O escritor americano de ficção científica John Scalzi diz que “O apanhador no campo de centeio”, de J.D. Salinger, é seu livro superestimado de eleição. Chama o narrador, Holden Caulfield, de insufferable twit – acho que “paspalhão insuportável” é uma tradução decente.
E daí? Bom, para saber se Scalzi tem alguma dose de razão eu teria que reler o livro de Salinger, que muito apreciei uns vinte anos atrás, mas confesso que poucas coisas estão mais distantes de minhas prioridades no momento. O que me interessa aqui é só pegar carona na idéia.
Qual seria o livro mais superestimado da literatura brasileira, caros leitores?
117 Comentários
Sérgio: vc tem andado muito provocativo ultimamente… Prevejo polêmicas 🙂
Macunaíma.
Só é lido hoje em dia porque foi a panelinha artística do cara que botou São Paulo no mapa cultural do país. Aliás, todo o modernismo brasileiro sobreviveu por puro bairrismo.
O Ateneu, de Raul Pompéia, alguém descorda?
Não gosto de Moacyr Scliar, me parece um autor superestimado, consequentemente seus livros também o são…
Augusto de Campos e sua glossolalia.
Sem dúvida, Lavoura Arcaica, do Raduan Nassar!!
qualquer jorge amado.
mas cada um tem o brasil que merece.
Não, não, assim não vale, não, Sérgio. Diz aí o seu primeiro.
li esse livro do Salinger esse ano depois de procurar bastante em bibliotecas… ruim demais. Rebeldia juvenil mal escrita, trash.
Brasileiro? Tem um monte que só possuem importância histórica e olhe lá, Moreninha, Inocência, Guarani (Senhora dá pra salvar alguma coisa)…
Tá certo, Tiago, é justo. Na verdade, não falei antes porque não conseguia me decidir, mas diante do seu ultimato vou ficar com “Fogo morto”, de José Lins do Rego.
Acho que a única coisa que presta naquele livro são as porradas que o protagonista apanha de seu colega de quarto. Na realidade, aquele fato isolado daria um bom conto. Poderia ter parado ali (alguém discorda?).
O livro mais superestimado da literatura brasileira do século passado é o Brás Cubas.
Retrasado, claro.
Concordo com o Antônio Fernando, o “Lavoura Arcaica”, apesar de ser um bom livro, é superestrimado.
Sinceramente, não sei de onde que vem tantos elogios a uma obra que abusa nas pirotecnias da linguagem e esquece do conteúdo.
Falar de autor morto é fácil, né, Sérgio, Vinicius e outros? Não compromete. Não estamos falando do que é ruim, mas do que não é tão bom quanto se diz, olha aí eu já me desculpando, e tenho um bem vivo e muito badalado pra apontar, não hesitei um segundo: Cinzas do Norte.
Eu discordo Vínicius. Para mim são todos do José Alencar, em sua fase indianista.
Tem também o Jorge Amado…como já falou a Dona de Casa…essste sim é endeusado, e me diz pouca coisa quando o leio.
Não é fácil não, Noga. Compromete mais, na medida em que Raul Pompéia e Zé Lins (para ficar nos dois que você pôs na roda) são mais canônicos do que qualquer contemporâneo. Mas já que você citou o Milton, acho “Cinzas do Norte” um belo livro.
Para mim outro do Raduan Nassar: “Um copo de cólera”.
Realmente não está com essa bola toda. Mas é um bom livro. O pior é você pegar o livro de alguma “revelação” e ficar horrorizada por não conseguir sequer imaginar como podem ter gostado daquilo…
Poxa, Sérgio, eu gostei de Fogo Morto… 🙁 Bom, meus superestimados de estimação (ops!) são: A Moreninha; Jorge Amados em geral, com exceção de Capitães de Areia; Alencares em geral – especialmente, é claro, O Guarani, o mais importante precursor de McGhiver -, com exceção de um romance que marcou minha infância chamado O Tronco do Ipê. Ah! Fernão Capelo Gaivota, naturalmente.
E ninguém me perguntou, mas o livro mais superestimado da literatura mundial tem que ser O Pequeno Príncipe. Odeio aquela cativação toda…
A obra da Clarice Lispector é superestimada. Acho até ofensivo quando fazem a pergunta “quem é o novo Rosa, a nova Lispector?” Rosa e Lispector na mesma linha? Ela é uma escritora interessante, tem gente que ama, e isso respeito. Mas aí colocá-la junto de Rosa e Machado quando temos Pedro Nava, Graciliano Ramos e Osman Lins é uma arbitrariedade crítica que não consigo entender. Não digo que ela é péssima, isso nunca diria, nem que carece de qualidades, apenas não consigo vê-la acima de Lins, Ramos ou Nava. E creio que a geografia literária do século passado poderia ser redesenhada para dar espaço para outros autores fora do binômio Rosa-Lispector. Eu trocaria sem problemas Rosa-Lispector por Ramos-Lins-Nava. Acho até que essa tríade daria mais conta de toda nossa literatura que Rosa-Lispector, porque nela há crítica social, engenho formal e a verve auto-biográfica tão cara a nossa literatura. São autores que aglutinariam mais nomes e debates porque Rosa e Lispector me parecem autores terminais, que não produzem estilos tributários daquilo que inventaram. Como ler uma tradição literária a partir de autores cujas obras não possuem estilos seminais? Quando se lê a partir de Rosa e Lispector a literatura brasileira parece vazia porque a lente que se usa, as poéticas de Rosa e Lispector, serve apenas para avaliar Rosa e Lispector, e não o restante. Aí se lê a literatura por subtração, justamente pelo que ela não tem de Rosa e Lispector, e creio que se deveria ter outra chave mais aberta para avaliar nossa literatura. Essa é a minha opinião.
Tudo do Luiz Vilela (um dos piores escritores do mundo, que não sabe fazer diálogo, ao contrário do que dizem). E da Nélida Piñon. E quase tudo do Manoel de Barros e do Mário Quintana.
Muito interessante este comentário do Vinicius Jatobá. Mas que tal incluir o Erico Verissimo nessa turma de referência, pra acrescentar à crítica social, ao engenho formal e à verve auto-biográfica também a capacidade indiscutível de contar uma boa história? Tudo bem, vão dizer que eu sou gaúcho, mas o quê que eu vou fazer?
JORGE AMADO. MUITO BEM-AMADO pela globo-brasil. Entre os vivos ficam muito mais difícil eleger um, entre as miríades de trash lançadas aos borbotões nestas últimas três décadas pós-ditadura e pós-68.
Macunaíma não é subestimado porque tem sua importância, mas é chato ao extremo.
Concordo com a visão de que Raduan Nassar, de modo geral, é superestimado, até pela mitologia que se criou em torno dos dois livros.
“Vidas Secas” é um péssimo livro, assim como “O Quinze”, de Rachel de Queiroz.
errata: “Macunaíma não é superestimado”
Acho Guimarães Rosa super-ultra-estimado. Como já disseram de Clarice, acima, está muito longe de ser ruim, pode ser apreciado intelectualmente, mas nem sempre fala ao coração. Quando consegue é de fato um dos GRANDES, como em, por um exemplo apenas, “Matraga” (que acho fantástico) mas muitas vezes é extremamente cansativo, e pernóstico na invenão e reinvenção tautológica da linguagem. Cansa. O Manoel de Barros é uma espécie de subproduto da idolatria ao Rosa na poesia, mas quase piegas (o que Rosa não é). Já do Machado não me canso de ler e reler quase tudo com enorme prazer (de coração) e admiração (pela razão). Achei estranha a des-adoração a “Lavoura Arcaica”, mas como dizia o mesmo Rosa, “pãos ou pães é questão de opiniÃes”. Quanto ao “Apanhador”, que também já adorei aos 15 anos, também teria que reler e não estou interessado no momento, mas os contos do Salinger, eu já reli e continuo achando muitos admiráveis e emocionantes. Uma outra supervalorizada é Adélia Prado que acho bem mais ou menos. Mais prá menos. Sem tocar na emoção, não vale e a literatura está muito des-afetivada como prática e é o que a crítca endeusa: tudo frio, formal, “cool”, elegante (?). Asim, não me encanta.
Pois é LuisFernandoGallego,
Manoel de Barros também me passou a idéia de construcao da linguagem de modo artificial. Adélia Prado também não me comove. Os textos me soam um tanto vazio. Estes entram no rol dos que a mídia queima seus incensos demasiadamente. Baseado nos extratos que li no passado remoto.
