo? seique isso faz parte, nao tem mto como fugir..mas é sempre bom lembrar..

  • Carlos 05/08/2010em10:37

    Quando Profissionais cultos, inteligentes, sabios, experientes e competentes em suas áreas de especialização se encontram, pode haver o que ocorreu com FHC,falando de Gilberto Freyre.
    Pontos de vista diferentes, sendo debatidos de forma ordeira, educada, criteriosa, prevalecendo sempre o bom senso e o respeito.
    É ass im a vida. Caso não fosse e ficassemos somente em uma possibilidade, um único ponto de vista, um argumento só, a vida, no planeta terra, não teria chegado onde chegou.
    Onde milhares de descobertas, invenções, mudanças de fatos e opiniões.
    Cada dia surgem novas hipoteses, novas analises, novas descobertas.
    Precisamos fazer com que TUDO, em nosso país seja assim.
    Coversar, trocar ideias, aceitar, compreender, entender, mudar. Isso faz o ser humano crescer intelectualmente e espiritualmente.
    TER UMA ÚNICA MANIFESTAÇÃO E DECISÃO. ISSO É COISA DE DITADURA, COMUNISMO, AUTORITARISMO E ISSO NÃO TEM MAIS ESPAÇO NESSE SÉCULO , NESSE MILÊNIO.

  • Ana Cristina 05/08/2010em10:39

    Fernando Henrique nos presenteia, como sempre, seus comentários claros,inteligentes e corajosos. Gostei!

  • Bastardo Inglório 05/08/2010em11:45

    O Mulla deve estar pensando “mas por causo de que que tão discutino o senadô Gilberto Freyre, em vez de falar ni mim?”.

  • Carlos S 05/08/2010em12:15

    A vaidade embaça , e muito, a capacidade de interpretar o valor e a inteligência dos outros na sua devida dimensão. FHC levou até um calhamaço para impressionar o público presente,mas, como bom ator, dispensou-o, como bem o recomendavam as circunstâncias. Afinal, não ficava bem a um intelectual “ler”um texto diante de uma platéia ávida por interpretações recheadas de frases de efeito.
    O que conhece FHC da vida nordestina que ocorreu no início do século passado ? Que vivência íntima tem ele com a realidade dura e complexa que foi o chão que Freire palmilhou e pesquisou?
    É óbvio que algumas críticas caberiam em sua exposição, mas não no nível em que foram colocadas pelo ilustre representante da “escola paulista de sociologia” . Uma pena !

  • Cebolinha - São Paulo 05/08/2010em12:23

    Os tempos mudaram.
    No princípio era a FIESP que manda no Brasil, junto obviamente com a casta dos militares; a indústria nacional sofreu décadas com esta proteção imbecil.
    Depois a grande imprensa sempre apoiando a “direita burra” que não adimitia/admite que pobre, preto e puta têm direitos iguais a qualquer cidadão que por méritos consegue fazer MBA em Warthon, MIT, Harward, etc..
    Pairou no ar um certo medo, apreensão pelo que poderia fazer um cidadão analfabeto, sem dedo, vindo das caatingas do nordeste.
    Apostarem nele, foi como se todas fichas fossem lançadas e rezas e mais rezas foram feitas para derrubá-lo, golpes baixos de toda a sorte.
    Bem, hoje este país não é nenhuma maravilha, mas respira, olha para o alto e sente que algo está mudando, que pobre já come alguma coisa, que preto tem direitos também, que escola/faculdade existe para que todos tenham oportunidades.
    A pobreza está diminuindo e a dispensa anda cheia de arroz, feijão, farinha, óleo, açúcar, sal…e de vez em quando um iogurtizinho…
    afinal ninguém é de ferro !!! abs

  • Herlon Farias 05/08/2010em12:52

    Esse cidadão é um frustrado, apesar de ser sociologo sempre trabalhou para as elites e não aceita o fato de não ser reconhecido como intelectual em seu proprio pais, é tão negativo, que nem os aliados querem aparecer publicamente ao seu lado. Toda vez que escreve um artigo ou se envolve em alguma discursão ataca todo mundo tentando ganhar notoriedade e vive isntigando a imprensa pra ver se alguém lembra dele. É um verme.

  • diego almeida 05/08/2010em14:05

    A escola paulista de sociologia produziu um lixo e uma hegemonia anêmica e desidratada. Viva Freyre e o calor de seus escritos!Abaixo a paulistada!

  • Ana Maria 05/08/2010em14:27

    Pelo visto, escrever um post sobre o Fernando Henrique Cardoso é garantia de muitos acessos e comentários. Gente que nunca vi por aqui surge do nada. Especialmente pra descer o malho no ex-presidente.
    Ótimo texto, como sempre.

  • Marcio FLA Brasilia 05/08/2010em14:39

    É sempre um prazer ler um pensador em ação. FHC é um grande intelectual e tem uma obra extremamente consistente e tem toda a relevância intelectual para contestar idéias.
    Impressionante, pois o Casa Grande e Senzala ainda é lido como obra de referência para entender o país. Bom, a considerar-se que Marx ainda é lido aqui como se fosse a bíblia da esquerda, entende-se o atraso atávico do Brasil.

  • Joao da Silva 05/08/2010em14:52

    A dispensa esta cheia de arroz, sal e feijao… Mas ainda o povo continua ignorante, sem escola e educaçao iguais aos paises mas desenvolvidos socialmente. Lamentaveis os argumentos dos defensores do lula, eles provam que realmente estamos perdido!

  • PASCOAL 05/08/2010em14:53

    PODE TER CERTEZA, GILBERTO FREIRE É DE MAIS FÁCIL ENTENDIMENTO DO QUE O GAGO E FHC, QUE AGORA DEVERIA MELHOR CUIDAR DE SEU NOVO FILHO AO INVÉS DE FALAR INCOMPREENSÍVEIS BOBAGENS!!

  • Eduardo (BH) 05/08/2010em15:02

    Não acompanhei o FLIP, mas pelo que está escrito acima, FHC esqueceu de tomar os remédios…

  • Aristóteles 05/08/2010em15:42

    FHC é um fracassado como presidente e negou em uma entrevista a Abril que não mandou esquecer os livros que escreveu.Daí, tiremos nossas próprias conclusões sobre este personagem.Na vida pessoal fazia dona Rute chorar e dizia que era culpa da oposição e jornalistas amigos passava a indignação para os leitores.Quer saber, este nunca assumiu nada a não ser 18 anos depois do ocorrido.

  • Carlos 09/08/2010em19:48

    FHC é um sub-intelectual de quinta categoria. Ele não tem como cobrar postura científica de ninguém, tendo sindo doutrinado por Florestan Fernandes, que achava Ho-Chi Min e Fidel Castro grandes pensadores políticos.Os conceitos de FHC sobre o papel econômico da escravidão foram cabalmente refutados pela moderna historiografia econômica, e perto da diarréica teoria da dependência até os mais idiossincráticos delírios de Freyre sobre o cafuné podem ser considerados ciência pura e exata.

  • Marcelo 11/08/2010em15:25

    os colegas estão politizando a discussão e acham que o LULA tem mais “autoridade” no assunto..

  • Georgino Melo e Silva 27/08/2010em19:18

    “ninguém escreveu em português
    no brasileiro de sua língua:
    esse à vontade que é da rede,
    dos alpendres, da alma mestiça,
    medindo sua prosa de sesta,
    ou prosa de quem se spreguiça.” (Joâo Cabral de Melo Neto).

  • Gustavo 25/12/2010em20:20

    Essa corja USPIANA não tem jeito, hã.