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O Estado deve incentivar escritores a escrever?

05/06/2008

O André Gonçalves sugere um excelente tema de debate:

Como disse, está havendo o Salão do Livro, aqui em Teresina. E 9 entre dez “escritores” reclamam da falta de apoio, da falta de incentivo, etc, etc, etc. Pergunto: até que ponto é obrigação/responsabilidade do Estado ou da iniciativa privada bancar/financiar livros (considerando-se que 90% deles, eu inclusive, ou mais, sejam de interesse único e exclusivo do autor e sua família, ou fruto de vaidade, ou qualidade literária sofrível)? Como incentivar novos escritores? Concursos premiam um de cada vez, e olhe lá. Enfim, qual o papel do Estado nisso tudo? Bem, se acreditar que isso pode ser um bom tema, ótimo. Senão, ao menos pode-se discutir por aqui.

Isso me fez lembrar de um link sugerido ontem na caixa de comentários do post da “Granta” por outro leitor: uma reportagem do “Jornal do Brasil” de três semanas atrás – que tinha me escapado por completo – sobre as insatisfações que começam a pipocar no bonde literário da Petrobras, o mais gordo e populoso do país.

O tema, que a partir deste momento está aberto para debate, é controverso. Vou gostar de ler as opiniões dos dois lados.

Mas não digam que fiquei em cima do muro. Acredito que o Estado tenha um único – e importantíssimo – papel em relação à literatura: cuidar dos leitores, tanto de sua formação (oferecendo uma educação pública de qualidade) quanto de seu acesso aos livros (por meio de uma boa rede de bibliotecas, campanhas de divulgação, incentivos para publicações de baixo custo etc.). Digamos que no desempenho desse papel, numa escala de zero a dez, o Estado brasileiro leve nota um.

Quanto à outra ponta da cadeia, a do escritor, o Estado não deve se meter, nem diretamente nem com programas que envolvam renúncia fiscal. Se quiser dar um prêmio de vez em quando, com base no julgamento de pessoas de notório saber, em reconhecimento à qualidade de um trabalho já realizado, tudo bem. Mais do que isso me parece um disparate.

84 Comentários

  • dona de casa gorda 05/06/2008em15:45

    e que fim deu aquela barbaridade dos ‘amores expressos’? ainda estamos pagando por aquelas viagens? escritor financiado pelo estado é, de fato, um delírio só imaginável no contexto stalinista.

  • Tibor Moricz 05/06/2008em16:08

    Não tenho nada contra, desde que depositem na minha conta…

  • Julio 05/06/2008em16:20

    E os próprios escritores sentem na pele a ineficência de programas estatais, tiveram que passar pelo processo da Petrobras e depois pela Lei Rouanet (nao dinheiro direto da estatal, dinheiro do tesouro mesmo).

    A matéria do jornal passa bem a mentalidade que o estado deve pagar pela nós, e trabalhos externos são um sacrifício. Nunca vi poeta vivendo de poesia: “Em vez de se dedicar ao projeto, teve que assumir outros trabalhos para pagar suas contas: revisão de textos, fechamentos de revistas e aulas como professor substituto”. Nossa, que pecado, estou trabalhando!!

    Mas o pior mesmo é aula de dança do ventre, desculpe repetir, mas por que tenho pagar isso?
    S. Campos: “– Aproveito o dinheiro para comprar livros em sebos e um laptop para poder escrever aonde quiser. – conta. – O patrocínio ajuda o escritor a se livrar da pressa cotidiana. Auxilia também a fazer algumas atividades inspiradoras. Comecei a ter aulas de dança do ventre e isso me serviu de inspiração para um conto.

    Pegando aquele link, olha só o que estamos pagando:

    AMOSTRAGEM COMPLEXA
    Protocolo: 296
    Proponente: Simone Silva Campos
    Estado do Proponente: RJ
    Apresentação: Livro de contos de uma autora que já tem dois romances publicados.

    A FILHA DO ESCRITOR
    Protocolo: 1397
    Proponente: Gustavo Bernardo Galvão Krause
    Estado do Proponente: RJ
    Apresentação: Romance metaficcional, tematizando o universo literário de Machado de Assis por meio da história de uma protagonista que se vê filha do escritor e que está internada num manicômio.

    UMA HISTÓRIA À MARGEM
    Protocolo: 1542
    Proponente: Ricardo De Carvalho Duarte – Chacal
    Estado do Proponente: RJ
    Apresentação: Narrativa ficcional de aspecto memorialístico que repassa a experiência da poesia marginal, do teatro experimental e da poesia falada a partir dos anos 70.

    A FÁBRICA DO FEMININO
    Protocolo: 2186
    Proponente: Paula Glenadel
    Estado do Proponente: RJ
    Apresentação: Livro de poesia organizado em torno da noção do “feminno” na perspectiva do humano.

    TODOS OS CACHORROS SÃO AZUIS
    Protocolo: 3472
    Proponente: Rodrigo Antonio de Souza Leão
    Estado do Proponente: RJ
    Apresentação: Apresentado como uma espécie de delírio, mesclando nomes de remédios, visões literárias fantasmais e registros do cotidiano, o texto é um estudo de caso em forma de ficção.

    PROJETO LITERÁRIO PRIMAVERA NOS OSSOS – ROMANCE
    Protocolo: 3533
    Proponente: Alessandra Leila Borges Gomes
    Estado do Proponente: BA
    Apresentação: Romance com linguagem experimental focada na representação da experiência de uma mulher estuprada.

    “ESSA COISA BRILHANTE QUE É A CHUVA”
    Protocolo: 3798
    Proponente: Cintia Moscovich
    Estado do Proponente: RS
    Apresentação: livro de contos com temática voltada para a contingência do individuo no mundo.

    A EXTINÇÃO DA INFÂNCIA
    Protocolo: 3826
    Proponente: João Carlos (Joca) Reiners Terron
    Estado do Proponente: SP
    Apresentação: Romance que tematiza a perda do universo infantil, numa estrutura e numa linguagem impactante.

    .
    “EU QUERO SER EU”
    Protocolo: 4630
    Proponente: Clara Averbuck
    Estado do Proponente: SP
    Apresentação: Proposta de romance juvenil, tematizando a história de uma adolescente em choques com os valores conservadores.

    http://www2.petrobras.com.br/cultura/ppc/edicao/resultados/resultados_literatura.asp

  • Tibor Moricz 05/06/2008em16:30

    “ESSA COISA BRILHANTE QUE É A CHUVA”
    Protocolo: 3798
    Proponente: Cintia Moscovich
    Estado do Proponente: RS
    Apresentação: livro de contos com temática voltada para a incontinência do individuo no mundo.
    Típica chuva dourada…rsrs

  • Luiz Mozzambani Neto 05/06/2008em16:49

    Penso que o estado deveria incentivar a produção literária, através de concursos e prêmios,mas apenas no período escolar, no máximo até o colegial…

    A partir de então quem deve bancar o escritor é o leitor através da compra de seus livros ou de sua procura nas bibliotecas… Uma mãozinha do estado ao leitor, através do barateamento e maior disponibilidade do livro não faria mal a ninguém, nem aos cofres públicos, mas que pare por aí!

  • Chato 05/06/2008em17:13

    Como sempre, o Estado ajuda se não atrapalhar: não deve tributar o livro em nenhuma etapa da cadeia produtiva (em tese seria imune, em matéria tributária, mas na prática não é bem assim).

    E de resto deve cumprir as suas obrigações mínimas – o que no Brasil sempre acaba ficando de lado – ou seja, dar educação de qualidade e meios de vida que permitam, além da cesta básica, comprar um livro de vez em quando.

    No mais, nunca vi Estado instilar criatividade em escritor algum. O contrário, no entanto, é bem verdadeiro.