Companheiros de esquerda, maoistas e bolivarianos.
Eu, josef mario, devo dizer que o meu livro, sem duvida, e o betinho da companheira carla rodrigues. A sua leitura, alem de servir como laxante, funciona, tambem, como um otimo remedio para a insonia.
Muito obrigado.
Quase memória, do Cony.
PS: QM é apenas uma crônica estendida.
lembro um argentino: rayuela. o próprio florencio desmistificou em uma entrevista de 1973. no fundo é tudo segue mesmo o axioma de rosa: é questão de opiniães…
Vidas Secas é péssimo? O que seria bom?
Só uma ressalva em relação ao Catcher in the Rye, após ler o artigo no link:
-se não gostar do protagonista for critério literário, então Auto-de-Fé e Macbeth, p.ex., tornam-se livros menores;
-o autor, aparentemente sem se dar conta, emula o estilo verbal do Holden Caulfield. Ou seja, é como se, veladamente, criticasse a si próprio, usando para tanto o protagonista do livro; p.ex, ele alega que “the main character wants to make you barf in irritation”; o próprio Holden Caulfield, no livro, diz “don’t see it if you don’t want to puke all over yourself” (sobre um filme ou algo assim, cito de memória).
O que me parece importante ressaltar aqui é um defeito que se imputa aos escritores mas tb afeta a crítica: a submissão do texto aos sentimentos, caprichos, insatisfações etc de quem escreve ou avalia a obra final. Se ele estivesse concentrado no livro como quem observa uma paisagem, e não um espelho, teria aproveitado muito mais.
Além disso, o livro do J.D. Salinger nunca foi admirado pela prosódia, digamos, nem pelas ações (ou inação) do personagem principal, e sim por destacar, em linguagem coloquial, as observações de uma geração que até então não tinha voz na literatura.
Dito isso, acho que o Catcher in the Rye é superestimado se comparado a Nine Stories, esse sim a obra-prima do J.D.Salinger.
clelio, São Bernardo é bom. Vidas Secas é apelativo.
A escrava Isaura. Tanto que as versões para TV superaram o livro (podem me linchar).
Caro Sérgio Karam, obrigado por transformar essa caixa de comentários num espaço de diálogo possível. E, claro, por colocar seu próprio nome, isso é muito importante. Quanto ao Veríssimo, que é excepcional autor, acredito que ele poderia ser colocado num binômio com Jorge Amado. Também resolveria muita coisa, e ideologicamente os dois dividem muito do mesmo projeto de pensar o Brasil a partir de narrativas que flertam com o folhetinesco, os pequenos relatos orais, a rádio e o cinema épico, como o western ou de fundação nacional, etc. O importante, creio, é forçar a imaginação crítica para além desse universo de leitura (Rosa-Lispector) que comporta apenas a “genialidade”.
Jorge Amado. E acho que ele tá ganhando essa eleição… 🙂
Alguém teve acesso ao livro quase pirata dos contos que Salinger publicou há décadas em revistas mas não autorizou republicar em livros? Ou seja, tudo o que ficou de fora de Nine Stories, Franny and Zooey e Raise High the Roof Bean, Carpenters and Seymour – an Introduction… Li em algum lugar que são mais de 20 contos (posso estar enganado) e que há muita coisa boa por ali que a idiossincrasia autocrítica de Salinger prefere manter inacesível. Os editores foram atrás das revistas e copiaram. Eu tenho um livro sobre Salinger que menciona os enredos de vários desses contos e já são de dar água na boca. Acho que foi publicado na França e um famoso tradutor brasileiro tem, mas não empresta, não vende, não dá, nem mostra. Afinal, estaria na lista dos crimes que não deveriam ser crimes de direitos autorais. Mas…
Caramba, citaram Pompéia, Nassar, Adélia Prado, Cony, Vilela.. todos escritores que admiro muito.
Entre os superestimados, acho que incluiria a Hilda Hilst, cuja suposta transgressão me parece bem atrasada e fora de época. Lembro que achei Menino do Engenho, do Zé Lins, um porre, mas faz um tempo isso, talvez se eu o relesse gostasse mais. Na época me deu muito sono.
Dos contemporâneos, Luiz Ruffato. Fora essa turma toda aí, de Mirisola, Marcelino e companhia.
LuizFernando:
http://www.geocities.com/deadcaulfields/UncollectedList.html
Bem lembrado, Jonas. Meu voto vai para o Mirisola, pelo conjunto da obra.
Obrigado pela dica do site que menciona os contos e seus enredos, mas eu queria mesmo era o livro com os contos. Concordo que as obras-primas estão em Nine Stories e gosto muito de “Raise High” (mas não tanto de Seymour) e de Franny and Zooey.
LuizFernado, basta clicar nos títulos em branco, os textos dos contos e de Hapsworth estão lá, aparentemente completos.
Caro Vinicius, com relação a Rosa e Lispector serem “autores terminais, que não produzem estilos tributários daquilo que inventaram”, talvez seja interessante pensar que o mais importante legado de ambos, além da própria obra, é claro, diz respeito aos novos limites que eles impuseram à linguagem literária brasileira. Não se trata de escrever como Clarice ou como Rosa, de ser seus epígonos, mas de ter consciência, ou mesmo de ter quase no inconsciente literário de quem vai escrever em português, que um caminho, aquele caminho, foi aberto, explorado e levado àqueles limites. Isso denota a riqueza de uma literatura e, ao contrário do que você diz, acho que abre caminhos novos para os que hão de vir, porque a língua foi expandida, mostrou até onde ela poderia ter ido e foi. Mutatis mutandis, eu penso que não haveria o Ian McEwan e seu fantástico Na praia, por exemplo, sem a Virginia Woolf antes dele.
Em tempo: leitores homens parecem ter mais dificuldades com a Clarice do que mulheres leitoras, creio que há razões para isso.
1. Benveja: grato pela dica, vou tentar. 2. Clara: Acho que McEwan está a anos-luz de distância de Virginia Woolf, nem dá para chegar perto, exceto talvez por Reparação e Amsterdan. E insisto que o caminho aberto por Rosa é pessoal e intransferível, para melhor ou/e – muitas vezes- para pior. Os epígonos ficaram caricatos, mais cansativos ainda e é horrível essa ditadura Clarice-Rosa. E “apesar de” ser homem, curto muito mais Clarice do que Guimarães (gosto de pãos e pães), já que muito de seus textos não raramente ficam chato mesmo, apesar de tudo de “revolucionário”, “inovador”, “transgresor” etc etc na linguagem. Posso ter que me exercitar (e curtir isso) ao acompanhar um desafio lingüístico desse tipo joyceano ou rosiano, mas já me cansou. Prefiro “Retrato do Artista quando Jovem” e “Dublinenses” a “Ulisses” em relação ao qual fui mais um que não o concluiu (pulei para o capítulo final da Molly Bloom que é uma maravilha, mas os antecedentes são frequnetemente insuportáveis. Como Rosa, às vezes. Mesmo que “pegue mal” tal declaração “em público”, insisto em querer prazer intelectual, sim, mas com mais emoção, afeto, coração e isso a Clarice até que conseguia muitas vezes, forma e conteúdo de primeira quando acertava a mão. Mas às vezes, quantas linhas tortas sem que ela, Rosa ou Joyce fossem Deus escrevendo “direito” pelas famosas tortas linhas.
Grande Sertão: Veredas
Li, na íntegra, GSV duas vezes: a primeira, numa edição antiga que encontrei abandonada na prateleira de uma pequena biblioteca pública numa cidade do interior. Tinha ouvido falar do livro nas aulas de literatura do colégio; meu professor era um entusiasta, um fervoroso entusiasta de Guimarães Rosa, cuja linguagem comparava à de Shakespeare, como se fosse a suprema criação poética. Contagiado pelo seu entusiasmo, peguei o livro com sofreguidão e fui até o fim, até a palavra “travessia”, que o encerra. Mesmo não tendo, confesso, alcançado o sentido de inúmeros parágrafos e ficando, às vezes, como que perdido em meio a tantas palavras esquisitas e à multidão de personagens que iam e vinham, senti-me fascinado pelo livro e pela história, na qual entrevia algo profundo demais para ser compreendido à primeira vista.
