Na já tradicional mesa dos “novos autores”, sempre a primeira de quinta-feira, terminada há pouco, o mediador João Moreira Salles se confessou em grande dificuldade para encontrar o “mínimo denominador comum” entre quatro escritores que, além de terem estilos diferentes, nem mesmo no tempo de carreira se parecem: de um lado Michel Laub e Adriana Lunardi, quase veteranos com seus três livros cada um, e do outro os calouríssimos Vanessa Barbara e Emilio Fraia, autores de “O verão do Chibo” (Alfaguara), um romance escrito, coisa rara, a quatro mãos.
Um dos pontos de contato que Moreira Salles descobriu entre eles – além de gozações como “sobrenomes iniciados por consoantes” – me chamou a atenção: todos têm bem-sucedidas carreiras paralelas à literatura, Adriana como roteirista de TV, os outros três como jornalistas. Pode parecer a maior das banalidades, mas numa mesa de novos e seminovos achei muito significativo. Talvez indique que está passando aquele sarampo neo-romântico que acometeu muita gente nos últimos anos: tratar a literatura como se ela simplesmente devesse ao escritor sua subsistência, ainda que precária, e que qualquer desvio dessa rota é uma sórdida traição à arte.
15 Comentários
Mas bem que eu adoraria não ter que trabalhar como mero proletário e só escrever. Corro livrarias, corro jornalistas, corro cadernos literários no país, atrás de um espaçozinho e um pouco de visibilidade. Bater cartão? Uma merda…
Agora é só esperar pra ver o pessoal chegar aqui e falar mal desses autores que você citou Sérgio.
Sempre acontece isso toda vez que se fala em alguém que está com um livro ou dois e é considerado autor novo ou seminovo…
A inveja é um dos piores males do ser humano…
Mr. Writer,
ninguém está escrevendo nada nestes posts. Parece que há somente indiferença…
errata: onde lê-se “ninguém”, leia-se “quase ninguém”.
Seja lá qual for, será sempre um prazer viver de sua arte. Esse seu também de quem for.
As editoras conseguem viver de livros, não?
Os jornalistas vivem do que escrevem?
Os blogueiros ainda não.
Bah, sem muitos paralelos por hoje que tenho trabalho para fazer.
Entao vamos la… a cultura do nao-trabalho… a velha tese quando se fala dos escritores….
Seu post é extremamente pertinente, Sérgio (há não muito tempo, a turma do sarampo neo-romântico chegou a reivindicar grana do governo para viajar, divulgar seus livros, etc, lembra?). Para lembrar só dois exemplos: Machado de Assis era funcionário público e nunca deixou a função para escrever; Erico Verissimo cuidava de uma farmácia e no começo da carreira escrevia apenas aos sábados. Deve haver dezenas de outros exemplos por aí. Abraços (com uma certa inveja de você por estar na Flip…) 🙂
Sou, vcs sabem, da seguinte opinião: 1] escrevamos, pelo diálogo, jamais pelo monólogo. 2] viver “com” ou “para” a literatura, jamais “da” literatura (no sentido “parasitário” do termo), logo, 3] ter um emprego é essencial, até, como fonte de informação esclarecida que, potencialmente, será usada para ficções ou ensaios.
Você tem algum problema em ver SD8 na lista dos mais vendidos e não fazer outra coisa senão receber os contra-cheques e escrever quando não está pescando? Eu não…
Há escritores e escritores. Alguns, pela própria natureza, estilo ou alcance do que tem a comunicar, tornam-se populares e portanto ganham dinheiro com seus livros e são reconhecidos socialmente como escritores. Outros precisam falar de temas que não interessam a tantos, ou exigem mais do leitor, seja pelo escopo onde trafegam suas idéias ou por sua linguagem. Esses ganham o selo “cult” e viveriam na miséria se dependessem da venda de seus escritos para financiar seu dia a dia.
Acho natural que os que mantém-se escrevendo sobre o que precisam sem se inclinar aos apelos do mercado, sejam vistos como mais próximos da arte, mas também como amadores, distantes da alcunha de profissionais.
O que eu acho estranho é a noção = ou – generalizada de que escrever não é trabalho e literatura é hobby. Quanto a sobreviver dela, acredito que a sorte e a competência contam, como em qualque outro ofício. Ou vcs já se esqueceram da piada dos arquitetos na arena dos leões?
Sera que o senhor Joao Moreira Sales era o mediador mais indicado para esta mesa ja que pelo que parece ele mau conhecia os autores?
O João conhece os autores bastante bem, Claudio. É até chefe da maioria deles.
Noga, não me inclua entre esses aí que você cita. Quem puder viver do seu texto não deve hesitar em fazê-lo, e eu seria louco de condenar um caminho de profissionalização que, de uma forma ou de outra, é o meu próprio. Nada de brincadeira, passatempo (dando dinheiro ou não, aliás, a coisa é seriíssima). Mas, além do fato de que esse projeto de profissionalização costuma levar anos para amadurecer, e no meio tempo é preciso comer, e também que poucos tipos de literatura se prestam a ele, garantir a subsistência em outras fontes, geralmente na vizinhança da literatura, passa a ser não apenas uma questão básica de bem-estar e auto-estima: a própria liberdade artística depende disso, para que amanhã o cara não seja praticamente forçado a trair tudo aquilo em que acredita em troca de um pão com manteiga.
Um abraço.
São ótimas essas “tiradas” do Tibor 🙂 Amigo, sem problemas “viver de literatura”, caso se restrinja à venda de livros e/ou colaborações em revistas/jornais ou em eventos cobrados. Palestras educacionais em escolas, bibliotecas, universidades etc, no Rio, eu faço de graça.
Acho, porém, que ao escritor, faz bem ter uma outra profissão: professor, entomólogo, bibliotecário, funcionário público, médico, jornalista, analista de sistemas etc.
Nabokov foi um grande entomólogo, mais precisamente, foi um grande lepidopterologista. Aposto que poucos sabiam isso.