Sim, eu sei: o assunto costuma render debates lamentáveis. Lixo para alguns, maravilha para outros, Harry Potter pode ser uma prova cabal do emburrecimento do mundo ou a melhor coisa que acontece para a popularização da leitura desde que Gutenberg inventou sua máquina sujona. Para quem tende a achar que a verdade imprime melhor em meios-tons, essa polêmica já soa vazia há alguns anos. Mais um motivo para ler o artigo (acesso livre, em inglês) que o crítico literário Ron Charles publicou ontem no “Washington Post”. Aproveitando a deixa dada por sua filha de dez anos – que, entediada, lhe pediu que parasse de ler os livros da série para ela –, Charles tenta entender por que os números da indústria editorial e de institutos de pesquisa indicam que não, Harry Potter não está estimulando a leitura de ficção de um modo geral, mas apenas a leitura de… Harry Potter:
Talvez mergulhar o mundo numa orgia histérica de marketing não encoraje o tipo de contemplação, independência e solidão que o verdadeiro envolvimento com livros exige – e recompensa. Deve-se considerar que, com o lançamento de cada novo volume, os leitores de Rowling vêm sendo levados não apenas a surtos mais intensos de entusiasmo, mas também a uma sincronização mais precisa uns com os outros. Por meio de um prodígio de edição moderna, publicidade e distribuição, milhões de pessoas receberão The Deathly Hallows no mesmo dia. Há algo de excitante nesse tipo de unidade, só que ela quase nada tem a ver com o prazer ímpar de ler um romance: aquela oportunidade cada vez mais rara de pular fora de sincronia com o mundo, de experimentar algo íntimo e privado, a sensação de que você e um autor estão conspirando por algumas horas para recriar um lugar por sua própria conta – sem versão para o cinema nem coleção de bonecos. Rowling não tem culpa nisso, mas a febre Potter treina crianças e adultos para esperar a algazarra do coliseu, uma experiência de comunicação de massa que nenhum outro romance tem a menor possibilidade de lhes oferecer.
49 Comentários
“Harry Potter não está estimulando a leitura de ficção de um modo geral, mas apenas a leitura de… Harry Potter”
Eu já havia percebido isso quando o sobrinho (ô raça) de minha namorada e muitos de seu amiguinhos (ô raça) entraram na febre de HP há alguns anos atrás. Atualmente o moleque tem 15 anos e só leu, lê e lerá HP, bem como seua amigos. Que ler é bom isso é, até bula de remédio que se leia já é algum bem em prol das letras, das frase e dos textos, entretanto o pessoal que lê HP realmente parece só ler isso e mais nada, até que o próximo HP seja lançado.
Não estou entrando nos méritos litrários de HP e de sua criadora, como já foi dito, não há mais nada a ser dito. Particularmente não sou o público ao qual o livro é destinado, então é perfeitamente normal que não me interesse por ele, mas acho uma pena que o universo de leitura de uma criança seja resumido em um único universo.
Infelizmente não tenho nenhuma propriedade para falar de livros ou autores “infantis” ou para “jovens”, pois comecei a ler muito tarde.
Complemento: pois comecei a ler muito tarde e não sou muito bom para recomendações deste tipo, me atenho apenas a observar.
Acredito que voce escolhe a educacao que da’ aos seus filhos. Se o seu filho estiver em um ambiente propicio, fica mais facil ele se interessar pela leitura. O mesmo vale se ele estiver vendo as pessoas a sua volta lendo tambem. E nao precisa ser so’ livro de crianca, eu com 10, 11 anos lia livros de adulto – sem aproveitar tudo o que a historia podia oferecer, mas de qualquer forma foi um aprendizado. Tive a sorte de estar em uma casa cheia de livros, entao a diversao era fuxicar nas prateleiras e pegar o livro que me chamasse a atencao. Uma crianca que nao tem mais que meia duzia de livros em casa, nao tem acesso a uma biblioteca e nao e’ levada a livrarias com uma certa frequencia vai descobrir do que gosta de ler como?
