Aproveito o centenário de Nelson Rodrigues, que se comemora amanhã, para reconhecer publicamente uma dívida pessoal e dar uma dica: talvez não haja lição mais importante que os escritores brasileiros do século 21 possam tirar da obra de um dos maiores escritores brasileiros do século 20 do que o difícil aprendizado do diálogo. Falo de uma questão de forma. Isso não significa minimizar o famoso conteúdo rodriguiano, esse impressionante universo de tipos caricaturais da baixa classe média carioca às voltas com tramas folhetinescas de amor e morte, infidelidade e incesto, numa atmosfera farsesca em que pulsões primitivas estão sempre prontas a furar o verniz da civilização e vir à tona com uma ferocidade equilibrada entre o trágico e o cômico. Evidentemente, é o alcance cultural desse universo que torna Nelson um monstro, um daqueles raros autores sem os quais o país não seria o que é. Mas disso não falta quem esteja falando. Quando me refiro ao diálogo, falo de uma técnica que permite a dois ou mais personagens trocarem blocos de discurso direto no meio de uma narrativa sem que soem como bonecos de ventríloquo do autor ou como oradores na tribuna da Câmara dos Deputados. Alguns escritores se…