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O amor literário é a raiz quadrada do ódio

04/04/2012

Otto Bax (autorretrato com esferográfica, 2007)

A fórmula v = b², proposta em seu clássico The supercool writer’s decalogue por Otto Bax, o berlinense suicida, é a genial quantificação de uma lei universal que, apesar de pressentida por geração após geração de cultores das letras, permanecia desde Homero no campo obscuro das intuições: no âmago de todo escritor, o número de colegas desprezados é igual ao número de colegas admirados ao quadrado. O que equivale a dizer, naturalmente, que o amor literário é a raiz quadrada do ódio.

(As iniciais v e b correspondem respectivamente às palavras Verachtung, “desprezo”, e Bewunderung, “admiração”. Optamos por não traduzi-las, discordando de outros autores, devido à consagração da fórmula de Bax nos mais influentes círculos da coologia acadêmica literária internacional.)

Não contente em capturar na malha dos números aquilo que se julgaria imponderável, Bax foi além e, antes de aplicar na própria veia uma gorda injeção de Frischluft, propôs outra lei universal: quando se levam em conta apenas autores vivos, a fórmula se transforma em v = b³, o desprezo equivalendo à admiração elevada ao cubo.

Infelizmente, a morte prematura de Bax não lhe deu tempo de se aprofundar nas consequências de seus achados para o estudo da complexa rede de alianças programáticas, declarações de guerra, elogios hipócritas e trairagens variadas que compõe os mecanismos dentados de fabricação e destruição da respeitabilidade literária.

Do planejado livro Über Ruhm (“Sobre a glória”) – que, na falta de amigos, Bax disse a pelo menos meia dúzia de garotos de programa ser o trabalho de sua vida – foram encontradas apenas anotações soltas em seu apartamento caótico. No meio delas, porém, destaca-se um aforismo de brilho ofuscante: “As panelinhas sugam todo o coeficiente de admiração para dentro de si mesmas, restando para o mundo lá fora nada além de um desprezo cúbico”.

Sobre o autodesprezo – e o risco que ele representa para a própria vida do escritor – Otto Bax não escreveu uma linha sequer.

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