  • Joca Oeiras 05/06/2008em17:39

    Em primeiro lugar eu colocaria as coisas num outro patamar: acho que o Estado, e não apenas o Estado, mas todas as autoridades educacionais neste país devem, e muito, incentivar as pessoas a escreverem. Não falo escritores porque antes de escrever não se pode dizer que alguém seja escritor, mas o que eu quero dizer que todas as pessoas que possam ser leitoras são, não há motivo para que não sejam, potenciais escritoras.
    Acho que estas campanhas incentivando a leitura de livros são, não apenas elitistas – promovem uma reserva de mercado ideológica – como também extremante colonizadas.
    Por isso sou contra as campanhas do tipo “Leia mais”. Acho que todas as pessoas que escrevem; professores, jornalistas, os tais escritores, advogados, juízes, enfim, todas as pessoas que se utilizam da escrita como instrumento de trabalho deveriam descer de seu pedestal e entrar fundo numa, essa sim, meritória campanha “ESCREVA MAIS”!

    É preciso desmistificar esta idéia segundo a qual “é muito difícil expressar-se através da escrita”. Acho, também, que esta “conspiração do silêncio” em torno de uma verdade tão simples, a saber, que só se aprende a ecrever, escrevendo; é o que justifica o imenso ego que os “Escritores” ostentam.

    Então, acho sim que o Estado, se tem este lado “educador”, deve estimular de todas as maneiras que as pessoas escrevam desde o momento em que aprendem as primeiras letras. Democratizar a Escrita, eis a palavra de ordem que eu reputo fundamental para a Escola brasileira. A ênfase na leitura, em detrinmento da escritura, é lastimável. precisamos planejar ações para que, no futuro, e a internet está ai para nos ajudar nisso, tenhamos uma Sociedade de Escritores.
    É o que penso, no momento. Espero ter contribuido para o debate.
    jbeijos e abraços
    do Joca Oeiras, o anjo andarilho

  • Lucas Colombo 05/06/2008em17:47

    Concordo inteiramente com você, Sérgio. O Estado tem é que cuidar dos leitores. As leis de incentivo à cultura já viraram uma farra. É muito cômodo usá-las. Ganha espaço no mercado cultural quem tem criatividade e planejamento. E, claro, uma obra qualificada. É isso que se espera. Ficar ‘empurrando’ livros e filmes de baixa qualidade, porém incentivados pelo Estado, é realmente um desserviço. Abraço!

  • C. S. Soares 05/06/2008em17:48

    Sérgio, é exatamente o que acho. Concordo plenamente com sua opinião. Para escrever, o escritor precisa de “lápis e papel”, não de bolsa literária. Que o governo trate do incentivo à leitura e as editoras nacionais invistam mais na produção nacional.

    Deixo com vocês as sábias (e definitivas) palavras de William Faulkner (em entrevista para a Paris Review):

    “The writer doesn’t need economic freedom. All he needs is a pencil and some paper. I’ve never known anything good in writing to come from having accepted any free gift of money. The good writer never applies to a foundation. He’s too busy writing something.

    Precisa dizer mais algumas coisa?

    Quem quiser ler a entrevista na integra acesse: http://www.theparisreview.com/media/4954_FAULKNER4.pdf

  • Rafael 05/06/2008em18:02

    Secundando o comentário do Joca, gostaria de enfatizar que não basta o Estado fazer com que as pessoas escrevam mais. Isso é pouca pretensão, coisa de quem não acredita em utopias. Precisamos forçar as pessoas a escreverem, e a escrever bem, sem solicismos, sem cacófatos e sem vícios de linguagem. Por isso, é necessário o retorno da palmatória, o melhor instrumento inventado pelo homem, depois do quadro-negro, para educar as pessoas. Ai daquele que não concordar o verbo com o sujeito e daquele que enfiar a vírgula entre o adjetivo e o substantivo a que se refere! Palmatória neles!

  • Rafael 05/06/2008em18:09

    Depois do solicismo, palmatória é pouca. Exponho meu flanco à chibata…

  • Chico 05/06/2008em18:22

    Lembro de uma entrevista interessantissima de um poeta chapa-branca portugues – de quem, criticas a parte, gosto muito – chamado Vasco Graca Moura. Ele dizia que o oficio de escritor eh um salto num precipicio vazio. Nao ha nenhuma promessa. Portanto, ele era contra a qualquer ajuda estatal, bolsa, residencia de escritores e coisas do tipo. Dizia que lanca-se ao ofico quem quer, assumindo os riscos do fracasso e da probreza. Apenas nao espere que o Estado te ampare.

    Tendo a concordar com essa opiniao. Talvez ateh desconheca casos de grandes escritores brasileiros que nao tenham tido carteira assinada e cartao de ponto- mesmo que nao passasse de uma sinecura.

    A questao eh… se o cidadao eh escritor e tem um trabalho de 8 horas, em que uma suposta bolsa irah incentiva-lo, ou alterarah sua rotina?

    Mas num pais onde a categoria “trabalho” eh um nao-valor, eh obvio e nao me espanta que muita gente por ai seja a favor de prebendas.

  • Noga Lubicz Sklar 05/06/2008em18:48

    Para o Claudio S.: “Faulkner donated a portion of his Nobel winnings ‘to establish a fund to support and encourage new fiction writers’, eventually resulting in the PEN/Faulkner Award for Fiction. ”
    Tendo isso esclarecido, só conheço uma coisa que faz de alguém um escritor: escrever, escrever, e escrever. Agora, se o sujeito não tem como sobreviver, e bolsas e prêmios devem ser desencorajados… Bem: quem souber a receita de como fazer uma omelete sem nenhum ovo pode me enviar.
    Ao longo de toda a história da arte, a sobrevivência de um artista sempre dependeu da “bondade de estranhos”, incluídos aí os mecenas de James Joyce, ou vcs acham que o Ulisses foi escrito em ritmo de “bico”?
    Muito pior que a subserviência aos canones do Estado é a subserviência aos interesses (muitas vezes escusos) do mercado. O problema não é o patrocínio do estado, mas a corrupção endêmica que o cerca.

  • Noga Lubicz Sklar 05/06/2008em18:50

    ops, patrocínio do Estado, com “E” maiúsculo.

  • Pedro David 05/06/2008em19:04

    Acho que o estado tem obrigação de promover uma educação de qualidade, que torne as pessoas autodeterminadas. Não estou falando de uma educação socialista para a concientização dos povos, etc. Educação, básica: português, matemática, cultura, esporte, línguas estrangeiras. Daí por diante, se o cara quiser ser escritor, cineasta, engenheiro naval, índio, hippie, problema dele. O que não pode é as pessoas não terem opção, ou o que é mais comum, nem saberem quais são as opções… Parece que eu estou fugindo do assunto, mas não. O Estado deve dar subsidio à formação de professores de literatura, portanto, mas de ecritores não.

    Agora, abindo uma outra discussão, acho muito típico da minha geração essa história de achar que vai viver de literatura, cinema, poesia… Na minha faculdade, que eu terminei recentemente, todo mundo era “gênio”, e pegava muito mal ter que trabalhar na grande imprensa, como eu trabalho…Será uma exclusividade da minha geração mesmo, que por causa da internet, desde logo acostoumou-se a publicar tudo o que escreve e fotografa ?

  • ricardo 05/06/2008em19:33

    sérigo está certo. num país sério, desenvolvido, a educação no 1º e no 2º grau deve ser gratuita e de qualidade, formadora de leitores; e o mercado editorial deve ser forte, para produzir maiores tiragens e remunerar decentemente os autores.

  • Nestor Magalhães 05/06/2008em19:50

    Em algum lugar da sua biografia de Joyce, Richard Ellman afirma que o escritor irlandês as vezes comentava que desejaria viver em um regime socialista no qual fosse pago para escrever. Joyce era sabidamente um homem de esquerda (é só lembrar do Dedalus logo no início de Ulysses: “Moi, je suis socialiste. Je ne crois pas en l’existence de Dieu”).
    Mas, fato é: nenhum Estado deu centavo algum para Joyce e mesmo assim ele seguiu com a elaboração de sua monstruosa obra (com a a ajuda de um tanto bom de mecenas). Mas isso fica aqui só como anedota.
    Que a literatura seja bancada pelo Estado é inaceitável. Se o indivíduo deseja fomentar a literatura que ele compre livros. O Estado poderia no máximo reduzir a carga tributária no que tange a publicação e circulação de livros, estabelecer uns pouscos prêmios literários (como foi dito), e fortalecer a educação (como já foi também dito).

