Clique para visitar a página do escritor.

O grandioso projeto de Antenor, microcontista do Twitter

16/01/2012

O microcontista Antenor já gostava de escrever contos curtos antes do Twitter. O que a rede social lhe proporcionou, além de um mural onde publicar sua obra até então inédita, foi um foco preciso. Isso foi mais importante até do que o próprio mural: a concentração que o limite de 140 caracteres lhe deu.

De mistura com a concentração de Antenor veio a grande ambição de Antenor: ser o primeiro dos microcontistas “científicos”. Aplicar a exigente moldura dos 140 toques a todos os aspectos da técnica ficcional, mapeando exaustivamente recursos e efeitos. Esquadrinhar as sete províncias da prosa imaginativa, projeto rascunhado certa manhã por Walser numa cabeça de alfinete, e ir além. Construir personagens redondos com pinceladas retas, lançá-los em conflitos épicos, guardar espaço para o twist final. Tudo num registro que ponha em questão a própria ideia de registro, brincando com a linguagem. Eis a meta, de resto tão inatingível quanto a imortalidade do corpo.

Contudo, não sendo possível conjugar perfeitamente foco e amplitude, é possível – tem de ser, é a aposta de Antenor – determinar onde e por quê. Onde começa o impossível e o que acontece com a história a partir daí: quando se fica com a amplitude, por que a definição dos traços se esfuma; e quando se agarra o foco com pulso firme, por que o campo de visão vira um diafragma anal em momento de grande aperto. O que pode ser feito para minimizar tal incompatibilidade: listar e classificar todos os recursos conhecidos, fusão, elipse, metonímia, aliteração, neologização, trocadilho, parábola, etc.

O rigor com que abraçou seu projeto faz Antenor ter à sua frente um puxado cronograma de produção de dezenas de milhares de microcontos pelos próximos trinta anos: cinco por dia, seis dias por semana. Naturalmente, uma maioria – em torno de 99% – será lixo, rebotalho, palavras automáticas, podres, carcomidas, mortas. Isso está no projeto de Antenor. Embora, sendo um espírito científico, reconheça haver nessa tentativa de precisão um alto grau de palpite, ele estima que o ouro não possa se produzir a taxas superiores a 1%. Dentro de três décadas, portanto (está hoje com 35 anos), terá cerca de quatro centenas de obras-primas incontornáveis, monolitos fincados bem no coração da história universal das micronarrativas. Esse é o negócio de Antenor, e ele acha que não é um mau negócio.

Enquanto isso, vai enchendo seus poucos seguidores de hermetismos e irrelevâncias. Mas tem a paciência dos predestinados, porque conhece como ninguém um dos segredos do mundo: a brevidade toma tempo demais.

6 Comentários

  • josé marins 16/01/2012em19:27

    O miniconto é um texto literário se for um conto. Tenho lido bons minicontos e bons autores deste gênero estão surgindo. São os que desenvolveram domínio técnico da forma: a linguagem sucinta, objetiva, a elipse narrativa, o impacto do desfecho, e superaram a facilidade do piadismo, pouco encontrado na maiorias dos minicontos atuais, principalmente na Internet.

  • W. Gorj 16/01/2012em21:27

    Pensei em Maux Aub, com seus deliciosos microtextos do livro Crimes Exemplares. Uma obra-prima, sem dúvida. Um livro cujos textos caberiam quase todos no Twitter. Abraços.

  • Alvaro Posselt 17/01/2012em13:34

    Lembrei-me de um professor que dizia: 99% transpiração e 1% inspiração. Não basta escrever uma frase e dizer que é um miniconto, assim como não basta escrever três versos e dizer que é haicai. Tenho visto muito trocadilho, piada e até mesmo aforismo. “A brevidade toma tempo demais”.
    Mas muitos autores já estão no caminho certo!

  • Osiris Duarte de Curityba 18/01/2012em12:46

    Pois se é assim, eu quero conhecer a “obra” deste tal Antenor, para que eu aprenda como não se deve escrever …

  • Felipe Holloway 20/01/2012em11:55

    Um Pierre Menard minimalista, esse Antenor!

  • Lilian 13/02/2012em03:22

    O texto me fez lembrar do projeto Six words, que vem sendo desenvolvido nos Estados Unidos.Conta a lenda que desafiado, Hemingway topou escrever um conto em seis palavras e compôs: For sale: baby shoes, never worn. (à venda. Sapatos de bebe jamais usados).