A neta de John Steinbeck andou levando cascudos dos leitores (veja a nota “De ratos e herdeiros”, abaixo), mas acho que foi vítima de uma injustiça. Seja como for, é inofensiva para a indústria editorial e para humanidade perto do neto do gênio irlandês James Joyce (1882-1941). Stephen Joyce, 74 anos, virou o pesadelo da comunidade de joycianos no mundo inteiro com seu modo discricionário de administrar o legado do avô, como mostra um artigo de D.T. Max no último número da revista “The New Yorker” (aqui, em inglês).
A princípio, quando Stephen dizia coisas como “sou um Joyce, não um joyciano”, muita gente achava divertido. Até suas tiradas contra o excesso de teorização em torno da obra do autor de “Dublinenses” encontraram eco num certo antiintelectualismo bonachão: “Se meu avô estivesse aqui, morreria de rir”, é um de seus bordões.
Menos engraçada foi sua confissão de que queimou um lote de cartas da família, assim como a suspeita de que pode ter feito o mesmo com cartas do punho do próprio Joyce. Sem falar na facilidade com que inviabiliza a publicação de estudos e outros projetos ligados ao avô, como a versão multimídia de “Ulisses” (pois é…) que um professor americano chamado Michael Groden passou sete anos desenvolvendo. Stephen Joyce exigiu um milhão e meio de dólares pelos direitos, matou o projeto e jurou Groden de morte (intelectual, mas morte) ao lhe dizer: “Você devia considerar uma nova carreira como lixeiro em Nova York, porque nunca mais vai poder citar um texto de Joyce”.
Ah, sim: 16 de junho é Bloomsday, isso o neto de Joyce ainda não conseguiu proibir.
16 Comentários
Que vergonha, para minha amada Irlanda, esse neto de Joyce… Não basta o Bono Vox, dizendo bobagens mundo afora?
Sérgio, podemos acrescentar Maria Kodama com a obra de Borges?
Dá para enfiar a Kodama e muita gente mais nesse pacote, Raquel. Mas esse Stephen que não é Dedalus parece imbatível.
Sérgio, o pouco que sei (li o que escreveu Sylvia Beach, editora e admiradora fervorosa, e, portanto, insuspeita) o Joyce era também um bocado egoísta. O que não justifica a arrogância e ganância do neto.
Amanhã beberei pelo menos uma Guinness. Slainte!
Puxa, que vaso ruim esse Stephen, hein?
Pelamordedeus!!
well….versão multimídia de “Ulisses”…..vai ser vendida em fascículos semanais?
Raquel, acho que alguém que diz querer a igualdade entre nações e cidadãos, que diz querer um mundo sem guerras, que diz que a fé – seja lá no que for – é algo importante, não é alguém que diz bobagens. Sobre o neto do Joyce, paciência. Se ele queimou os escritos ele tem os motivos dele. Talvez não quisesse que a vida pessoal do avô fosse publicada. Mas aí eu já não arrisco dizer nada, pois o que conheço de Joyce, “Dublinenses”, está na minha estante, e eu nem terminei de ler ainda.
O cara não queimou nada. Só queria um pouco de holofote em cima dele. Alguém já viu um louco rasgando dinheiro? Pois as cartas de família devem valer uma grana violenta, daqui um tempo vão aparecer em algum leilão por aí.
Deve ser mal de familia…
Como todo bom herdeiro sem talento, esse cara não é excessão… Mande ele escrever algo à altura do avô, e aí a gente vê. Se sim, ele pode queimar o que quiser.
Deixa o cara…só tá capitalizando em cima da obra do avô…garanto que o Joyce, que sempre foi duro feito um côco, ia gostar de ver o netinho ganhando umas libras a mais…hoje em dia é pueril exigir escrúpulos quando o assunto é dinheiro.
Quando essas cartas, digamos, ressurgirem, quanto estarão valendo?
Salvador Dali disse que nao queria ter filhos porque todos os genios geram idiotas. Mas penso que se deveria mesmo eh acabar com o direito de heranca, isso sim eh revolucionario.:-))
Bem… hoje eu e minha amiga fizemos um Bloomsday tapuia, vamos dizer assim. Fui muito bom, trouxe ótimos títulos de sebos pra casa. O cara não vai querer cobrar uma taxa, vai…
E não é que Joyce esteve ontem em Belo Horizonte?
Joyce morreu em 41. Cinco anos e estaremos livres dele. A obra vai cair no domínio público.
Rafael Rodrigues,
me agradam os Dublinenses, principalmente “The Dead”, acho que em português está como “Os vivos e os mortos”. Ulisses, tenho o livro e não li, um dia quem sabe. Finnegans Wake, como diz um amigo, nem Joyce leu! E quanto ao Bono Vox me socorro de outro amigo, irlandês, e que me disse o que segue:
“It took me a little while to figure out who you meant by “Bono Vox”. In Ireland, he’s regarded with some affection, but not many people take him very seriously.
Do you know what is the difference between God and Bono?
(Answer:) God doesn’t think he’s Bono…”
Rafael, eu também aprecio a paz, mas não vamos ser deselegantes com o Sérgio Rodrigues e abusar do espaço dele! E sei que já abusei… Um abraço, Raquel
dr. ‘inverso’ té-qui-tem-razão… em alguns anos esse estróina do neto babão já não poderá nos impedir de ‘samplear’, estudar e escarafunchar a obra do irlandês… que era um sujeito esquisito, ah, era! mas o que produziu compensa a curta e até muito infeliz vida que levou.
…já imaginou, “Finnegans Wake” pelo Creative Commons? vou esperar.
pergunta (a quem souber responder):
– onde está a versão do Augusto de Campos? nas livrarias só encontro uma outra, recente. existe, aliás, a versão integral do poeta concretista? ou existem apenas trechos ‘versados’?