  • shirlei horta 05/06/2008em21:46

    Eu concordo totalmente com você, Sérgio, mas fico sem argumentos para justificar a existência, desde sempre, dos mecenas. De qualquer forma, Estado tem outras funções; misturar estações resulta, quase sempre, em propinodutos.

  • C. S. Soares 05/06/2008em22:40

    Ao contrário do que vc disse, Noga, nada fica esclarecido. Faulkner ganha o Nobel em 1949 e a entrevista é de 1956. Morre em 1962 e o prêmio começa a ser outorgado em 1981.

    Vivemos uma democracia, logo, pelos que são a favor de bolsas para escritores, sugiro que a criação da CSE (não confundir com o glorioso Centro Social Esportivo, de Alagoas, “arquirival” dos não menos gloriosos CSA, CRB e ASA, o de Arapiraca, lógico, quem aqui não saberá?). CSE = imposto = Contribuição Social da Escrita. Vcs pagariam?

  • C. S. Soares 05/06/2008em22:42

    Sendo imposto, claro.

  • Rafael Rodrigues 06/06/2008em00:02

    “Acredito que o Estado tenha um único – e importantíssimo – papel em relação à literatura: cuidar dos leitores, tanto de sua formação (oferecendo uma educação pública de qualidade) quanto de seu acesso aos livros (por meio de uma boa rede de bibliotecas, campanhas de divulgação, incentivos para publicações de baixo custo etc.).” Você mesmo respondeu, Sérgio. É isso aí mesmo, nem mais, nem menos. Abraço!

  • Gepeto Ígor 06/06/2008em02:34

    O Estado não deveria incentivar escritores, mas matá-los. Aliás, é para isso mesmo que existem os Estados. Só para isso: matar escritores. De fome, de preferência.

    Mas o Estado também não deveria dar empréstimos de mãe (“pague quando puder, ou não pague, se quiser”) para portais picaretas de internet que contratam escritores frustrados travestidos de jornalistas literários. Não estou dizendo que isso acontece – não no Brasil, certamente… Mas, se acontece em algum lugar, deveria ser proibido. E também os donos dos portais, os jornalistas mal-pagos e todo o maldito público leitor deveriam ser mortos e enterrados numa enorme vala comum, no meio do Mato Grosso, ao lado dos escritores mortos de fome. Um mundo melhor é possível!

  • Hefestus 06/06/2008em03:44

    Concordo integralmente com teu ponto de vista, Sergio. Vou já delirando na interpretação e começo a pensar que essa farra das “leis de incentivo” é sintoma de uma classe artística que resolveu punir o público que não consome sua arte fazendo-o pagar indiretamente a conta das obras. E isso não se restringe só à arte, me faz pensar em uma tragédia mais ampla Parece haver uma desistência completa do país como projeto coletivo, ninguém mais quer saber do “nobre própósito” de simplesmente unir esforços em nome da idéia de sociedade. Nesse contexto, na política, na economia e na arte o que parece proliferar é gente querendo salvar o seu, já que o nosso Estado morreu e nosso país é um caso perdido mesmo…

  • Sinara 06/06/2008em04:12

    Noga, você escreveu “Muito pior que a subserviência aos canones do Estado é a subserviência aos interesses (muitas vezes escusos) do mercado”.

    Eu acho que os escritores podem servir aos interesses que quiserem, e eles na realidade servem aos próprios interesses, como todo mundo. Só nao quero pagar com o meu dinheiro com isso. “Estado” é abstrato, é o nosso dinheiro que o sustenta. Dinheiro não vem do nada.

  • Noga Lubicz Sklar 06/06/2008em07:19

    Sinara: o problema do Brasil não é que o “nosso” dinheiro paga pelo delírio de outrem. O problema é que no Brasil ninguém paga nada para delirar com cultura. Ponto. Poucos sabem o que cultura é, e neste ponto concordo com o Sérgio et al. A cultura, e em especial a literatura, é um valor desprezado e secundário. Em outros lugares, por exemplo, bolsas de patrocínio são comuns, só que vindas de instituições privadas que todo cidadão abonado faz questão de sustentar com doações, porque é um must, é chique, e uma questão de boa educação. É consenso geral, ou, pelo menos, era, de que o artista é um sujeito fora do comum, e como tal, por proporcionar um prazer fora do comum, merece um tratamento fora do comum também, diferente do nine-to-five dos escritórios. Agora, isso, tratando-se de artistas, claro, não de picaretas e outros interesseiros.
    Eu, por exemplo, embora fã incondicional de Joyce, não desejo uma cultura stalinista e muito menos mamar nas tetas do Estado. Quem me conhece sabe que nem dou pra isso, sempre fracasso em pretensões oficiais, notadamente junto ao MinC, onde estou, no momento, concorrendo a uma bolsa milionária para “obras em fase de conclusão” da Biblioteca Nacional: 1500,00 por mês, e olhem que tem tanto concorrente que a comissão julgadora luta há meses para decidir quem leva, eita paisinho culto esse nosso, sô (como bem disse alguém aí em cima, 90% dos postulantes a escritor, etc, etc). Independentemente disso, faço o que um escritor deve fazer: escrevo, escrevo, escrevo, e, às vezes, publico. Mas isso, claro, é porque sou “rica”, tenho um teto sobre a minha cabeça (cada cabeça uma sentença) e não falta comida na minha mesa. O que não quer dizer que me conforme com a premissa de que quem escolheu a literatura como profissão, deve se preparar para a miséria, para a indigência. A não ser, é claro, que conheça alguma figurinha importante no vasto mundo editorial ou dê uma sorte do cão ou escreva mil vezes melhor do que James Joyce que, aliás, passou a vida sendo rejeitado pelo mercado. E pelo Estado (o Ulisses foi censurado nos Estados Unidos por 11 anos depois de sua primeira publicação na França).

  • Sérgio Rodrigues 06/06/2008em08:50

    Noga, minha admiração por você, que não era pequena, cresceu muito. A coragem de fazer ponderações de cara limpa contra o coro anti-estatal que aqui se instalou – está certo, provavelmente incentivado pelas convicções deste escritor profissional e auto-sustentável que vos fala – não é para qualquer um, não. Imaginei que o debate renderia bem mais. Pena que não tenham aparecido mais defensores de algum tipo de incentivo estatal com a sua dignidade. Coisa fora de moda, talvez. Será que o Hefestus está certo quando vê aí “uma tragédia mais ampla”? Um abraço.

  • Pablo Casado 06/06/2008em09:51

    Por um lado, o cenário ideal é justamente esse que o Sérgio colocou, com o Estado incentivando e dando subsídios para a formação de leitores – algo a se realizar, claro, a médio e longo prazo.

    Digamos que hoje as leis de incentivo servem como paliativo. Há pontos positivos e negativos nelas. Mas não sei se concordo que seja um disparate o apoio, atualmente, aos escritores. Porque, quando olho de um modo geral e percebo para onde vai parte dessa verba em diversos segmentos artísticos, noto projeto interessantes – e, inclusive, mesclando cultura e educação.

    Participei a dois anos do edital do BNB. Meu projeto – uma história em quadrinhos sobre Zumbi e o Quilombo dos Palmares – passou da primeira fase, mas, infelizmente, estancou na fase de seleção final. Um dos projetos vencedores, em Alagoas, foi o de uma ONG no interior do estado, que tratava de estimular a leitura entre alunos de escolas municipais daquela região. Havia mais coisa que deixava a proposta bem bacana, mas não lembro de tudo agora.

    Este foi um exemplo positivo (ao meu ver).

    Negativo, hm… que tal a Bravo! – que é uma revista que gosto, mas hoje não acompanho mais para não estourar meu orçamento de leituras – ser bancada pela Lei Rouanet, quando, por trás da revista, há um grupo do porte da Abril?

  • Escritor pedinte 06/06/2008em10:47

    Por favor, um minuto de sua atenção!

    Eu poderia estar roubando, eu poderia estar matando, eu poderia estar concorrendo às eleições, mas estou aqui escrevendo….

    Me dêem um dinheiro, pode ser um real, cinqüenta centavos, dez, até.