Passados vários anos e após a leitura de tantos livros, voltei ao GSV. Desta vez, comprei uma edição, pois não resisti à idéia de ter esse livro em casa, para folheá-lo quando quisesse, quantas vezes quisesse. Imaginava que ele seria (como o entusiasmo juvenil nos contamina!) o meu livro de cabeceira, ao qual iria recorrer toda vez que precisasse de uma palavra mais sábia. No entanto, já nas primeiras páginas, fui sendo tomado por um sentimento de decepção. A sintaxe inovadora de Guimarães Rosa e as palavras inventadas por ele começaram a soar um tanto artificiais. Por exemplo: a frase “pão ou pães é questão de opiniães” deixou a impressão de algo pueril, de um tolo joguinho de palavras pelo qual o autor tentava emprestar um significado sapiencial a uma sentença vulgar. Fiquei matutando por que muitos críticos e escritores se deixavam impressionar com detalhes tão irrisórios quanto essa rima (ães/ães), que em si valem nada. Cervantes, no capítulo inicial do Dom Quixote, havia satirizado essa forma de escrever três séculos antes:
“(…) este sobredicho hidalgo (…) se daba a leer libros de caballerías con tanta afición y gusto (…) y de todos ningunos le parecían tan bien como los que compuso el famoso Feliciano de Silva: porque la claridad de su prosa, y aquellas intrincadas razones suyas, le parecían de perlas; y más cuando llegaba a leer aquellos requiebros y cartas de desafío, donde en muchas partes hallaba escrito: la razón de la sinrazón que a mi razón se hace, de tal manera mi razón enflaquece, que con razón me quejo de la vuestra fermosura, y también cuando leía: los altos cielos que de vuestra divinidad divinamente con las estrellas se fortifican, y os hacen merecedora del merecimiento que merece la vuestra grandeza. Con estas y semejantes razones perdía el pobre caballero el juicio, y desvelábase por entenderlas, y desentrañarles el sentido, que no se lo sacara, ni las entendiera el mismo Aristóteles, si resucitara para sólo ello. (…)”
Não raro Guimarães Rosa aparenta para mim uma espécie de Feliciano de Silva, que o mordaz Cervantes não perdoou.
Devo dizer que, pela segunda vez, terminei o livro, do qual cheguei a memorizar alguns parágrafos (o primeiro — “Nonada. Os tiros que o senhor ouviu foram de briga, não (…)” — até hoje sei quase de cor). Verdade é que, vez ou outra, apareciam trechos primorosos, belíssimos. Mas o trabalho final é, para mim, muito irregular, cheios de altos e baixos.
“Grande Sertão :Veredas”, sem dúvida.
Guimarães Rosa é intragável e todo mundo dia que é lindo
nem nos meus momentos mais livromaníaca eu consegui terminar esse livro… tentei 3 vezes
Caramba.Os comentário a esse post estão especialmente interessantes.Quanta coisa boa tá aparecendo por aqui!
Companheira elaine
Eu, josef mario, devo dizer que ter a humildade de reconhecer a própria jumentice não é para qualquer um. Felizmente, a companheira ainda tem uma certa modéstia. Meus parabéns!
Muito obrigado.
Josef,
E Elaine disse que considerou Grande Sertão intragável. Intragável. Não conseguiu ler até o fim, por três vezes, porque o livro era para ela intragável.
Não realizar uma tarefa por repulsa é coisa diferente de não realizá-la por estupidez.
Aprenda uma coisa: para inteligir o sentido de uma frase, é antes necessário compreender o significado das palavras. Depois, só depois dessa providência preliminar, é que você estará habilitado a emitir juízos de valor sobre a inteligência (ou falta dela) alheia.
Não achei o GSV intragável, pois vi nele momentos sublimes. Porém, é, no meu entender, um livro superestimado. Discordo da Eliane, que não conheço; a divergência das nossas opiniões, contudo, não me autoriza a acreditá-la curta de entendimento.
Realmente, dizer que Grande Sertão: Veredas é “intragável” é preocupante.
É bom lembrar que nem tudo em GSV são criações etimológicas, citações ao Vedas etc. O Guimarães Rosa tinha grande afeição pelo linguajar do povo, com suas expressões etc.
Penso que “pãos ou pães é questão de opiniães”, p.ex., não seja um algo construído com alto grau de elaboração e complexidade, é simplesmente um ditado popular que o autor incorporou ao texto.
Todos
Bemveja: talvez não um ditado popular mas um chiste.
Viva Vaia (Augusto de Campos).
Bemveja,
Eu sinceramente não sei se o “pão ou pães” é criação do Guimarães Rosa ou se provém de algum ditado popular. Toda vez que li alguém citando esta frase, ela era atribuída invariavelmente ao Guimarães Rosa e não ao povo.
É, no entanto, possível que seja um dito popular, desses cujo registro se perde com o tempo. São famosas as viagens de Guimarães Rosa nas costas de um burro pelo interior de Minas, caderninho à mão, anotando frases, ditos e palavras empregados pelo povo. Quiçá um tropeiro, cigarro de palha no canto da boca e chapéu de palha na cabeça, tenha soltado a frase numa conversa qualquer cujo colorido foi anotado por Guimarães Rosa. Observo que essa hipótese é pura especulação.
Citei o “pão ou pães” porque é uma das frases mais famosas do GSV, sempre citadas. Muitos anos atrás, deparei-me com um artigo de Antônio Cândido na Folha de S. Paulo que se encerrava com o “pão ou pães”, devidamente atribuído a Guimarães Rosa.
A “fórmula” de Guimarães Rosa (tome essa palavra no sentido de “solução estilística pessoal para um problema estético”) padece de uma incoerência que, para mim, é a causa do artificialismo que às vezes enxergo em suas obras. Em Guimarães Rosa, há um esforço muito grande para expressar a sabedoria do homem popular que, embora não seja instruído, apreende instintivamente certas verdades maiores, graças à sua longa, conflituosa e difícil experiência de vida. Riobaldo é o arquétipo supremo desse tipo de homem. Guimarães Rosa parece buscar, nas profundezas do sertão, a sabedoria pré-civilização, da qual a humanidade teria se apartado com a miragem do racionalismo. Riobaldo, mesmo sem ter lido as grandes obras da filosofia, sem ter estudado os clássicos, sem ter debatido com professores numa universidade, sabe instintivamente as grandes verdades da vida, profanas e metafísicas.
A incoerência que vejo está no próprio Guimarães Rosa. Ele, poliglota, formado médico, burocrata, embaixador na Alemanha e leitor compulsivo de livros, é o exato oposto do Riobaldo. Riobaldo é um personagem artificial porque raciocina de uma forma que somente alguém com a bagagem cultural de Guimarães Rosa conseguiria raciocinar. A linguagem de Guimarães Rosa encobre um pouco esse artificialismo, o qual seria por demais evidente se o escritor mineiro escrevesse num vernáculo castiço.
É por essa razão que não sinto pouca empatia por Riobaldo.
Errata: “É por essa razão que sinto pouca empatia por Riobaldo.”
sobre GS:V, o próprio JGR nos esclarece em Tutaméia:
“Quanto ao Grande sertão: veredas, forte coisa e comprida demais seria tentar fazer crer que foi ditado, sustentado e protegido – por forças ou corrente muito estranhas”
Ou seja, foi psicogfrafado.
Oi
Ler que Raduan Nassar é superestimado ou que Clarice também é, só revela que existe gente semianalfabeta espalhando sua ignorância. “Quem é você que não sabe o que diz/ Meu Deus do céu, que palpite infeliz!”
*psicografado.
não acreditam? sabem da história da eleição e posse dele na ABL?
Admiro, em Francisco, comentarista valente, a finura do pensamento, a agudeza dos argumentos e sagacidade das demonstrações.
Houvesse mais pessoas assim no mundo, decerto menos gente semianalfabeta espalharia sua ignorância.
Cláudio,
Você está se referindo à resistência de Guimarães Rosa a tomar posse na ABL, mesmo tendo sido eleito. Ele receava que, quando o fizesse, iria logo logo morrer. Durante alguns anos, ele postergou a solenidade de posse; três dias depois da cerimônia, sofreu enfarto e faleceu.