Nao e’ a responsabilidade dos Harry Potters da vida interessar o seu filho em ler, o exemplo vem de casa. Eu nao consegui nem terminar o primeiro livro, entao nao tenho como opinar sobre a qualidade da serie em si – o que eu li, achei chato. E acho que, no minimo, o sucesso da serie mostra que a garotada e’ capaz de sentar e ler, mesmo que seja por modismo. Isso porque a propria midia do livro ja’ vem sendo questionada por uns como nao sendo dinamica suficiente para interessar jovens que crescem na base da tv, internet e videogame. Acho que foi essa a teoria que foi por agua abaixo com as aventuras do HP.
É como jogar xadrez….Se quando pequeno, você se você se torna um ótimo jogador de xadrez, certamente no futuro terá uma ótima capacidade para jogar xadrez. E só.
Sérgio, você já leu algum dos Harry Potter?
Nunca li nenhuma linha nem vi quaisquer dos filmes do Harry Potter, mas acho que literatura, nesse caso, é apenas o meio que veicula a história, porque do ponto de vista do modelo de ficção, HP estaria mais para uma novela tipo Rebelde ou High School Musical do que para qualquer outra coisa.
Nem uma pseudomitologia é, pelo que captei; os personagens bons e maus são apenas representações mal-disfarçadas de figuras paternas, hostilidades grupais etc etc. Literatura é apenas o formato que a autora escolheu, talvez pelo fato de que, num primeiro momento, teria sido uma aposta temerária transformar aquela congestão de vassouras voadoras, bruxos e macumbeiros em um produto audiovisual caro e de rentabilidade incerta. A literatura foi o laboratório de testes e comercialmente, claro, os livros são bem-sucedidos.
Respondam-me,
Pobres mortais,
Com muita atenção
E nenhuma pressa:
Quem governará a quem?
Eis a questão.
A Literatura ao Zeitgeist?
O Zeitgeist à Literatura?
Vice e versa?
HP também não é o meu tipo de leitura preferida, quando criança lia coleção vaga-lume, por obrigação escolar. Hoje prefiro literatura tipo bíblia (não no sentido religioso), Divina Comédia e vou começar a ler Fausto, por citação da Shirlei Horta.
Odeio Sidney Sheldon, Shakespeare’s (Eca!). Troco por Stephen King e Alfred Hitchcock . E São Tomas de Aquino é ótimo no ramo da filosofia, com texto em Latim e tudo mais.
Como vê, gosto realmente não se discute.
Meu sobrinho começou com Harry Potter aos 9. Hoje, aos 12, lê tudo o que lhe cai nas mãos. Philip K. Dick, André Carneiro, Tibor Moricz, Machado de Assis e, pasmem, Stephen Hawking. Pode não ser uma regra, mas funcionou com ele. Deve funcionar com outros também.
Gostei de ler “Mate-me por Favor” e assistir o “Botinada” este do Gastão Moreira.
Só para relembrar a minha época Punk.
Ana Z., li o primeiro com meu filho, alguns anos atrás. Achei muito fraco, não passou nem perto de me pegar.
Por que a implicação com Potter? Ou com Paulo Coelho? Ou com James Joyce… com com..com…
Deixem a molecada ler o que quiserem, ou não lerem nada…
Deixem os adultos lerem ou não lerem o que quiserem…
Cada sabe de si, cada um descobre suas paixões em algum momento da vida…ou não descobrem e a vida segue assim mesmo.
Quem gosta e se dispõe a falar porque, que o faça. Se não gosta, que o faça também, com argumentos pelo menos razoáveis.
Literatura/livros é bom demais, mas não é o mais importante da vida.
Tem quem viva toda a vida sem…e daí?
Ah sim, meu filho gostou. Mas não virou um potter-head típico. No segundo ou terceiro livro, se aborreceu e foi ler outras coisas.
oi Sérgio, passo pra deixar meu abraço e aproveito pra dizer que não li, mas não perco um filme do Harry Porter… são lindos, divertidos, com enredo, clima, fotografia, elenco, música, muito especiais. Beijo da Gisele 😉
Sérgio, o New York Times tem uma matéria mais ou menos sobre o mesmo assunto que me parece mais balanceada: ela deixa claro que o efeito Harry Potter sobre a leitura em geral é limitado, mas também fala do lado positivo da “orgia histérica de marketing” – de uma hora para outra, ler não é só coisa de nerd – e chega a citar um professor que acha que é mais importante aprender a ler informação do que aprender a ler narrativa. Não sei se concordo totalmente com ele, mas desconfio que muitos leitores vorazes exageram a importância da literatura apenas para justificar intelectualmente seus gostos pessoais. O link da matéria é http://www.nytimes.com/2007/07/11/books/11potter.html?pagewanted=2&_r=1&8bu&emc=bu
O artigo do Washington Post, por outro lado, é de um esnobismo discreto mas muito irritante. O que não é bom para Ron Charles e sua filha não é bom para os outros; adultos que lêem Harry Potter para si mesmos e não para suas crianças são prova de “infantilismo cultural”. Ron Charles simplesmente esquece que, por maior que seja o hype, ler um dos romances de J.K. Rowling é uma experiência tão contemplativa, independente e solitária quanto a leitura de qualquer outro romance. Ele e sua filha podem não gostar da série, mas balançar a cabeça com pena dos que gostam é uma atitude, ela sim, muito infantil.