  • Rodolfo 06/06/2008em12:00

    O conceito de incentivo ao leitor é muito bom (apesar de ser apenas uma forma diferente de defender o investimento em educação) Faz sentido. Quanto mais leitores, mais mercado para os escritores. Quanto mais mercado para os escritores, mais interesse da iniciativa privada — o que pode dispensar o Estado, de certa forma, ou pelo menos liberá-lo para atacar o problema seriamente, via formação de leitores, ou seja, via educação (o que de fato é uma atribuição indiscutível do Estado). A questão me soa muito parecida com aquela das cotas universitárias (polêmicas, polêmicas). Sabemos que o problema da educação no país começa desde o ensino básico, mas preferimos atacá-lo no seu fim, sob o risco de diminuir a qualidade da produção acadêmica. E aqui a comparação fica curiosa: aumentando o número e a qualidade dos leitores (ou estudantes dos ensinos básico e médio), provavelmente a qualidade dos escritores também aumentaria (como o investimento no ensino básico aumentaria a qualidade das pesquisas nas universidades). Ao apostar apenas nos escritores, corremos o risco de investir em aventureiros, como o pessoal destacou acima, e a maioria de nós nem sequer saberia disso, porque continuaríamos leitores medíocres, incapazes de julgar os reais méritos de um livro. O pior disso tudo é que as estratégias erradas não me parecem fruto de má fé. Antes fossem.

  • Saint-Clair Stockler 06/06/2008em12:29

    Já que todo mundo mama nas tetinhas trevisanenses do Governo (vejam o absurdo dos atores & atoras), por que não nós?

    Não vejo nada de mais. Só fiquei chateado com o negócio do Amores Expressos porque o pessoal lá chamou um ou dois escritores “inéditos” e nenhum fui eu! Inédito por inédito, sou mais eu, que recebi 1/2 página de resenha elogiosa no Prosa & Verso d’O Globo (e nem precisei dar pra ninguém!) pra um livro meu – ainda – inédito.

    Vou lhes fazer uma pergunta e quero que sejam sinceros: vocês preferem dinheiro do Governo/seu no bolso de um escritor (que, bem ou mal, produz uma obra) ou no bolso do deputado Paulinho da Força???

    Então pronto.

  • Chico 06/06/2008em12:29

    Nao levem a mal mas o debate esta descambando para assunto que nao vem bem ao caso. E acho que isso foi um pouco o problema do encunciado da proposta de debate.

    Uma coisa eh ‘educacao’ e outra coisa eh ‘cultura.’ Pode parecer o mesmo, mas nao eh nao. O Brasil, por exemplo tem dois Ministerios distintos para tratar de temas distintos. Educacao tangencia o que o Rrrrafael, em termos praticos, afirma ….concordar o verbo com o sujeito, colocacao correta das virgulas … e por ai vai, ou seja, regras basicas, intrumental teorico, formacao profissional minima para preparar o jovem para o mercado de trabalho. E eh evidente que o Estado deve responsavel pela educacao de massa – com todos os seus problemas – e incentivar a leitura. Isso eh ponto pacifico.

    Cultura eh algo muito mais profundo… valorizacoes de tradicoes literarias, escolha de um passado comum a todos, capacidade inovadora, identidade, e outras categorias tao ou mais genericas que estas – e que o Pablo tocou de passagem. Estas escolhas, no Brasil, mudam a cada geracao e que dependem quem estah a cultivar o solo.

    Ao confundi-los corre-se o risco de pensar, como muitos aqui pensam que aprende-se a ‘ler’ com qualidade na escola. Tenho reservas a esse argumento.

    A grande questao eh que no Brasil nos nao temos um Paul Getty ou um Rockefeller. A filantropia aqui eh feita pelo Estado – fruto, para o bem e para o mal, da Era Vargas – e eh natural que isso gere o vicio nefasto de achar que o Estado tem obrigacao de te sustentar, [ironia on] por voce ser um artista originalissimo, cheio de ideias, que escreve intensamente confundindo quantidade de paginas com competencia, mas que so consegue inserir teu protagonista numa, pois eh, fazer o que, ham ham, “temática voltada para a contingência do individuo no mundo.”

    Mas eh aquela questao que alguem colocou ai em cima, ja que exitem as tais prebendas, qual o argumento em contrario(?), pois como Rodolfo sugeriu, vivemos um paradoxo… ja que existem, os escritores sao levados a concorrer pelo senso de oportunidade imperdivel alimentando a veleidade e desconhecendo athe a ma fe de sermos maus leitores.

  • Alessandra Pires 06/06/2008em12:47

    O Governo deve incentivar as editoras publicarem autores brasileiros, principalemente obras de ficção. Creio que no início dos anos oitenta (não estava trabalhando no mercado ainda) o governo disponibilizou recursos para as editoras que publicassem autores brasileiros – destinados à produção dos tais livros. Naquele momento surgiram grandes nomes da literatura brasileira. Porém, não adianta só editá-los, a iniciativa privada juntamente com as entidades de classe do livro precisam valorizar esses escritores, promover o autor nacional – boa parte deste recurso obrigatóriamente deve ser destinado à divulgação dos mesmos. Só assim deixaremos que as listas de best sellers de obras de ficção, tenham na sua maioria, autores estrangeiros. Como agente literária, tenho muita dificuldade de apresentar um texto ficçional de escritor brasileiro, ouço das editoras: ficção nacional não vende, e ponto (inclusive contos, crônicas e poesia). No mínimo, o mercado deveria refletir sobre o fato, e interpretá-lo como grave. Falta valorizar a propriedade intelectual do nosso país, além da Amazônia , é claro….

  • Raul 06/06/2008em13:01

    De que adianta sustentar escritores em um país que não tem leitores? Quem vai ler os livros escritos graças aos incentivos? Os habitantes da torre de marfim?

  • Rafael 06/06/2008em13:09

    Gostei da idéia de subsídio à publicação de autores nacionais. Eles ganham uns trocados, as editoras ganham rios de dinheiro e a lista de best sellers continuará recheada de autores estrangeiros…

    Entre um thriller de espionagem, cheio de intrigas, reviravoltas, cenários exóticos e passagens eróticas e um “romance com linguagem experimental focada na representação da experiência de uma mulher estuprada”, qual entrará na lista dos mais vendidos?

  • Fernando Torres 06/06/2008em13:45

    Sérgio, eu não acho importante saber quem é contra ou favor do incentivo. Mas quem recusaria se tivesse a oportunidade de entrar no “Bonde”.

  • Mr. WRITER 06/06/2008em13:51

    Acho triste que um “escritor” precise de um investimento externo para se motivar a escrever… É até ridículo que alguém cogite a possibilidade de que outrem lhe pague para que escreva, até porque os prentensiosos novos escritores adoram ser assim, pretensos e novos escritores… e como o texto mesmo diz, a esmagadora maioria é de qualidade sofrível… Se quer escrever que escreva, mas não espera virar a última coca-cola do deserto do dia pra noite e menos ainda que ser pago para isso.

  • Sinara 06/06/2008em13:51

    Noga, fico feliz que você entendeu que questionei a sua posição e não fiz um ataque pessoal, pois tem gente na caixa de comentários que não entende.
    Eu também escrevo e adoraria um dia viver disso, mas isso é impossível no Brasil e em boa parte do mundo.
    Concordo com o Sérgio, dinheiro público deve ajudar a mudar isso criando leitores, não empregados públicos.

    Saint-Clair, vamos atrás do Paulinho também. Todo mundo pegando o seu dá nisso o que vemos agora.

  • Sérgio Rodrigues 06/06/2008em13:59

    Fernando: mesmo correndo o risco de ser chamado de ingênuo, faço questão de partir do princípio de que as pessoas agem de acordo com suas convicções. Declarar e agir, portanto, dão na mesma. Mas sim, conheço gente que não apenas recusaria, mas – teste supremo nestes tempos cínicos – já recusou bondes do gênero. Não gostaria de dar nomes, criar aqui uma descabida galeria de “heróis”. Não tem heroísmo nenhum. E se isso tudo, que é tão simples, parece difícil de acreditar é porque o Hefestus tem razão: é ampla mesmo a tragédia.