A história é impressionante, realmente, e dá o que pensar. No creo en brujas, pero que las hay, las hay.
agora sem brincadeira. se cada país tivesse que ser representado por um livro (em uma copa do mundo de romances, por exemplo), com GS:V estariamos muito (mas muito mesmo) bem representados. É, SEM DÚVIDA, UM DOS GRANDES LIVROS DA LITERATURA MUNDIAL.
cheguei, tarde. mas vamos lá:
gosto do Guimarães Rosa (amo, melhor dizendo)
gosto da Clarice
acho o Cony meio chato, não gosto do Lins do Rego, não gosto do Alencar, gosto do Artur Azevedo, gosto do Raduan Nassar.
Adoro macunaíma, odeio Paulo Coelho (naquela bem infantil de “não comi e não gostei” – mas isto é literatura?).
vai por aí…
Rafael: exatamente. impressionante mesmo. e ele conta diversas histórias como essa em Tutaméia. uma das que mais impressionam é aquela sobre um romance que tlvz (é preciso averiguar) ele não tenha terminado: A fazedora de velas.
na verdade, Guimarães Rosa não morreu (pois é eterno), apenas ficou encantado.
Nossa. Fiquei meio chateada com a crítica do Sérgio ao meu comentário, mas só agora voltei aqui e bem. Criticar a escolha alheia ficou normal, me senti bem melhor. Só fui sincera, porque meu voto foi para um livro que me incomodou muito, infelizmente já não o tenho pra discorrer academicamente sobre o que me fez detestá-lo, incluídos aí faltas ou excessos de gramática. De resto, tb não li Ulisses e adoro o monólogo de Molly Bloom que já li várias vezes, contra o que dizem por aí vejo em Manoel de Barros momentos lindos, gosto de Clarice, a personagem, mas não do que ela escreve, bem, eu talvez devesse ter apontado o Laços de Familia pra atender ao Sérgio, que acha mais difícil escolher ícones. O fato é que minha relação com a literatura é puramente emocional e subjetiva. Não sou jornalista. Não sou resenhista. Não sou graduada em letras e não tenho a menor pretensão acadêmica, e não acho que isso faça de mim uma pessoa ignorante. E mais. Como escritora, grande parte do que leio hoje em dia me provoca um tédio enorme e por isso, tendo a ler cada vez menos.
Em homenagem a Antonioni acabei de rever A Noite, um filme do qual pouco me lembrava. Marcelo Mastroianni faz um escritor famoso, acossado por dúvidas e protegido de dívidas por uma esposa rica, sounds familiar? Em certa altura, uma convidada da festa em que se passa a maior parte do filme pede a ele que lhe conte uma história, uma história real, que tivesse acontecido com ele. Ele se nega, e ela diz que adoraria saber o que pensa um escritor, ao que ele responde: “Não. Você não quer saber.”
Certo. Melhor não saber, melhor não contar, silenciar de vez sobre as minhas radicais opiniões, eu e minha grande língua.
Rafael, assisti certa ocasião a uma palestra de uma pessoa que partilhou do convívio com o JGR durante décadas. Ela conta que ele tinha um deleite especial com essas máximas populares: ele gostava de ficar repetindo aquela expressão “jacaré comprou cadeira, não tem b. para sentar!” e ria desatademente com a frase.
Acredito que o “pãos ou pães” se fixou na memória coletiva (assim como “boi e boi. Campo e campo”, “viver é muito perigoso” etc) apenas por uma seletividade meio vulgar– essas frases não são exemplos do estilo, nem do teor, nem dos motivos e modos exercitados no livro.
Por ser tão extenso e complexo, as pesoas edulcoram o GSV e, o que é pior, recorrem até hoje ao imaginário reducionista da minissérie da Globo para abordar um livro que é essencialmente filosófico.
Os conceitos de amizade, travessia (eu me lembro que na minha época de estudante ficamos literalmente um mês analisando cada palavra relativa ao Liso do Sussuarão) e os desafios ante a presença do mal são eixos centrais desse livro, e demandam disposição do leitor (“Deus é paciência.”)
Até a linguagem, que me parece a mais rica e musical de toda a história da ficção em língua portuguesa, é secundária diante da defesa temática da racionalidade subjacente ao livro: identificar, entre conflitos, jagunços e perplexidade emocional, veredas transitáveis no meio do emaranhado do sertão.
Quanto ao autor, Riobaldo está tão distante de Guimarães Rosa quanto Ulisses de Homero. Ambos os autores são intérpretes da história de um terceiro, o que pressupõe um viés.
C.Soares, até existem umas lexicografias sobre Grande Sertão: Veredas e tal, mas a obra de JGR ainda não foi suficientemente anotada e comentada (não vi essa edição comemorativa ainda). Seria necessário um trabalho criterioso p/ identificar a origem dessas expressões, inclusive os próprios cadernos de viagem dele podem oferecer datações, origens etc.
Sobre as superstições dele, no Ave Palavra tem um texto sobre a visita que ele fez na Alemanha com duas amigas a uma mulher que teria sido a astróloga do Hitler etc. Aliás, é igualmente vexaminoso que não exista no Brasil uma biografia decente de Guimarães Rosa, ou seja, vida e obra do autor permanecem um enigma por mera preguiça do estabelecimento academico.
p.s.: lá em cima, em meu comentário anterior, é citação “dos” Vedas.
obs: “desatadamente”
A caixa de comentários é, de certa forma, a confirmação daquilo que disse: não se pensa a literatura brasileira fora do binômio Rosa-Lispector. E por mais interessantes e fortes que esses autores sejam, ler a literatura brasileira a partir deles paradoxalmente empobrece nosso legado cultural. É como ler a literatura francesa a partir de Proust. Qual o autor francês que sobrevive à comparação com Proust? A solução poética de Proust para sua obra só serve para sua obra. Creio que isso é o que acontece com Rosa (e em menor grau, com Lispector). E volto a repetir que, na minha maneira de ler, colocar Lispector ao lado de Rosa é superestimá-la. É como colocar K. Mansfield ao lado de Joyce. Mansfield é brilhante e rica e fabulosa, mas Joyce é Joyce. Agora é tão evidente essa centralização Rosa-Lispector que até agora ninguém arriscou nessa caixa de comentários sair dessa leitura institucional e burocrática de nossa literatura. Porque se funciona assim para nossa máquina cultural cada um é dono de sua própria biblioteca, e duvido que as bibliotecas pessoais se organizem da mesma forma que a biblioteca da crítica institucional organiza seus valores nacionais. Ninguém colocou no céu até agora nenhum autor diferente de Rosa e Lispector. Sou a favor de cada um explodir essa leitura sacralizada e forçar seus limites e encontrar novos espaços para autores como Ramos, Lins, Nava, Rubião, Nassar… Onde Barreto é colocado? Não é possível colocá-lo em espaço algum porque Rosa-Lispector não estão na mesma poética de Barreto, suas lentes não ajudam a ler Barreto. Então se não serve, é como se ele não existisse. A leitura tem que se abrir mais para outras poéticas narrativas singulares, e democratizá-las. Por exemplo, onde está a pornografia nacional? A ficção científica? A picaresca urbana? Não está, nunca estará, enquanto só se utilizar a lente “genial” que “transgride” e “expande os limites da linguagem”. O filtro e lente que se usa para medir a literatura “séria”, mesmo partindo de um gênio como Rosa e uma autora interessante como Lispector, paradoxalmente não resolve e soluciona e pluraliza a cultura literária. Ao contrário: torna um ambiente literário rico num imenso deserto.
E eu, bobo, achava que quem diz “Pãos ou pães é questão de opiniães” é o Riobaldo!!!
Agora descubro que é o Guimarães…
Não se deve confundir nem autor com narrador (onisciente), imagine com personagem… (que, no caso, é verdade, é também o narrador).
Quem diz “Marcela amou-me…” é o Machado??? Não entendo mais nada.
uhn, cheguei meio atrasado, mas minha aposta é na obra do Paulo Coelho! Oops, mas se não estão falando nele, vai ver que ele não se enquadra como “literatura”…
Antes de prosseguir, devo declarar que não acho o GSV um livro ruim, não; pelo contrário, é uma grande obra-prima; juntamente com “Os Sertões”, a mais ambiciosa já escrita no País.
Acho-o superestimado, rara ocasião em que me sinto obrigado a discordar do Cláudio, que considera GSV um dos grandes livros da literatura mundial. É um grande livro, sem dúvida alguma; porém, não tão grandioso assim.
