O escritor americano Jonathan Franzen, uma das principais estrelas da Flip 2012, divertiu e intrigou o público em igual medida na mesa encerrada agora há pouco. Com uma mistura peculiar de respostas espirituosas, piadinhas sem graça, longos silêncios aparentemente dedicados à reflexão antes de emitir um simples sim ou não, tudo isso somado a um profundo desajeitamento corporal de nerd de anedota, Franzen conversou com o mediador Angel Gurría-Quintana e respondeu também às perguntas do público. Soou sincero, apesar de parecer caprichar na pose de esquisitão, ao admitir, por exemplo, que vivia com seu amigo David Foster Wallace uma relação extremamente competitiva. Mas deixou claro que nada o empolgou tanto em sua visita ao Brasil quanto o fato de ter observado pássaros. O elogio que fez à região de Paraty por sua riqueza ornitológica foi o momento mais empolgado da noite. Abaixo, uma seleção de suas falas propriamente literárias (as perguntas vão resumidas).
Todas as famílias felizes se parecem, como disse Tolstoi?
“Tolstoi estava dizendo algo bastante óbvio, que se está tudo certo com uma pessoa, por que você leria sobre elas? Nós exageramos tudo. Para uma pessoa que escreve romances, a vida comum não é interessante o suficiente. Você precisa se apartar dela e viver num mundo exagerado. Meus pais foram excelentes para mim, embora meu irmão talvez não concorde. Meus pais não eram tão infelizes, mas houve anos ruins, e o que o romancista faz é exagerar os anos ruins.”
“Liberdade”é resposta a 11 de setembro?
“Não. Eu ficava querendo que aquilo desaparecesse. Não foi um ataque terrorista, foi um ataque de mídia e um ataque político com base num ato terrorista. Diziam-nos a cada cinco minutos que o país tinha mudado para sempre. Depois de seis semanas, eu estava cheio, mas aquilo continuou. Tenho essa birra com a politização e a midiatização do 11 de setembro. Espero que estejamos vivendo o pós-11 de setembro. O contraste entre o que aconteceu depois de Pearl Harbor e o que aconteceu depois do 11 de setembro não é lisonjeiro para os tempos de hoje. Meu personagem preferido no livro é o do jovem republicano. Eu precisava imaginar como seria ser brilhante e simpático e legal e, ao mesmo tempo, ser republicano, e por muito tempo não consegui. Estava com raiva demais para isso.”
Em 1996, você criticou o ambiente literário americano num ensaio raivoso, dizendo que escritores como James Joyce jamais seriam capa da revista “Time” nos dias de hoje, que esse lugar agora estava reservado a Stephen King. Ano passado, você virou capa da “Time”. Como se sente? Mudou de ideia?
“Há duas semanas fui jantar com um amigo em Nova York. Uma pessoa se levantou da mesa ao lado e veio me perguntar: ‘Desculpe, você é Stephen King?’ O que aconteceu foi que os escritores que vendiam tiragens medianas, que eram muitos nos anos 1960, desapareceram por completo nos EUA. Agora existem apenas superastros, astros e zé-ninguéns. Na época desse ensaio, eu me sentia um zé-ninguém, então andava meio ressentido com as outras duas categorias. Mas ainda é esse o caminho das coisas. As grandes corporações querem assinar contrato com John Grisham e perguntam: quem é essa Lispector? E esse Kafka, e esse Joyce? Vendem abaixo de três mil exemplares, livrem-se deles! Ainda é assim, cada vez mais. O que aconteceu é que agora estou do outro lado, mas continuo me sentindo culturalmente excluído, se é que isso faz algum sentido.”
Já pensou em desistir de escrever?
“Não nos últimos nove dias. Bem, talvez 48 horas.”
Um comentário
Sérgio
Sou brasileiro, mas estou nos EUA.
Um dia, peguei o metrô em San Francisco e sentei ao lado de um sujeito que era a cara do Renato Russo.
Pensei em perguntar qualquer coisa, lembrei que o Renato já tinha vivido alguns meses aqui, mas chegou a minha parada e ficou por isso mesmo.
Mais tarde, voltei pra casa com uma ideia de livro na cabeça: um jornalista brasileiro chega a SF, vai a uma festa e descobre que Renato está vivo e morando aqui.
O resultado é “O que Foi Escondido”, uma mistura de história de detetive, cultura pop e guia de viagem/sobrevivência, que eu estou lançando como eBook na Amazon.
Há também uma versão em inglês em que, ao invés do Renato, ele procura a Amy Winehouse. O título é “Ain´t Miss Beehive”.