  • Rafael 06/06/2008em14:11

    É incrível como alguns indivíduos medem as inclinações da Humanidade segundo suas próprias inclinações…

  • Fernando Torres 06/06/2008em14:31

    Concordo com você Sérgio. Mas os tempos além de cínicos, são maniqueístas.Quem aceitou, o fez como muitos outros o fariam, e isso não os tornam crápulas. Não torna, automaticamente, suas obras dejetos literários. Pode ser que caia algo bom daí, mas acho que sairia sem o “bonde”. Acho que o Estado Democrático deve incentivar a literatura formando leitores capazes de entender as sutilezas de Machado ou a riqueza vocabular de Guimarães Rosa (para exautar os que fazem aniversário), bem como, com isso formar potenciais escritores. Independente das convicções de cada um, o mais triste, para mim, é ver esses projetos gerenciados com objetivo favorecer os seus amigos.

  • Sérgio Rodrigues 06/06/2008em14:38

    Fernando, tem um jeito relativamente simples de saber quem prefere escrever longe desses esquemas. Pense numa lista de todos os escritores brasileiros com obra publicada e resenhada na grande imprensa, editora de peso na retaguarda e tal. Agora veja a lista da Petrobras. Se um nome aparece numa lista e não aparece na outra, há boas chances de ser porque o cara não quis. Isso não envolve de modo algum uma condenação moral de quem entrou, veja bem. São escolhas.

  • Saint-Clair Stockler 06/06/2008em14:41

    É incrível como alguns indíviduos – eu diria grande parte deles – estão doidos para arranjar uma boca dessas (cada um em sua área de atividade) mas muito poucos têm colhões para dizê-lo…

    Sérgio, desculpa, mas não vejo “heroísmo” nenhum em gente que recusou “rios de dinheiro”. Escritor tem de ter algum tipo de apoio governamental, sim. Ficar na mão do mercado? Com editoras como a Companhia das Letras, que lucram de tudo quanto é lado (vejam o exemplo do Orham Pamuk: a Cia. das Letras ganhou apoio do Ministério Turco da Cultura pra publicar as traduções do escritor a partir do inglês!?!; qualquer editora de fundo de quintal teria VERGONHA de fazer tradução triangular, nessa altura do campeonato!)???? O mercado está cagando pra escritores novatos – com ou sem qualidades literárias. E não me venham dizer que não é bem assim, que não sou a Helen Keller. E se são heróis mesmo, ou pessoas dignas de admiração, qual o problema em citar seus nomes? Afinal, não foi – segundo você – um belo ato de resistência às tentações? Temos de divulgar seus nomes! De preferência, em letras garrafais, para que autores que torcem por uma bolsinha de 3000 reais tenham vergonha de tanta avidez!

    Acho muita ingenuidade achar que as editoras vão ficar boazinhas de um dia pro outro, que vão passar a privilegiar autores brasileiros de uma hora pra outra. Não vão.

    Na França, o governo distribui dinheiro pra todo mundo. Pras editoras. Pros autores. Pros pretendentes a autores. A infinidade de bolsas chega a deixar a gente zonzo. E ninguém reclama. E todo mundo concorda que é assim que tem de ser.

    Devia haver uma espécie de “reserva de mercado” referente às nossas editoras: digamos que 20% do que elas publicam (ou 30%, sei lá) devia ser literatura nacional. Ou então livro de autor nacional tinha de ser mais barato, para estimular o consumo e a leitura do produto nacional.

    Mas num país em que deputado pede pra viúva do Mitterand aconselhar o marido a mudar de idéia, em referência à sua posição com relação à Amazõnia… É essa lambança que se vê.

    Vergonha não é um escritor ganhar um incentivozinho financeiro sem-vergonha, ridiculamente baixo. Vergonhoso mesmo é ator metido a diretor arrancar 5 milhões do Governo pra fazer um filme e o filme até hoje não estar pronto, não ser exibido, o o tal ator/diretor não ir pra trás das grades. Vergonha mesmo é atora pretensa diretora, antiga vedete de pornochanchadas, arrancar milhões do governo pra fazer filme superfaturado, todo mundo saber, e a madama não estar “engalinholada”. Chatô deve estar rindo na tumba.

  • Rodolfo 06/06/2008em14:45

    Chico, o que eu vejo com reservas é essa distinção entre cultura e educação, principalmente do ponto de vista prático (vide a existência mencionada de ministérios distintos para tratar de assuntos irmãos. Aliás, o que me parece ponto pacífico é que muito da estrutura governamental não funciona exatamente por ser compartimentada, e por esses compartimentos não interagirem).

    É exatamente essa forma que você sugeriu de encarar a educação (como o ensino de “regras basicas, instrumental teorico, formação profissional minima para preparar o jovem para o mercado de trabalho”) que nos mantém no mesmo ponto. É mais prático, mas gera os analfabetos funcionais já mencionados neste blog. Quando eu falo em educação, portanto, entendam que o componente “cultura” (em seus sentidos mais amplos) é tão ou mais importante no ensino do que a tabuada ou a tabela periódica. Também não acredito que é possível ensinar uma turma inteira a “ler com qualidade”. Mas não custa nada provocar a molecada a valorizar “tradicoes literarias”, a tentar inovar, a buscar uma identidade ou “outras categorias tão ou mais genericas que essas” (vai que tem algum Dostoievski na turma). Criaremos alguns monstrinhos, mas pelo menos eles serão capazes de argumentar com a qualidade dos comentários deste blog.

  • Sérgio Rodrigues 06/06/2008em14:50

    Saint-Clair, discordamos em quase tudo, mas concordamos num ponto, embora você não tenha percebido: como eu disse com todas as letras, também não vejo heroísmo nenhum nessa recusa. Se você quer nomes, é só apurar direitinho. Agora, o pior de todos os argumentos é esse que cita o Paulinho da Força, o Chatô, o “locupletemo-nos todos”. Na boa, reduz a pó qualquer outra construção teórica que você pudesse ter feito para justificar o Estado como mecenas literário.

  • Saint-Clair Stockler 06/06/2008em14:51

    Outra coisa: apoio governamental pra literatura é que nem as cotas raciais nas universidades. Todo mundo sabe que não é justo, mas é melhor do que deixar do jeito que está, sem fazer nada.

    Ou vocês preferem que os escritores brasileiros continuem lutando, sozinhos (porque apoio das editoras é que eles não vão ter), contra esses megaprodutos de papel (me recuso a chamá-los de “literatura”) fabricados para virarem bestsellers com doses generosas de Marketing?

    Que chances tem um escritor brilhante como o Esdras do Nascimento, o Antônio Fernando Borges ou a Elvira Vigna contra um medíocre Dan Brown da vida? Se estes três escritores – que não hesito em colocar entre os principais grandes autores brasileiros vivos – têm dificuldades em “vender” seus livros, que dirá o pobre mas honesto “autor médio” nacional. O cara que tá aí batalhando, escrevendo da melhor forma que pode, lutando contra as marés. Nem todo mundo é gênio. Mas há os escritores honestos, que fazem seu trabalho com humildade, bem sabendo que não gênios, mas mesmo assim querendo seu lugar ao sol.

    Acho que todos nós devíamos abandonar a literatura – seja como autores, seja como leitores. Ficamos aqui reclamando por migalhinhas. Que tal virar lobista? Dá muito menos dor de cabeça. Ou então, para aqueles que têm talento histriônico, virar Deputado ou Senador (quem sabe Governador ou Presidente?)

  • Fernando Torres 06/06/2008em14:52

    Saint-Clair, a França não tem milhões de analfabetos, na França, ninguem morre de fome ou na fila de um hospital público, na França as universidades não estão sucateada, o ensino público não é motivo de vergonha. Eu pago meus impostos e ainda vejo crianças fora das escolas pedindo dinheiro na rua enquanto tem gente enfiando a mão na minha grana para viajar para a Índia. Talvez, outros países que tenham seus problemas sociais diminutos perto dos tupiniquins podem se dar ao luxo de encher escritores e editoras de dinheiro. Por enquanto, o lugar do escritor no Brasil deve ser de resistência è tudo que eu disse acima, e não se locupletando do dinheiro que deveria (em tese) ser destinado a solução destas questões.