Obrigada por responder, Sérgio. Se uma orgia histérica de marketing faz um menino ter vontade de ler um livro – seja que Harry Potter for – neste mundo de tantas e instigantes linguagens disponíveis, parece a mim – que adoro literatura e puxo, descarada, a brasa para a minha sardinha – coisa inquestionavelmente boa.
Concordo, Ana Z. Mas isso me parece um ponto de partida, algo que é – há muito tempo – dado. Sim, muito legal que tanta gente esteja lendo. O mesmo se pode dizer de Paulo Coelho. Mas se os blockbusters (cada vez mais blockbusters, num movimento de concentração que, curiosamente, encontra paralelo no das próprias editoras como empresas, em todo o mundo), se os blockbusters, digo, são incapazes de gerar mais leitura de um modo geral – pelo contrário, como parece ser o caso – talvez tenhamos um problema cultural meio grave, não? Um certo nariz em pé à parte, o que me pareceu legal no artigo que o Lucas Murtinho detestou é isso – a disposição de dar esse passo à frente em terreno, claro, nebulosíssimo. Sai a crítica literária com sua lupa, entra a crítica cultural com sua grande angular. Claro que Harry Potter não pode carregar as culpas do mundo, nem eu estou interessado, aqui, num julgamento estético ou moral da obra de JK Rowling. Por critérios exclusivamente literários, o que li me pareceu surpreendentemente fraco. Mas é lógico que estamos muito além desses critérios. Não sei se fiz algum sentido, mas a discussão que me parece produtiva começa depois que termina o embate bom x não bom. Acho que ainda mal começamos a entender essa história. Um abraço.
O estudo da NEA que o Ron Charles cita chama-se Reading at Risk e vale uma olhada.
Segundo os dados da pesquisa, o índice de leitura de livros em geral caiu 7% nos EUA entre 1992 e 2002, mas o de literatura isoladamente teve uma queda ainda maior: 14%.
Outros trechos:
“Reading among women is also declining significantly, but at a slower rate.”
“Over the past 20 years, young adults (18-34) have declined from being those most likely to read literature to those least likely (with the exception of those age 65 and above).”
Link do documento em pdf:
http://www.nea.gov/pub/ReadingAtRisk.pdf
Esse crítico é um imbecil. Aposto que ele não se lembra de quando era criança/adolescente e começava a ler.
E antes que alguém me acuse de ser exatamente daquele tipo que acha a série Harry Potter uma “maravilha”, aviso que só li os 3 primeiros livros (e, sim, gostei). Fico no meio do caminho entre considerá-la um lixo e uma maravilha.
Dizer que os livros de J. K. Rowling não conseguem, por causa da intensa e global (prestem atenção na palavrinha subentendida) campanha de marketing, produzir uma oportunidade de experimentar algo íntimo e privado é de um sem-sentido total. Além de ser tão raso quanto uma poça d’água. Você pode acabar sendo arrastado pela onda artificial de entusiasmo que o nome “Harry Potter” provoca, mas na hora em que pega o livro e começa a lê-lo (não importa se movido por um genuíno interesse ou só porque é moda), a experiência torna-se, sim, íntima e pessoal – quer esse critico bobalhão concorde ou não. É por essas e outras que ninguém mais lê cadernos literários…
Sérgio, a literatura hoje disputa com um absurdo de outras manifestações culturais, linguagens e formas de entretenimento. Neste atordoante mundo globalizado, me parece difícil defender que a expansão de uma atividade de natureza contemplativa, independente e solitária se dê sem a intervenção de muito marketing e blockbusters. A questão é que nem marketing e blockbusters resolvem, se não houver também uma melhoria considerável na educação. A fruição da literatura, diferentemente de outras artes mais imediatas, depende de uma coisinha não muito simples que é saber ler. Os índices de leitura (especialmente de leitura literária) caem exatamente nos países em que a qualidade da educação desaba. No caso do Brasil (nariz em pé à parte), quem tem cacife para alçar vôos literários? Você tem toda razão – temos um problema cultural meio grave mesmo.
