Na morna mesa de abertura da Flip 2011, hoje à noite, o crítico literário e ensaísta Antonio Candido, 93 anos, não foi nem crítico nem ensaísta ao falar de Oswald de Andrade, o escritor homenageado da festa este ano. Foi memorialista, contando casos para ilustrar a personalidade marcante do poeta e provocador cultural modernista. “Hoje eu sou um sobrevivente”, disse. “Só eu posso falar como era Oswald de Andrade.”
Coube a José Miguel Wisnik, que dividiu a mesa com Candido, abordar o legado de Oswald, sintetizado no “Manifesto antropófago”, e tentar dar sustentação à tese de que, além de ter influenciado movimentos artísticos como o concretismo e a tropicália, ele permanece atual no século 21.
Candido pintou o retrato de um Oswald brigão mas generoso, sarcástico mas de candura infantil, agressivo mas carente de carinho, que gostava de “brigar e desbrigar, xingar e elogiar”, e que jamais guardava rancor. Uma personalidade tão forte e tão propícia à criação de lendas – como a de que tinha um filho chamado Lança-Perfume, à qual muita gente dava crédito – que, acredita Candido, acabou por prejudicar a recepção de sua obra. “Era muito difícil encontrar um livro dele para comprar”, disse o crítico.
Wisnik destacou o maior mal-entendido que cerca a antropofagia oswaldiana, o de que ele pregava a deglutição de todas as influências estrangeiras. “A antropofagia é seletiva”, afirmou. E arrancou exclamações de pasmo da plateia ao citar duas tiradas de Oswald que ganham ressonância no presente: a de que haveria no mundo um certo “anel equatorial” onde “o Brasil acorda, assim como a China, a Índia e a África”; e o aviso de direito autoral liberado que ele pespegou nos anos 1930 em “Serafim Ponte Grande”, dizendo que o livro poderia ser livremente “traduzido e deformado” em qualquer língua.
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