  • Saint-Clair Stockler 06/06/2008em14:58

    Sérgio:

    às vezes a melhor forma de estimular o diálogo é fingir-se de desentendido. Não estou dizendo que seja o caso aqui (embora também não esteja dizendo que NÃO seja….rsrsrs), mas muitas vezes afirmo o contrário do que penso só para provocar reações nos meus interlocutores. Como falei, é muito mais produtivo do que simplesmente concordar com o que os outros falam.

    Há, é claro, um perigo nisso: pessoas menos atentas ou menos maliciosas (e este NÃO é o seu caso) podem achar que você é contraditório ou volúvel. Mas é um pequeno preço a se pagar em troca de muito mais reações das pessoas.

  • Sérgio Rodrigues 06/06/2008em15:03

    Saint-Clair, não entendi nada, mas tudo bem.

  • Fernando Torres 06/06/2008em15:04

    Deixa Sérgio, Saint-Claire acha que é artista, mas isso passa. Ou não.

  • André Gonçalves 06/06/2008em15:04

    Bem, eu levantei a lebre, tenho obrigação de dizer algo. Acho que: 1) todo mundo espera demais algo do(s) Governo(s). Eu só espero que ele(s), estaduais, municipais e Federal, paguem melhor os professores, para que esses professores possam comprar mais livros, estudar mais, transferir o hábito de leitura às crianças, e ainda; 2) que os governos invistam nas bibliotecas públicas, de verdade. Invistam comprando os clássicos, os premiados, os bambambans. Não sei, talvez uma banca de notáveis elabore uma lista “mínima” para as bibliotecas, ou algo do gênero. Investe-se tanto em “salas de computação”pelo país afora, atrás de votos, que as “salas de computação” são instaladas até em escolas sem energia elétrica. Mais barato investir em bibliotecas, e mais útil. 3) até gosto de prêmios. Acho que estimulam determinados tipos de público. Mas acho que esses prêmios deveriam partir ainda mais das escolas particulares, faculdades, das próprias editoras. Se cada editora lançasse um concurso onde publicaria a obra vencedora com toda a pompa e circunstância, já seria de grande ajuda. Tem faculdades país afora que investem milhões em shows de forró (acreditem), e mal mantém uma biblioteca minimamente aceitável; 4) programas de tv, rádio, publicações, falando de literatura de forma menos árida que o que acontece normalmente; 5) redução tributária ou algo do gênero para editoras que publicassem autores nacionais/regionais. Nada de graça. Mais barato, para baratear o preço final, sim.
    Banquei (ou melhor, estou devendo) meu próprio livro, que está à venda no Salão daqui. Pedi apoio à gráfica, que reduziu um pouco o preço em troca da marca na contra-capa. O resto, saiu (não sei como vai sair, na verdade) de mim mesmo. E tem vendido relativamente bem. Não é o mais importante, eu acho. Não escrevi o livro para ganhar dinheiro. Quero que venda para eu poder ter o mínimo para fazer outro. A qualidade dele, se vai vender ou não, é outra história. Claro que vai concorrer com muita gente grande, com autores infinitamente melhores que eu, com grandes editoras. Mas vou ter de achar meu público, meu jeito de divulgar, minha maneira de vender. A internet está aí, o Orkut, o msn, e já vendi duas vezes mais pela internet que na livraria. Mas, sinceramente, não vou ficar esperando nada para escrever, não. Acho que acho mais alguma coisa, mas depois eu digo. Abraços, e a conversa está boa demais!

  • Saint-Clair Stockler 06/06/2008em15:11

    Fernando:

    concordo com você: não somos mesmo a França – não chegamos a ser nem remotamente parecidos. E acho que enquanto uma criança estiver sem comida ou sem escola, enquanto houver um analfabeto no Brasil, enquanto os hospitais não tiverem sequer álcool e algodão, nem um único centavo “nosso” (já que, como dizia aquela lamentável propaganda da Justiça Eleitoral, somos nós os patrões “deles”) devia ser usado em Cultura. Acho um absurdo que lá no Nordeste haja crianças comendo xique-xique enquanto no Sudeste um bando de escritores vagabundos queiram uma bolsa de 3000 reais por mês pra escrever uma história! E depois, como se não bastasse, ainda tripudiassem querendo vê-la publicada por uma editora, com uma capa bonita, exposta nas principais livrarias do país! Que audácia a dessa gente!

  • Saint-Clair Stockler 06/06/2008em15:15

    E por favor – POR FAVOR – nunca, jamais, em tempo algum escrevam meu nome com “e” no final! Claire é a Marie. Eu sou Clair. Se tem uma coisa que me tira do sério é escreverem “Saint-Claire” no lugar de “Saint-Clair”. Eu fico subindo pelas paredes! rsrsrsrs.

    A outra coisa que me tira do sério é me obrigarem a escrever meu nome todo. Mas os meus outros sobrenomes além do “Stockler”, felizmente, nenhum de vocês aqui conhece.

    (Tibor, por favor, nem um pio!)

  • Saint-Clair Stockler 06/06/2008em15:19

    Só finalizando:

    algo me diz que há uma relação matemática: quanto menos dinheiro fosse aplicado na Cultura mais dinheiro sobraria pro Bolsa Família. Nossos problemas sociais estariam resolvidos! Enforquemos os últimos escritores com as tripas dos últimos atores de Teatro! ET VIVE LA REVOLUTION!

  • Fernando Torres 06/06/2008em16:02

    Saint-Clair, tu adoras um maniqueísmo, não? Adoras uma generalização. O interessante é que você gosta ainda mais da ironia e da desvalorização do argumento alheio (alguém anda lendo Shopenhauer!). Mas enfim, você acha que é artista….

  • Chico 06/06/2008em16:07

    Sergio, a tragedia eh ampla e profunda, a medida que os comentarios vao aparecendo.

    Rodolfo, acho que a questao nao se limita a escola ou a compartimentacao de orgaos govenamentais. E nao sei se o estado de coisas estah como esta apenas por isso, mas ainda acho que ha uma confusao entre os temos. Pois vejamos o caso deste debate: Todos aqui tiveram educacao formal, sabem as 4 operacoes, ja ouviram falar de Capitu e desconfiam o que seja uma mitocondria. Ou seja, todos tiveram educacao formal. Entretanto, eh gritante a obtusidade e ateh mesmo os argumentos levianos com cara de revanchismo sugerindo que a fome, a miseria, a bolsa familia pudessem interferir na producao literaria…

    Sinceramente nao tenho paciencia para esses argumentos de que o Estado brasileiro tem obrigacao de me sustentar ja que a Franca sustenta os seus, por la nao existirem excluidos. Em que isso interefere na producao literaria?

    Bom, pra terminar, para aqueles que ainda acham que sao injusticados, Drummond publicava os primeiros livros do proprio bolso; o Machado, para quem ja teve a oportunidade de ler seu testamento, deixou uma casa e uns tostoes para uma sobrinha ou afilhada… portanto, falta etica mesmo ateh num debate destes. Arrumar um emprego, trabalhar de madrugada depois de por os filhos para dormir, isso da trabalho. E como eu disse…. num pais onde o trabalho eh um NAO-VALOR, nao sei por que ainda me sinto indignado.

    Andre, nao te conheco e nem sei sobre a qualidade de teu texto, mas tua atitude eh digna.

  • André Gonçalves 06/06/2008em16:27

    Chico, obrigado pelo comentário. Não sei se é o certo ou o errado, mas é no que eu acredito. Quanto à qualidade do meu texto, é fácil saber. Só dar um sinal e/ou visitar o blog. Abraço!

  • El Torero 06/06/2008em16:36

    Eu concordo contigo, Saint-Clair Stockler. E não adianta mudar de opinião.

  • Fernando Torres 06/06/2008em17:08

    Chico, gostei do que escreveu. Eu não colocaria em melhores palavras. Me lembrou de algo que ouvi em uma palestra de uma crítica literária alemã que veio ao Brasil (que me falha a memória acerca do nome): Se incentivou tanto a literatura, existia tanta gente recebendo dinheiro para escrever, que houve uma profusão de autores jovens sem nada o que dizer, por lhes faltar experiência de vida.

  • C. S. Soares 06/06/2008em18:03

    Li com mais calma a reportagem do JB indicada pelo Sérgio no seu post e fiquei surpreso com a falta de planejamento (diria até profissionalismo) do processo (na reportamente, essa “falta de planejamento” é chamada de “entraves burocráticos”).