igual Paulo Coelho, ler Paulo Coelho leva a ler mais Paulo Coelho e, no máximo, coisas próximas como auto-ajuda, livros psicografados da Gasparetto et caterva.
Melhor do que não ler? Não sei… acho mais culta uma pessoa que assiste um filme de Buñuel ou escuta um cd dos Beatles e nunca leu um livro (é raro, mas… vai saber) do que alguém que perde tempo da vida lendo Lair Ribeiro.
Analfabetismo é horrível, mas leitura também não é um valor em si.
Antes de Rowling, quem fisgou mesmo minha filha mais velha para o sabor da leitura foi Pedro Bandeira. E tem gente que nem sabe quem ele é!
Nem tudo que se publica no formato livro é literatura. Por exemplo:auto-ajuda, Paulo Coelho, best-sellers ruins de doer, livros religiosos, assim como livros didáticos bons ou ruins, livros técnicos, jurídicos, médicos, etc etc não são literatura. Alguma coisa publicada como “diversão” , “entretenimento” (por exemplo, alguns livros policiais) podem chegar a despertar o interesse de um leitor para a chamada “grande” literatura. Como se começa? Cada um tem seu jeito, sua história: eu comecei lendo “Pato Donald” e outras revistas em quadrinhos. Diziam que eu nunca leria um livro, acostumado às imagens. Poderia ser. Romances de aventuras em quadrinhos (uma série da Editora Ebal chamada “Edição Maravilhosa”) fez com que, de fato eu nunca lesse os livros de Walter Scott e Alexandre Dumas, já que conhecia os enredos. Mas de Monteiro Lobato em diante fui saltando para F.Scott Fitzgerald alternando com Agatha Christie etc etc etc. Mas de Harry Potter só vi o último filme e dormi bastante apesar da barulheira dos efeitos sonoros. Do que pude ver, achei muito chato. É filme, mas não é cinema.
Nem lixo, nem maravilha. O problema é quando se torna a única opção. Totalitarismo cultural, imposto pela ignorância e seus representantes midiáticos.
O que era o mundo antes de H. Potter?
Peter Pan, Mowgli, Pedrinho & Narizinho, Tarzan, O Rei do Crime, muito gibi…
Julio Verne, Kipling, Dumas, Lobato, Stevenson, Defoe, Melville, Dickens, Coleção Jovens de Todo o Mundo. Sumiu das prateleiras, acabou-se. Que jovem leitor do Potter partiu para estes, na sequência? Só aqueles que foram induzidos (forçados?) pelos pais mais teimosos! Pessoalmente, não conheço nenhum…
É Cesar Santos. Tá coberto de razão, assim como tem quem vive com objetividade tem quem vive por viver.
Lembro-me de ficar vendo as fotonovelas e buscando imitar a minha irmã, que na época já sabia ler e eu não. Depois, a compra de um Cebolinha usado que deu início a minha coleção de quadrinhos, ainda sem saber ler. Somente depois da Caminho Suave e as histórias da série Cachorrinho Samba, é que a coisa deslanchou.
Já li um pouco de Harry, mas não me atrai. Acho os filmes mais interessantes e, mesmo assim, considero como uma distração menor. Da minha parte não merece grande atenção. Nesta linha de – como direi? – magos, etc – prefiro a sátira da série DiscWord ou “negrume” do que considero a melhor obra de Tolkien: O Silmarillion.
Abrs,
Sergio, parabéns pela iniciativa de manter vivo o belíssimo trabalho que fazia no NoMinimo. Para o novo site TodoProsa tenho somente um crítica a fazer: o tipo de letra (ou fonte, como dizem os entendidos de computação) que você utiliza agora não é confortável para a leitura e o resultado é ainda pior nos textos em itálico. Se for possível o ajuste, o leitor agrade. Um forte abraço.
