Metade da Turquia comemorou o Nobel de Orhan Pamuk, enquanto a outra metade ficou arrasada com a consagração internacional de um sujeito que é considerado traidor da pátria – leia mais sobre as reações, em inglês, aqui. Parece saído de um livro de Pamuk esse embate de consciências irreconciliáveis num país que, até por razões geográficas, para não mencionar as históricas, se estica sobre o abismo entre Ocidente e Oriente.
O problema – para todo mundo, claro, mas primeiro e principalmente para quem tem um pé de cada lado – é que o abismo está se alargando nestes nossos “tempos catastróficos”, como anotou Margaret Atwood num emocionado artigo para o jornal inglês “The Guardian”. A escritora canadense afirma não conceber hoje, por essa razão, um Nobel de literatura mais importante do que Orhan Pamuk.
Tudo isso me fez pensar na recente polêmica provocada por um acadêmico iraniano radicado nos EUA, Hamid Dabashi, professor de literatura da Universidade de Colúmbia, ao atacar com violência a escritora Azar Nafisi, autora do best-seller “Lendo Lolita em Teerã” (editora Girafa, 2004). O livro trata, a seu modo, do mesmo choque cultural que alimenta a obra de Pamuk. Escreveu Dabashi:
“Lendo Lolita em Teerã” é reminiscente dos mais pestíferos projetos coloniais dos britânicos na Índia, quando, por exemplo, em 1835 um funcionário colonial como Thomas Macaulay declarou: “Precisamos fazer tudo o que pudermos para formar uma classe que aja como intérprete entre nós e os milhões que governamos, uma classe de pessoas indianas no sangue e na cor, mas inglesas no gosto, em opiniões, palavras e intelecto”. Azar Nafisi é a personificação daquele informante nativo e agente colonial, a serviço da versão americana do mesmíssimo projeto.
Numa entrevista posterior, o acadêmico escancarou a grosseria e comparou a autora àquela americana flagrada torturando prisioneiros em Abu Ghraib: “Para mim, não há nenhuma diferença entre Lynndie England e Azar Nafisi”, disse. A história dessa triste polêmica é contada, em inglês, neste artigo de “The Chronicle of Higher Education”.
Sou obrigado a concordar com dona Atwood: são tempos catastróficos esses em que traduzir uma cultura para a outra, tarefa indispensável à civilidade, à inteligência e à própria sobrevivência da espécie, vira traição.
12 Comentários
É uma pena mesmo, até pq o caso da soldada americana está mais pra perversão sádica e humilhação…
Sérgio,
lá está, muito bem assentado e certamente muito bem pago na “ocidental”, “imperialista” e “colonialista” Columbia, o senhor acadêmico Hamid Dabashi a dizer barbaridades só posssíveis num país democrático como os Estados Unidos.
…”traduzir uma cultura para a outra” Parece que o sr. Sergio Rodrigues está dando palpites sobre um livro que sequer leu. Está lá, do começo ao fim toda a baixeza, manipulação e arrogância de uma representande do império colonialista, tal e qual o sr.Ramid Dabashi expôs.
Alceu, li o suficiente do livro, e sobre o livro, para saber que ele não me interessa muito. Não é esse o ponto. “Lendo Lolita em Teerã” é o desabafo de uma mulher que repudia o fundamentalismo dos aiatolás, sem dúvida – e, tratando-se de uma mulher, não lhe faltam excelentes razões. Daí a transformá-la em “representante do império colonialista” – bem, lamento que sua mensagem seja um caso típico de “como queríamos demonstrar”.
Raquel, essa liberdade não foi inventada nem é privilégio dos Estados Unidos, certo? Mais da metade do mundo ocidental – incluindo o Brasil – tem essa liberdade de opinião. Felizmente.
“, li o suficiente do livro, e sobre o livro, para saber que ele não me interessa muito.”
Profissional é profissional.
Alceu,
Aprenda…
…com algumas décadas de treino um dia vc chega lá.
Clarice, não estou aqui pra defender o anônimo, nem concordo com ele, nem li o livro; Só penso que o profissionalismo que tu fala é exercido na divergência, que deve dar gosto ao dono do Blog faze-lo.
vinicius,
Por que existem estes “anônimos” em tudo o que é blog? Já reparou que tem sempre alguém que não tem coragem de assumir um nick qualquer e comenta com vários codinomes?
Para elogiar têm um nick. Para provocar a covardia aparece.
Irk!!
Daniel Brazil,
sim vários países tem esta liberdade, coloquei os Estados Unidos por ser o país onde vive este senhor. Falando em Brasil ou seria Brazil como o seu sobrenome? é preciso ficar atento: podemos ser condenados por crime contra honra, não importando se falamos a verdade ou não. Um grande passo para barrar a liberdade, pois não?
? Cap. V, Título I da Parte Especial do Código Penal Brasileiro trata “Dos Crimes Contra a Honra” .
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