Será que a cena do poeta gaúcho Fabricio Carpinejar recitando entre berros, sussurros e gargalhadas de vilão de filme B o poema “Confidência do itabirano”, de Carlos Drummond de Andrade, enquanto caminhava entre as cadeiras no auditório da Tenda dos Autores, ficará na história como o momento mais explosivo e transgressor da Flip 2012, um evento de resto bem comportado e até morno (leia o balanço do blog vizinho Veja Meus Livros)? Ou será lembrada, a tal cena, apenas como um momento constrangedor, equivocado, desrespeitoso com o homenageado?
Não é fácil escolher uma resposta. A favor da primeira existe o argumento de que só pode fazer bem à arte, inimiga do saber institucionalizado, o tratamento dessacralizante dispensado a um poeta tão consagrado que já virou estátua – e uma réplica da que mora na orla do Rio de Janeiro podia ser encontrada durante a Flip em frente à casa alugada pela Companhia das Letras em Paraty, sem dúvida a atração mais fotografada de todo o evento. O princípio modernista da iconoclastia justificaria assim a performance histriônica do gaúcho gauche, tão mais necessária quanto mais respeitosas e até solenes tiverem sido – como foram – as demais leituras de poemas drummondianos feitas por convidados da Flip antes do início de cada mesa, uma bem-vinda inovação desta décima edição.
Tudo bem mas, como a verdade poética pode estar tanto na coisa quanto em seu contrário, não há como descartar o que a cena teve de canastroso, gratuito e até desesperado no afã com que se lançou à disputa da mercadoria mais arisca na superpovoada (de autores) e desprestigiada (pelos leitores) literatura contemporânea: atenção. Já não basta ao poeta dizer com aquela sobriedade tímida de Carlos, confiante na força das palavras, que “Itabira é apenas uma fotografia na parede,/ Mas como dói!”. É preciso esgoelar a mensagem, teatralizá-la, reencená-la como farsa – exatamente como faz a própria Flip ao montar todo ano um circo midiático de luzes estroboscópicas para vender aquilo que, o resto do tempo, fica pegando pó em prateleiras que só uns poucos aficionados de carteirinha insistem em vasculhar.
14 Comentários
Ler um poema aos berros pode ser uma transgressão, dependendo da alma, da fruta e da essência da poesia. Drummond é um poeta de oratória sim, mais não creio que sua poesia deva ser lida aos berros e aos gritos como me parece que esse gaúcho (que com toda verdade nem deva saber o que é poesia) fez. TALVEZ APELO, um ótimo poema dedicado a Nara Leão fosse o tipo adequado para se ler aos gritos (um poema da época ditatorial que estavam0, mais não CONFISSÕES DE UM ITABIRANO.
G.A.L
Gabriel de Ataíde Lima, poeta e contistas de Adamantina.
Demorou, mas alguém teve coragem de falar do triste e canastrésimo papel que o Carpinejar assumiu. Alguém precisa dizer a ele que Elton John só tem um. E canta. E compóe. E É REALMENTE artista. VERGONHA ALHEIA. Vergonha de ver o Rio Grande do Sul ser ridicularizado desta forma. A terra que produziu Mario Quintana e Simões Lopes Neto não merece isso.
Pelo que li aqui, só faltou o sujeito baixar as calças e cagar na frente de todos para chamar a atenção…
É isso aí, Sérgio. A FLIP já deu. Tem duas alternativas: ser como Pelé e parar no auge (deixando saudades) ou continuar feito Ronaldinho, constrangendo todo mundo, inclusive a si mesma.
Um poeta sofre três vezes: primeiro quando ele os sente, depois quando ele os escreve e, por último, quando declamam os seus versos. (Mario Quintana)
Que coisa mais cafona. Vanguarda é só pra quem pode…
Talvez eu seja apenas uma inculta, mas na minha opinião Drummond deve ser apreciado em leitura silenciosa. É tamanho seu vulto que gritos não alcançam, o Silêncio sim.
Sérgio,
Primeiro: o gaúcho gauche está sendo comentado aqui, não está? Surtiria o mesmo resultado uma leitura comportada do referido poema?, ou seria só mais uma, e nem a melhor, entre tantas, caindo no esquecimento tão logo concluída?
Longe de defender ou justificar o histrionismo do recitador (!), que considero inconveniente, desrespeitoso e outros tantos adjetivos similares, só posso crer que na mente que ele carrega sobre os ombros vai um bom bocado de bobagem – além da óbvia necessidade de aparecer. Pois bem: conseguiu seus minutos de fama.
A continuar assim, daqui a algumas edições veremos cenas como as previstas pelo nosso amigo “chato de plantão” (abaixo) – concorrência da escatologia em exaltação à poesia (ou a um ego necessitado de atenção).
Mas os que vão à FLIP fazem parte desses aficionados!
toda a crítica que se ampara em estereótipos, ou mostra a inconsistência do argumentador ou mostra a incosistência e o preconceito do argumentador.
se Carpinejar fez ou não papel de palhaço pouco importa, já que é um autor sem relevância, mas por que o tão igualmente relevante Sérgio Rodrigues amparou sua crítica no gentílico “gaúcho”? isso fala mais de Carpinejar ou da mágoa incontida de Rodrigues?
ser gaúcho não é ser Carpinejar. ser gaúcho é ter nascido numa latitude e longitude determinada para efeito de localizção.
todo resto é estereótipo e preconceito, argumento ideal para maus autores. nascidos no Rio Grande do Sul ou na terra dos incompetentes.
Inacreditável, Eduardo. Espero que você esteja apenas num mau dia para cometer comentário tão grotesco.
Eu já disse o que acho sobre isso,estava lá, e senti vergonha alheia. “Longe de defender ou justificar o histrionismo do recitador (!), que considero inconveniente, desrespeitoso e outros tantos adjetivos similares, só posso crer que na mente que ele carrega sobre os ombros vai um bom bocado de bobagem – além da óbvia necessidade de aparecer. Pois bem: conseguiu seus minutos de fama.” Foi exatamente isso. Mas discordo de um leitor que disse que a Flip já deu. Foi muito bom poder ouvir vários escritores fantásticos. Sim, o tal do Carpinejar tentou transformar a Flip em um show cafona da off strip em Las Vegas, sim gostaria de ter ouvido Jackie Kay falar um pouco mais… Porém, em geral, foi ótima a Flip!!!
sem comentários, ambos: fabrício e sérgio!!!
Roubam-nos no futebol; atacam-nos na poesia.