E admiro muitíssimo João Guimarães Rosa. As entrevistas dele que li revelam um homem culto, inteligentíssimo, dotado de fino humor e com gosto literário muito refinado. Recomendo vivamente a leitura da entrevista que Guimarães Rosa deu ao alemão Günter Lorenz: a melhor, sem sombra de dúvida, que um escritor brasileiro já concedeu. Há um dado biográfico de Guimarães Rosa que merece ser lembrado, sempre: ele foi embaixador do Brasil na Alemanha na época da ascensão de Hitler; corajosamente, ele arriscou a vida concedendo vistos a muitos judeus que procuravam uma via de fuga do nazismo — contra, aliás, a orientação do governo brasileiro, que então se alinhava à Alemanha e adotava políticas anti-semitas (época do Estado Novo, do execrável Getúlio Vargas). Há, em Israel, uma praça chamada Guimarães Rosa — uma homenagem honrosa.
Bemveja: acho um tanto arbitrário, sinceramente, atribuir as frases de apelo mais fácil à cultura popular sob o argumento de que não representam o estilo do GSV. É uma forma cômoda de desculpar os momentos de menor inspiração do autor. Não há, no texto, nada que autorize tal ilação. Guimarães Rosa era um cultor de linguagem popular e colecionava ditos e adágios que foram incorporados à obra; foi um estilista vigoroso, mas imperfeito. Suas soluções nem sempre foram felizes, o que é desculpável, tendo em vista suas ambições literárias.
É claro que Riobaldo é tão ficcional quanto Ulisses, D. Quixote, Tirant lo Blanc, Anna Karennina ou Joseph K. Ainda assim, Riobaldo é, no meu sentir, o mais artificial deles todos. Falta a ele a naturalidade de um Sancho Pança, também modelo ficcional de homem inculto que, no fundo, guardava uma sabedoria algo instintiva (vide o episódio da Ilha da Barataria). Há um quê de falso em Riobaldo, que não encontro no lendário Ulisses.
Sirio: Partindo desse seu pressuposto, seria impossível fazer uma análise da linguagem de Guimarães Rosa em GSV. Só daria para analisar a linguagem de Riobaldo em GSV. O sucesso da linguagem literária depende, em grande parte, do engenho do escritor em conceber o estilo correto para cada personagem. Não é lícito, entretanto, isentar ao escritor a falta de inspiração e imputá-la ao personagem.
Um adendo: “Marcela amou-me …” é pura ironia machadiana, expressada por meio de Brás Cubas. “To be or not to be…” é Shakespeare falando por meio de Hamlet. “Ó glória de mandar, ó vã cobiça…” é Camões admoestando através do Velho do Restelo.
Bemveja,
Concordo plenamente com sua reverência ao GSV.
Acho que muitas das rejeições lidas aqui devem-se mesmo à densidade da floresta que representa o livro, mesmo nas passagens desérticas. As cerca de 30 páginas iniciais, de fato, perambulam por diversos assuntos antes de engrenarmos no cerne da narrativa, ou da travessia (palavra que não é a última por acaso). Tive o raro privilégio de fazer uma leitura do romance guiado por Davi Arrigucci Jr, ao longo de algumas semanas de aula.
Na minha parca opinião tosca e leiga para a ceara em que vou me meter a seguir, acho mesmo que GSV é uma realização magistral da teoria do húngaro Gerog Lukács em A Teoria do Romance. E, como a realização é arte, é infinitamente superior sua leitura.
Sou leitor fiel. E ele é sim meu livro de cabeceira mesmo quando não estou na cama.
Abraços,
André Laurentino
Perdão: Georg Lukács
André,
O cipoal é denso, realmente; no entanto, não tão intrincado que o facão do meu entendimento não consiga nele penetrar. Nem toda reserva ao GSV deve-se à estreiteza da compreensão.
Todos do Paulo Coelho! Principalmente o Alquimista!
Rafael,
Claro que não. Por favor, não quis dizer isso. Mas uma leitura cerrada (refiro-me ao método crítico) desvenda muitas entranhas que escapam mesmo ao bom leitor. Tampouco quero dizer que disponho deste aparato. Daí que as interpretações do Davi de do José Miguel Wisnik (este com O Recado do morro) revelaram coisas da estrutura, do diálogo com outras obras, correntes filosóficas e até a estrutura planetária (em Recado do morro) que surpreendem justamente pela destreza em sumirem no apanhado geral. Ou seja, este esqueleto não é opaco, mas transparente. E só mesmo um estudo aprofundado é capaz de trazê-lo à tona, por sobre as muitas camadas de tecido e músculo.
Isto está longe de ser uma ressalva aos leitores. Daí minha referência à densidade da floresta. Mas, como disse acima e repito aqui, para cachorro novo, estou entrando demais no mato.
Em tempo, seara é com s, e não com o c que escrevi acima.
Abraço.
Acho o romancista Cortázar superestimado. Não consigo me encantar com seus romances, embora ele seja um contista incontornável, magnífico. Entre Rayuela e Avalovara, acho este último muito mais genial.
Também não consigo gostar do Ulisses, do Joyce. Como disse Virginia Woolf, ao terminar de lê-lo: “Que explêndida ruína!” (é bem essa a sensação que eu tenho).
Ainda em língua inglesa, Salman Rushdie me parece superestimado.
Não seria a hora de pensar na lista dos livros e autores subestimados? Além do acima-mencionado Osman Lins, cito também o inglês E. M. Forster. Seu romance Passagem para a Índia é impressionante.
Brasileiros subestimados têm muitos. Nem vou ficar aqui citando. O próprio Érico Veríssimo é tremendamente subestimado – nem estudado nas faculdades de Letras é.
Dá para fazer uma análise da linguagem que Guimarães construiu para Riobaldo… Esse é o ponto. É aí que ele falha ou é bem sucedido. Eu acho.
Bemveja: “é igualmente vexaminoso que não exista no Brasil uma biografia decente de Guimarães Rosa, ou seja, vida e obra do autor permanecem um enigma por mera preguiça do estabelecimento academico.”
Quem dera que fosse por isso! Vá lá ver o tirânico controle que a família exerce sobre as obras, o nome, a vida e a sombra do Rosa. Se a gente continuar a citá-lo aqui, aliás, é capaz de começarem a nos ameaçar de processo….
Morto: Macunaíma
Vivo: Cinzas do Norte
Tá legal, será que alguém vai concordar? Dois Irmãos do Milton Hatoum…
Lavoura Arcaica do Raduan também, embora Um Copo de Cólera foi o melhor livro de ficção que li nos últimos tres anos. pode não ser grande literatura mas que me emocionou, ah, isso sim.
Até hoje não consegui terminar nenhum do Guimarães
obra-prima é o livro, ou o filme, o conjunto, não cada página, cada parágrafo, cada tomada; quem lê um livro ou vê um filme esperando uma revelação a cada momento só pode ser ingênuo. GSV é uma obra-prima, mas como toda produção humana é irregular, não é uma obra sem defeitos. Aliás, isso não existe.
ê cambada de vagabundos. acham o GSV superestimado? mas vocês pelo menos o leram, para dizer uma merda dessas? querem o quê? rubem fonseca? sérgio rodrigues?
s/ coment
Sergio, vc está comprando briga com imortais. Quando era aluno do Alfredo Bosi, ele me disse que as obras-primas da literatura brasileira eram três: Vidas Secas, Grande Sertão Veredas e …adivinha só… Fogo Morto. Desse jeito vc não vai pra Acadêmia rsrs
LuizFernandoGallego, o McEwan bebeu, sim, e muito, no estilo da Virginia Woolf, e o fez de modo magistral pois não copiou e foi além dela, criando sua própria fala, seu estilo particular. E mais: a Florence é um personagem que tem muito da própria Virginia. E tenho dito, já que aqui funciona assim: os homens falam e as mulheres ouvem, é isso?
Grande Sertão: Veredas, As mil e uma noites, O velho e o mar, Dom Quixote, A divina comédia, Guerra e paz, As viagens de Gulliver, Hamlet, Otelo, Metamorfose, A Odisséia e A Ilíade, de Omero , Crime e castigo…e “outros”…os livros mais superestimados da literatura mundial!!!!hahahahahahahaha
(fonte: Círculo do Livro da Noruega)
“Grande Sertão :Veredas entre os melhores livros da literatura mundial ”
Grande Sertão: Veredas, do renomadíssimo escritor Guimarães
Rosa, foi a ÚNICA OBRA BRASILEIRA escolhida em pesquisa organizada pelos editores do Círculo do Livro da Noruega.