Concordo em ir além da questão bom x não bom, mas deixo antes uma pergunta-provocação: o que diria o Ron Charles se, em vez de Harry Potter, as crianças não estivessem lendo nada além de Shakespeare? Acho que ele acharia muito bom, e é o que me incomoda no seu artigo.
Mas uma pergunta que pode ser respondida sem apelar para o gosto é: a diminuição de horas de leitura por prazer e o poder de atração dos grandes sucessos são mesmo um problema cultural grave? Se eu tivesse que responder agora, diria não. Grave é não saber ler, ser incapaz de decodificar um texto, mas cada vez menos pessoas sofrem desse problema. Passar desse ponto é uma questão de gosto. Leitores fanaticos podemos ficar tristes pela pequena popularidade do nosso passatempo, mas não devemos esquecer que literatura é isso, um passatempo, e que preferir fazer outra coisa não é tão mal assim.
Ron Charles é meu profeta!
O segundo parágrafo já está em meu “Cânon.
Alguns itens que me chamam a atenção nessa onda Harry Potter:
-confirma a tendência de infantilização do público adulto; muitos adultos lêem HP, e isso engendra desde um “leio sim, e daí” até o velho deslocamento do preconceito (“leio, mas Paulo Coelho é bem pior “etc); o fato é que em nenhuma época houve esse surto de adultos fixados numa narrativa infanto-juvenil;
-HP, pelo pouco que sei a respeito, é um universo pagão, e pode induzir a vícios intelectuais tipo escapismo, pensamento mágico, depreciação da lógica e da análise etc etc;
-HP é uma leitura de formação que se esgota em si mesma, ou seja, enquanto histórias em quadrinhos, Monteiro Lobato, Maria José Dupré e outros levam o jovem leitor a um universo mais amplo, Harry Potter aprisiona, por assim dizer, o seu público leitor num universo auto-referente, não remete a nada que não seja a si mesmo; e
-os pais têm sim responsabilidade com o curso que o hábito de leitura de seus filhos tomará; a indulgência com relação a HP é uma aposta de risco p/ a formação intelectual de um jovem ou de uma criança; tem um trecho no “A La Recherche” em que a avó do narrador dá de presente ao neto um livro de Georges Sand, e oferece a seguinte explicação: “eu não saberia dar a essa criança algo mal-escrito”; essa criança, alter-ego do autor, virou, tomando-se por base que haja sido um episódio autobiográfico, o Marcel Proust; abastecendo seu filho tão somente com os livros do Harry Potter, que espécie de adulto ele se tornará?
Fatalista, hem, Cerveja?
Bemveja… hehehe, escusas sinceras.
Fatalista não Tibor, a formação intelectual acontece, a meu ver, até os 14, 15 anos. Eu me lembro do Lobão ter dito, profeticamente, que essa geração que cresceu assistindo ao programa da Xuxa seria, essencialemente, uma legião de débeis mentais. Vendo os resultados de nossas escolhas coletivas, de nossos padrões de consumo intelectual e da paupérrima produção intelectual emanada dessa geração, eu vejo que ele estava mais do que certo. Com Harry Potter pode ser mais ou menos a mesma coisa, só que em escala global. Acho que as pessoas estão sendo um pouco levianas e superficiais sobre a literatura nesse tópico e no outro sobre o Oz.
Nossa cultura é multifacetada. Nem só de Shakespeare, Camus, Tolstoy ou Cortazar… também de HP, Stephen King, Paulo Coelho e outros que tais. Viver em meio aos contrastes nos faz mais seletivos. Amplifica nossa capacidade de avaliação. Não acredito naqueles que começam por cima. Tendem a menosprezar o q
É incrível como esse assunto leitura, HP, e PC rendem…Particularmente li o primeiro HP a trabalho e achei muito ruim, nada comparável a qualquer façanhas de capa-espada de Sr Walter Scott…
merda… não era pra ter ido agora.
…Não acredito naqueles que começam por cima. Tendem a menosprezar o que lhes vai abaixo, sem conceder-lhes, ao menos, o benefício da dúvida.
HP é tão bom quando qualquer outra literatura infantil da mesma cepa. Tem uma função edificante. Aproximar da leitura jovens pouco afeitos a ela. E discordo que ler HP é burrificante.