    Tudo nessa terra brasilis (mesmo os “projetos” que, por conceito, deveriam ter inicio, meio e fim) parece mesmo um imenso “working-in-progress”, pior, “working-in-regress”, decola-se o avião sem asas, coloca-se o carro na frente dos bois.

    Agora, vamos combinar, o que começa errado poderá dar certo no final? Parece-me o óbvio ululante do Nelson.

    Por um lado, os escritores sabiam que a “verba” era pouca. Quem imaginava poder sobreviver somente pelo valor da bolsa, penso, não fez as contas direito (e ia naufragar da mesma forma) ou então poderia completar seu livro independentemente da bolsa, pois necessariamente tem outra fonte de renda.

    Por outro, volto a lembrar algo que disse naquela época dos resultados (inclusive em emails para a própria Petrobrás): Quer fazer? Faz direito, então.

    Para começar, a avaliação dos trabalhos deveriam seguir um critério mais objetivo do que subjetivo.

    O resto, o que veio depois, já é mera consequência.

  • C. S. Soares 06/06/2008em18:04

    reportamente = reportagem

  • Rafael 06/06/2008em18:15

    Pergunta! Como a avaliar objetivamente um trabalho literário? Pelo número de páginas, pela quantidade de personagens, pela freqüência com que a palavra “onírico” aparece no texto?

  • Rodolfo 06/06/2008em18:19

    Chico, como geralmente acontece nesse tipo de discussão, concordamos, mas, por amor ao diálogo ou algo parecido, continuamos a discutir. Eu não disse que a questão se limita à escola ou à compartimentação de orgãos govenamentais, nem credito apenas a isso o estado de coisas.

    E, em vez de contrapor meu argumento, sua intervenção apenas corrobora o que eu disse: todos aqui recebemos educação formal, mas a “obtusidade e até os argumentos levianos com cara de revanchismo sugerindo que a fome, a miseria, a bolsa familia pudessem interferir na producao literaria…” indicam que falta algo, que na falta de outra palavra, podemos chamar de cultura.

  • Noga Lubicz Sklar 06/06/2008em18:26

    Sérgio: quem frequenta o meu blog sabe que cara limpa é o meu negócio. Agora, a sua “admiração que já não era pequena” me pegou totalmente de surpresa. Espero que não seja ironia, né? rsrs. Aliás, te citei hj. Abraço.

    (nota da revisão: pior que “atora” é “ficçional”)

  • Sérgio Rodrigues 06/06/2008em18:30

    Ironia nenhuma, Noga. Outro abraço.

  • Tibor Moricz 06/06/2008em18:39

    Tanta celeuma por uma coisa tão pequena. Todo mundo grita contra, mas não recusaria uma bolsa se lhe a oferecessem. É tudo uma questão de oportunidade. Muitos que se opõe tem lá seu projeto inscrito, as unhas roidas e o coração aos saltos imaginando como “será” bom quando for escolhido.
    E a garotada que come xique-xique no nordeste rende sempre uma boa história… daquelas que concorrem à bolsas estatais.

  • Sérgio Rodrigues 06/06/2008em19:00

    Você está enganado, Tibor. Eu falo por mim e você fala por você, que tal? Não digo que quem pega bolsa do Estado é canalha. Por que admitiria ser chamado de hipócrita?

    O problema é sim de cultura, Rodolfo. Brasileiros se habituaram a tetas estatais desde os tempos da Colônia.

    Admito que a necessidade também conte. Se o cara tem um emprego decente que lhe permita sustentar a si e aos filhos, ganha muito mais do que essas bolsas oferecem – e sem burocracia, prestação de contas ou exigência de selo de estatal na contracapa, para não mencionar possíveis tentativas de interferir no conteúdo. Nesse caso ele nem precisa entrar nos aspectos filosóficos da questão para fugir de tal pesadelo.

    Eu fujo, quero crer que por ambas as razões – e podem cobrar. Quando minha editora veio com a proposta de inscrição na Petrobras, saí correndo.

    Agora, se a pessoa não tem uma carreira que lhe garanta seu próprio sustento, entendo que fique muito tentada a entrar num esquema desses – que nada tem de ilegal, é bom frisar. Como eu já disse, não se trata de condenar ninguém, nem mesmo levar para o lado pessoal. A idéia aqui, felizmente compreendida por boa parte dos leitores, é travar um debate filosófico.

  • Roberto Klotz 06/06/2008em19:24

    Estou muito bem impressionado com a pureza d’alma dos escritores. Todos enxergam a verdade e todos são absolutamente contra o incentivo à própria classe.
    Nas próximas eleições todos meus escolhidos serão escritores.
    Escritor não faz discurso demagogo. Escreve.

  • Sérgio Rodrigues 06/06/2008em19:30

    Pois é, Chico: além de ampla e profunda, a tragédia vai se revelando espessa e pegajosa…

  • Paulo 06/06/2008em20:32

    Essa lista dos projetos aprovados diz parte da coisa. Os que passaram na primeira triagem diz mai, en PDF:
    http://www2.petrobras.com.br/CULTURA/ppc/doc/triagem_todos.pdf

    Na parte de criação literária, alguns nomes carimbados inscritos não levaram: Santiago Nazarian, Marcelo Moutinho, Marcelo Mirisola, Paulo Scott.

    Pelo jeito, “a nova literatura brasileira” depois de abocanhar um espaço n~ao merecido na imprensa foi atrás do dinheiro estatal, a etapa seguinte. E nao podemos reclamar ou eles xingam.

  • Saint-Clair Stockler 06/06/2008em20:43

    Fernando:

    Não sei se diria que gosto de “manisqueísmos”. O que gosto é de brincar com as várias opiniões – em grande parte contrárias umas às outras – pra ver no que isso vai dar. Iluminações. Achei bem mais ofensivo você dizer que gosto de “generalizações” (ou será que isso foi um elogio? Já que os últimos 150 anos foram tempos de especializações, e veja no que isso deu, vou escolher achar que foi um elogio!) Quando duas pessoas discutem opiniões opostas sobre um mesmo assunto e não prestam atenção no argumento alheio – coisa, aliás, muito frequente – não temos um diálogo: temos dois monólogos em paralelo. Eu tomo muito cuidado para não travar monólogos em paralelo, porque eles não são produtivos nem acrescentam nada à minha cosmovisão. E aí você errou mais uma vez: não gosto da desvalorização do pensamento alheio, até porque não vejo graça em ganhar sempre, em estar sempre certo. Sou um sujeito bem pouco vaidoso. Não é por aí que está o meu calcanhar de aquiles. Agora, você acertou EM CHEIO quando disse que adoro uma ironia. E como gosto! Você citou Schopenhauer. Pois bem: há uma diferença entre nós dois. Ele era pessimista, eu sou cético (ao menos a maior parte do tempo).

    Acho que, em outra encaranação, fui um Sofista – com tudo de negativo que essa palavra chegou a implicar.

    Outra coisa que você acertou na mosca: eu realmente penso que sou artista. É um direito meu, você me permite? Fico-lhe imensamente grato.

  • Saint-Clair Stockler 06/06/2008em20:45

    (Correções: “maniqueísmos”, “encarnação”)

  • C. S. Soares 07/06/2008em10:09

    Rafael, respondo com outra pergunta: vc concorda que dinheiro público seja “distribuído” com base em critérios meramente subjetivos?

  • C. S. Soares 07/06/2008em10:25

    Deixo como reflexão as seguintes perguntas:

    1) em nossos incertos dias, ainda existirá no dicionário dos escritores a palavra (não deturpada) engajamento?

    2) Se literatura é acima de tudo questionamento, o que questiona (em suas obras) o escritor brasileiro?

    3) Qual o significado da palavra “social” para essa (muitas vezes auto-denominada) nova literatura brasileira? Acredita na exustência de vida para além do seu umbigo?

