Por Raissa Pascoal A mesa Cidade e Democracia abriu o quarto dia da Flip com uma discussão longa, com pontos interessantes, mas que perdeu em dinâmica e conteúdo pela falta de habilidade do mediador Guilherme Wisnik na condução da discussão entre o escritor indiano Suketu Mehta e o antropólogo brasileiro Roberto DaMatta. A partir do livro Bombaim: Cidade Máxima, de Mehta, lançado no país pela Companhia das Letras em 2011, a conversa abordou pontos como o nascimento das grandes metrópoles, suas transformações e as semelhanças entre as favelas do Rio de Janeiro e de Bombaim, hoje chamada de Mumbai. Apesar de promissores, alguns tópicos deixaram de ser desenvolvidos a contento, e o mediador, que poderia incitar os autores a falar, não o fez. Durante uma hora e 20 minutos, tempo que durou a mesa, Wisnik só lançou três perguntas aos convidados. Em lugar de promover um debate, ele deu espaço para que Mehta e DaMatta falassem longamente e sem destino – a conversa não tinha um norte. Parte do tempo também foi destinado à apresentação de músicas sobre grandes metrópoles, como a canção This is Bombay, My Love, da Bollywood da década de 1950, e New York, New York, clássico na voz de Frank Sinatra….
Se a ficção brasileira, como a de qualquer país, parece tímida ao retratar nossa maior paixão esportiva (veja nota abaixo), não se pode dizer o mesmo da literatura em sentido mais amplo. A produção cultural em torno do futebol, que tem na crônica esportiva seu gênero mais tradicional, vem ganhando nos últimos anos a contribuição da universidade, especialmente na área de sociologia. Em entrevista por e-mail, um dos representantes dessa tendência, Ronaldo Helal – doutor em sociologia pela New York University, professor de pós-graduação em comunicação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e autor de “Passes e impasses: futebol e cultura de massa no Brasil”, entre outros livros – tem uma tese para o eterno choro sobre o relativo silêncio de nossos escritores diante do futebol, de resto semelhante ao dos escritores de países não menos vidrados no esporte: “A diferença é que os brasileiros se creem os mais apaixonados e entendidos no assunto”. 1. A imprensa e a crítica literária vivem estranhando que o Brasil nunca tenha produzido seu “grande romance do futebol”. Isso faz algum sentido? Literatura combina com esporte? – Veja que em 1919 Lima Barreto fundou a “Liga Anti-Futebol” e dois anos depois…
Onde está o Grande Romance do Futebol Brasileiro? Por que nossos escritores perebas não conseguem fazer justiça a essa porção tão risonha e límpida da alma nacional? A questão vive rondando a fronteira entre a crítica literária e o departamento de vigilância da auto-estima brasileira. A cada Copa do Mundo, ressurge com ares de grande sabedoria para rechear cadernos literários, blogs e seminários. Convocados a explicar o fenômeno, os sábios de plantão costumam se dividir em dois times: o dos que consideram os escritores brasileiros elitistas demais para dar bola para o tema e o dos que consideram os escritores brasileiros competentes de menos diante da magnitude do tema. De uma forma ou de outra, culpados. Mas será que o Grande Romance do Futebol Brasileiro (daqui em diante GRFB, para facilitar) é essa grande lacuna porque, como diz o antropólogo Roberto DaMatta, os elitistas intelectuais brasileiros “detestam o futebol” – logo eles, com sua forte corrente populista encabeçada por ninguém menos que Jorge Amado? Ou seria porque, nas palavras do crítico Silviano Santiago, “o imaginário sobre futebol no Brasil é um espaço tão complexo, tão amplo e tão multifacetado” que provoca a falência dos projetos estéticos que dele se aproximam…