Ah, puxa vida! Comparar Rouling com Walter Scott é foda!! É por isso que essas discussões jamais levarão a lugar algum…
Já vi e ouvi comparações piores….
De fato, Sr.Moricz essas discussões são apenas boas discussões para afiar a retórica, arte gasta, puída e esquecida….
(Recomendo tb a pesquisa Reading at Risk).
http://www.nea.gov/pub/ReadingAtRisk.pdf
Senhor tá no céu…
Se o teu filho quer ler _apenas_ Harry Potter e não se interessa por outros livros, bem vindo às estatísticas. Era quanto mesmo a média do brasileiro, 1.5 livro/ano?
Mas não se desesperem, eu mesmo só comecei a ler bastante dos 17 em diante. O jeito é ter uma biblioteca disponível para quando e se o moleque se interessar, estimulando a leitura com teu próprio exemplo e com sugestões de vez em quando, com calma pra não traumatizar. Depois que ele pegar no tranco, daí sim, oriente bem as leituras com alguns clássicos de fácil acesso, atualidades e uma ou outra coisa mais complicada. Ajude-o a encontrar o seu estilo predileto.
Meus pais sempre foram grandes leitores, com uma biblioteca de pouco conteúdo infantil e infanto-juvenil, mas o que mais me pesa na memória é não ter uma recordação sequer deles lendo. Os velhinhos liam apenas no quarto, um bom tempo depois dos filhos terem ido dormir. Não façam isso.
Informação relevante:
A escritora inglesa J. K. Rowling ganha atualmente cerca de cem euros por minuto…
Está aí o grande problema dos críticos em relação a ela.
Caro Sérgio,
contemplação, solidão e silêncio nunca foram problemas para mim. Na verdade, recomendo-os ao final de minha tese em filosofia. Meu escritor predileto é Proust e me divirto lendo as três críticas de Kant. Me gabo disso tudo porque preciso sair do armário, mas não quero que pensem que sou superficial: eu adoro Harry Potter. Sim, tenho 40 anos e adoro. E o que é pior: contaminei minha pobre mãe, meu pai, meu padrasto, enfim, toda a família.
Os livros são bem escritos,são cheios de referências mitológicas inacreditáveis, e ainda crescem na medida em que crescem os leitores. O primeiro livro é bastante infantil e o último fica no limiar da idade adulta. A estória é bem contada, a narrativa é fluida e cheia do bom humor inglês. Acredito que entrará para a história como um clássico para adolescentes.
Agora, existe um concorrente que é muito mais profundo, filosófico e interessante, mas não fez sucesso. Trata-se da série “Fronteiras do Universo” de Philip Pullman. Para aqueles que têm pudores com o bruxo, aí está um livro ( para adolescentes) cuja leitura não envergonha ninguém.
Pronto! Saí do armário.
Angela:
Que ótimo o seu comentário! Você disse tudo: não se precisa ser um imbecil pra gostar de J. K. Rowling. Alguém com cultura elevada também pode.
Sobre Pullman, concordo 110% com você: é uma série brilhante o Fronteiras do Universo. Merecia ser melhor conhecida. Acho que à partir do filme, que está pra sair, passará a ser melhor conhecida…
pra quem acha que J.K. Rowling é apenas sortuda ou esforçada, vale ler uma primeira crítica do último HP pelo NY Times: http://www.nytimes.com/2007/07/19/books/19potter.html?_r=1&oref=slogin
Levei Harry Potter para casa no primeiro volume, e até hoje me culpo por isso, minhas filhas passam de um para outro e voltam e vão, mas não conseguem ler outra coisa. Junte-se a isso que ao verter o produto para o cinema, fazem a proeza de modificar seqüências inteiras, o que é inacreditável. Temos então livros com aventura, adrenalina tudo em doses cavalares, onde encontrar isso por aí?. Sigo tentando, e são livros e mais livros abandonados, Bem Vindo ao Clube, do Coe está lá largado a quase um ano, Meu Pé de Laranja Lima foi o último derrotado, um que chamou a atenção da minha filha menor foi Kipling com o Livro da Selva, mas eu tive que ler para ela. Resumo da ópera, são livros que agradam e não colaboram em nada para a formação de bons leitores, e ainda estragam os futuros cinéfilos com filmes carregados de efeitos especiais, acho que estamos perdendo nas duas frentes…em tempo li todos os livros e vi todos os filmes, ser pai é….