  • Cléverson Faria Costa 08/06/2008em15:10

    Sérgio, concordo com a sua posição. O Estado tem que formar leitores (educação pública de qualidade) e fomentar o acesso aos livros. Mas não é só. O Estado poderia incentivar a produção literária e, aí o Luiz Mozzambani Neto tem razão, desde que ficasse adstrito ao período escolar.
    Um abraço,

    Cléverson Faria

  • Claudio Barros 09/06/2008em09:13

    Fico imaginando que obra o mundo teria perdido se García Márques não tivesse torrado quase todo seu patrimônio para publicar Cem Anos de Solidão.
    Imagino como teria sido dura a nossa vida se escritores como Balzac tivessem esperado pelo beneplácito do Estado para publicar sua obra.
    Penso o quão seria mais pobre o mundo se tivesse Jorge Luis Borges esperado pela benevolência do Estado argentino para publicá-lo.
    O mundo não precisa ficar pior literariamente com financiamento público.

  • Marco Catalão 09/06/2008em11:13

    Alguém acha um absurdo que o Estado patrocine pesquisas em matemática, biologia, química e até crítica literária? Pesquisas que, como qualquer cientista sabe, não precisam necessariamente resultar em algo “útil” ou “comprometido com os interesses do governo”… O Estado (e, supostamente, a sociedade que ele representa) reconhece que tais pesquisas são importantes, não só porque podem eventualmente ter resultados úteis, mas porque (se conduzidas com o rigor necessário) aprimoram a formação do próprio pesquisador.
    Ninguém diz que um pesquisador que recebe bolsa da Fapesp ou do CNPq está “mamando no Estado”, da mesma forma que ninguém imagina (salvo engano) que há alguma questão moral envolvida aí (“há crianças passando fome, então não vamos investir no Projeto Genoma”). Mas, quando entramos no território sagrado da Literatura, as opiniões mudam… Um escritor (ao contrário de um pesquisador) não seria capaz de manter sua “pureza” e sua “liberdade” se tivesse um financiamento público… Por quê?
    A meu ver, o problema está colocado de forma errada. O problema não é haver ou não apoio estatal às atividades artísticas, mas sim haver uma fiscalização séria sobre esse apoio, de forma a que não se torne um jogo de cartas marcadas, com compadrios, favorecimentos e nepotismos.
    Se é possível fazer isso com a ciência, por que não seria com a arte? Não seria possível estabelecer parâmetros objetivos para separar o trabalho sério da enganação pura e simples?

  • Marco Catalão 09/06/2008em11:45

    Só para completar:
    A médio ou longo prazo, a solução apontada pelo Sérgio parece a melhor: com um maior número de bons leitores, a tendência é que os bons escritores possam sobreviver apenas com a venda dos seus livros. Mas isso é só para daqui a cinqüenta ou cem anos…

  • Sérgio Rodrigues 09/06/2008em14:27

    Marco, o paralelo que você estabelece é interessante, mas, a meu ver, não resiste a uma análise mais detida:

    Se é possível fazer isso com a ciência, por que não seria com a arte? Não seria possível estabelecer parâmetros objetivos para separar o trabalho sério da enganação pura e simples?

    Essa resposta eu acho fácil: não. “Parâmetros objetivos”, definitivamente não. E se a subjetividade inerente ao ofício já torna uma selva a avaliação de trabalhos artísticos acabados, julgá-los com base em projetos é pura comédia. Claro que a não-ficção é diferente, admite melhor esses critérios. Um abraço.

  • Julio 09/06/2008em14:28

    1 – O primeiro problema é que a política públicatem sempre que priorizar: não há escassez de produção literária no país. Não é um problema de oferta, mas de demanda. Se não houver dinheiro, a pesquisa sobre vacinas não vai acontecer, já o livro “Extinção da infância” vai demorar mais, mas acaba saindo por conta do autor. E garanto que não fará a mesma falta.

    2 – A produção acadêmica deve (ou deveria) garantir que toda disserção ou tese seja relevante no cenário da pesquisa o conteúdo novo. Há chance de critérios Não há como fazer isso na literatura. Todo mundo sabe que as grandes inovações já aconteceram, os romance e poemas que importam de verdade já foram publicados. Bancar o novo Joyce, Falkner, Drummond soa ótimo, mas bancar autores medianos para baixo com esses…. Academia e arte são sim coisas diferentes.

    3 – Como os resultado da Petrobras Cultural ou do Jabuti mostram, não há no Brasil maneira de “fiscalizar” (olha mais dinheiro gasto) a produção literária. O meio literário está dominado por gente que não sabe escolher. Será um ação entre amigos.

    4 -Enfim, esse argumento de comparação não vale: “se dão bolsas para cientistas por que não para os escritores? Dinheiro público de um país carente deve ser tratato com o máximo de respeito e não com esse “então também quero o meu”. Essa mentalidade tem que mudar, por favor. Vamos trabalhar, gente.

  • Marco Catalão 10/06/2008em13:16

    Caro Sérgio,
    acredito (ingenuamente?) na possibilidade de distinguir os trabalhos sérios das enganações. Não se trata de dizer de antemão que determinado autor é “um Joyce ou um Drummond”, como quereriam alguns… Se fosse assim, seria muito fácil! Trata-se, isso sim, de apostar em probabilidades (exatamente como na ciência): se de cem bolsistas sair um Drummond, o dinheiro gasto com os outros não terá valido a pena?
    Até o século XIX, a ciência era tarefa de amadores, que gastavam do próprio bolso com equipamentos e viagens, e (quando não eram ricos) só podiam se dedicar à ciência nas horas de folga. Isso não impediu que houvesse grandes avanços, mas o salto exponencial do século XX só foi possível porque passou a haver milhões de pessoas dedicadas integralmente à pesquisa.
    É muito difícil julgar os contemporâneos, dizer quem está escrevendo uma obra realmente duradoura. Mas não acho tão difícil separar o que é tentativa de criar um trabalho de qualidade do que é mera verborragia. Um abraço!

  • O Tautológico 10/06/2008em19:34

    Perguntam se o Estado deve incentivar escritores a escrever. Para quê, respondo? Um monte de gente está escrevendo neste tópico de graça…

  • Albarus Andreos 13/06/2008em13:58

    Eu acho horrível o governo bancar a ida dos Meninos Batuqueiros da Vila Anastácia para a Holanda, para que os loirões de lá vejam pessoalmente o que é um pobre sulamericano saracoteando ornado com penas de arara. Só que quem paga por isso é o governo da Holanda. Até se justifica, pela curiosidade sui-generis, implícita nesta hecatombe excêntrica de país milionário. Os moleques então tomam champanhe e comem caviar (que cospem fora no primeiro vaso de planta que encontram). Mas o governo brasileiro patrocinar uma resma de filminhos chinfrim só porque a Fernanda Montenegro vai lá no planalto de óculos escuros, é uma merda! Se patrocínio para autor iniciante que não tem nem onde cair morto é questionável, imagina para os que não tem nada de iniciantes, com carreira longa e cheia de prêmios. Dar bolsa para autores de qualidade (comprovada através de prêmios e concursos ganhos), que não conseguem se sustentar de outra forma ((comprovado por um hollerit miserável) o que é bem provável), é contribuir para a cultura, sim (é um male que se tem que aceitar, pois senão não haverá literatura nenhuma) mas patrocínio para o Fernanda Montenegro é aviltante e imoral. Mas que inferno é este?????

  • Tomas 14/06/2008em00:57

    Revelador o comentário do Paulo, e concordo. A nova geração nivelou a nossa literatura por baixo e agora ela vai aproximar o indústria editorial da parasitária indústria de cinema tupiniquim. Foi a pior coisa que aconteceu com a cultura de letras no país desde o o movimento concreto, que estragou a visão da poesia por gerações. Esperam que estejam satisfeitos.

  • Edra 15/11/2008em23:22

    Só para aqueles que não sabem a história da Irlanda, é bom salientar que durante anos escritores não pagavam impostos na Irlanda.
    Num país aonde a maioria pensa assim como voceis. Não me surpreendo que o Brasil virou sinônimo de bunda e futebol, enquanto a Irlanda significa Joyce e Becket. A boa literatura é mãe do teatro, do cinema e da televisão. E dá-lhe encenar pela décima vez …(coloque aqui o nome do seu escritor estrangeiro preferido).
    Porque além de ser bom, o escritor brasileiro tem que competir com o investimento em marketing feito pelas grandes editoras, normalmente com autores internacionais.