A decisão em realizar essa pesquisa faz parte de uma campanha para incentivar a leitura de clássicos da literatura mundial contra o apelo da televisão, vídeo e dos jogos de computador.
Entre os 100 escritores dos 54 países que participaram da votação estavam Salman Rushdie, Milan Kundera, John Le Carre, John Irving, Nadine Gordimer, Carlos Fuentes e Norman Mailer.
Cada um dos autores elegeu dez trabalhos considerados os melhores e mais importantes livros da literatura
mundial.
Dom Quixote, obra-prima de Miguel de Cervantes, foi o grande vencedor, com mais de 50% dos votos do segundo
colocado, Em Busca do Tempo Perdido, de Marcel Proust.
A história de Dom Quixote, um cavaleiro que vive entre um mundo de fantasia e a realidade, superou obras de outros gênios da literatura mundial, como William Shakespeare e Homero.
Ao anunciar o prêmio, em Oslo, o escritor nigeriano Ben Okri, ganhador do Nobel de Literatura, disse que Dom Quixote é “um romance que todos devem ler antes de morrer.”
A literatura brasileira foi brilhantemente representada por GUIMARÃES ROSA, com Grande Sertão: Veredas, a história
do sertão, seus costumes e sua típica paisagem, cenário do desenrolar da trama que envolve as duas personagens
principais, Diadorim e Riobaldo.
Conheça algumas obras da literatura mundial:
Decameron, de Giovanni Boccaccio (1313-1375), Itália.
O Morro dos Ventos Uivantes, de Emily Bronte (1818-1848),Inglaterra.
A Divina Comédia, de Dante Alighieri (1265-1321), Itália.
Grande Expectativas, de Charles Dickens (1812-1870),Inglaterra.
Crime e Castigo, de Fyodor M. Dostoievski (1821-1881),Rússia.
Medéia, de Euripides (480-406 a.C.), Grécia.
Madame Bovary, de Gustave Flaubert (1821-1880), França.
O Amor no Tempo do Cólera, de Gabriel García Márquez
(nascido em 1928), Colômbia
Fausto, de Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832), Alemanha
Grande Sertão: Veredas, de João Guimarães Rosa (1880-1967),Brasil
O Velho e o Mar, de Ernest Hemingway (1899-1961), Estados
Unidos
A Odisséia; A Ilíada, de Homero (700 a.C.), Grécia
Ulisses, de James Joyce (1882-1941), Irlanda.
Zorba, O Grego, de Nikos Kazantzakis (1883-1957), Grécia.
1984, de George Orwell (1903-1950), Inglaterra
Metamorfose, de Kafka (1883-1924), Atual República Tcheca
Em Busca do Tempo Perdidode Marcel Proust (1871-1922),França.
Ensaio sobre a Cegueira, de José Saramago (nascido em
1922), Portugal.
Hamlet, KingLear, Othello, de William Shakespeare (1564-1616),Inglaterra
As Viagens de Gulliver, de Jonathan Swift (1667-1745),Irlanda
Guerra e Paz, de Leo Tolstoy (1828-1910), Rússia
As Mil e Uma Noites(700-1500), Índia/Irã/Iraque/Egito”
(fonte: Círculo do Livro da Noruega)
É…o Guimarães Rosa está com tudo e não está prosa…
O homem está com a bola cheia, universalmente falando…
Clara, respeito sua opinião, seu ponto de vista sobre McEwan. Mas a minha opinião, meu ponto de vista é que ele é superestimado e que o resultado de suas obras – como queira chamar – artísticos, literários, qualitativos – ficam muito auém da obra de Virginia Woolf. Acho que ele tem livros tão pretensiosos quanto frustrantes, fracos mesmo; e que o resultado final da obra dele, até agora, é pálido perto da obra de Virginia Woolf. Gostei muito de ter lido “Reparação” e gosto igualmente de “Amsterdan”. Nenhum dos outros livros que li me encantou e acho que ele tem incursões que o deixam muito mal, por exemplo, como o roteiro original de um filme com o ex-garoto de “Esqueceram de Mim”, – e eu esqueci o nome do garoto, talvez McCulkin – o filme se chamava no Brasil (talvez) Anjo Malvado. A sutileza aparente de Virginia Woolf em concretizar experiências íntimas e “abstratas” é resultado de uma habilidade com a palvra e com a percepção da intimidade mental do ser humano muito diferente do que me parece uma certa “mão pesada” de Mc Ewan que, porm exemplo, abandona o excelente gancho incial de “Enduring Love” quanto à experiência limite de dois homens no episódio trágico do balão para escrever uma espécie de “Atração fatal” homoerótica. Acho que ele desperdiça igualmente bons temas em “Cães Negros”, “O inocente” e um passado em Veneza. Não li outros e só fui considerá-lo melhor do que eu achava, como já disse, depois de “Amsterdan” e “Reparação”. Abraços
Scliar, sem dúvida, é superestimado. Faz algumas coisas razoáveis e umas bombinhas. Também pudera, o cara escreve com uma rapidez tremenda. Isso é prejudicial. Escrever não é fazer pãozinho a quilo…
Manoel de Barros também é dose. A primeira vez que o li, achei admirável. Na segunda, me toquei: isso ai é pura embromação. Pensando bem, qualquer pessoa que tenha alguma familiaridade com a escrita pode fazer aquelas ilações estapafúrdias. Me dá a sensação de uma obra facilitária, embromativa, que pega carona no que pior tem o Guimarães, os joguinhos de letras.
E falando em Guimarães, o cara é sensacional, principalmente nos contos. Mas que há um exagero nos neologismo há.
nos nelogismos
citando: “Morto: Macunaíma
Vivo: Cinzas do Norte”
Particularmente, acho “Macunaíma” um livro exageradamente estimado. Como experimentalismo é convicente e até atraente, porém, como literatura, é fraquíssimo e muito desinteressante.
96 comentários sobre livros atraiu-me. Estào aí amantes dos livros a comentá-los. Ledo engano. Nenhum amor aos livros, apenas aos cânones da literatura. Não são leitores, são estudiosos.
Caindo na mais absoluta platitude, cada lvro tem sua época e seu público, assim como cada leitor tem seus livros em cada época. Qual o valor de um livro? O que interessa a 99,9% (espero) dos leitores é uma história bem contada, numa linguagem atraente.
Na minha juventude encantei-me com Jules Verne e aborreci-me com E.R. Burroughs, ao contrário do meu primo que preferia Tarzan a Aronax, Ned Land e Passepartout. O Ö Apanhador no Campo de Centeio”foi bom quando eu o li aos 16 anos, quando tinha uma identificação com o adolescente cheio de espinhas e orgulhosos do seu chapéu de dez(?) dólares vivendo numa época muito semelhante à que eu vivia então (início dos anos sessenta). Tentei relê-lo há alguns anos, mas o livrohavia perdido o sabor.
“Grande Sertão: Veredas” (meu Deus! reduzido a GSV!) foi lido de cabo a rabo num final de semana como um romance de aventuras. Fugi dos zébebelos, encantei-me com Diadorim. Mesmo para o inculto adolescente que era, a trama pareceu-me primária, mas não tirou nada do prazer da leitura. Palavras complicadas? Não para mim, habituado ao linguajar de “caipiras” tentando impressionar citadinos com uma bom “causo, escolhendo/criando palavras. Um dos melhores livros de aventuras que já li e fui e sou leitor voraz.
O Vargas Lllosa fez um trabalho sobre Ös Miseráveis”, mostrando omïssóes, inverossimelhanças e quejandos. Para que ler o livro dezenas de vezes para procurar seus pontos fortes ou fracos. Isso só fz espantar leitores e cativar literatos (no mau sentido).
Livros devem ser lido pelo prazer que porporcionam, assim não há livro super ou subestimado, há momentos na vida. “Dom Casmurro”foi chatíssimo como tarefa escolar, mas todos os livros de contos do Machado de Assis foram ótimos em dias de chuva na fazenda.
Não compreendo ler um livro várias vezes sem fã incondicional dele. Li “Guerra e Paz”em português. Achando a tradução deficiente (intermediada), li em francês e ele cresceu. Li em russo – aprendi só para lê-lo – e tornou-se um monumento.
Quando não gosto de um livro após as 50 primeiras páginas, simplesmente o abandono e pego outro, a não ser por falta de opção. Superestimo a todos ou dou-lhes o devido valor?
Expectativas frustradas geram erros de avaliaçào.
