Na 11a e última aula de sua oficina literária online no Portal Literal, o romancista pernambucano Raimundo Carrero, autor de “Os segredos da ficção” (Agir), faz um resumão do curso tomando como fio condutor a bibliografia comentada que usou nas aulas – aulas que também é possível revisitar no arquivo do site.
O aproveitamento de “lições” desse tipo vai ser sempre idiossincrático, claro, ou não será aproveitamento algum. Há tópicos para assimilar, para refutar e para esquecer. No geral, porém, Carrero reflete com lucidez sobre o ofício de escrever ficção. Eis o ponto mais louvável de sua abordagem: o fato de tratar como ofício o que ofício é, sem dar bola para a mitologia da “irrefreável expressão do eu” que a era da internet, num curioso retrocesso, tanto reavivou.
O autor de “Sombra severa” (Iluminuras) chega ao exagero de sustentar – como neste artigo publicado ano passado em NoMínimo, em resposta a uma crítica de Antonio Fernando Borges às novas gerações de escritores – que qualquer pessoa pode se tornar ficcionista, que talento é balela. Nesse ponto eu subo no caixote para discordar com a maior ênfase possível: acredito, como Nelson Rodrigues, que o sujeito precisa de talento até para atravessar a rua. O que não me impede de reconhecer o valor da missão civilizadora de quem, neste Brasil sérgio-buarquiano de inspirações e facilidades, apregoa pelas esquinas a importância de trabalhar, trabalhar, trabalhar, trabalhar, trabalhar.
18 Comentários
Escrever é viver… A técnica literária é a lapidação do talento… O texto abaixo foi escrito na UNINOVE, em uma sala de aula – disciplina: LPT-II (Leitura Processual de Texto)…
CRÍTICA – “FAROESTE CABOCLO” (RENATO RUSSO)
Nas regiões rurais brasileiras o bem caminha lado a lado com o mal e nessa “ladainha”, aparecem nos cartórios de “registro civil”, pessoas de vários “credos” religiosos, que deixam nas folhas dos livros “centenários”, nomes como “João de Santo Cristo”, em referência à fé católica, herança da colonização portuguesa.
Um “cidadão” registrado na “Comarca” do interior baiano cresceu e no percurso dos atalhos da vida, mudou o caminho de uma educação conservadora e cheia de princípios morais, comum nas pequenas cidades do Brasil. O estopim foi a morte do pai. “João de Santo Cristo”, menino rebelde e inteligente, viu o “Seu Santo Cristo” (sua base maior) ser assassinado por um soldado da Polícia Militar. O ódio latente na personalidade do menino interiorano se manifestou de forma incomum.
Eram três da tarde e os pássaros bebiam nas cacimbas quando “Seu Santo Cristo”, pai de João, voltava do “Sítio dos Mulungais”, após trabalhar em uma tarefa (serviço de empreitada na roça) do “Finado Zé Machado”. O galope do cavalo em que vinha montado, tinha o cansaço do “verão nordestino” e deixava o som compassado num ritmo próprio de uma melodia fúnebre, que nas próximas horas, seria executada pela “R-45”, bandinha ou retreta da redondeza.
Ouviu-se o barulho de um tiro! Táááá… Um corpo suado e sujo de barro (“Seu Santo Cristo” havia trabalhado em uma olaria) caiu sangrando o sangue dos justos. A cena lembrava uma aquarela renascentista de “Leonardo da Vinci”.
Nos pesadelos de “João de Santo Cristo”, as imagens da tragédia no passado, são as principais motivações para que o “personagem mau” apareça no seu cotidiano de delinqüente.
“Joãos”, com ou sem “Cristos”, desprovidos de santidade e com um grau de dramatização tipo “Terror da Cercania” – Cercanias de Canudos, aparecem em cópias literárias na forma de música e fazem “As Aventuras de Lampião e Maria Bonita”, no “Faroeste Caboclo”, ficarem desprovidos de motivação e sensibilidade literária.
Autor: LAILTON ARAÚJO
A meu ver, é o esforço que separa o escritor bom do ruim, mas é só o talento que distingue um escritor excelente de um escritor bom.
Para os interessados no fazer literário, sugiro a leitura do livro “Cartas a um jovem escritor”, de Mario Vargas Llosa. Esse livrinho é uma jóia.
