Compreensivelmente, o Radiohead fez muito mais barulho – com e sem trocadilho – ao liberar seu novo álbum na internet para quem quiser baixá-lo, ao preço que quiser pagar. Mas o Man Booker Prize também está dando sua contribuição para tornar 2007 um ano-marco na história da indústria cultural. O grande prêmio da ficção britânica, vencido na semana passada pela irlandesa Anne Enright, anunciou estar em negociação (em inglês, acesso livre) com as editoras envolvidas para publicar online, sem custo para o leitor, todos os livros finalistas deste ano.
Sim, é provável que as duas iniciativas sejam menos comparáveis do que sugere uma primeira impressão. Músicas baixadas online podem ser ouvidas com o mesmíssimo conforto daquelas compradas na loja, enquanto ler um romance inteiro na forma digital, dado o atual estágio pré-histórico dos e-books, ainda é uma perspectiva desoladora. Mas não deixa de ser animador ver a literatura, essa senhora antiquada, se meter a competir – pelo menos no marketing “radical” – com o pop-rock.
21 Comentários
Muito boa essa idéia do booker.
que sirva de inspiração às editoras para olharem a internet com mais ousadia, como aliada — e não com a desconfiança ou ignorância como costumeiramente fazem.
Afinal, quantas editoras brasileiras participam do google books? das grandes, só a ediouro.
Admirável mundo novo… Mas ainda vejo uma distinção bem grande entre ouvir todo um cd no computador e ler mais de 200 páginas na tela ou em papel a4. Talvez a anatomia humana tenha que se adaptar também.
Eu acho risível a idéia de que a digitalização teria por força motriz a tentativa de alcançar regiões da África e da Ásia onde os livros selecionados não chegam. À exceção de duas ou três ditaduras, livro chega em qualquer lugar, a Amazon está aí p/ isso.
Livros, a meu ver, são a prova de fogo da maturidade intelectual, e oferecê-los via internet não amplia o exíguo número daqueles que nascem com as precondições mentais para consumi-los. Elitismo é um elemento incontornável em um mundo intelectual e socialmente desigual, e acho temerário que os organizadores do Booker se curvem a pressões demagógicas; daqui a pouco vai virar uma ONG sem credibilidade feito o Nobel.
Sérgio, na verdade a idéia é colocar os livros online mas à venda:
http://www.thebookstandard.com/bookstandard/search/article_display.jsp?vnu_content_id=1003660106
Abraços,
Lucas
Estranho isso, não, Lucas? Tem a maior pinta de recuo do British Council diante do jogo duro das editoras. Achei curioso não ter encontrado uma errata no Times – parece que o jornal continua bancando a informação original. Downloads pagos? Puxa, que revolução. Espero que não fique realmente nisso. Se ficar, não vale o tempo investido na leitura da notícia. Um abraço.
Estreante no mundo dos livros, talvez não tenha conhecimento de causa para opinar sobre o assunto…
o que posso dizer é que o fato de colocar meu livro EMBRULHOS no google books possibilitou-me vender dois exemplares (em papel) para leitores que jamais saberiam que existo.
É pouco, mas diante do mínimo que vendi, no corpo a corpo, para mim, foi animador. (rssrss)
Mozzambani
Sérgio, se for como o Radiohead, o cliente pode escolher o quanto quer pagar pelo produto. Há quem pense que é pouco, mas ao que tudo indica a banda “vendeu” 1,2 milhões de downloads. Vários colegas da redação deram seus três ou cinco dólares. É uma grande sacada.
Quanto à diferença de suporte entre MP3 e livros: bem, você sempre pode imprimir o e-book. Baixar gratuitamente e pagar a impressão ainda sai mais barato do que comprar o livro..
Não é uma defesa, até porque nunca consegui ler um livro inteiro na tela e não abro mão do cheirinho de livro. Mas..
Sim, Jonas, é como eu disse no texto: “para quem quiser baixar, ao preço que quiser pagar”. Não fica claro na matéria do ‘Times’ se o pessoal do Booker imaginou algo semelhante, mas concordo que é uma ótima idéia – pelo menos neste momento, pela novidade, além de roubar público da pirataria deve garantir uma boa receita. Como solução de longo prazo, não sei. Mas quem disse que alguém sabe?
complicado é alguma obra de ficção atual ser tão boa quanto Ok Computer
Nos domínios da FC, isso não é novidade nenhuma. Os candidatos ao prêmio Hugo de 2007 (um dos maiores prêmios de FC mundiais) tiveram, quase todos, seus trabalhos disponibilizados on line:
http://www.nippon2007.us/hugo_nominees.php
E, Sérgio, fora que lá fora as pessoas têm uma relação diferente com a coisa de pagar por um download (mesmo porque a realidade financeira permite isso). Seria muito bacana para a indústria editorial de lá. Não acho que isso prejudicaria o papel. Digamos, o novo de tal autor sai em hardcover. Se faz sucesso, ao sair em paperback sai também em download pago, mais em conta para compensar a falta do suporte físico do livro. Seria sensacional.
Talvez vocês achem meio (ou totalmente) absurdo, mas vá lá, tentarei me respaldar em dados históricos (o que pode não significar muito, aceito).