Invejo o conhecimento literário exibido or todos, mas não deve substituir o prazer da leitura de uma boa história hábilmente narrada.
Completando: “Os Sertões” foi ótimo como livro de guerra aos meus quinze anos (passei por cima de “A Terra”e “O Homem”, razoável como fonte histórica na faculdade e ótimo na maturidade.
Felicidade para todos. Boas leituras,
Nelson Lott, leitor
Antes de criticar, uma defesa: adoro José de Alencar e seu livro Diva deveria estar entre os mais subestimados da literatura em lingua portuguesa.
Agora, meu livro superestimado:
Memórias Póstumas.
Claro que é bom. É ótimo. É EXCELENTE! Mas alçá-lo ao posto de melhor livro da Literatura Basileira foi demais, quando o próprio Machado de Assis tem livros melhores, como Memorial de Aires, por exemplo.
Dos comtemporâneos, o escritor de literatura fantástica André Vianco é agraciado com tanta condescendência por parte da crítica e na recomendação por “leitores avançados” e eu não consigo entender qual o valor de um só parágrafo seu.
Fugindo um pouco do tal binômio citado acima (gosto mais do Rosa que da Clarice, esclareço), creio que o escritor mais superestimado do país é Rubem Fonseca.
Excelente contista no início, acabou se tornando um romancista medíocre, mas com uma enorme capacidade de influenciar uma legião de epígonos. Creio até que uma leitura rasteira de suas – vá lá! -, intenções tenha levado os seguidores a criar um modelo de literatura amoral, sem profundidade psicológica, calcada em tipos mais ou menos repulsivos, para quem a ação antecede o raciocínio. É preferível não ter discípulos (como Guimarães Rosa) que ser seguido por um bando de diluidores…
Não consigo ler o Hatoum sem bocejar, me parece outro equívoco do status quo da crítica. Não é um cara burro, pelo contrário, mas está longe de ser empolgante.
Curioso, nunca vi um crítico literário sério superestimando o Jorge Amado. De onde tiraram isso?
Ele é o que é, o maior best-seller brasileiro do século XX, publicado em trocentas línguas e países (antes do P.Coelho, claro). Aliás, a crítica “acadêmica” geralmente o subestima… O Bosi o coloca na categoria de acarajé gorduroso pra turista!
LuizFernandoGallego, quando disse que o McEwan foi além dela (da Virginia) quis dizer que não a copiou servilmente, mas conseguiu lê-la, aproveitar a atenção ao detalhe e a compreensão do universo mental feminino e criar com esse material um mundo seu (dele), que, concordo inteiramente com você, tem a mão mais pesada, mas muito porque Virginia levou a “leveza” a limites extremos de beleza e criação, além disso, ela está num patamar muito alto para qualquer escritor, assim como a Clarice, a Hilda Hilst e só no Brasil quanto a escritoras mulheres. Acho que Virginia e Marguerite Duras são as duas mais extraordinárias escritoras fora daqui. Quanto ao McEwan, não conheço mais nada além desse Na praia, que acabei de ler achando ótimo. Vou ler outros, com certeza.
Ainda sobre o valor de Rosa, sugiro ler um texto excelente do Claudio Willer na Revista Agulha em
http://www.revista.agulha.nom.br/ag57rosa.htm
Clara: Virginia Woolf e Clarice Lispector, sim. Hilda Hilst não me convenceu. Lembro outra mulher que não é tão apreciada como, ao meu ver, mereceria: Cecilia Meireles, grande poeta. Quanto a outra mensagem d eoutra pessoa que escreveu acima que os comentários não são de amor aos livros, mas aos cânones da literatura. Discordo: acho que houve comentários bem sinceros, honestos, francos, pouco ligando para os supostos cânones ou “regras” do que se deve ou não se deve gostar para ficar bem na apreciação alheia. Coisa de gente com suas paixões e decepções literárias, já que a coisa tenha começado para apontar obras mais vaorizadas do que mereceriam em julgamentos que teriam se tornado “oficiais” e “inatacáveis”. Acho sim, como já foi sugerido, que seria interessante que se discutisse os livros subestimados, dando vez a obras que se ama, ainda que menos considerados em geral. Eu, por exemplo gosto de uma fase do Autran Dourado, entre “Braca dos Homens” e “Sinos da Agonia” com destaque para “Ópera dos Mortos” e “Uma Vida em Segredo”. Mas raramente encontro quem tenha a mesma opinião, e que criticam os livros posteriores e bem menos felizes do mesmo autor.
LuizFernandoGallego, a Hilda é mesmo muito difícil, no sentido de que você precisa estar querendo aquele mundo em pedaços, aquela maldição toda, aquela torrente verbal, aquele desejo que não tem fim. Um pouco como a leitura do Nietzsche, você sai dela muito cansado, mas tomado de paixão – ou então abandona e decide que aquilo não lhe pertence. Há autores assim, não é? São os ‘danados’, movidos a danação.
Vou colocar uns textos sobre a obra dela em http://www.linhadepesca.blogspot.com, caso você tenha interesse
Sorry, LuizFernandoGallego, o que vou colocar no blog mencionado são endereços de sites onde se podem encontrar boas análises sobre a HH.
Falando de superestima… tudo bem que o papo é literatura brasileira, mas Virginia Woolf bem que mereceria (para o próprio bem dela) ser tirada desse pedestal pseudo-proto-feminista onde a colocaram.
Ela é legal, tudo bem, tem uma técnica interessantíssima e até certo ponto revolucionária.
Mas a admiração a ela e a suas obras deveria ser posta em termos menos… religiosos…
Oh, Fabio, essa coisa toda das feministas com a Virginia é porque ela tenta demais, ninguém que trabalhe com crítica feminista, o que quer que isso signifique, permanece ileso diante de Um teto todo seu, que acho, eu também e ainda hoje, muito, muito bom.
Ah… mas eu nunca disse que os livros delas não são bons. São. Mas a babação de ovo acaba desviando o foco dos livros.
Morto: Jorge Amado. irmãos Campos (estão mortos ou vivos?!); Souzandrade (lembram da febre SZ na década de 90)
Vivos: Mirisola, Nazarian, Nelson de Oliveira, Marcelino freire, André santana. Escritores que tem mídia, boas relações, estabeleceram importantes redes de troca, mas não têm o principal: a literatura. Como vcs podem colocar nesse mesmo saco o Milton Hatoum? Voces têm lido o que se escreve nesse pais?
Falei de estrangeiro e deixei o nacional de fora.
Então tá. É Mirisola na cabeça.
Trecho de Sagarana, de Guimarães Rosa…
Sebastião entrou no curral. Zé Grande, o guieiro, sopra no berrante. Os outros se põem em duas alas divergentes – fazem paredes, formando a xiringa. Sinoca escancara a porteira, que fica segurando. Leofredo, o contador-, reclama:
– Apertem mais, p’ra o gado sair fino, gente! Ajusta, Juca, tu não sabe fazer o gado? Ei, um!…
É o primeiro jato de uma represa. Saltou uma vaca china, estabanada, olhando para os lados ainda indecisa. – Dois! – Pula um pé-duro mofino, como veado perseguido. Passam todos. Três, quatro, cinco. Dez. Quinze. Vinte. Trinta.
– Hê boi! Hê boi! Hê boi-hê boi-hê boi!…
– Cinqüenta! Sessenta!
– Rebate esse bicho bezerro. P’ra um lado! Não presta, não pesa nada .
– Oitenta! Cem!
– Cerca o mestiço da Uberaba. Topa, Tote! … Eh bicho bronco … Chi-fre torto, orelhudo, desinquieto e de tundá! … – exclamam os vaqueiros, aplaudindo um auroque de anatomia e macicez esplêndidas, que avançou agredir.
– Estampa de boi brioso. Quando corre, bate caixa, quando anda, amassa o chão!
Agora é o jorro, unido, de bois enlameados, com as ancas emplastadas de sujeira verde, comprimidos, empinados, propelindo-se, levando-se de cambulhada, num atropelo estrugente. Os flanqueadores recuam, alargando o beco.
– Eh, boi!… Eh, boi! …
– Quatrocentos e cinqüenta … e sessenta. Pronto, seu Major.
Corta o lado o Major Saulo, envolto na capa larga, comandando:
– Dianta, Leofredo! Da banda de lá, Badu!