Existe coisa mais escrota do que uma pessoa “esforçada”?? Talento é tudo.
Mas talento, sem esforço, também não irrompe, né..
Quase concordei com BCK numa primeira leitura, mas… pensando melhor… deve existir bons escritores que não são esforçados, e ruins que, por mais que se esforcem, nunca serão bons. E, afinal, quem consegue medir o nível de esforço de uma pessoa?, não há como definir isto em termos absolutos (seria em horas de dedicação? de revisões do próprio texto? de volume de leituras?). Enfim… o termo “esforçado” é ruinzinho mesmo…
Esforço = trabalho. Quer dizer que o cara fica esperando baixar o exu-literato e dana a escrever? Se for assim, não sei não… Nenhuma história sai pronta. Sei de autores – vocês já devem ter lido em entrevistas também – que levam meses ou até anos, até finalizar um simples conto. Romance então, nem se fala. Casos como o de Kerouac que escreveu “On the road” meio que como um zumbi são raros. A realidade é a leitura, releitura, melhoras, cortes, outra releitura, e por aí vai, até o escritor ter certeza de que não há mais o que mudar no texto. Ao menos é o que eu acho. Abraços!
A Carreiro só resta mesmo o trabalho, porque talento que é bom… Vai ser sempre um escritor esforçadinho, tadinho.
O curioso é que desde o século XIII blogueiros postam notas sobre esse dueto feito de trabalho e inspiração.
Sou escritor e percebo o seguinte no meu trabalho: o primeiro tratamento de um texto – digo, um pedaço de texto – é a trilha que se abre a golpe de foices na mata densa. Nesse estágio importa a estrutura, não propriamente a linguagem. Não há vez para finuras.
Depois, definido o rumo do texto, da trama, é feito o acabamento, ajustada a sintonia fina. Hora das indagações, do “como melhorar”, de especulações, aventuras lingüísticas. A segunda etapa requer talento, sensibilidade.
Quanto à primeira… é sangue, suor e lágrimas.
Claro que trabalho é importante, mas existe algo anterior a ele, que se chama VOCAÇÃO. É o famoso “chamado da literatura”.
Sérgio,
imagino ser eu obtuso, pois entendi que escrevestes que Sergio Buarque prega a frase fácil, o bacharelismo, quando ocorre exatamente o contrário em Raízes do Brasil.
Sem mais, abraços.
carroazul, não creio que Sérgio Buarque de Holanda “pregue” nada. O Brasil fascinado pelo brilho fácil é aquele de seu diagnóstico famoso, sim, em “Raízes do Brasil”.
Vocação sem talento não é nada. É o desejo sem competência.
Vocação, sim, mas com talento e trabalho, trabalho, trabalho.
Há diversas formas de trabalho – e o mais importante é o do inconsciente, que ficar refinando nossas percepções e nossa relação com a linguagem o tempo todo. Borges dizia que seus melhores poemas foram esritos pela mnahã, ao acordar, e saíram assim “facilmente”. É claro que esse é um modo superior de “gestação”. O trabalho consciente é de finalização. Por isso quanto mais trabalho “consciente” mais esforço, de um tipo cansativo. Inspiração é a abertura para o inconsciente. Mas não há boa literatura sem treino, sem o escrever sempre.
Repito o comentário acima, para honrar outra exigência fundamental do texto literário: a revisão. Por favor, desculpem-me os erros da postagem anterior. “Há diversas formas de trabalho – e a mais importante é a do inconsciente, que fica refinando nossas percepções e nossa relação com a linguagem o tempo todo. Borges dizia que seus melhores poemas foram escritos pela manhã, ao acordar, e saíram assim “facilmente”. É claro que esse é um modo superior de “gestação”. O trabalho consciente é de finalização. Por isso quanto mais trabalho “consciente”, mais esforço, de um tipo cansativo. Inspiração é a abertura para o inconsciente. Mas não há boa literatura sem treino, sem o escrever sempre.
Uma boa este debate sobre a arte de escrever. É o seguinte: A inspiração é responsável por tudo de ruim que aparece na literatura. Brasileira ou não. E não suporto os talentosos. Em geral, não passam disso. E por serem talentosos, esquecem de estudar. Raimundo Carrero
E mais: Maravilha, Sérgio. Só agora descobri o seu comentário. Abraços.