As atrocidades que nomeia são mais velhas que a Bíblia, mas a palavra genocídio – extermínio deliberado, total ou parcial, de um grupo étnico, nacional ou religioso – tem apenas 64 anos. Quase a mesma idade de Radovan Karadzic, o ex-líder servo-bósnio que, preso esta semana em Belgrado, aguarda extradição para responder a processo no Tribunal Penal Internacional para a Antiga Iugoslávia, em Haia. Entre as acusações que Karadzic enfrentará, por crimes de guerra cometidos contra os muçulmanos bósnios no conflito dos Bálcãs nos anos 1990, a de genocídio diz respeito a um crime que ainda não existia no direito internacional em 1945, quando ele nasceu.
A palavra acabara de surgir. Um ano antes, o advogado polonês de origem judaica Raphael Lemkin tinha publicado nos EUA um livro sobre a ocupação nazista na Europa em que punha por escrito pela primeira vez um termo cunhado por ele mesmo com elementos do grego (génos, “tronco, raça”, da família de gênese e gente) e do latim (cidium, “ação de matar”). A mesma obra propunha uma definição de genocídio que abrangia não só a perseguição física mas também a cultural, a moral etc.
Como costuma ocorrer, a realidade tinha se antecipado à linguagem. Em 1944, diante da anunciada derrota do Eixo na Segunda Guerra Mundial, a máquina de extermínio nazista fazia hora extra para dar números finais – 6 milhões de mortos – ao Holocausto. Mas o estudo de Lemkin também levava em conta o massacre de um milhão de armênios pelo governo turco durante a Primeira Guerra.
As idéias do advogado polonês serviram de base para o julgamento de criminosos nazistas no Tribunal de Nuremberg, instaurado em 1945. No entanto, só em 1948 a ONU aprovou a convenção que fixava uma definição de genocídio – restrita às perseguições físicas, aquém do que preconizava Lemkin – e sua punição.
Publicado na “Revista da Semana”.
2 Comentários
Esse silêncio eloquente parece indicar a inexistência de uma palavra que reproduza todo o horror causado pelo genocídio.
E aí veio você logo com dezoito…rs