Vão à frente, Zé Grande, tocando o berrante, e Sebastião, que solta a toda a garganta o primeiro aboio, como um bárbaro refrão:
– Eêêê, bo-oi!…
Escalonados, do flanco direito, Leofredo, Tote, Sinoca e Benevides. Da banda esquerda, Badu, Juca Bananeira, Silvino e Raymundão .
– Boiada boa! … – proclama o Major, zarpando.
– Burrico miserável! … – desabafa João Manico, cravando as esporas nos vazios de Sete-de-Ouros, que abana a cabeça, amolece as orelhas, e arranca, nada macio, no seu viageiro assendeirado, de ângulo escasso, pouca bulha e queda pronta.
Caniço de magro, com um boné de jóquei no crânio, lá vai Francolim, logo atrás do Major.
– Eh,boi!. .. Eh, boi …
E, ao trompear intercadente do berrante, já ecoam as canções:
“O Curvelo vale um conto,
Cordisburgo um conto e cem.
Mas as Lages não têm preço,
Porque lá mora o meu bem … ”
Nenhum perigo, por ora, com os dois lados da estrada tapados pelas cercas. Mas o gado gordo, na marcha contraída, se desordena em turbulências. Ainda não abaixaram as cabeças, e o trote é duro, sob vez de aguilhoó-das e gritos.
– Mais depressa, é para esmoer?! – ralha o Major. – Boiada boa!. .. Galhudos, gaiolos, estrelos, espácios, combucos, cubetos, lobunos, lompardos, caldeiros, cambraias, chamurros, churriados, corombos, cor-netos, bocalvos, borralhos, chumbados, chitados, vareiros, silveiros … E os tocos da testa do mocho macheado, e as armas antigas do boi comalão …
– P’ra trás, boi-vaca!
– Repele Juca … Viu a brabeza dos olhos? Vai com sangue no cangote.
– Só ruindade e mais ruindade, de em-desde o redemunho da testa até na volta da pá! Este eu não vou perder de olho, que ele é boi espirrador…
Apuram o passo, por entre campinas ricas, onde pastam ou ruminam -outros mil e mais bois. Mas os vaqueiros não esmorecem nos eias e canti-gas, porque a boiada ainda tem passagens inquietantes: alarga-se e recomprime-se, sem motivo, e mesmo dentro da multidão movediça há giros estranhos, que não os deslocamentos normais do gado em marcha -quando sempre alguns disputam a colocação na vanguarda, outros procu-ram o centro, e muitos se deixam levar, empurrados, sobrenadando quase com os mais fracos rolando para os lados e os mais pesados tardando para trás, no coice da procissão.
– Eh, boi lá! … Eh-ê-ê-eh, boi!. .. Tou! Tou! Tou …
As ancas balançam, e as vagas de dorsos, das vacas e touros, batendo com as caudas, mugindo no meio, na massa embolada, com atritos de cou-ros, estralos de guampas, estrondos e baques, e o berro queixoso do gado junqueira, de chifres imensos, com muita tristeza, saudade dos campo; querência dos pastos de lá do sertão …
“Um boi preto, um boi pintado,
cada um tem sua cor.
Cada coração um jeito
de mostrar o seu amor.”
Boi bem bravo, bate baixo, bota baba, boi berrando … Dança doido, dá de duro, dá de dentro, dá direito … Vai, vem, volta, vem na vara, vai não volta, vai varando …
“Todo passarinh’ do mato
tem seu pio diferente.
Cantiga de amor doído
não carece ter rompante … ”
Pouco a pouco, porém, os rostos se desempanam e os homens tomam gesto de repouso nas selas, satisfeitos. Que de trinta, trezentos ou três mil, só está quase pronta a boiada quando as alimárias se aglutinam em bicho inteiro – centopéia , mesmo prestes assim para surpresas más.
– Tchou!…Tchou!…Eh, boooi!…
E, agora, pronta de todo está ela ficando, cá que cada vaqueiro pega o balanço de busto, sem-querer e imitativo, e que os cavalos gingam bovinamente. Devagar, mal percebido, vão sugados todos pelo rebanho trovejante – pata a pata, casco a casco, soca soca, fasta vento, rola e trota, cabisbaixos, mexe lama, pela estrada, chifres no ar…
A boiada vai, como um navio.
A literatura ocidental passa muito bem sem a literatura brasileira.
Literatura brasileira é superestimada apenas por quem não sabe outra língua.
A cultura brasileira não tem a menor importância para a civilização ocidental.
Para quê tanto estardalhaço em relação à escritores brasileiros?
Tudo cópia ou inspirado nos países que têm cultura de verdade, tradutores de verdade, escritores de verdade.
Nelson Lott não se preocupe.
Isto é um jogo né?
Superestimado não significa não estimado, verdade?
Porque praticamente a totalidade dos autores citados nestes comentarios são bons ou muito bons…
Roger: considerar um autor superestimado não é o mesmo que declará-lo ruim. Ele pode ser bom e ter, porém, um cartaz que se considera excessivo. Este é o espírito do jogo.
Pois é. O problema é que em muitos destes comentários o espírito parece ser se burlar de autores que não merecem isso.
A gente brincava com isso na faculdade, na Espanha. A superestimada número 1, todos concordávamos, era Virginia Woolf. E ninguém gostou do Ulysses. Mas eu não diria mais, como dizia nesses anos, que Virginia Woolf não vale nada.
Do mesmo jeito, dizer isso sobre o Jorge Amado ou outros só desacredita quem o diz.
Além disso, para mim, de todos os escritores brasileiros que eu li, o grande romancista (que não é a mesma coisa que o grande autor ou grande escritor) é Érico Verissimo.
Vou me corrigir. Dei uma olhada de novo e não tem tantos comentários arrogantes assim. A maioria são respeitosos e até instrutivos. 🙂
Mas vamos la, falando de livros e nao de autores. Ai vao meus canones ao avesso.
The Poe Shadow – Matthew Pearl
Selvagem da Opera – achei fraco apesar de admirar a forma de narrar do Fonseca – o Carlos Gomes parecia o Cobrador! Os outros livros sao bons, especialmente os contos reunidos.
Cabra-cega – do Carlos Nascimento Silva. Achei uma estoria confusa pra dedéu (primeiro pensei que era espiritismo, depois telepatia, por fim macumba da brava).
Agua Viva – Clarice Lispector e na carona, sua versao atual ( Berkeley em Belagio e A Ceu Aberto do Noll). O Harmada eh bom.
Macunaima – Mario de Andrade que engalbelou por anos minha consciencia ruminante com aquele papo de que minha cultura regusgitada era antropofagica
O triste fim de Policarpo Quaresma – Lima Barreto. Eh triste mesmo. E pior, semelhante ao O Duplo do Dostoievski. A proposito enfia ai o Noite Branca – romance da juventude – do homem e que o Visconti deu uma melhorada na tela.
La autopista del sur – Cortazar e se der pra enfiar o Weekend do Goddard eu agradeceria muitissimo aos moderadores deste recinto.
Great Gatsby – Fitzgerald
Canaa do Graca Aranha. Sim, acho que eu fui o unico infeliz na face da terra a ter lido esse livro infeliz. Por isso eu acho que depois disso qualquer calculo renal, Iracema, Copo de Colera, tudo sai na ‘oRiNa’.
Galatea 2.2 – Richar Powers. Eh um daqueles livros que o Millor dizia… eh um livro que assim que se larga nao se volta mais a ele. Larguei no meio! Esse eh o pior da minha lista
Opinions of Tristam Shandy – Lawrence Sterne. Laguei no meio athe por que o Bras Cubas do Machado eh infinitamente melhor.
Cabeca de Papel – Paulo Francis. Sei la, talvez seja uma injustica, mas eu acho que eh um livro que so ele entendeu.
Tragedia da Rua das Flores – Eça. Achei inverosimil.
Maria da penha pinta as unhas para ira choperia mostar o trabalho da manicure ( ou algo assim) do Mirisola, eh diversao grosseira.
Las peliculas de mi vida – Alberto Fuguet, pela superficialidade e pela eficiencia da propaganda!!
Nota. O Diario de um mago eh ruim, nao por ser um plagio de um conto do Borges, mas dei uma chance pois pensei na epoca equivocadamente… eh o primeiro livro, temos que dar uma chance….entao outro dia resolvi folhear o Veronika decide morrer…. qual nao foi minha surpresa ao constatar que o Coelho escreve assim mesmo, de maneira superficial, rasteira, tratando o leitor como um proselito debil mental.