Depois da decisão do juiz americano que refreou o apetite de digitalização universal do Google, ontem, vale a pena recuperar o trecho mais aplaudido da palestra que o historiador Robert Darnton fez na Flip do ano passado:
Em primeiro lugar, devo dizer que admiro o Google, que fez coisas maravilhosas, e não quero soar como um D. Quixote. A digitalização do conhecimento é uma grande oportunidade e um grande risco. O Google já digitalizou cerca de 2 milhões de livros que estão em domínio publico. Não cobra pelo acesso e ganha discretamente com publicidade, mas isso não me incomoda. O que me preocupa é a comercialização do nosso patrimônio cultural. Na Biblioteca de Harvard temos 14 milhões de livros. O Google nos procurou e propôs digitalizar tudo sem custo para nós, mas em troca eles nos cobrariam pela leitura em formato digital. Isso é inaceitável. Estão criando o maior monopólio já visto, um monopólio de informação. Não acho correto comercializar uma biblioteca que foi formada ao longo de séculos e deixar isso na mão de uma empresa que precisa gerar lucro para seus acionistas. A República das Letras, com seu acesso universal ao conhecimento, ideal do seculo 18, tem uma chance de ser tornada real no século 21, mas precisamos encontrar modelos que façam isso levando em conta o interesse público, não o privado.
O Google sempre alegou que negociar individualmente a cessão de direitos autorais seria impossível. Daí ter fechado com a associação de classe dos escritores americanos um acordo modelo pacotão no qual qualquer autor estaria incluído automaticamente, a menos que solicitasse sua exclusão até o ano passado – mais ou menos como quem recebe em casa um cartão de crédito não solicitado e se vê obrigado a ligar para o banco e cancelá-lo. Foi exatamente isso que o juiz federal Denny Chin, de Nova York, entendeu ir “longe demais”. Ele quer que se inverta o processo e que os autores optem por entrar, não por sair.
Os próximos passos da novela dirão se o Google falava sério quando se queixava da “impossibilidade” de tal modelo. E quem sabe chegou a hora de outros esquemas se apresentarem, de preferência com algum projeto público – como quer Darnton – organizando investimentos e ganhos privados, que pouca gente acredita serem dispensáveis diante da monumental tarefa de digitalização que a humanidade tem pela frente.
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Correta a decisão da Justiça norte-americana.
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