Bem, vocês que são jovens corajosos, abram o ‘Grande sertão’ e leiam as 565 páginas. Isso para mim é um ato de coragem, ler ‘O jogo da amarelinha’, do Cortázar. Leia ‘Guerra e paz’. É um ato de coragem, transgressor, vai fazer bem para a sua vida, para a sua alma, para as conversas com a namorada. É um assunto e tanto. Já pensou, ‘Guerra e paz’? Três anos de conversa. Poucos momentos de silêncio e tédio. Chega o tédio, você fala: “tem uma cena no Grande sertão…”. É um casamento, uma vida inteira. Quando ele entra nas veredas mortas… sabe por que veredas mortas? Porque alguma coisa vai acontecer. É um lugar sombrio, obscuro. Conta isso para ela.
Milton Hatoum, autor de “Dois irmãos” e “Cinzas do Norte”, saiu-se com a excelente tirada acima em seu bate-papo público na série de encontros Um escritor na Biblioteca, organizada pela Biblioteca Pública do Paraná, transcrita e publicada pelo jornal “Cândido”.
Tocou num ponto nevrálgico que as campanhas pró-leitura, em geral chatíssimas, costumam deixar de lado por pudor ou caretice: o fato de que, em sua fase de formação, todo leitor é um aventureiro movido pela libido – nem mais nem menos do que fãs de rock ou surfe, cosplay ou academias de ginástica.
O fato de se dar por meio da ficção literária não torna o processo de construção de uma subjetividade e de uma identidade social menos ligado à sensualidade, ao desejo, à vontade de impressionar e seduzir. O que é de uma obviedade solar, mas frequentemente ignorado pelo antiintelectualismo que domina a sociedade brasileira.
Para formar um bom leitor, bastam dois itens: educação de qualidade – para acabar com o calamitoso analfabetismo funcional que atrofia o país – e uma paixonite adolescente pela Maga ou por Mandrake, ao gosto do freguês. O resto vai no embalo.
11 Comentários
Concordo. Será que lendo isto aqui esse pessoal desperta?
Perfeito. Mas o fato é: poucos entenderão.
é muito dificil convencer alguém a gostar de ler, apesar do que disse o Milton, eu nunca peguei ninguém falando de Literatura ou dos livros que li, há dois tipos de garotas neste caso: as que não entendem, não gostam e acham chato e as que entendem gostam e acham chato alguém falar sobre isso que não seja elas.
E pensar que eu estava presente nesse evento. Foi excelente, muito melhor do que a “oficina” que o escritor ofertou já em 2012.
Para complementar o seu título, faço minhas as palavras da velhinha numa cena famosa de Harry & Sally: “Eu vou querer o mesmo que ele.”
E o quiko??
Mas vcs andam pegando umas garotas bem burras ou bem chatas, não?
Pena que os livros dele não dão tanto assunto.
Tivemos somente um Machado de Assis, talvez o mais libidinoso de nossos escritores. Acredito que a libido transmutou-se em transgressão já na década de 40, seguindo a linha Genet (sexo & drugs) que nos levou ao ‘beat’. A atual geração de ‘garotos excel’ e ‘coroas power point’ não parece ter tempo para isso.
Concordo com o Ataliba quando diz que: “há dois tipos de garotas neste caso: as que não entendem, não gostam e acham chato e as que entendem gostam e acham chato alguém falar sobre isso que não seja elas”. Muito bom o post, pena é não ler aqueles que tem o poder de mudar a educação nos termos propostos.
por favor, poderia me informar o que é maga e mandrake? vu utilizar esse texto em um trabalho e preciso saber o significado
Leticia, a Maga é a principal personagem feminina do romance “O jogo da amarelinha”, do escritor argentino Julio Cortazar. Mandrake é um advogado-detetive que protagoniza algumas histórias do brasileiro Rubem Fonseca. Boa sorte no trabalho.