A popularizaçao dos computadores (estes “eletromésticos”) veio quando a indústria de informática mudou o seu foco – assombrada pela beco aparentemente sem saída da Lei de Moore – do hardware (o corpo) para o software (a mente).
A indústria de software, concomitantemente, teve seu salto quântico quando o modelo arcaico de desenvolvimento de programas que originava aplicações “monolíticas” começou a ser “contaminado” pelo paradigma da orientação a objetos.
Aqui começou a era dos aplicativos gráficos. O computador ficou mais fácil de ser usado, convergente, foi embutido em outros “information appliances”, o mundo se tornou uma plataforma TCP/IP. Hoje, o acesso às informações são quase instantâneas.
O resto do impacto da tecnologia em nossas vidas, bem, este todos nós já sabemos e sobre ele teremos diversas histórias para contar.
Em relação à indústria fonográfica, assistimos o advento do mp3. Depois apareceram Napsters, Kazaas, etc.
O conceito de álbum já era obsoleto há muitos anos. Desde sempre desejávamos personalizar o CD, que está com os seus dias contados, pois o futuro aponta que o “computador” é a própria rede, distribuída, a música sai de algum lugar na rede para o mp3 player ou qualquer outro dispositivo.
Algo semelhante acontecerá com os livros (hardware) e o conteúdo destes livros (software).
A simples digitalização e comercialização de um conteúdo monolítico (a obra), torna incompleta essa possível “revolução” do mercado editorial.
A revolução realmente virá quando a criação do conteúdo efetivamente começar a ser influenciada por este paradigma orientado a objetos que (indiretamente pelo uso da internet) também está impregnando outras áreas fora da tecnologia da informação.
O impacto ideal no modelo de negócios virá com o impacto no modelo de criação ( e nos formatos de distribuição também, claro).
O conteúdo de um “livro” conceitual conterá diversas camadas (quem “montará” o “livro” será – como sempre o foi – o leitor, o escritor apenas apresentará possibilidades).
A leitura será uma experiência virtual aumentada. A ficção (ensaio, etc.) será um ambiente de interação sinestésico (como os games que também contam histórias).
E pasmem: será exatamente como nos modelos de desenvolvimento de software, como quase tudo o que hoje funciona na web (incluisve esse modelo de log, post, comments deste blog, por exemplo) que é uma extensão do modelo “orientado a objetos”: personalizável, componentizável, reutilizável.
Isso não lhes soa familiar?
Cada coisa é cada coisa…
Há uma semana estou curtindo esse som do Radiohead (In rainbows) no carro. Rock num levada mais light, voz legal do Thom Yorke, enfim, uma excelente música descartável, altamente curtível, como sói acontecer com a obra “radioheadiana” em geral …
Agora, livro é livro, bom de ler é no suporte “papeloso” mesmo, embora eu já tenha lido algumas dezenas na telinha do pc… e o mundo continua girando e a lusitana rodando…
Sérgio, as editoras têm tanto medo dessa história de digitalização que eu tinha achado muito estranha essa notícia, e ela fez um pouco mais de sentido para mim depois do esclarecimento do British Council. Eu apostaria até que o formato do livro a ser vendido, se o projeto seguir em frente, vai ser em algum arquivo com DRM – nada de um pdf que possa ser copiado por aí.
Mas o Saint-Clair tem razão, na ficção científica distribuir livros online não é novidade – o Cory Doctorow vive disso. E em outros gêneros o avanço também é grande: a Harlequin anunciou recentemente que todos os seus lançamentos vão ser lançados online:
http://www.booksquare.com/ebook-customers-less-testosterone-than-you-think/#more-2551
Abraços,
Lucas
Acho que o genial sistema do “pague quanto quiser” elaborado pelo Radiohead jamais funcionaria no caso dos livros, simplesmente porque escritores (à exceção, talvez, de meia dúzia) não são tratados como profissionais. Duas coisas que penso estarem bastante de acordo com o senso comum (e das quais, obviamente, discordo de todo): (a) pra que remunerar quem, pra realizar seu trabalho, tem um gasto material ínfimo – já que nem o lápis e o papel são mais necessários? Músicos precisam de estúdio, instrumentos, etc. Já escritores… (b) ora, qualquer um escreve literatura! Fazer música exige, no mínimo, domínio de instrumentos e noções mínimas de mixagem; literatura qualquer criatura (semi-)alfabetizada sabe fazer. Isso não quer dizer que eu seja contra a publicação de livros na internet: acho, como muitos, que tão cedo a divulgação de livros online não representará qualquer risco às editoras (pelo menos às que cobram preços decentes); eu mesmo jamais deixei de comprar algum livro por tê-lo digitalizado. Mas acho que, primeiro, essa disponibilização deve ser gratuita; segundo, deve ser utilizada em prol da profissionalização do escritor (não sei bem como: talvez deixando claro que o livro disponibilizado no sítio da livraria/editora é uma “degustação”, uma mera peça de divulgação, mais ou menos como antigamente funcionava um “single” em relação ao álbum completo de um determinado músico).
Nice
Nice!
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